Experimente agora!
VoltarHome/Jurisprudência Previdenciária

PREVIDENCIÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. APOSENTADORIA POR IDADE HÍBRIDA. DIREITO LÍQUIDO E CERTO DEMONSTRADO. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. TRF4. 5001209-15.2020.4...

Data da publicação: 15/04/2021, 11:01:05

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. APOSENTADORIA POR IDADE HÍBRIDA. DIREITO LÍQUIDO E CERTO DEMONSTRADO. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. 1. Tratando-se de mandado de segurança, a remessa oficial é devida quando concedida a ordem, ainda que parcialmente, nos termos do artigo 14, § 1º, da Lei nº 12.016/2009. 2. Mantida a sentença que concedeu a segurança para determinar à autoridade impetrada que implante a aposentadoria por idade hibrida. (TRF4 5001209-15.2020.4.04.7001, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, Relator LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO, juntado aos autos em 07/04/2021)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Remessa Necessária Cível Nº 5001209-15.2020.4.04.7001/PR

RELATOR: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO

PARTE AUTORA: SEBASTIAO DOMINGO DOS SANTOS (IMPETRANTE)

PARTE RÉ: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (INTERESSADO)

RELATÓRIO

Trata-se de mandado de segurança em que a parte autora objetiva a concessão de aposentadoria por idade híbrida, mediante o reconhecimento dos períodos constantes na CTPS, CNIS e contagem do processo administrativo como carência.

Sentenciando, em 24/06/2020, o MM. Juiz julgou o feito, nos seguintes termos:

Por todo o exposto, JULGO PROCEDENTES OS PEDIDOS FORMULADOS NA INICIAL, com fundamento no artigo 487, inciso I, do Código de Processual Civil, e CONCEDO A SEGURANÇA para determinar à Autoridade Impetrada que implante o benefício de aposentadoria por idade NB 41/184.671.752-0 (DER em 14/10/2019) no prazo de 30 dias.

Requisite-se a Agência do INSS para cumprimento da liminar ora deferida.

Sem condenação em honorários (art. 25 da Lei nº 12.016/2009).

Custas processuais pela Impetrada, observando a isenção prevista à Autarquia no artigo 4º, inciso I, da Lei n.º 9.289/96.

Havendo interposição de recurso de apelação, desde já o recebo em seu efeito devolutivo, ressalvada a possibilidade de reexame dos pressupostos de admissibilidade do recurso após a resposta, nos termos do parágrafo 2º do art. 518 do Código de Processo Civil. Com a apresentação de recurso de apelação, dê-se vista ao Apelado para oferecimento de contrarrazões, no prazo legal. Em seguida, remetam-se eletronicamente ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região.

Reexame necessário (artigo 14, §1º da Lei 12.016/2009).

É o relatório.

VOTO

REMESSA NECESSÁRIA

Tratando-se de ação mandamental, na qual tenha sido concedida a segurança em favor do impetrante, deverá a sentença ser submetida ao duplo grau de jurisdição obrigatório, nos termos do artigo 14º da Lei n. 12.016/2009, que assim dispõe:

Art. 14. Da sentença, denegando ou concedendo o mandado, cabe apelação.

§ 1º Concedida a segurança, a sentença estará sujeita obrigatoriamente ao duplo grau de jurisdição.

Nesse contexto, impõe-se o reexame do julgado.

CASO CONCRETO

Adoto os próprios fundamentos da sentença como razões para decidir:

Conforme preconizado no art. 5.º, inciso LXIX, da Constituição Federal, "conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público" (destaquei).

Portanto, por disposição constitucional, somente o direito que se apresentar líquido e certo pode ser amparado pela via estreita do mandado de segurança, em que, como é cediço, inexiste a possibilidade de dilação probatória, devendo o direito invocado pela parte impetrante estar evidenciado em prova pré-constituída.

Sobre o tema, confira-se a jurisprudência:

TRIBUTÁRIO E PROCESSO CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. CONCEITO DE LIQUIDEZ E CERTEZA. ISENÇÃO ONEROSA. IRREVOGABILIDADE. LEI-7988/89 E DEL-2324/87. 1. O conceito atual de direito líquido e certo guarda cunho marcadamente processual, referindo-se ao direito demonstrado de plano, com prova pré-constituída, a dispensar dilação probatória. 2. A isenção onerosa não pode ser revogada. (TRF4, AMS 95.04.14784-4, Segunda Turma, Relator Luiz Carlos de Castro Lugon, DJ 17/02/1999, destaquei).

TRIBUTÁRIO - CSLL E IRPJ - BASE DE CÁLCULO - SERVIÇOS HOSPITALARES - ABRANGÊNCIA - ART. 15, § 1º, III, "A", e ARTIGO 20 DA LEI Nº 9.249/95. [...] 2 - A via estreita do mandado de segurança pressupõe a existência de direito líquido e certo e deve estar fundada em prova pré-constituída. Não há como aferir, apenas com os documentos juntados, se o impetrante tinha ou não o direito pleiteado. Ordem denegada, ressalvando-se à parte o recurso às vias ordinárias. (TRF4, AC 2007.70.00.003825-5, Segunda Turma, Relatora Marciane Bonzanini, D.E. 04/02/2009, destaquei).

PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL. MANDADO DE SEGURANÇA. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. ENTIDADE FILANTRÓPICA. ISENÇÃO. DILAÇÃO PROBATÓRIA. CERTIDÃO NEGATIVA DE DÉBITO. DIREITO LÍQUIDO E CERTO. INEXISTÊNCIA. 1. O mandado de segurança é via inadequada para o reconhecimento do direito à isenção tributária pela entidade filantrópica, nas hipóteses em que se exige dilação probatória, uma vez que esta descaracteriza o denominado direito líquido e certo. Suposto direito líquido e certo à certidão negativa de débito. 2. A averiguação de liquidez e certeza do direito pelo E. STJ somente pode ocorrer nos casos de writ de impetração originária, porquanto, do contrário, imiscui-se a Corte na análise da prova, transmudando-se em tribunal de terceira instância, com desvirtuamento de sua função constitucional. 3. O conceito de direito líquido e certo emigra do campo normativo para o âmbito probatório, por isso que a liquidez e certeza do jus não se perscruta na lei, senão aquele no próprio fato constitutivo do direito do autor, cuja demonstração em juízo se opera através da prova. 4. Em conseqüência, o recorrente que pretende seja reavaliado o seu direito líquido e certo, esbarra na súmula impeditiva de número 07 do E. STJ e de seguinte teor: "A pretensão de simples reexame de prova não enseja recurso especial". 5. Pretensão imunizatório-tributária que não restará sem alvitre judicial, tanto mais que a declaração de inexistência de direito líquido e certo não inibe a demonstração das razões da parte pela via da cognição ordinária, como preceitua o art. 15 da lei mandamental. 6. Ausência de motivos suficientes para a modificação do julgado. Manutenção da decisão agravada. 7. Agravo Regimental improvido. (AgRg no REsp 331.024/SP, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 05/12/2002, DJ 19/12/2002 p. 335, destaquei)

Cabe dizer que, na ação de mandado de segurança, não está vedada a discussão acerca do direito aplicável, por mais complexo que ele seja (STF, Súmula n.º 625: Controvérsia sobre matéria de direito não impede concessão de mandado de segurança); entretanto, não se admite controvérsia sobre os fatos subjacentes; daí a necessidade da prova pré-constituída, onde os fatos devem estar incontestavelmente demonstrados.

Estabelecido o alcance do mandado de segurança, passa-se a analisar o direito aplicável ao caso em análise.

No presente caso, o impetrante alega que possui direito líquido e certo à concessão do benefício da aposentadoria por idade, aduzindo que os requisitos de idade (65 anos) e carência (180 meses) se encontram satisfeitos.

Quanto à carência, o impetrante assim referiu na inicial, em síntese (evento 1, INIC1):

Pois bem.

Verifica-se que o INSS indeferiu o benefício do impetrante sob os seguintes fundamentos constantes no processo administrativo (evento 9, PROCADM2, p. 12):

Conforme se verifica, o INSS, mesmo reconhecendo 219 meses de carência até a DER, conforme planilha anexada ao PA (evento 9, PROCADM2, p. 7), deixou de conceder ao impetrante o benefício de aposentadoria por idade híbrida, nos termos da decisão administrativa acima colacionada.

Pois bem.

De todo esse contexto, extrai-se que a questão a ser analisada no caso presente é a possibilidade da utilização dos períodos rurais de 20/06/1995 a 19/06/2000 e 01/03/2010 a 14/09/2014 para a concessão da aposentadoria por idade híbrida ao impetrante.

Inicialmente, impende salientar que tais períodos restaram definitivamente reconhecidos, especialmente para efeitos de carência, nos autos da ação nº 5012151-82.2015.4.04.7001, que tramitou perante o Juízo Federal desta 8ª Vara Federal de Londrina.

Por oportuno, transcrevo trechos da sentença, transitada em julgada, prolatada na referida ação (evento 17, SENT1, daqueles autos eletrônicos):

"O INSS deverá averbar ambos os períodos de trabalho rural acima, mas com as seguintes ressalvas.

O interregno de 20/06/1995 a 19/06/2000, no qual a parte autora ostentou a condição de segurado especial (porcenteiro), deverá ser averbado pelo INSS para o fim exclusivo de concessão eventual de aposentadoria por idade, uma vez que não há provas no feito de que houve recolhimentos das respectivas contribuições previdenciárias exigidas pela Lei 8.212/91, para o aproveitamento como carência e tempo de serviço/contribuição.

Já o lapso de 01/03/2010 a 14/09/2014, no qual a parte autora manteve vínculos de trabalho rural volante (bóia-fria) será averbado e poderá ser aproveitado na aferição dos requisitos legais da eventual concessão de aposentadoria por tempo de contribuição (tempo de contribuição e carência).

(...)

DISPOSITIVO

Diante do exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados na petição inicial, para reconhecer o desempenho do trabalho rural de 20/06/1995 a 19/06/2000 e de 01/03/2010 a 17/09/2014 (DER). Os respectivos interregnos serão averbados pelo INSS, mas apenas o tempo de contribuição de 01/03/2010 a 17/09/2014 poderá ser utilizado na eventual concessão de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição, nos termos da fundamentação.

Não há direito adquirido à aposentadoria por idade ao trabalhador rural."

Assim, tem-se que restou imutável, pelo manto da coisa julgada, a possibilidade de o impetrante utilizar ambos os períodos rurais em questão para fins de carência em futura aposentadoria por idade.

Da Aposentadoria por idade

A aposentadoria por idade exige o cumprimento de dois requisitos, quais sejam, carência e idade. Entretanto, no caso da aposentadoria por idade rural, o exercício de atividade rural por tempo igual ao número de meses de contribuição corresponde à carência.

Consoante o art. 201, §7º, II, da Constituição Federal de 1988, para se aposentar por idade no âmbito do RGPS, o segurado deve ter a idade de 65 anos, se homem, e de 60 anos, se mulher, limites que são reduzidos em cinco anos, nos casos dos trabalhadores rurais de ambos os sexos e para os que exerçam suas atividades em regime de economia familiar (60 anos para o homem, e 55 para a mulher).

Pois bem.

No presente caso, o requisito etário restou implementado em 30/08/2019, pois, nesta data, o impetrante (sexo masculino) completou 65 anos de idade. De fato, o impetrante nascera em 30/08/1954 (evento 01, PROCADM4, p. 8).

Por outro lado, considerando que o impetrante se filiou ao RGPS antes da Lei 8.213/1991, para o ano de 2019, em que a idade mínima restou implementada, a tabela do art. 142 exige a carência de 180 contribuições mensais.

Ressalto que descabe a tese defendida pelo INSS quanto à fixação da carência no momento em que entraram em vigência as alterações promovidas pela Lei 11.718/2008, em especial quando o caso concreto versar acerca da hipótese de concessão da "aposentadoria por idade mista".

Ora, o art. 142 da Lei 8.213/91 consignou norma específica acerca da fixação da carência a ser cumprida pelos segurados filiados no RGPS antes da vigência da Lei 8.213/91. E, ao aplicar referida norma, a jurisprudência assentou entendimento no sentido de que o marco temporal que define a carência é data em que o segurado implementou a idade mínima exigida, tal qual decidiu a TNU na Súmula 44:

Para efeito de aposentadoria por idade urbana, a tabela progressiva de carência prevista no artigo 142 da Lei 8.213/91 deve ser aplicada em função do ano em que o segurado completa a idade mínima para concessão do benefício, ainda que o período de carência só seja preenchido posteriormente.

Portanto, considerando que a regra de transição do art. 142 se manteve intacta, entendo que a simples hermenêutica acerca do conflito temporal da Lei 8.213/91 com a Lei 11.718/2008 não é capaz de gerar interpretação no sentido da revogação tácita daquele dispositivo.

Note-se que as inovações introduzidas nos §2º e §3º do art. 48 trazem normas vinculadas às formas de cumprimento da carência, sobremodo quanto à integração dos interregnos de trabalho urbano e rural na concessão da aposentadoria por idade, ou vice-versa. E visam facilitar o acesso dos segurados que ostentem tais condições ao aludido benefício, e não dificultar o seu gozo.

Destarte, in casu, a carência exigida se perfaz com exatos 180 meses que correspondem a 15 anos de tempo de serviço rural ou urbano.

Da "Aposentadoria por idade Mista"

Na petição inicial, o impetrante pleiteou a consideração dos períodos de trabalho de natureza rural realizados antes e/ou depois do labor urbano, para fins de complementação da carência e consequente concessão de aposentadoria por idade mista prevista no art. 48, §3º, da Lei 8.213/91.

A Lei 11.718, de 20/07/2008, alterou a disciplina da concessão da aposentadoria por idade, em especial o disposto no art. 48 da Lei 8.213/91, dando nova redação ao §2º e incluindo os parágrafos 3º e 4º deste dispositivo.

Confira-se:

Art. 48. A aposentadoria por idade será devida ao segurado que, cumprida a carência exigida nesta Lei, completar 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta), se mulher. (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995)

§1o Os limites fixados no caput são reduzidos para sessenta e cinquenta e cinco anos no caso de trabalhadores rurais, respectivamente homens e mulheres, referidos na alínea a do inciso I, na alínea g do inciso V e nos incisos VI e VII do art. 11. (Redação dada pela Lei nº 9.876, de 1999)

§2o Para os efeitos do disposto no § 1o deste artigo, o trabalhador rural deve comprovar o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício pretendido, computado o período a que se referem os incisos III a VIII do § 9o do art. 11 desta Lei. (Redação dada pela Lei nº 11,718, de 2008)

§3o Os trabalhadores rurais de que trata o § 1o deste artigo que não atendam ao disposto no § 2o deste artigo, mas que satisfaçam essa condição, se forem considerados períodos de contribuição sob outras categorias do segurado, farão jus ao benefício ao completarem 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta) anos, se mulher. (Incluído pela Lei nº 11,718, de 2008)

§4o Para efeito do § 3o deste artigo, o cálculo da renda mensal do benefício será apurado de acordo com o disposto no inciso II do caput do art. 29 desta Lei, considerando-se como salário-de-contribuição mensal do período como segurado especial o limite mínimo de salário-de-contribuição da Previdência Social. (Incluído pela Lei nº 11,718, de 2008)

De acordo com a redação do novo parágrafo 3º, surge no mundo jurídico a chamada "aposentadoria por idade mista", pela qual aos trabalhadores rurais que não tenham comprovado o efetivo exercício de atividade rurícola, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício pretendido, mas que satisfaçam essa condição, se forem considerados períodos de contribuição sob outras categorias do segurado, será garantido o direito ao benefício quando completarem 65 anos de idade, se homem, e 60 anos, se mulher.

Em outras palavras, para a obtenção da aposentadoria por idade, é lícito ao trabalhador rural, para fins de cumprimento do período de efetivo exercício de atividade rurícola, somar a este os períodos de contribuição sob outras categorias do segurado, desde que implementado o requisito etário concernente à aposentadoria por idade concedida ao trabalhador urbano.

Oportuno recordar que, conforme redação do art. 4° da EC 20/1998, "... o tempo de serviço considerado pela legislação vigente para efeito de aposentadoria, cumprido até que a lei discipline a matéria, será contado como tempo de contribuição". Destarte, sendo a EC 20/1998 posterior à Lei 8.213/1991, forçoso reconhecer que o tempo de serviço rural pode ser computado como carência no caso de aposentadoria por idade mista (mas não para aposentadoria por tempo de contribuição), sob pena de desatender o referido mandamento constitucional.

No que tange à eventual arguição de inexistência de contribuição direta relativa ao período de atividade rural, ressalto que, até a edição da Lei 8.213/1991, não se exigia recolhimento, sendo que, atualmente, consoante disposto no parágrafo 9º do art. 195 da CF, segundo o qual "As contribuições sociais previstas no inciso I do caput deste artigo poderão ter alíquotas ou bases de cálculo diferenciadas, em razão da atividade econômica, da utilização intensiva de mão-de-obra, do porte da empresa ou da condição estrutural do mercado de trabalho", combinado com o § 1° do art. 3° da Lei n° 10.666/03, o legislador entendeu bastar prova do tempo de serviço equivalente ao tempo de contribuição.

Transcreve-se:

Lei 10.666/2003 - Art. 3º. A perda da qualidade de segurado não será considerada para a concessão das aposentadorias por tempo de contribuição e especial.

§ 1o. Na hipótese de aposentadoria por idade, a perda da qualidade de segurado não será considerada para a concessão desse benefício, desde que o segurado conte com, no mínimo, o tempo de contribuição correspondente ao exigido para efeito de carência na data do requerimento do benefício.

Nada obstante, a análise desse permissivo legal à luz dos princípios constitucionais da uniformidade e equivalência dos benefícios às populações rurais e urbanas faz surgir questionamentos acerca de sua aplicabilidade também aos trabalhadores urbanos.

Não há lógica, nem justiça, em permitir que o trabalhador rural aproveite períodos urbanos para a obtenção de "aposentadoria por idade mista" (§3° do art. 48 da Lei n° 8.213/91), e denegar o mesmo direito ao trabalhador urbano que tenha laborado anteriormente na área rural. Esta hipótese constituiria violação do princípio da isonomia (art. 5°, inc. I, da CF).

Ressalte-se que, diante do princípio constitucional de uniformidade da seguridade social às populações urbanas e rurais (art. 194, inc. II, da CF), imperioso se realizar uma interpretação conforme a Constituição, com a supressão da palavra "rurais" no texto do §3º do art. 48 da Lei n° 8.213/91, estendendo-se o benefício também aos trabalhadores urbanos, desde que comprovada a atividade urbana e rural.

Em conclusão, o nosso entendimento é o seguinte: o segurado poderá somar os períodos rurais (sem contribuição - excluídos os segurados que tinham a obrigação de recolher por conta própria) aos urbanos (com contribuição efetiva) para a obtenção da aposentadoria por idade mista. Ressalva-se que essa aceitação do período rural sem contribuição somente é válida para a carência da aposentadoria por idade mista, pois é uma exceção à regra geral. Situação diferenciada que foi autorizada pelo novo par. 3. do art. 48 da Lei 8.213. Precedentes na jurisprudência do TRF da 4a. Região: Apelações Cíveis 0001627-75.2014.404.9999/RS; 0000063-61.2014.404.9999/RS; 0023169-86.2013.404.9999/RS. Em todos os julgamentos mencionados foi relator o ilustre Desembargador Federal Rogério Favreto da egrégia 5a. Turma.

Nesse sentido, também decidiu a Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais, nos autos 5000957-33.2012.4.04.7214, in verbis:

"DIREITO PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA MISTA OU HÍBRIDA. CONTAGEM DE TEMPO RURAL PARA APOSENTADORIA URBANA. APLICAÇÃO EXTENSIVA DO ATUAL DO ARTIGO 48, § 3º E 4O. DA LEI DE BENEFÍCIOS. DIRETRIZ FIXADA PELA SEGUNDA TURMA DO SUPERIOR TRIBUNA DE JUSTIÇA NO RECURSO ESPECIAL 1.407.613. ISONOMIA DO TRABALHADOR RURAL COM O URBANO. APOSENTADORIA POR IDADE NA FORMA HÍBRIDA PERMITIDA TAMBÉM PARA O URBANO QUANDO HOUVER, ALÉM DA IDADE, CUMPRIDO A CARÊNCIA EXIGIDA COM CONSIDERAÇÃO DOS PERÍODOS DE TRABALHO RURAL. PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO CONHECIDO E PROVIDO.

(...)

Com efeito, extrai-se da nova redação do parágrafo 3o do art. 48 da Lei no 8.213/91, dada pela Lei no 11.718/2008, que aos trabalhadores rurais que não cumprirem a carência da aposentadoria rural por idade, mas que satisfizerem essa condição se considerados períodos de contribuição sob outras categorias, poderão ter direito ao benefício quando completados 65 anos, se homem, ou 60 anos de idade, se mulher. A alteração, portanto, destina-se aos trabalhadores rurais, não aos trabalhadores tipicamente urbanos, como é o caso do(a) autor(a).”

(...)

3.1. A nova disciplina inserida pela Lei 11.718/2008 tem por objetivo corrigir situações de injustiça de diversos segurados que, por terem trabalhado parte no campo, parte no meio urbano, não conseguiam implementar, in totum, a carência exigida para a concessão da aposentadoria por idade (Art. 48, Lei 8.213/91). O parágrafo 3o. do citado Art. 48 da Lei 8.213/91 permite que a carência necessária à percepção do benefício previdenciário fosse aferida consoante a forma nele prevista, para que o trabalhador rural não viesse a ser prejudicado.

4. Essa forma de aposentadoria por idade prevista no par. 3o., do Art. 48, da Lei 8.213/91, alcança o segurado/trabalhador rural, com a finalidade de tutelar a condição jurídica daqueles que, por certo tempo afetos ao trabalho urbano, viessem a retornar ao campo.

(...)

7. Quanto ao mérito, tenho que a mais recente diretriz hermenêutica da Segunda Turma do C. STJ, fixada nos autos do Recurso Especial 1407613, da Relatoria do Min. Herman Benjamin (julgado em 14.10.2014) deu nova configuração à tese tratada nestes autos. Com efeito, esta Turma Nacional, em precedentes vários, havia entendido que a regra constante no art. 48 artigo 48, parágrafos 3º. e 4º., da Lei de Benefícios de Previdência possuía “mão única”, sendo devida apenas para o trabalhador rural. 7.1.Desse modo, se o trabalhador fosse urbano, não faria jus o beneficiário ao favor legis. Com efeito, esta Turma Nacional de Uniformização, ao julgar os Pedidos de Uniformização n. 2008.50.51.001295-0 (Rel. Juiz Federal Paulo Ernane Moreira Barros) e 5001211-58.2012.4.04.7102 (Rel. Juíza Federal Ana Beatriz Vieira da Luz Palumbo), procedendo a uma interpretação sistemática dos artigos 48 e 55 da Lei 8.213/91, decidiu que a Lei 11.718/2008 apenas autorizou ao trabalhador rural utilizar as contribuições recolhidas para o regime urbano para fins de cumprimento da carência para aposentadoria por idade rural. Por outro lado, o trabalhador urbano não pode se utilizar de período rural para o preenchimento de carência com vistas à aposentadoria por idade urbana.

8. Entretanto, foi justamente essa a tese que veio a ser rechaçada pelo STJ no julgamento ora referido. Verbis: “o trabalhador tem direito a se aposentar por idade, na forma híbrida, quando atinge 65 anos (homens) ou 60 (mulheres), desde que tenha cumprido a carência exigida com a consideração dos períodos urbano e rural. Nesse caso, não faz diferença se ele está ou não exercendo atividade rural no momento em que completa a idade ou apresenta o requerimento administrativo, nem o tipo de trabalho predominante”. 8.1. Segundo o em. Ministro Relator, efetivamente, “… o que define o regime jurídico da aposentadoria é o trabalho exercido no período de carência: se exclusivamente rural ou urbano, será respectivamente aposentadoria por idade rural ou urbana; se de natureza mista, o regime será o do artigo 48, parágrafos 3º. e 4º, da Lei 8.213, independentemente de a atividade urbana ser a preponderante no período de carência ou a vigente quando do implemento da idade”. 8.2. Desse modo, o que decidiu a Corte Federal foi que a denominada aposentação por idade híbrida de regimes de trabalho, instituída pela Lei 11.718/08 contempla tanto os trabalhadores rurais que migraram da cidade para o campo, como o contrário (aqueles que saíram do campo e foram para a cidade). Isso porque, seja por amor ao postulado da isonomia, vez que a ratio é a mesma como ainda ante o fato de que, em sendo postulada aposentadoria urbana, de toda forma estar-se-á valorizando aquele que, muito ou pouco, contribuiu para o sistema.

(PEDILEF 50009573320124047214, JUIZ FEDERAL BRUNO LEONARDO CÂMARA CARRÁ, TNU, DOU 19/12/2014 PÁGINAS 277/424.)

Destarte, fica assegurada a possibilidade concessão da "aposentadoria por idade mista", em idênticas condições, tanto ao segurado trabalhador rural quanto ao segurado trabalhador urbano.

Com isso, na esteira dos fundamentos acima, entendo que não há óbice a que sejam considerados, como carência, para fins de concessão do benefício de aposentadoria por idade ao impetrante, na forma híbrida, os períodos rurais já reconhecidos judicialmente para tal fim e incluídos na contagem de tempo administrativa efetuada pelo INSS (20/06/1995 a 19/06/2000 e de 01/03/2010 a 17/09/2014), a qual resultou em 219 meses de carência (evento 9, PROCADM2, p. 7).

Apenas a título de registro, saliento que os lapsos rurais acima mencionados não se incluem naqueles de que trata o Tema 1007 do sistema de repetitivos do STJ, o qual foi afetado, como representativo de controvérsia, de Recurso Extraordinário interposto ("tempo de serviço rural, ainda que remoto e descontínuo, anterior ao advento da Lei 8.213/1991").

Por tudo isso, verifica-se o impetrante possui direito líquido e certo à concessão do benefício da aposentadoria por idade híbrida, a partir da DER em 14/10/2019, uma vez que os requisitos de idade (65 anos) e carência (180 meses) se encontram satisfeitos.

Logo, tendo a Administração Pública violado direito líquido e certo do segurado à concessão do benefício, impõe-se a concessão da segurança.

CONSECTÁRIOS LEGAIS

Os consectários legais devem ser fixados nos termos que constam do Manual de Cálculos da Justiça Federal e, a partir da vigência da Lei nº11.960/2009 que alterou a redação do artigo 1º-F da Lei nº 9.494/1997, nos termos das teses firmadas pelo Supremo Tribunal Federal no Tema 810 (RE 870.947) e pelo Superior Tribunal de Justiça no Tema 905 (REsp 1.492.221/PR).

TUTELA ESPECÍFICA

Reconhecido o direito do autor ao benefício, resta mantida a tutela concedida na sentença.

CONCLUSÃO

Remessa necessária improvida.

Mantida a tutela concedida na sentença.

DISPOSITIVO

Ante o exposto, voto por negar provimento à remessa necessária e manter a tutela concedida na sentença.



Documento eletrônico assinado por LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002374599v8 e do código CRC 41ece552.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
Data e Hora: 7/4/2021, às 14:41:37


5001209-15.2020.4.04.7001
40002374599.V8


Conferência de autenticidade emitida em 15/04/2021 08:01:02.

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Remessa Necessária Cível Nº 5001209-15.2020.4.04.7001/PR

RELATOR: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO

PARTE AUTORA: SEBASTIAO DOMINGO DOS SANTOS (IMPETRANTE)

PARTE RÉ: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (INTERESSADO)

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. APOSENTADORIA POR IDADE HÍBRIDA. DIREITO LÍQUIDO E CERTO DEMONSTRADO. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA.

1. Tratando-se de mandado de segurança, a remessa oficial é devida quando concedida a ordem, ainda que parcialmente, nos termos do artigo 14, § 1º, da Lei nº 12.016/2009.

2. Mantida a sentença que concedeu a segurança para determinar à autoridade impetrada que implante a aposentadoria por idade hibrida.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar do Paraná do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à remessa necessária e manter a tutela concedida na sentença, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Curitiba, 30 de março de 2021.



Documento eletrônico assinado por LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002374600v4 e do código CRC 54decb52.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
Data e Hora: 7/4/2021, às 14:41:37


5001209-15.2020.4.04.7001
40002374600 .V4


Conferência de autenticidade emitida em 15/04/2021 08:01:02.

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 23/03/2021 A 30/03/2021

Remessa Necessária Cível Nº 5001209-15.2020.4.04.7001/PR

RELATOR: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO

PRESIDENTE: Desembargador Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA

PARTE AUTORA: SEBASTIAO DOMINGO DOS SANTOS (IMPETRANTE)

ADVOGADO: Rafael Passetti Monteiro (OAB PR062298)

PARTE RÉ: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (INTERESSADO)

MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (MPF)

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 23/03/2021, às 00:00, a 30/03/2021, às 16:00, na sequência 723, disponibilizada no DE de 12/03/2021.

Certifico que a Turma Regional suplementar do Paraná, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PARANÁ DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À REMESSA NECESSÁRIA E MANTER A TUTELA CONCEDIDA NA SENTENÇA.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO

Votante: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO

Votante: Desembargador Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA

Votante: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA

SUZANA ROESSING

Secretária



Conferência de autenticidade emitida em 15/04/2021 08:01:02.

O Prev já ajudou mais de 140 mil advogados em todo o Brasil.Faça cálculos ilimitados e utilize quantas petições quiser!

Experimente agora