APELAÇÃO CÍVEL Nº 5023371-48.2013.404.7001/PR
RELATOR | : | TAIS SCHILLING FERRAZ |
APELANTE | : | VERA LUCIA DEVANCO DA SILVA |
ADVOGADO | : | BRUNO ANDRÉ SOARES BETAZZA |
: | ALEXANDRE DA SILVA | |
: | EVANDRO CESAR MELLO DE OLIVEIRA | |
: | HELDER MASQUETE CALIXTI | |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
MPF | : | MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL |
EMENTA
MANDADO DE SEGURANÇA. PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. DEVOLUÇÃO DE VALORES RECEBIDOS.
Considerandoo auxílio-doença é benefício concebido para amparar o trabalhador incapaz profissionalmente, não há como se cogitar da boa-fé do segurado que, ao pleitear e receber auxílio-doença, ao fundamento da incapacidade para o desenvolvimento de suas atividades profissionais habituais, permanece auferindo rendimentos a título de pro-labore, provenientes justamente da fonte pagadora de onde estaria afastada pela situação de incapacidade.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 5a. Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 17 de dezembro de 2014.
Juíza Federal Taís Schilling Ferraz
Relatora
| Documento eletrônico assinado por Juíza Federal Taís Schilling Ferraz, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7207104v8 e, se solicitado, do código CRC 259E298D. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Taís Schilling Ferraz |
| Data e Hora: | 26/01/2015 17:02 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5023371-48.2013.404.7001/PR
RELATOR | : | TAIS SCHILLING FERRAZ |
APELANTE | : | VERA LUCIA DEVANCO DA SILVA |
ADVOGADO | : | BRUNO ANDRÉ SOARES BETAZZA |
: | ALEXANDRE DA SILVA | |
: | EVANDRO CESAR MELLO DE OLIVEIRA | |
: | HELDER MASQUETE CALIXTI | |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
MPF | : | MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL |
RELATÓRIO
Trata-se de Mandado de Segurança impetrado por Vera Lucia Devanco da Silva, em face do Chefe da Agência do Instituto Nacional do Seguro Social de Arapongas, consistente na decisão que determinou a devolução dos valores recebidos a título de auxílio-doença (NB 551.664.912-5), de 03/05/2012 a 22/10/2012, pagos supostamente de forma ilegal, objetivando que seja determinada a suspensão da exigibilidade do débito, bem como seja vetada a inscrição em dívida ativa de seu nome, ou a exclusão imediata caso já inscrito.
O juízo de primeiro grau julgou improcedente o pedido e denegou a segurança, entendendo que a concessão do auxílio-doença, embora regular em sua origem, tornou-se ilegítimo, na medida em que a impetrante continuou percebendo rendimentos fruto de seu trabalho como sócia administradora e não comunicou tal fato à Previdência Social (evento 20 do originário).
Irresignada, a impetrante interpôs apelação, requerendo a reforma da sentença. Alega em síntese, que agiu de boa-fé, na percepção do auxílio-doença concomitante com pro labore, e que por isso deve ser aplicado o princípio da irrepetibilidade da verbas alimentares, desobrigando-a da devolução de quaisquer valores.
Sem contrarrazões.
O MPF não se manifestou sobre a demanda.
É o relatório.
VOTO
O Magistrado a quo deslindou com muita propriedade a questão posta nos autos, razão pela qual passo a transcrever excerto da r. sentença, adotando os seus fundamentos como razão de decidir, verbis (evento 20 - SENT1):
"II. FUNDAMENTAÇÃO.
Tanto a Constituição Federal, no inciso LXIX de seu artigo 5º, quanto a Lei n. 12.016/2009, em seu art. 1º, exigem como pressuposto para a impetração do mandado de segurança que o direito subjetivo, a ser protegido pelo órgão jurisdicional, seja líquido e certo.
E, no prestigiado ensinamento de Hely Lopes Meirelles (Mandado de Segurança, 16ª ed., São Paulo: Malheiros, 1995, p. 29), direito líquido e certo é o que se apresenta com todos os requisitos para seu reconhecimento e exercício no momento da impetração. Em última análise, direito líquido e certo é comprovado de plano.
Complementa o já citado professor que o conceito legal está mal expresso, porque traz referência ao direito, quando, na verdade, deveria aludir à precisão e à comprovação dos fatos e situações que propiciam o exercício desse direito. Por isso, não haveria dilação probatória no mandado de segurança, limitando-se às informações prestadas pelo impetrado, sendo que a existência ou não do direito e do seu suporte fático deriva do exame da inicial, dos documentos que a acompanham, e dessas informações.
O writ constitui, pois, um instituto de direito processual constitucional que visa a garantir a recomposição imediata do direito individual ou coletivo lesado por ato ilegal ou abusivo da autoridade, a exigir prova pré-constituída das situações e fatos que amparam o direito do impetrante.
Na espécie, pretende a impetrante seja declarada a '(...) inexigibilidade do débito de R$ 4.063,08 (quatro mil e sessenta e três reais e oito centavos) e os acréscimos legais (juros e multa exigidos) decorrente da percepção cumulativa do benefício de auxílio-doença no período de 03/05/2012 a 22/10/2012 com pró-labore'.
Os benefícios previdenciários de auxílio-doença, auxílio-acidente e de aposentadorias substituem, em regra, os rendimentos do trabalhador/segurado, tanto que a renda mensal do respectivo benefício é calculada com base nestes ganhos habituais denominados de salário-de-contribuição, nos termos do artigos 2º, VI, 33 e 35, todos da Lei 8.213/1991.
Especificamente, o benefício previdenciário de auxílio-doença é uma prestação que substitui a renda do trabalhador justamente pela inaptidão física temporária de continuar exercer seu trabalho habitual que lhe garanta subsistência.
O risco social, portanto, a ser amparado pela Previdência Social é a incapacidade laborativa da qual é consequencia lógica o não recebimento dos respectivos rendimentos (salário, pro labore etc) para prover a subsistência. Em outras palavras, o que objetiva a norma de proteção previdenciária, ao fim e ao cabo, não é amparar o indivíduo incapacitado pelo simples fato de estar nessa condição, mas sim por não ter ele meios próprios de prover ao próprio sustento ou de sua família.
Nessa linha, caso o segurado continue a receber, por alguma razão, esta mesma renda decorrente do mesmo vínculo empregatício e/ou contratual anterior, o amparo estatal (benefício por incapacidade) deixa de ser necessário, porque financeiramente ele ainda estaria assistido.
Logo, as regras referentes ao auxílio-doença (art. 59 e seguintes da Lei 8.213/1991) somente incidirão se verificados no caso concreto os seguintes requisitos e condições: a) constatação por perícia médica da enfermidade incapacitante; b) afastamento do trabalho para o qual o segurado não possuiria saúde físico-mental para exercer; c) ausência de continuidade do pagamento da respectiva remuneração pelo empregador, tomador de serviço etc, dado o caráter substitutivo da renda deste benefício previdenciário.
Os artigos 59, caput, 60 e 62 da Lei 8.213/1991 são claros ao exigirem essa situação fática complexa (incapacidade + afastamento do trabalho + ausência de remuneração), nos seguintes termos:
Art. 59. O auxílio-doença será devido ao segurado que, havendo cumprido, quando for o caso, o período de carência exigido nesta Lei, ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias consecutivos.
Art. 60. O auxílio-doença será devido ao segurado empregado a contar do décimo sexto dia do afastamento da atividade, e, no caso dos demais segurados, a contar da data do início da incapacidade e enquanto ele permanecer incapaz.
Art. 62. O segurado em gozo de auxílio-doença, insusceptível de recuperação para sua atividade habitual, deverá submeter-se a processo de reabilitação profissional para o exercício de outra atividade. Não cessará o benefício até que seja dado como habilitado para o desempenho de nova atividade que lhe garanta a subsistência ou, quando considerado não-recuperável, for aposentado por invalidez.
No caso em apreço, a Impetrante é segurada do Regime Geral da Previdência Social como contribuinte individual (sócio-gerente), prestando serviços para a sociedade empresária L C Davanco e Silva Ltda.
Restou apurado pelo INSS, mediante diligência externa junto ao contador de referida pessoa jurídica, que a Impetrante continuou recebendo pro labore no período em que esteve em gozo de auxílio-doença (05/2012 a 10/2012). Os respectivos recibos de pagamento da remuneração encontram-se às fl. 6-11 do PROCADM12.
A impetrante, embora não negue ter recebido as remunerações a título de pro labore, diz não ter trabalhado.
Ainda que se repute verdadeira a afirmação da Impetrante, deixou ela de observar a condição legal exigida para que continuasse a receber legitimamente o auxílio-doença, qual seja, a ausência de recebimento de remuneração da mesma fonte pagadora.
Ora, se a Impetrante esteve amparada financeiramente no período em que padecia de enfermidade incapacitante, não restaram preenchidos todos os requisitos e condições para a manutenção do pagamento do benefício por incapacidade em questão, conforme acima fundamentado.
Nesses termos, denota-se legítimo o ato decisório da autoridade impetrada que concluiu pela ilegalidade do pagamento das parcelas do benefício de auxílio-doença nº 551.664.912-5.
Sob outra perspectiva, não tem aplicação, na situação dos autos, a construção jurisprudencial que entende serem irrepetíveis os benefícios previdenciários recebidos de boa-fé, dada a natureza alimentar, na medida em que a renda auferida pelo pagamento do auxílio-doença tinha caráter complementar da renda e não estritamente alimentar, justamente porque a impetrante estava recebendo pro labore quando doente. Diante disso, houve um substancial incremento em sua renda mensal no período de incapacidade, em que foram cumulados o pro labore e o benefício previdenciário, sendo de todos sabido que o auxílio-doença tem como finalidade substituir, e não complementar, os rendimentos do segurado temporariamente incapacitado.
Além disso, a concessão do auxílio-doença, embora regular em sua origem, tornou-se ilegítimo, na medida em que a impetrante continuou percebendo rendimentos fruto de seu trabalho como sócia administradora e não comunicou tal fato à Previdência Social. Ora, se a impetrante tinha ciência da inacumulabilidade das duas verbas e manteve-se inerte, então, difícil sustentar conduta leal de sua parte, o que ilide o requisito da boa-fé objetiva.
Assim, tendo a impetrante recebido valores sem causa justa, tem a obrigação legal de devolvê-los, a teor das regras do art. 884 do Código Civil e art. 115, II, da Lei 8.213/1991:
Art. 884. Aquele que, sem justa causa, se enriquecer à custa de outrem, será obrigado a restituir o indevidamente auferido, feita a atualização dos valores monetários.
Art. 115. Podem ser descontados dos benefícios:
(...)
II - pagamento de benefício além do devido;
Por tais razões, a pretensão improcede sob qualquer perspectiva."
Não vejo motivo para alterar o posicionamento acima.
A demandante obteve auxílio-doença na via administrativa e, em virtude de ter retirado pro labore no período coincidente ao do amparo, a autarquia fez o estorno dos valores, em função de pagamento indevido do benefício.
Considerando-se que o auxílio-doença é benefício concebido para amparar o trabalhador incapaz profissionalmente, está correto o proceder do INSS, ainda mais quando comprovado documentalmente, conforme recibos de pagamento da remuneração juntados no PROCADM12, fls. 6-11 (evento 1), a continuidade do recebimento do pro labore.
Não se justifica a suspensão dos descontos com base nas afirmações da apelante de que estava incapacitada para o trabalho, pois é justamente essa condição que torna incompatível o percebimento cumulado dos valores a título de auxílio-doença e pro labore. Não há como se presumir a boa-fé da segurada no presente caso, por evidentemente indevida cumulação de benefício por incapacidade com remuneração proveniente justamente da empresa frente a qual a requerente afirmou, perante a autarquia, não poder desenvolver suas atividades.
Neste sentido o seguinte precedente:
EMENTA:
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO LEGAL. ART. 557 DO CPC. DESCABIDO O RECEBIMENTO DE PRESTAÇÕES DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO CUMULADAS COM REMUNERAÇÃO. AGRAVO DESPROVIDO. 1. A legislação de regência não permite o recebimento de prestações relativas a benefício de auxílio-doença ou de aposentadoria por invalidez cumuladas com remuneração a título de salário ou pro labore. 2. A agravante não faz jus ao pagamento de auxílio-doença nos meses em que verteu contribuições previdenciárias. 3. Agravo legal a que se nega provimento.
(TRF3ª Região, AC nº 0023384-89.2013.4.03.9999/SP, 7ª Turma, julgado em 11/11/2013, Des. Fed. Fausto de Sanctis)
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação.
Juíza Federal Taís Schilling Ferraz
Relatora
| Documento eletrônico assinado por Juíza Federal Taís Schilling Ferraz, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7207103v4 e, se solicitado, do código CRC D1A79F97. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Taís Schilling Ferraz |
| Data e Hora: | 26/01/2015 17:02 |
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 17/12/2014
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5023371-48.2013.404.7001/PR
ORIGEM: PR 50233714820134047001
RELATOR | : | Juiza Federal TAÍS SCHILLING FERRAZ |
PRESIDENTE | : | Rogerio Favreto |
PROCURADOR | : | Dr. Marcus Vinícius Aguiar Macedo |
APELANTE | : | VERA LUCIA DEVANCO DA SILVA |
ADVOGADO | : | BRUNO ANDRÉ SOARES BETAZZA |
: | ALEXANDRE DA SILVA | |
: | EVANDRO CESAR MELLO DE OLIVEIRA | |
: | HELDER MASQUETE CALIXTI | |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
MPF | : | MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 17/12/2014, na seqüência 370, disponibilizada no DE de 03/12/2014, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 5ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Juiza Federal TAÍS SCHILLING FERRAZ |
VOTANTE(S) | : | Juiza Federal TAÍS SCHILLING FERRAZ |
: | Des. Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA | |
: | Des. Federal ROGERIO FAVRETO |
Lídice Peña Thomaz
Diretora de Secretaria
| Documento eletrônico assinado por Lídice Peña Thomaz, Diretora de Secretaria, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7281482v1 e, se solicitado, do código CRC 6442067C. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Lídice Peña Thomaz |
| Data e Hora: | 19/12/2014 00:47 |
