Apelação/Remessa Necessária Nº 5024365-36.2019.4.04.7108/RS
RELATORA: Juíza Federal GISELE LEMKE
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (INTERESSADO)
APELADO: DIRCE MARGARETE ENGSTER (IMPETRANTE)
ADVOGADO: AMANDA RAMOS FLORES (OAB RS087652)
RELATÓRIO
Trata-se de mandado de segurança impetrado por Dirce Maria Engster em face da Gerência Executiva do INSS - Novo Hamburgo/RS, em que postula a anulação do ato administrativo que cancelou o auxílio-doença, com o consequente restabelecimento do benefício que titularizou de 28/04/2016 a 13/09/2019.
Narra na exordial que em decisão foi trânsito em julgado foi determinada a manutenção do benefício até que esteja reabilitada para outra atividade capaz de lhe garantir a subsistência, de modo que a suspensão configura ilegalidade.
O magistrado de origem, da 3ª VF de Novo Hamburgo/RS, proferiu sentença em 04/09/2020, em que concedeu a segurança nos seguintes termos (evento 57, Sent1):
3. DISPOSITIVO
Ante o exposto, concedo a segurança, julgando o processo com resolução de mérito, na forma do art. 487, I, do CPC/2015, para:
I - DETERMINAR a concessão do benefício de auxílio-doença NB 41/614.171.083-6 desde 13/09/2019 (DER/DIB), devendo ser implantado sem DCB, até a conclusão do processo de reabilitação profissional, com RMI a ser calculada pelo instituto réu e DIP no primeiro dia do mês da efetiva implantação;
II - CONDENAR o INSS a pagar as parcelas vencidas e vincendas, a serem corrigidas pelo INPC desde o vencimento das parcelas e juros de mora da poupança desde a citação, descontados eventuais benefícios inacumuláveis pagos no período (auxílio-emergencial, auxilío doença com base em atestado médico, entre outros).
Sem condenação em custas e honorários (art. 4º, Lei 9.289/96 e art. 25, Lei nº 12.016/09).
Sentença sujeita ao reexame necessário (art. 14, § 1º Lei nº 12.016/09)
O INSS apelou, insurgindo-se contra a determinação para pagamento das prestações do benefício entre a DCB (13/09/2019) e a impetração do presente mandamus (em 11/12/2019). Alude que as Súmulas 269 e 271 do STF referem expressamente que o mandado de segurança não é substituto da ação de cobrança e que não produz efeitos patrimoniais. Assevera que ao eleger o mandado de segurança a autora se volta especificamente contra o ato administrativo que indeferiu/cessou o benefício, não em relação ao pagamento de atrasados, razão pela qual a sentença deve ser reformada (evento 66, Apelação 1).
Com contrarrazões (evento 70) e por força da remessa necessária os autos vieram para julgamento.
VOTO
O mandado de segurança destina-se à proteção de direito líquido e certo, nos termos do art. 1º da Lei 12.016/2009, sendo exigível a prova pré-constituída, uma vez que não admite dilação probatória.
No caso em apreço, o benefício em discussão foi restabelecido por decisão com trânsito em julgado proferida nos autos n. 5027715-66.2018.4.04.7108, com trâmite na 6ª VF de Novo Hamburgo/RS, pelo procedimento dos Juizados Especais Federais.
Constou da decisão proferida pela Turma Recursal naquele feito, a qual manteve a sentença de procedência (evento 1, Out6):
Considerando que o expert judicial informou que a parte autora está incapacitada permanentemente para a atividade laboral exercida, entendo correta a decisão do Juízo a quo, a qual determinou a inclusão da parte autora em programa de reabilitação profissional (item 'b' do dispositivo).
Em tal perspectiva, não identifico desarmonia em relação à tese firmada no representativo da controvérsia mencionado no recurso inominado (PU n. 0506698- 72.2015.4.05.8500/SE - Tema 177 da TNU), uma vez que a decisão atacada fez constar expressamente que o benefício poderá ser suspenso em caso de recusa da parte autora a participar do processo de reabilitação, nos termos da legislação de regência.
Em que pese a determinação expressa para encaminhamento a processo de reabilitação profissional, a autora foi submetida à perícia de elegibilidade em 13/09/2019 (evento 1, InfBen11), ocasião em que o perito verificou a existência de sequela de cirurgia em coxa esquerda por neoplasia, datada de abril de 2016. O médico da autarquia referiu no laudo que a doença estava estabilizada, sem recidivas; exame físico sem achados que gerassem incapacidade, não havendo indicação de PRP (Programa de Reabilitação Profissional). Concluiu que houve incapacidade pretérita, não constatada na data exame.
Como bem decidiu o magistrado de origem, sem ter havido a inclusão da parte autora em processo de reabilitação profissional, conforme determinado na decisão transitada em julgado, mostra-se ilegal a cessação do benefício pela autarquia, devendo ser restabelecido o auxílio-doença.
Portanto, a sentença não merece retoques quanto ao mérito.
No que concerne às parcelas vencidas entre a DCB e a impetração do mandamus, o juiz de origem consignou:
Nada obstante, não posso deixar de destacar que, no caso, as parcelas entre a DCB (13/09/2019) e a impetração do mandado de segurança (11/12/2019) compreendem meros três meses, sendo decorrência do provimento mandamental de restabelecimento do benefício, não havendo, uma vez reconhecido o direito ao restabelecimento, a menor dúvida quanto ao direito ao pagamento daquelas parcelas.
De fato, seria desproporcional, contrário à economia e celeridade processual, exigir do impetrante a formulação de novo requerimento administrativo ou o ajuizamento de nova ação judicial apenas para a cobrança de três meses em que notoriamente tem direito ao recebimento das parcelas do benefício previdenciário de auxílio-doença.
É compreensível que, em face das limitações do mandado de segurança, do caráter reduzido dos seus prazos, da impossibilidade de dilação probatória, da sua rápida tramitação, haja um maior cuidado em relação ao pagamento de quantias em dinheiro por parte da Fazenda Pública, a fim de evitar pagamentos indevidos.
No caso, contudo, o custo de eventual novo requerimento ou ação seria muitíssimo maior do que os três meses de benefício anteriores à impetração.
Ademais, se o impetrante pode, nestes autos de mandado de segurança, executar as parcelas a contar da impetração, qual o motivo de impedir a execução de meros três meses de parcelas pretéritas? O respeito à forma, no Direito, é importante, mas desde que tenha alguma função, represente algum valor ou finalidade a ser preservada, sob pena de se ter um quadro da 'forma pela forma', de formalismo.
Assim, concedida a segurança e restabelecido o benefício desde 13/09/2019, fica o INSS condenado ao pagamento das parcelas pretéritas.
No ponto, merece reforma o decisum, a começar por ser ultra petita, visto que o pedido constante da inicial do presente mandado de segurança foi pela anulação do ato administrativo que cancelou o benefício, com o consequente restabelecimento do auxílio-doença, não havendo qualquer menção aos valores atrasados.
Confira-se: (evento 1, Inic1, p. 10):
(...)
d) A CONCESSÃO DA SEGURANÇA a fim de determinar a anulação definitiva do ato de cessação do benefício da Impetrante, com o consequente restabelecimento do mesmo, e o prosseguimento do serviço de reabilitação profissional, mantendo-o em vigência até a Impetrante estar reabilitada para exercer outra atividade que lhe garanta a subsistência;
e) Em caso de desobediência, seja aplicada multa diária (astreintes), na forma prevista nos arts. 497; 536, § 1º; 537 do CPC, valor este que deverá ser revertido em favor da Impetrante.
Além disso, eventuais efeitos financeiros pretéritos à data da impetração desta ação mandamental não podem ser considerados, pois o writ presta-se para demonstrar cabal direito líquido e certo, a teor das Súmulas do STF nº 269 e 271:
Súmula nº 269 do STF - O mandado de segurança não é substitutivo de ação de cobrança.
Súmula nº 271 do STF - Concessão de mandado de segurança não produz efeitos patrimoniais em relação a período pretérito, os quais devem ser reclamados administrativamente ou pela via judicial própria.
No mesmo sentido, a jurisprudência desta Corte:
PREVIDENCIÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. ADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. DILAÇÃO PROBATÓRIA. DESNECESSIDADE. AUXÍLIO-DOENÇA. REQUISITOS LEGAIS. COBRANÇA DE PRESTAÇÕES PRETÉRITAS. 1. Hipótese em que não se faz necessária dilação probatória, estando satisfeita a exigência de prova pré-constituída com aptidão para demonstrar a violação de direito líquido e certo. 2. Quatro são os requisitos para a concessão do benefício por incapacidade: (a) qualidade de segurado do requerente; (b) cumprimento da carência de 12 contribuições mensais; (c) superveniência de moléstia incapacitante para o desenvolvimento de atividade que garanta a subsistência; e (d) caráter definitivo/temporário da incapacidade. 3. Preenchidos os requisitos necessários à obtenção de auxílio-doença, tem a parte impetrante direito à concessão do benefício. 4. À luz das Súmulas 269 e 271 do STF, o mandado de segurança não é a via adequada para a recomposição de efeitos patrimoniais pretéritos, tampouco instrumento substitutivo da ação de cobrança. (TRF4 5002176-52.2019.4.04.7015, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, Relator LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO, juntado aos autos em 30/09/2020)
PREVIDENCIÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. SALÁRIO-MATERNIDADE. MENOR SOB GUARDA. SEGURADO EMPREGADO. REQUISITOS PREENCHIDOS. 1. Deve ser concedida ordem, em mandado de segurança, de concessão de salário-maternidade, pelo prazo de 120 (cento e vinte) dias, a segurado da previdência social que faz prova pré-constituída da guarda judicialmente deferida para o fim de adoção de menor (art. 71-A da Lei n. 8.213). 2. É indevido a cobrança de parcelas em atraso em ação que não produz efeitos pretéritos (Súmulas 269 e 271 do Supremo Tribunal Federal). 3. Remessa oficial a que se nega provimento. (TRF4 5000928-36.2019.4.04.7117, QUINTA TURMA, Relator OSNI CARDOSO FILHO, juntado aos autos em 07/08/2020)
Observe-se que a impetração de mandado de segurança foi uma escolha da parte impetrante. A cobrança de valores pretéritos deve ser objeto de ação própria, servindo a decisão destes autos como título executivo judicial para a cobrança de prestações posteriores à data da impetração do writ, in casu, ocorrida em 11/12/2019.
Ademais, eventual pagamento de valores atrasados, nos termos acima referidos, ocorrerá após o trânsito em julgado deste feito.
Provido o recurso do INSS e a remesssa necessária no tópico.
Dispositivo
Ante o exposto voto por dar provimento à apelação do INSS e dar parcial provimento à remessa necessária.
Documento eletrônico assinado por GISELE LEMKE, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002287760v6 e do código CRC 59aa84ff.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): GISELE LEMKE
Data e Hora: 9/2/2021, às 12:10:23
Conferência de autenticidade emitida em 17/03/2021 04:01:35.
Apelação/Remessa Necessária Nº 5024365-36.2019.4.04.7108/RS
RELATORA: Juíza Federal GISELE LEMKE
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (INTERESSADO)
APELADO: DIRCE MARGARETE ENGSTER (IMPETRANTE)
ADVOGADO: AMANDA RAMOS FLORES (OAB RS087652)
EMENTA
previdenciário. mandado de segurança. auxílio-doença. restabelecimento de benefício. cabimento. efeitos financeiros.
1. Hipótese em que cessado indevidamente o auxílio-doença sem o encaminhamento da autora a processo de reabilitação profissional, expressamente determinado por decisão com trânsito em julgado. Segurança concedida, determinando-se o imediato restabelecimento do benefício.
2. O mandado de segurança não é substitutivo de ação de cobrança, não produzindo, portanto, efeitos patrimoniais em relação a período pretérito à impetração do writ (Súmulas 269 e 271 do STF).
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar provimento à apelação do INSS e dar parcial provimento à remessa necessária, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 09 de março de 2021.
Documento eletrônico assinado por GISELE LEMKE, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002287761v4 e do código CRC 0ee51dcf.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): GISELE LEMKE
Data e Hora: 9/3/2021, às 16:51:4
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 02/03/2021 A 09/03/2021
Apelação/Remessa Necessária Nº 5024365-36.2019.4.04.7108/RS
RELATORA: Juíza Federal GISELE LEMKE
PRESIDENTE: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
PROCURADOR(A): PAULO GILBERTO COGO LEIVAS
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (INTERESSADO)
APELADO: DIRCE MARGARETE ENGSTER (IMPETRANTE)
ADVOGADO: AMANDA RAMOS FLORES (OAB RS087652)
MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (MPF)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 02/03/2021, às 00:00, a 09/03/2021, às 14:00, na sequência 167, disponibilizada no DE de 19/02/2021.
Certifico que a 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 5ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS E DAR PARCIAL PROVIMENTO À REMESSA NECESSÁRIA.
RELATORA DO ACÓRDÃO: Juíza Federal GISELE LEMKE
Votante: Juíza Federal GISELE LEMKE
Votante: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
Votante: Juiz Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO
LIDICE PEÑA THOMAZ
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 17/03/2021 04:01:35.