Remessa Necessária Cível Nº 5012887-09.2020.4.04.7201/SC
RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
PARTE AUTORA: VANDERLEIA VANZUITA (IMPETRANTE)
PARTE RÉ: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (INTERESSADO)
RELATÓRIO
Em reexame necessário a sentença proferida nos autos de mandado de segurança, que concedeu em parte a segurança, a fim de determinar à autoridade impetrada que implante e/ou mantenha ativo o benefício de auxílio por incapacidade temporária nº 31/632.792.445-3 em favor da impetrante, com DIB em 13/08/2020, até que perícia médica administrativa ateste a capacidade laborativa da segurada, sob pena de multa diária fixada em R$ 100,00.
O Ministério Público Federal, em seu parecer, opinou pelo desprovimento da remessa necessária (e. 5.1).
É o relatório.
VOTO
A fim de evitar tautologia, transcrevo excerto da sentença (e.22.1), adotando os seus fundamentos como razões de decidir:
"Não há motivo para mudar o entendimento exposto na decisão liminar, cujos fundamentos adoto como razões de decidir, in verbis:
"Inicialmente, convém registrar que o(a) impetrante demonstrou tanto ter realizado o suprarreferido requerimento na data informada quanto que havia perícia médica designada, tendo inclusive apresentado o(s) respectivo(s) comprovante(s) (evento 1, PROCADM10).
Tal como é cediço, a Pandemia de COVID-19 tem afetado a todos, e as medidas que tem sido adotadas para minimizar seus efeitos tem impactado, em maior ou menor grau, as atividades dos mais diversos órgãos e entidades do Poder Público.
A fim de minimizar os efeitos da Pandemia, foi editada a Lei nº 13.982/20, que previu, entre outros, a criação do Auxílio-Emergencial (art. 2º) e a possibilidade de antecipação, pelo INSS, de um salário-mínimo mensal para os requerentes de benefício de prestação continuada (art. 3º) e auxílio-doença (art. 4º) durante o período de 3 (três) meses, a contar da publicação da referida lei, fato ocorrido em 02/04/2020, ou até que fosse realizada a competente avaliação do solicitante, inclusive mediante perícia, o que ocorresse primeiro, podendo o período inicial previsto ser prorrogado por ato do Poder Executivo (art. 6º).
Em razão do agravamento e/ou continuidade da situação de calamidade na saúde pública, o Poder Executivo editou o Decreto nº 10.412, de 30/06/2020, prorrogando por mais 02 (dois) meses o auxílio-emergencial, previsto no art. 2º, da Lei nº 13.982/20, sem que, contudo, tenha previsto semelhante prorrogação para as hipóteses previstas nos arts. 3º e 4º do referido diploma.
Desta feita, tenho que não há como conceder a antecipação de tutela com fulcro na Lei nº 13.982/20.
Não obstante, é cediço que a decisão judicial proferida na ACP n° 5004227-10.2012.404.7200 determinou que o INSS deve conceder provisoriamente o benefício por incapacidade, caso a perícia médica não seja realizada no prazo máximo de 45 dias do requerimento administrativo, conforme julgamento da Apelação/Reexame Necessário proferido pelo TRF-4ª Região em 19/05/2014.
No caso, não tendo sido realizada a perícia médica designada para 14/09/2020, resta claro que o supracitado prazo já foi extrapolado, haja vista que foram juntados os comprovantes de requerimentos administrativos realizados em 13/08/2020 (evento 1, PROCADM9) e também em 07/07/2020 (evento 1, PROCADM9).
Buscando demonstrar a existência de direito líquido e certo, o(a) impetrante juntou aos autos alguns documentos, entre o(s) qual(is) entendo relevante destacar o(s) seguinte(s): a) Atestado Médico lavrado em 08/08/2019, pelo Dr. André Carminati Lima (CRM 16.831), do qual consta que a impetrante passou por procedimento cirúrgico extenso em 29/07/2019, pelo que necessitaria de 90 (noventa) dias de afastamento do trabalho (evento 1, ATESTMED6).
Nesta esteira, vale notar que o(a) impetrante gozou do benefício nº 31/629.309.136-5 no período de 23/08/2019 a 31/05/2020 (evento 1, CNIS7); bem como, que a documentação carreada aos autos não deixa dúvidas acerca da sua qualidade de segurado(a) e do cumprimento da carência (evento 1, CTPS5 e CNIS7).
Sendo assim, verifico estarem presentes os requisitos do fumus boni iuris e do periculum in mora, pelo que se afigura possível a concessão, ao menos parcial, da liminar perquirida.
Ante o exposto, DEFIRO EM PARTE o pedido de liminar, para o fim de determinar à(s) autoridade(s) impetrada(s) vinculada(s) ao INSS que implante o benefício de auxílio doença à parte impetrante, no prazo de 20 (vinte) dias, devendo mantê-lo até que perícia médica administrativa ateste a capacidade laborativa da segurada, sob pena de multa diária fixada em R$ 100,00."
Não obstante deva ser mantida a decisão liminar, tenho que, a fim de elidir quaisquer dúvidas, importa frisar que a DIB deve ser fixada/mantida na DER do pedido administrativo em questão, ou seja, 13/08/2020, bem como, que o benefício deverá permanecer ativo até a realização de perícia médica, a ser realizada após prévia comunicação da impetrada, não podendo o seu não comparecimento à perícia inicialmente designada para 13/11/2020 servir como fundamento para a suspensão e/ou cancelamento do benefício."
Não há qualquer reparo a ser feito no decisum, porquanto, efetivamente, configura conduta ilegal e abusiva do órgão previdenciário a não realização da perícia médica previamente agendada pela impetrante diante da suspensão dos atendimentos presenciais nas agências do INSS, em virtude da pandemia no novo coronavírus, restando evidenciada, pois, a plausibilidade do direito.
De outra banda, cumpre salientar que é descabida a pretensão para condicionar o processamento de benefício por incapacidade à realização de perícia médica presencial, haja vista que sobreveio Portaria Conjunta nº 9.381, de 06 de abril de 2020, do Ministério da Economia/Secretaria Especial de Previdência e Trabalho/INSS, cujo art. 2º prevê expressamente que, "enquanto perdurar o regime de plantão reduzido de atendimento nas Agências da Previdência Social, nos termos da Portaria Conjunta SEPRT/INSS n° 8.024, de 19 de março de 2020, os requerimentos de auxílio-doença poderão ser instruídos com atestado médico".
Por conseguinte, a jurisprudência deste Regional vem considerando que "a pandemia não pode obstaculizar os direitos dos segurados, sob a argumentação de não ter como processar o cumprimento da ordem judicial, devendo o INSS criar mecanismos que ofereçam uma solução emergencial a esse problema e, assim, dar efetividade ao cumprimento da decisão judicial, sob pena de multa" (5001029-66.2020.4.04.7108, SEXTA TURMA, Relator JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, juntado aos autos em 02/07/2020).
O Judiciário hoje centraliza a esperança e as responsabilidades pelo gerenciamento dos riscos sociais que o Estado Social, por mandado constitucional, assumiu o dever de tutelar, mas não se desincumbe a contento. Observa-se a existência de uma crise valorativa e simbólica nas sociedades contemporâneas, matriz de um volume e de uma diversidade demasiados de pleitos submetidos aos juízes, notadamente diante da retração do Estado do Bem-Estar Social. Esse fenômeno é justificado pela circunstância de ser o juiz um “sobrevivente no universo simbólico da humanidade”, a última instância moral de nossa sociedade e uma das últimas instâncias simbólicas que ainda se mantém. "Perante a decomposição do político, doravante é ao juiz que se pede a salvação”, afirmou Garapon. Surge o juiz como "recurso contra a implosão das sociedades democráticas que não conseguem gerir de forma diferente a complexidade e a diversidade que geram".1
A crise multifacetada escancarou a fragilidade do nosso capitalismo (atrasado, diria Habermas) para atender as demandas sociais dos que não têm condições de pagar pelos serviços privatizados.
A judicialização em tempos de pandemia acrescenta novas perspectivas e vieses à atuação do sistema judicial. Em alguns aspectos, os limites de atuação do Poder Judiciário e da própria separação constitucional dos poderes são revisitados e ganham outras roupagens. O que se tinha com certo, diante da crise e da atuação (ou omissão) do executivo e do legislativo, volta a ser discutido, sobretudo no âmbito do Supremo Tribunal Federal.
Ante o exposto, voto por negar provimento à remessa oficial.
Documento eletrônico assinado por PAULO AFONSO BRUM VAZ, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002601330v7 e do código CRC bb2c19ea.Informações adicionais da assinatura:
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Remessa Necessária Cível Nº 5012887-09.2020.4.04.7201/SC
RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
PARTE AUTORA: VANDERLEIA VANZUITA (IMPETRANTE)
PARTE RÉ: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (INTERESSADO)
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. DESNECESSIDADE DE REALIZAÇÃO DE PERÍCIA PRESENCIAL NAS AGÊNCIAS DO INSS. PANDEMIA. POSSIBILIDADE. ANÁLISE DOS BENEFÍCIOS POR INCAPACIDADE MEDIANTE APRESENTAÇÃO DE ATESTADOS MÉDICOS IDÔNEOS. RESPONSABILIDADE DO PODER JUDICIÁRIO.
1. Configura conduta ilegal e abusiva do órgão previdenciário a não realização da perícia médica previamente agendada pela impetrante diante da suspensão dos atendimentos presenciais nas agências do INSS, em virtude da pandemia no novo coronavírus, restando evidenciada, pois, a plausibilidade do direito.
2. É descabido condicionar o processamento de benefício à realização de perícia médica presencial, haja vista que sobreveio Portaria Conjunta nº 9.381, de 06 de abril de 2020, do Ministério da Economia/Secretaria Especial de Previdência e Trabalho/INSS, cujo art. 2º prevê expressamente que, "enquanto perdurar o regime de plantão reduzido de atendimento nas Agências da Previdência Social, nos termos da Portaria Conjunta SEPRT/INSS n° 8.024, de 19 de março de 2020, os requerimentos de auxílio-doença poderão ser instruídos com atestado médico".
3. O Judiciário hoje centraliza a esperança e as responsabilidades pelo gerenciamento dos riscos sociais que o Estado Social, por mandado constitucional, assumiu o dever de tutelar. A judicialização em tempos de pandemia acrescenta novas perspectivas e vieses à atuação do sistema judicial. Em alguns aspectos, os limites de atuação do Poder Judiciário e da própria separação constitucional dos poderes são revisitados e ganham outras roupagens. O que se tinha com certo, diante da crise e da atuação (ou omissão) do executivo e do legislativo, volta a ser discutido.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar de Santa Catarina do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à remessa oficial, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 15 de junho de 2021.
Documento eletrônico assinado por PAULO AFONSO BRUM VAZ, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002601331v3 e do código CRC a53826ed.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 08/06/2021 A 15/06/2021
Remessa Necessária Cível Nº 5012887-09.2020.4.04.7201/SC
RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
PRESIDENTE: Desembargador Federal CELSO KIPPER
PROCURADOR(A): WALDIR ALVES
PARTE AUTORA: VANDERLEIA VANZUITA (IMPETRANTE)
ADVOGADO: Ivan Antonio Costa (OAB SC029619)
ADVOGADO: BRUNA DE OLIVEIRA HUGEN (OAB SC037976)
PARTE RÉ: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (INTERESSADO)
MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (MPF)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 08/06/2021, às 00:00, a 15/06/2021, às 16:00, na sequência 286, disponibilizada no DE de 27/05/2021.
Certifico que a Turma Regional suplementar de Santa Catarina, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SANTA CATARINA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À REMESSA OFICIAL.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
Votante: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
Votante: Desembargador Federal CELSO KIPPER
Votante: Juíza Federal ÉRIKA GIOVANINI REUPKE
ANA CAROLINA GAMBA BERNARDES
Secretária
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