Apelação/Remessa Necessária Nº 5018666-84.2016.4.04.7200/SC
RELATOR: Desembargador Federal JORGE ANTONIO MAURIQUE
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (INTERESSADO)
APELADO: CARLOS ERNESTO RATZAT (IMPETRANTE)
ADVOGADO: IVO BORCHARDT
RELATÓRIO
Carlos Ernesto Ratzat impetrou mandado de segurança em face do INSS, para determinar à autoridade impetrada que reconheça e averbe o período em que trabalhou na qualidade de aluno-aprendiz do Centro Estadual de Educação Tecnológica Paula Souza, em Penápolis/SP, no período compreendido entre 1971 e 1973.
A sentença, proferida em 05/04/2017, concedeu a segurança nos seguintes termos:
Ante o exposto, rejeito a preliminar de falta de interesse em agir e concedo a segurança para afastar o ato coator e reconhecer o período em que trabalhou na qualidade de aluno aprendiz (01/02/1971 a 31/12/1973) perante a Escola Técnica Agrícola João Jorge Geraissate - Centro Paula Souza, e determinar à autoridade impetrada que averbe o respectivo período como tempo de serviço/contribuição do impetrante, nos termos da fundamentação.
Isenção legal de custas ao INSS (art. 4º, I, da Lei nº 9.289/96).
Sentença sujeita ao reexame necessário.
Sem condenação em honorários advocatícios (art. 25 da Lei nº.12.016/2009 e Súmulas nº 105 do STJ e 512 do STF).
O INSS apelou alegando que o juízo monocrático divergiu da jurisprudência dominante, inclusive, do STJ ao entender que o fato de se tratar de escola técnica estadual (sem ser cridada pelo governo federal) não impede o reconhecimento da condição de aluno aprendiz do impetrante. Afirma que não há prova da contraprestação pecuniária ou indireta à conta de orçamento da União, já que se trata de escola estadual. Além disso, a sentença recorrida, desconsiderando que a documentação carreada aos autos pelo impetrante faz referência apenas a sua situação de "aluno" da instituição e não de aluno aprendiz acaba por admitir que o regime de internato e o recebimento de alimentação e alojamento bastariam para comprovar a situação do impetrante como "aluno aprendiz" no período em questão. Assim, não sendo remunerado às custas de dotação orçamentária da União e não havendo configuração do vínculo empregatício com a escola técnica, isto é, não preenchendo os requisitos na forma do Decreto-Lei nº 4.073/42, improcede o pedido do autor, pois não se enquadra no art. 58 do Decreto 611/92, e demais diplomas legais pertinentes, sendo indevido o cômputo do tempo de serviço. Ante o exposto, requer seja dado PROVIMENTO ao recurso, reformando-se a sentença de 1º grau e denegando-se a segurança.
Com as contrarrazões, vieram os autos.
O MPF opinou pelo desprovimento do recurso de apelação e do reexame necessário (Evento 4, PARECER1).
No Evento 5 foi requerida a prioridade de tramitação.
É o relatório.
VOTO
Consoante a jurisprudência do STJ, o aluno-aprendiz é aquele estudante de escola pública profissional ou de ensino federal (escola técnica federal) que, por ter recebido remuneração, mesmo que de forma indireta, à conta do orçamento público, tem direito à averbação do período correspondente como tempo de serviço, o qual deverá ser computado na aposentadoria previdenciária, a teor do disposto na Lei n.º 6.226/75 - seja na vigência do Decreto-Lei 4.073/42, seja após a Lei n.º 3.552/59. É o que se observa dos arrestos a seguir transcritos:
PREVIDENCIÁRIO. ALUNO-APRENDIZ . ESCOLA TÉCNICA FEDERAL. CONTAGEM. TEMPO DE SERVIÇO. POSSIBILIDADE. REMUNERAÇÃO. EXISTÊNCIA. SÚMULA N.º 96 DO TCU. (...) Restando caracterizado que o aluno-aprendiz é aquele estudante de Escola Técnica Federal recebia remuneração, mesmo que indireta, a expensas do orçamento da União, há direito ao aproveitamento do período como tempo de serviço estatutário federal, o qual deverá ser computado na aposentadoria previdenciária pela via da contagem recíproca, a teor do disposto na Lei n.º 6.226/1975. Precedentes. (REsp 585.511/PB, 5ª Turma, Rel. Min. Laurita Vaz, DJU 05.04.2004).
PREVIDENCIÁRIO. ALUNO-APRENDIZ . RECONHECIMENTO DE TEMPO DE SERVIÇO. POSSIBILIDADE. SÚMULA 96/TCU. Esta Corte entende ser possível computar-se o tempo de estudo de aluno-aprendizem escola pública profissional, sob expensas do poder público, para fins previdenciários. Incidência da Súmula n.º 96/TCU. (REsp 638.634/SE, 6ª Turma, Rel. Min. Paulo Medina, DJU 04.06.2004).
Na esteira desse mesmo entendimento, já decidiu este Tribunal:
PREVIDENCIÁRIO. TEMPO DE SERVIÇO. ESCOLAS PÚBLICAS PROFISSIONAIS. ESCOLA TÉCNICA FEDERAL. ALUNO-APRENDIZ. RETRIBUIÇÃO PECUNIÁRIA À CONTA DO ORÇAMENTO DO TESOURO DO ESTADO E DA UNIÃO. COMPROVAÇÃO RECONHECIMENTO.
1. "Conta-se para todos os efeitos, como tempo de serviço público, o período de trabalho prestado na qualidade de aluno-aprendiz, em escola pública profissional, desde que comprovada a retribuição pecuniária à conta do Orçamento, admitindo-se, como tal, o recebimento de alimentação, fardamento, material escolar e parcela de renda auferida com a execução de encomendas de terceiros" (Súmula n.º 96, do TCU, na redação aprovada na Sessão Administrativa de 08-12-1994; DOU, Seção I, de 03-01-1995, p. 185). Precedentes das Turmas que integram a Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça.(...)
2. Hipótese em que os autores lograram comprovar a percepção de remuneração à conta da dotação orçamentária do Tesouro do Estado do Rio Grande do Sul e da União Federal, nos períodos controvertidos, ainda que de forma indireta, motivo pelo qual assiste-lhes direito à contagem como tempo de serviço do tempo de estudante laborado na condição de aluno-aprendiz em escolas públicas profissionais (Escola Técnica Parobé e Colégio Industrial Monteiro Lobato, na denominação original) e em escola técnica federal (Escola Técnica Federal de Pelotas, presentemente Centro Federal de Educação Tecnológica de Pelotas) para fins previdenciários.
(...)
(AC 2000.71.00.037274-6/RS, Rel. Des. Fed. Nylson Paim de Abreu, DJU 29.09.2004).
Depreende-se, pois, que a jurisprudência entende ser possível a contagem de serviço ao aluno-aprendiz desde que preenchidas determinadas condições. Para tanto, faz-se mister uma clara distinção entre aluno-aprendiz e empregado-aprendiz. O empregado-aprendiz, sujeito da proteção legal, é o que recebe formação profissional na própria empresa, ou em escola vinculada a ela, cuja tutela resulta da própria relação de emprego que lhe é inerente. Na qualidade de empregado, tem sua condição de aprendiz dirigida a uma proficiência pessoal no interesse de seu empregador, por este sustentado, com todos os direitos oriundos das leis trabalhistas e previdenciárias, estando o curso de aprendizado inserido no expediente de trabalho.
Por outro lado, o aluno-aprendiz aprende trabalhando em Escola Técnica, mantida pelo Governo, durante todo o curso, recebendo ou não pecúnia à conta do Orçamento e/ou salário indireto representado pelo alimento, fardamento, atendimento médico-odontológico, alojamento, e, em determinados casos, retribuição por serviços prestados a terceiros. Deduz-se, pois, que podem ser equiparados aos empregados-aprendizes para fins de contagem de tempo de serviço aqueles alunos-aprendizes cujo trabalho seja remunerado especificamente, caracterizando esta retribuição ao trabalho efetuado a relação empregatícia ensejadora do direito previdenciário pleiteado.
No caso vertente, o autor trouxe aos autos, para comprovar o tempo de serviço como aluno-aprendiz de 01/02/1971 a 31/12/1973:
- certidão expedida pelo Centro Paula Souza, de que o autor frequentou o Curso Técnico Agrícola de 1971 a 1973 e que se trata de curso gratuito, fornecido pelo Estado de São Paulo e que durante o curso o aluno aprendiz teve para o desenvolvimento de seu aprendizado o fornecimento de alimentação e alojamento, e não houve incidência de desconto previdenciário (Evento1, DECL6);
- Cópia do Diário Oficial do Estado de São Paulo, na qual consta a Lei Estadual nº. 8.407, de 13 de novembro de 1954; da Lei Estadual nº. 283, de 1º de Julho de 1974, que alterou o nome da Escola para "Colégio Técnico Agrícola de Penápolis"; e do Decreto nº. 52.897, de 16 de fevereiro de 1970, que dispôs sobre a criação dos Colégios Técnicos Agrícolas Estaduais, subordinados à Diretoria de Ensino Agrícola (evento 1 - PROCADM8, p. 9/11).
- Pedido de justificação administrativa para o reconhecimento do período de aluno aprendiz (evento 1 - PROCADM8, p. 12/20).
- Histórico Escolar (evento 1 - PROCADM8, p. 30/31).
- Diploma de conclusão do ensino técnico agrícola emitido pela Secretaria de Estado da Educação do Governo de São Paulo - Departamento do Ensino Agrícola (evento 1 - PROCADM8, p. 32/33).
Portanto, sendo a parcela de renda auferida com a execução de trabalhos espécie de retribuição pecuniária, ainda que indireta, tem-se que o autor comprovou o tempo de serviço na qualidade de aluno-aprendiz no período de 01/02/1971 a 31/12/1973, em escola de ensino público, perfazendo 02 anos, 10 meses e 9 dias de tempo de serviço.
O fato de se tratar de escola estadual não obsta o reconhecimento da qualidade de aluno aprendiz, como alega o apelante. Tampouco se trata de entendimento contraditório com a jurisprudência desta Corte ou do STJ, como se verifica de recente julgado desta Corte:
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. ESCOLA TÉCNICA ESTADUAL. EXPEDIÇÃO DE CERTIDÃO DE TEMPO DE SERVIÇO. ALUNO-APRENDIZ. EXISTÊNCIA DE RETRIBUIÇÃO ESTATAL. 1. Havendo prova da contraprestação estatal pelos serviços prestados na condição de aluno-aprendiz, deve ser considerado o respectivo período de labor. 3. Provida a apelação para condenar o INSS a reconhecer e averbar o tempo de serviço como aluno-aprendiz e expedir a respectiva certidão de tempo de serviço. (TRF4, APELAÇÃO CÍVEL Nº 0012546-55.2016.404.9999, 5ª TURMA, Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ, POR UNANIMIDADE, D.E. 29/03/2017, PUBLICAÇÃO EM 30/03/2017)
O Ministro Humberto Martins na decisão monocrática do RECURSO ESPECIAL Nº 1.318.990 - SC (2012/0075263-0) afirma claramente que: "A pacífica jurisprudência do STJ entende que o período de trabalho prestado na qualidade de aluno aprendiz em escola técnica federal ou estadual, com remuneração, ainda que indireta, desde que às contas do Poder Público, deve ser considerado para efeitos de concessão da aposentadoria."
Assim, não merece reparos a sentença que concedeu a ordem para que a Impetrada averbe o respectivo período como tempo de serviço/contribuição do impetrante.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação do INSS e à remessa oficial.
Documento eletrônico assinado por JORGE ANTONIO MAURIQUE, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40000488733v9 e do código CRC 599611cb.Informações adicionais da assinatura:
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Apelação/Remessa Necessária Nº 5018666-84.2016.4.04.7200/SC
RELATOR: Desembargador Federal JORGE ANTONIO MAURIQUE
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (INTERESSADO)
APELADO: CARLOS ERNESTO RATZAT (IMPETRANTE)
ADVOGADO: IVO BORCHARDT
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. mandado de segurança. ESCOLA TÉCNICA ESTADUAL. averbação do TEMPO DE SERVIÇO. ALUNO-APRENDIZ. EXISTÊNCIA DE RETRIBUIÇÃO ESTATAL.
1. A pacífica jurisprudência do STJ entende que o período de trabalho prestado na qualidade de aluno aprendiz em escola técnica estadual (não apenas federal), com remuneração, ainda que indireta, desde que às contas do Poder Público, deve ser considerado para efeitos de concessão da aposentadoria (RECURSO ESPECIAL Nº 1.318.990 - SC (2012/0075263-0, Relator Ministro Humberto Martins).
2. Havendo prova da contraprestação estatal pelos serviços prestados na condição de aluno-aprendiz, deve ser considerado o respectivo período de labor.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar de Santa Catarina do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, decidiu negar provimento à apelação do INSS e à remessa oficial, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 21 de junho de 2018.
Documento eletrônico assinado por JORGE ANTONIO MAURIQUE, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40000488734v5 e do código CRC 984c6970.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 21/06/2018
Apelação/Remessa Necessária Nº 5018666-84.2016.4.04.7200/SC
RELATOR: Desembargador Federal JORGE ANTONIO MAURIQUE
PRESIDENTE: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
PROCURADOR(A): MARCUS VINICIUS AGUIAR MACEDO
PREFERÊNCIA: IVO BORCHARDT por CARLOS ERNESTO RATZAT
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (INTERESSADO)
APELADO: CARLOS ERNESTO RATZAT (IMPETRANTE)
ADVOGADO: IVO BORCHARDT
MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (MPF)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 21/06/2018, na seqüência 291, disponibilizada no DE de 04/06/2018.
Certifico que a Turma Regional suplementar de Santa Catarina, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A Turma Regional Suplementar de Santa Catarina, por unanimidade, decidiu negar provimento à apelação do INSS e à remessa oficial.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal JORGE ANTONIO MAURIQUE
Votante: Desembargador Federal JORGE ANTONIO MAURIQUE
Votante: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
Votante: Desembargador Federal CELSO KIPPER
ANA CAROLINA GAMBA BERNARDES
Secretária
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