Remessa Necessária Cível Nº 5000710-75.2019.4.04.7127/RS
RELATORA: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
PARTE AUTORA: LUCI FERNANDES COCZENSKI (IMPETRANTE)
PARTE RÉ: Chefe de Agência - INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS - Frederico Westphalen (IMPETRADO)
PARTE RÉ: UNIÃO - FAZENDA NACIONAL (INTERESSADO)
PARTE RÉ: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (INTERESSADO)
RELATÓRIO
Trata-se de reexame necessário de sentença na qual o magistrado singular concedeu a segurança, para determinar à autoridade coatora que emita a guia de pagamento para recolhimento do valor devido relativo à indenização do período de 01/01/1992 a 30/06/1993, sem a incidência de juros e multa. Sem condenação em honorários advocatícios ou em custas.
Nesta Corte, o representante do Ministério Público Federal ofertou parecer pelo desprovimento da remessa oficial.
É o relatório.
VOTO
A r. sentença proferida pelo MM. Juíza Federal Ana Raquel Pinto de Lima bem analisou as questões controvertidas, devendo ser mantida por seus próprios fundamentos, os quais adoto como razões de decidir, in verbis:
"(...)
O direito em que a impetrante busca com o presente mandamus é o de efetuar o recolhimento apenas das contribuições necessárias à obtenção de benefício previdenciário.
Em relação à sentença transitada em julgado nos autos da ação nº 5000445-10.2018.4.04.7127, destaco (evento 1, PROCADM5, p. 12):
Nos termos do dispositivo, trata-se de sentença declaratória que reconheceu como de efetivo labor rural o período de 01/01/1992 a 31/12/1996, sendo que o comando determinava o cômputo mediante a devida e correspondente indenização.
Assim, diferente do que alega a impetrada, não se trata de rediscussão da matéria ou de direito que poderia ser executado naquela ação, pois o comando da sentença determinava que o INSS, após a devida indenização por parte da ora impetrante, procedesse o cômputo do período para dos devidos fins previdenciários, e é desse direito que trata a presente ação, o de recolher as contribuições relativas a indenização do período necessário, em que pese a sentença tenha reconhecido como de efetiva atividade rural um período maior.
Destarte, concluo que o mandado de segurança é adequado para o pleito da impetrante que busca a proteção de um direito líquido e certo, o qual fora liminarmente concedido com a seguinte fundamentação (evento 3):
Trata-se de mandado de segurança impetrado por LUCI FERNANDES COCZENSKI em face do CHEFE DA AGÊNCIA DO INSS DE FREDERICO WESTPHALEN, objetivando a concessão de medida liminar nos seguintes termos: (evento 1, INIC1):
A concessão liminar da segurança, sem oitiva da parte contrária, para determinar que a autoridade coatora promova nova análise do pedido administrativo, para recalcular a indenização das contribuições previdenciárias, considerando somente o entretempo de 01/01/1992 até 30/06/1993, e afastar a incidência de juros e multa sobre o referido período, emitindo, com esses parâmetros, nova guia para recolhimento já em sede de liminar, pois o processo administrativo encontra-se ativo em decorrência do recente trânsito em julgado do pedido de reconhecimento da atividade rural em regime de economia familiar e caso não haja o pagamento o mesmo é indeferido e arquivado definitivamente.
Para tanto, relatou, em síntese, ter solicitado ao INSS a emissão de guia para indenização de contribuições referentes ao período de 01/01/1991 a 30/06/1993, necessários aos cumprimento do tempo necessário para a sua aposentadoria, ainda que todo período de labor rural de 01/01/1991 a 31/12/1996 tenha sido reconhecido em sentença que transitou em julgado na ação n° 5000445-10.2018.404.7127.
Arguiu que, no cálculo do valor indenizatório dos referidos períodos, a autarquia incluiu, além do montante principal, os juros e a multa. Aduziu que a indenização das contribuições de parte do período em questão é anterior à MP 1.523/1996, quando não havia previsão legal para inclusão de juros e multa. Requereu o benefício da assistência judiciária gratuita. Juntou documentos.
Vieram os autos conclusos para decisão.
Da concessão de liminar
A controvérsia a ser dirimida resume-se acerca da possibilidade de indenizar período de labor rural menor que o reconhecido em juízo, bem como acerca da possibilidade de pagamento de indenização de contribuições previdenciárias sem a incidência de juros e multa.
A concessão de liminar em mandado de segurança requer a coexistência de dois pressupostos normativos, consubstanciados no art. 7º, III, da Lei nº 12.016/2009, quais sejam, a relevância do fundamento alegado pelo impetrante, cabendo-lhe comprovar a violação do seu direito líquido e certo ou a sua iminente ocorrência - fumus boni juris -, assim como a possibilidade de ineficácia da medida se concedida apenas ao final - periculum in mora -, em segurança definitiva, evitando seu perecimento.
Em que pese tenha sido reconhecido o período de labor rural da impetrante de 01/01/1991 a 31/12/1996 em ação judicial, o período a ser indenizado para fins de benefício é aquele de interesse da parte para cômputo como tempo de contribuição. Nesse ponto, a autoridade não pode recusar o pagamento parcial, motivo pelo qual violado o direito da impetrante em receber o documento de arrecadação conforme requerido.
Além disso, as contribuições que a impetrante procurar indenizar correspondem ao período de 01/01/1991 a 30/06/1993. Nesse período, não existia a previsão de juros e multa conforme calculados na guia de recolhimento emitida (evento 1, PROCADM5, p.21 a 22), porquanto esta previsão somente passou a vigorar com a edição da MP n.º 1.523, de 11/10/1996.
Nesse ponto, saliento que é incabível a retroatividade da lei previdenciária para prejudicar os segurados.
Dessa forma, verifico a relevância dos fundamentos apresentados.
O risco de dano irreparável está na inviabilidade de cômputo dos referidos períodos e, de forma reflexa, na impossibilidade de concessão de benefício previdenciário, de caráter alimentar.
Outrossim, não há prejuízo ao INSS, pois acaso julgado improcedente o pedido, poderá, por meios próprios, proceder à cobrança dos referidos encargos.
Logo, tenho por deferir a medida liminar pleiteada.
Ademais, importante destacar a manifestação da União-Fazenda Nacional que reconheceu o direito da impetrante acerca do não cabimento dos juros e multa nos períodos de indenização anteriores à edição da MP 1.523/96:
A UNIÃO (Fazenda Nacional), por sua procuradora signatária, nos autos do processo em epígrafe, vem à presença de Vossa Excelência, informar que NÃO APRESENTARÁ OPOSIÇÃO quanto ao mérito do presente feito, em face da Nota PGFN/CRJ/nº 647/2017 e da previsão do art. 11, caput e § 1º, da Portaria PGFN Nº 985/2016, no sentido de que “a União possui legitimidade ordinária para atuar nas ações que versem sobre a inexigibilidade de juros de mora e de multa na indenização prevista no art. 45-A da Lei nº 8.212, de 1991 (antigo art. 45 da mesma lei), e no art. 96, inciso IV, da Lei nº 8.213, de 1991, sendo certo que tais consectários legais são indevidos, caso a indenização refira-se à período anterior à vigência da MP nº 1.523, de 1996” [grifei].
(...)"
De fato, no tocante à incidência de consectários, o art. 8º da Lei Complementar n. 128, de 19-12-2008, que acresceu o art. 45-A à Lei n. 8.212/91, traz a previsão da incidência de juros e multa sobre o valor da indenização a ser paga ao INSS para fins de obtenção de benefício no Regime Geral de Previdência Social ou de contagem recíproca de tempo de contribuição, verbis:
"Art. 45-A. O contribuinte individual que pretenda contar como tempo de contribuição, para fins de obtenção de benefício no Regime Geral de Previdência Social ou de contagem recíproca do tempo de contribuição, período de atividade remunerada alcançada pela decadência deverá indenizar o INSS.
§ 1º O valor da indenização a que se refere o caput deste artigo e o § 1º do art. 55 da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991, corresponderá a 20% (vinte por cento):
I - da média aritmética simples dos maiores salários-decontribuição, reajustados, correspondentes a 80% (oitenta por cento) de todo o período contributivo decorrido desde a competência julho de 1994; ou
II - da remuneração sobre a qual incidem as contribuições para o regime próprio de previdência social a que estiver filiado o interessado, no caso de indenização para fins da contagem recíproca de que tratam os arts. 94 a 99 da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991, observados o limite máximo previsto no art. 28 e o disposto em regulamento.
§ 2º Sobre os valores apurados na forma do § 1º deste artigo incidirão juros moratórios de 0,5% (cinco décimos por cento) ao mês, capitalizados anualmente, limitados ao percentual máximo de 50% (cinqüenta por cento), e multa de 10% (dez por cento).
§ 3º O disposto no § 1º deste artigo não se aplica aos casos de contribuições em atraso não alcançadas pela decadência do direito de a Previdência constituir o respectivo crédito, obedecendo- se, em relação a elas, as disposições aplicadas às empresas em geral." (grifei)
Entretanto, a jurisprudência deste Tribunal Regional Federal da Quarta Região e do Superior Tribunal de Justiça tem consagrado posição no sentido de que, apenas a partir da data da inserção do § 4º no art. 45 da Lei de Custeio - posteriormente revogado pela Lei Complementar n. 128/2008, ("sobre os valores apurados na forma dos §§ 2º e 3º [recolhimento de contribuições para utilização de tempo de serviço de contribuinte individual e para contagem recíproca, respectivamente], incidirão juros moratórios de zero vírgula cinco por cento ao mês, capitalizados anualmente, e multa de dez por cento"), pela Medida Provisória n. 1.523, de 11-10-1996, convertida na Lei n. 9.528, de 10-12-1997, admite-se a incidência dos consectários sobre os valores a que ele se refere. Nesse sentido, os seguintes arestos:
PREVIDENCIÁRIO. CONTAGEM RECÍPROCA. ART. 45, §§ 3º e 4º, DA LEI N. 8.212/1991. BASE DE CÁLCULO DA INDENIZAÇÃO. PERÍODO ANTERIOR À EDIÇÃO DA MEDIDA PROVISÓRIA N. 1.523/1996. JUROS E MULTA INCABÍVEIS.
1. A respeito da cobrança das contribuições não pagas em época própria, para fins de contagem recíproca, dispõe a Lei de Custeio (8.212/1991), em seu artigo 45, § 3º, que a base de incidência será a remuneração sobre a qual incidem as contribuições para o regime específico de previdência social a que estiver filiado o interessado, ou seja, a atual remuneração do autor.
2. O § 4º, introduzido pela Medida Provisória n. 1.523/1996, convertida na Lei n. 9.528/1997, determina que sobre os valores apurados na forma dos §§ 2º e 3º incidirão juros moratórios de um por cento ao mês e multa de dez por cento.
3. Atualmente, a legislação alterada pela Lei Complementar n. 123, de 2006, prevê limitação até o percentual máximo de cinqüenta por cento.
4. A jurisprudência desta Corte firmou-se no sentido de que a exigência de juros e multa somente tem lugar quando o período a ser indenizado é posterior à edição da Medida Provisória n. 1.523/1996.
5. Recurso especial parcialmente provido.
(STJ, REsp n. 889095/SP, Rel. Min. Jorge Mussi, Quinta Turma, DJe de 13-10-2009)
AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. PREVIDENCIÁRIO. RECOLHIMENTO EXTEMPORÂNEO DAS CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS. INCIDÊNCIA DE JUROS MORATÓRIOS E MULTA SOMENTE A PARTIR DA EDIÇÃO DA MP 1.523/96.
1. É firme a orientação desta Corte no sentido de que inexistindo previsão de juros e multa em período anterior à edição da MP 1.523/96, ou seja, a 11/10/1996, não pode haver retroatividade da lei previdenciária para prejudicar os segurados, razão pela qual devem ser afastados os juros e a multa do cálculo da indenização no referido período.
2. Agravo interno a que se nega provimento.
(STJ, AgRg no Ag n. 1078841/RS, Rel. Min. Celso Limongi [Desembargador convocado do TJ/SP], Sexta Turma, DJe de 08-06-2009)
PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS INFRINGENTES. AUTÔNOMO. RECOLHIMENTO DE CONTRIBUIÇÕES. PERÍODO PRETÉRITO. FORMA DE CÁLCULO. JUROS MORATÓRIOS E MULTA .
1. São devidos juros de mora e multa sobre contribuições recolhidas com atraso, por autônomos, para fins de reconhecimento de tempo de serviço, apenas a partir da edição da MP nº 1523, de 11/10/1996, posteriormente convertida na Lei nº 9528/97, que acrescentou o § 4º, ao artigo 45, da Lei nº 8212/91.
2. Precedentes do STJ.
(TRF4, EIAC n. 2001.71.05.005476-1/RS, Rel. Des. Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, Terceira Seção, D.E. de 17-09-2009)
Diante disso, em relação aos períodos anteriores a 11/10/1996, tem o autor direito a recolher os valores exigidos independentemente da incidência dos juros e da multa previstos no art. 45-A, § 2º, da Lei n. 8.212/91, pelo que é de ser mantida a sentença.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto por negar provimento à remessa oficial.
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Remessa Necessária Cível Nº 5000710-75.2019.4.04.7127/RS
RELATORA: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
PARTE AUTORA: LUCI FERNANDES COCZENSKI (IMPETRANTE)
PARTE RÉ: Chefe de Agência - INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS - Frederico Westphalen (IMPETRADO)
PARTE RÉ: UNIÃO - FAZENDA NACIONAL (INTERESSADO)
PARTE RÉ: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (INTERESSADO)
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. JUROS DE MORA E MULTA REFERENTES A CONTRIBUIÇÕES NÃO RECOLHIDAS EM PERÍODOS ANTERIORES À MP 1.523/96 (LEI 9.528/97).
1. A incidência de juros moratórios e multa no cálculo da indenização das contribuições previdenciárias, imposta pelo § 4º do art. 45 da Lei n.º 8.212/91, somente é exigível a partir da edição da MP n.º 1.523/96.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à remessa oficial, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 16 de junho de 2021.
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 09/06/2021 A 16/06/2021
Remessa Necessária Cível Nº 5000710-75.2019.4.04.7127/RS
RELATORA: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
PRESIDENTE: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
PROCURADOR(A): PAULO GILBERTO COGO LEIVAS
PARTE AUTORA: LUCI FERNANDES COCZENSKI (IMPETRANTE)
ADVOGADO: ALINE BITENCOURT (OAB RS101403)
ADVOGADO: SELONI DUTRA BITENCOURT (OAB RS097844)
PARTE RÉ: Chefe de Agência - INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS - Frederico Westphalen (IMPETRADO)
PARTE RÉ: UNIÃO - FAZENDA NACIONAL (INTERESSADO)
PARTE RÉ: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (INTERESSADO)
MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (MPF)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 09/06/2021, às 00:00, a 16/06/2021, às 14:00, na sequência 447, disponibilizada no DE de 28/05/2021.
Certifico que a 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 6ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À REMESSA OFICIAL.
RELATORA DO ACÓRDÃO: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
Votante: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
Votante: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER
Votante: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
LIDICE PEÑA THOMAZ
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 25/06/2021 04:00:59.