
Apelação Cível Nº 5000861-25.2024.4.04.7205/SC
RELATOR: Desembargador Federal CELSO KIPPER
RELATÓRIO
Cuida-se de apelação contra sentença em que o magistrado a quo denegou a segurança e julgou improcedente o pedido, em razão da ausência de direito líquido e certo a amparar a pretensão da parte impetrante. Sem custas em face do benefício da AJG concedido à parte impetrante e da isenção conferida à parte impetrada. Sem condenação em honorários advocatícios.
Em suas razões, a parte impetrante sustenta, em síntese, que a decisão do INSS foi proferida de maneira genérica, sem sequer fundamentar de acordo com a legislação regente e desconsiderando vasta documentação anexa, cingindo-se o INSS a decidir, em síntese, que não há comprovação da efetiva atividade rural praticada pela Autora durante a infância. Assevera que não se deve basear a conclusão sobre o trabalho exercido pelo menor no âmbito rural através de achismo, não podendo este ser confundido com mero auxílio, pois trata-se de prática comum à época e de extrema importância, que ocorria muito antes dos 07 (sete) anos de idade. Argui que não foi possível comprovar a essencialidade do trabalho para a manutenção da renda do grupo familiar porque a autora não teve a oportunidade de produzir prova testemunhal (Justificação Administrativa), em que pese ter feito requerimento expresso para a utilização deste meio de prova. Afirma que a Autarquia, ao indeferir o benefício à impetrante, violou os princípios da legalidade, do contraditório e da ampla defesa, além da eficiência. Alega que o INSS deve seguir o disposto nos artigos 687, 691 e 680 da IN 77/15. Diante disso, requer a concessão da segurança, com a reabertura do processo administrativo ora rechaçado, para, após a devida instrução do processo na via administrativa, seja obtida a concessão do benefício.
Apresentadas contrarrazões, vieram os autos a esta Corte para julgamento.
Nesta instância, o MPF deixou de se manifestar quanto ao mérito.
É o relatório.
VOTO
Trata-se de mandado de segurança em que a parte impetrante busca a reabertura do procedimento administrativo, para que a autoridade coatora analise o período rural requerido, autorizando o processamento de justificação administrativa, e observando os critérios definidos na Ação Civil Pública n. 5017267-34.2013.4.04.7100, da qual exsurgiu regulamentação administrativa pelo Ofício-Circular Conjunto nº 25 /DIRBEN/PFE/INSS e, ao final, que seja concedido o benefício, nos termos do art. 696, parágrafo único, da IN 77/15, art. 300 e seguintes do CPC/15, c/c art. 7º, III, da Lei nº 12.016/09.(
)Proferindo sentença, o magistrado a quo assim decidiu (evento 15, SENT1).
FUNDAMENTAÇÃO
No caso em tela, a documentação acostada à inicial demonstra que a parte impetrante formulou pedido administrativo de concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, em 29/04/2023, com pedido de reconhecimento da qualidade de segurado especial sem limitação de idade (evento 1, PROCADM8, p. 34).
Nas informações, a autoridade coatora informa a juntada de cópia integral do requerimento interposto pelo interessado onde constam os motivos fundamentados da decisão (evento 3).
A Constituição Federal dispõe que a Administração Pública obedecerá, dentre outros princípios, o da eficiência (art. 37, caput), garantindo a todos a razoável duração do processo no âmbito judicial ou administrativo (art. 5°, LXXVIII).
No plano infraconstitucional, a Lei n. 9.784/99 estabelece normas básicas sobre o processo administrativo na esfera da Administração Federal direta e indireta. Em consonância com o disposto na Constituição, ela também inclui o princípio da motivação como um dos que devem nortear a Administração Pública:
Art. 2o A Administração Pública obedecerá, dentre outros, aos princípios da legalidade, finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica, interesse público e eficiência.
Parágrafo único. Nos processos administrativos serão observados, entre outros, os critérios de:
I - atuação conforme a lei e o Direito;
II - atendimento a fins de interesse geral, vedada a renúncia total ou parcial de poderes ou competências, salvo autorização em lei;
III - objetividade no atendimento do interesse público, vedada a promoção pessoal de agentes ou autoridades;
IV - atuação segundo padrões éticos de probidade, decoro e boa-fé;
V - divulgação oficial dos atos administrativos, ressalvadas as hipóteses de sigilo previstas na Constituição;
VI - adequação entre meios e fins, vedada a imposição de obrigações, restrições e sanções em medida superior àquelas estritamente necessárias ao atendimento do interesse público;
VII - indicação dos pressupostos de fato e de direito que determinarem a decisão;
VIII – observância das formalidades essenciais à garantia dos direitos dos administrados;
IX - adoção de formas simples, suficientes para propiciar adequado grau de certeza, segurança e respeito aos direitos dos administrados;
(...)
Além disso, o art. 50 do referido diploma legal preconiza a obrigatoriedade da motivação nos seguintes termos:
Art. 50. Os atos administrativos deverão ser motivados, com indicação dos fatos e dos fundamentos jurídicos, quando:
I - neguem, limitem ou afetem direitos ou interesses;
(...)
§ 1o A motivação deve ser explícita, clara e congruente, podendo consistir em declaração de concordância com fundamentos de anteriores pareceres, informações, decisões ou propostas, que, neste caso, serão parte integrante do ato.
O princípio da motivação dos atos administrativos impõe à administração o dever de indicar os fundamentos de fato e de direito de suas decisões. Tal obrigatoriedade se fundamenta na necessidade de permitir o controle da legalidade dos atos administrativos.
Por ocasião do indeferimento administrativo do benefício, fundamentou o INSS (evento 1, PROCADM8, p. 270):
(...) Não obstante, ainda que uma parcela da jurisprudência admita a possibilidade, em tese e em casos excepcionalíssimos, de reconhecimento de tempo rural antes dos 12 anos de idade, o menor com essa idade em princípio não possui compleição física que permita a execução de trabalho rural efetivo e em caráter profissional que possa ser prestado de forma indispensável ao sustento do grupo familiar. Dito de outra forma, sua ajuda no lar é complementar, e não indispensável. Assim, em que pese a decisão proferida pelo TRF4, em sede de ação civil pública, admitindo o cômputo da atividade laborativa antes dos 12 anos, a referida decisão somente se aplica a casos excepcionais, por exemplo, quando esteja narrado no processo uma situação de vulnerabilidade exacerbada ou de trabalho escravo-infantil, ou ainda nos casos do trabalho artístico, cultural e desportivo o que não verificamos na presente situação, não a prova por exemplo de resgate pelo órgão de fiscalização do trabalho da família ou menor em situação de trabalho análogo a escravo. Em regra, o trabalho anterior aos 12 anos deve ser afastado.
Portanto, no presente caso, entendo que houve motivação quanto ao indeferimento do período de atividade rural anterior aos 12 anos.
A autarquia analisou os documentos e a autodeclaração apresentada pela segurada. Porém, entendeu que a prova produzida não era suficiente para o reconhecimento do labor rural antes dos 12 anos, conforme pleiteado pela impetrante.
A impetrante, acaso não concorde com as razões que culminaram no indeferimento administrativo do benefício, pode pleitear, por meio de recurso administrativo, previsto expressamente no Ofício-Circular Conjunto nº 25, item 5, ou de ação judicial, a alteração da decisão. Porém, não é correto afirmar que a decisão que indeferiu o benefício foi imotivada.
A decisão do evento 1, PROCADM8, p. 270, expõe de forma clara que já houve análise das provas pela autarquia, bem como os motivos pelas quais a impetrada entendeu não ter sido comprovado o labor rural. Não é cabível, portanto, a reabertura do processo administrativo para que seja realizada nova análise nos termos defendidos pela impetrante, porquanto a constante dos autos observou os termos do art. 50 da Lei n. 9.784/99.
Assim, tendo a autoridade impetrada motivado a decisão que indeferiu o benefício pleiteado pela impetrante, é de ser denegada a ordem pleiteada.
Assinale-se que o interesse de agir para o ajuizamento de mandado de segurança com pedido de reabertura do processo administrativo para nova decisão está condicionado à existência de decisão administrativa com fundamentação genérica, omissa ou inexistente, em flagrante violação ao devido processo legal. É a jurisprudência deste Regional:
PREVIDENCIÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. PEDIDO DE REABERTURA DE PROCESSO ADMINISTRATIVO. RECONHECIMENTO DE TEMPO RURAL. PRINCÍPIO DA MOTIVAÇÃO. ADEQUAÇÃO. 1. A Lei nº 9.784/99 estabelece as normas básicas sobre o processo administrativo na esfera da Administração Federal direta e indireta, em consonância com o disposto no artigo 37 da Constituição, acerca dos princípios que devem reger a boa Administração, incluindo também o princípio da motivação como um dos que devem nortear a Administração Pública (especialmente em seu artigo 2º e artigo 50). 2. O princípio da motivação dos atos administrativos impõe à administração o dever de indicar os fundamentos de fato e de direito de suas decisões, devendo seu texto guardar congruência com a realidade fática, ser claro, coerente e consistente, todas caracterísitcas de uma boa argumentação. Tal obrigatoriedade se fundamenta na necessidade de permitir o controle da legalidade dos atos administrativos. 3. Não se tratando de caso de fundamentação genérica, omissa ou inexistente, não há falar em violação ao devido processo legal a justificar a reabertura dos processos administrativos para nova decisão. A insurgência contra o próprio mérito da decisão administrativa deve ser formulada mediante recurso administrativo ou ação ordinária que comporte dilação probatória. 4. Manutenção da sentença que denegou a segurança. (TRF4, AC 5005907-97.2021.4.04.7205, Nona Turma, Relatora Eliana Paggiarin Marinho, juntado aos autos em 15/12/2021) (Grifou-se)
PREVIDENCIÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. PEDIDO DE REABERTURA DE PROCESSO ADMINISTRATIVO. RECONHECIMENTO DE TEMPO RURAL. PRINCÍPIO DA MOTIVAÇÃO. ADEQUAÇÃO. 1. A Lei nº 9.784/99 estabelece as normas básicas sobre o processo administrativo na esfera da Administração Federal direta e indireta, em consonância com o disposto no artigo 37 da Constituição, acerca dos princípios que devem reger a boa Administração, incluindo também o princípio da motivação como um dos que devem nortear a Administração Pública (especialmente em seu artigo 2º e artigo 50). 2. O princípio da motivação dos atos administrativos impõe à administração o dever de indicar os fundamentos de fato e de direito de suas decisões, devendo seu texto guardar congruência com a realidade fática, ser claro, coerente e consistente, todas caracterísitcas de uma boa argumentação. Tal obrigatoriedade se fundamenta na necessidade de permitir o controle da legalidade dos atos administrativos. 3. Espécie em que restou verificado que todos os pedidos formulados no âmbito administrativo foram apreciados e decididos fundamentadamente. Não se tratando de caso de fundamentação genérica, omissa ou inexistente, não há falar em violação ao devido processo legal a justificar a reabertura dos processos administrativos para nova decisão. 4. Manutenção da sentença que denegou a segurança. (TRF4, AC 5006945-84.2020.4.04.7204, Nona Turma, Relator Sebastião Ogê Muniz, juntado aos autos em 18/03/2021) (Grifou-se)
Portanto, o mandado de segurança com pedido de reabertura do processo administrativo para nova decisão deve fundar-se em alguma omissão ou nulidade procedimental, não tendo lugar diante de decisão administrativa alegadamente equivocada ou contrária às normas de regência.
No caso dos autos, a impetrante aduz que as ilegalidades cometidas pela autarquia correspondem à omissão quanto à oportunização do processamento da justificação administrativa referente ao período de labor rural anterior aos seus 12 anos de idade, de 02-08-1974 a 05-06-1987, em regime de economia familiar e de 06-06-1987 a 01-08-1978.
Verifico, ainda, que o indeferimento do período de alegado exercício de atividades rurais deu-se com base nos seguintes fundamentos (evento 1, PROCADM8, p. 270):
O indeferimento administrativo referente aos períodos de 02-08-1974 a 05-06-1987, e 06-06-1987 a 01-08-1978 está embasado no entendimento da Autarquia quanto à caracterização do segurado especial.
Acerca da legalidade dos atos administrativos, confira-se o disposto no art. 50 da Lei n. 9.784/1999:
Art. 50. Os atos administrativos deverão ser motivados, com indicação dos fatos e dos fundamentos jurídicos, quando:
I - neguem, limitem ou afetem direitos ou interesses;
(...)
§ 1o A motivação deve ser explícita, clara e congruente, podendo consistir em declaração de concordância com fundamentos de anteriores pareceres, informações, decisões ou propostas, que, neste caso, serão parte integrante do ato.
Ora, o princípio da motivação dos atos administrativos impõe à administração o dever de indicar os fundamentos de fato e de direito de suas decisões, devendo seu texto guardar congruência com a realidade fática, ser claro, coerente e consistente, todas características de uma boa argumentação. Tal obrigatoriedade se fundamenta na necessidade de permitir o controle da legalidade dos atos administrativos.
Atendido o disposto no art. 50, § 1º, da Lei n. 9.784/1999, e considerando que a fundamentação guarda, em princípio, consonância com os documentos acostados e congruência com o pedido, não se verifica ilegalidade a justificar a determinação de reabertura do procedimento administrativo para nova decisão quanto ao referido período, sendo certo que a insurgência acerca do mérito do ato administrativo deve ser buscada pela via adequada.
Destarte, considerando que as razões que motivaram o indeferimento da pretensão foram devidamente expostas, tenho que a denegação da segurança é a medida que se impõe.
Ante o exposto, voto por negar provimento ao recurso de apelação da parte autora.
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Apelação Cível Nº 5000861-25.2024.4.04.7205/SC
RELATOR: Desembargador Federal CELSO KIPPER
VOTO DIVERGENTE
Peço vênia para divergir do i. Relator Des. Federal Celso Kipper.
Isso porque entendo que é o caso de acolher a insurgência recursal da parte impetrante, a fim de seja realizada justificação administrativa. Explico.
Da necessidade de realização de justificação administrativa. Poder-dever da Administração Pública. Início de prova material do labor rural em regime de economia familiar
Em relação ao instituto da justificação administrativa, o § 3.º, do art. 55, da Lei n.º 8.213/91, que dispõe sobre os Planos de Benefícios da Previdência Social, estabelece:
Art. 55. O tempo de serviço será comprovado na forma estabelecida no Regulamento, compreendendo, além do correspondente às atividades de qualquer das categorias de segurados de que trata o art. 11 desta Lei, mesmo que anterior à perda da qualidade de segurado:
(...)
§ 3º A comprovação do tempo de serviço para os efeitos desta Lei, inclusive mediante justificação administrativa ou judicial, conforme o disposto no art. 108, só produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no Regulamento.
O art. 108 da referida norma, por sua vez, prevê:
Art. 108. Mediante justificação processada perante a Previdência Social, observado o disposto no § 3º do art. 55 e na forma estabelecida no Regulamento, poderá ser suprida a falta de documento ou provado ato do interesse de beneficiário ou empresa, salvo no que se refere a registro público.
No mesmo sentido, os arts. 143 e 151, do Decreto n.º 3.048/99, que aprova o Regulamento da Previdência Social, restam redigidos nos seguintes termos:
Art. 143. A justificação administrativa ou judicial, para fins de comprovação de tempo de contribuição, dependência econômica, identidade e relação de parentesco, somente produzirá efeito quando for baseada em início de prova material contemporânea dos fatos e não serão admitidas as provas exclusivamente testemunhais.
Art. 151. Somente será admitido o processamento de justificação administrativa quando necessário para corroborar o início de prova material apto a demonstrar a plausibilidade do que se pretende comprovar.
Os dispositivos transcritos indicam, em suma, que o processamento da justificação administrativa somente será admitido caso existente início de prova material. Tal ocorre, sobretudo, pela impossibilidade de reconhecimento, em regra, de tempo de serviço mediante a produção de prova exclusivamente testemunhal (Súmula n.º 149 do STJ).
De outra banda, uma vez presentes os requisitos, a realização da justificação administrativa passa a ser um dever da Administração Pública, para que seja assegurada a observância do devido processo legal substancial. Trata-se de medida fundamental para que o processo administrativo alcance o seu objetivo primordial de realização da justiça com a concessão do amparo previdenciário devido, notadamente ao se considerar o caráter social dos direitos em discussão. Nesse mesmo sentido já concluiu esta 9ª Turma (TRF4, AC 5006530-64.2021.4.04.7205, NONA TURMA, Relator PAULO AFONSO BRUM VAZ, juntado aos autos em 27/06/2022).
Assim, a adoção da medida (justificação administrativa) pode se revelar essencial para a melhor elucidação das condições do labor do grupo familiar da parte autora.
Ademais, verificam-se dos autos documentação que, a priori, pode servir de início de prova material para o período em questão (vide ev.
, p. 36-37 e 41-90).Oportunamente, destaco que os documentos apresentados em nome de terceiros, sobretudo quando integrantes do mesmo núcleo familiar, consubstanciam início de prova material do labor rural, consoante inclusive consagrado na Súmula n.º 73 deste Tribunal Regional Federal da 4.ª Região ("Admitem-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental").
Sobre o reconhecimento de período rural anterior ao documento mais antigo, o Superior Tribunal de Justiça editou a Súmula nº 577, nas seguintes letras: "É possível reconhecer o tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentado, desde que amparado em convincente prova testemunhal colhida sob o contraditório".
Não é demais destacar que, conforme decidido na Ação Civil Pública nº 5017267-34.2013.4.04.7100/RS, proposta pelo Ministério Público Federal em face do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), é possível o cômputo de período de trabalho rural realizado mesmo antes dos 12 anos de idade, para fins de reconhecimento de tempo de serviço e de contribuição pelo exercício das atividades descritas no art. 11 da Lei nº 8.213/91, em maior amplitude, sem a fixação de requisito etário (TRF4, AC 5017267-34.2013.4.04.7100, Sexta Turma, Relatora para Acórdão Salise Monteiro Sanchotene, julgado em 09-04-2018). Na mesma linha recentes julgados do STJ (por todos: AgInt no AREsp 956.558/SP, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 02/06/2020, DJe 17/06/2020).
Ora, se o INSS referiu que é necessária uma maior robustez probatória para o reconhecimento do labor rural anterior aos 12 anos de idade, revela-se contraditório o comportamento da autarquia no sentido de impedir o segurado de produzi-la. É exatamente por meio da prova oral (seja em sede de justificação administrativa, seja em audiência judicial) que o segurado tem a possibilidade de comprovar a rotina do seu grupo familiar na lida rural, melhor esclarecendo acerca da sua participação no regime de economia familiar e, por consequência, para a subsistência do grupo.
Nesse contexto, nos casos em que a parte apresenta início de prova material do labor em regime de economia familiar, deve a autarquia previdenciária realizar a justificação administrativa, ainda mais quando efetivamente pleiteada pelo segurado, sob pena de manifesta violação ao princípios do devido processo legal, contraditório e ampla defesa (art. 5.º, inciso LV, da Constituição Federal).
Saliente-se, outrossim, que o processamento da justificação administrativa não implica reconhecimento do período pleiteado, mas apenas serve de subsídio para análise do pedido de concessão de benefício previdenciário em consonância com os demais elementos apresentados pelo segurado, de forma a se garantir a prolação de decisão devidamente fundamentada e motivada por parte da Administração Pública (art. 50, caput e § 1.º, da Lei n.º 9.784/99).
Assim, com base na fundamentação supra, tenho que merece acolhida a insurgência recursal da parte impetrante, sendo o caso de conceder a segurança, a fim de determinar à autoridade impetrada que proceda à reabertura da instrução do processo administrativo (NB 205.239.516-9), com a devida análise do exercício da atividade rural no período de 02/08/1974 a 01/08/1978, procedendo-se à realização de justificação administrativa para fins de complementação da instrução, e então seja prolatada nova decisão, devidamente fundamentada.
Para cumprimento da ordem, fixo prazo de 45 (quarenta e cinco) dias, contados a partir da intimação do representante judicial da pessoa jurídica interessada quanto ao presente acórdão, nos termos do art. 497 do CPC e da jurisprudência consolidada da Colenda Terceira Seção desta Corte (QO-AC nº 2002.71.00.050349-7, Rel. p/ acórdão Des. Federal Celso Kipper). Incumbe ao representante judicial da pessoa jurídica interessada que for intimado dar ciência à autoridade administrativa competente e tomar as demais providências necessárias ao cumprimento da tutela específica.
Segundo permissivo dos arts. 536, § 1.º, e 537, do CPC, em caso de descumprimento da obrigação de fazer, fixo o valor da multa diária em R$ 100,00 (cem reais). Sobre o tema, necessário ressaltar que não há qualquer vedação no que se refere à cominação de astreinte contra a Fazenda Pública, em caso de descumprimento de ordem judicial. Assim já decidiu o Superior Tribunal de Justiça em reiteradas decisões: Resp nº 508116, DJ de 13-10-2003; Resp nº 464388, DJ de 29-09-2003; Agresp nº 374502, DJ de 19-12-2002 e Resp nº 316368, DJ de 04-03-2002.
Por fim, esclareço que a delimitação do período a ser objeto de reabertura da instrução administrativa levou em consideração que no intervalo de 02/08/1974 a 01/08/1978 a parte impetrante tinha entre 8 e 12 anos; que o período de 02/08/1978 a 31/10/1991 já fora reconhecido como tempo rural (ev.
, p. 175); e que o intervalo posterior, de 01/11/1991 a 14/04/1999, fora indeferido por motivo estranho à discussão travada nesta demanda (labor rural anterior aos 12 anos de idade).Honorários advocatícios
Consoante as súmulas 105 do STJ e 502 do STF, bem como nos termos do artigo 25 da Lei n.º 12.016/2009, no mandado de segurança não há condenação em honorários advocatícios.
Custas processuais
Ante a reforma da sentença, tem-se a sucumbência total do INSS. Não obstante, a União e suas autarquias são isentas do pagamento de custas no Foro Federal (art. 4º, inciso I, da Lei n.º 9.289/96).
Dispositivo
Ante o exposto, com a devida vênia do e. Relator, voto por dar provimento ao apelo para conceder a segurança.
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Apelação Cível Nº 5000861-25.2024.4.04.7205/SC
RELATOR: Desembargador Federal CELSO KIPPER
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. LABOR RURAL ANTERIOR AOS 12 ANOS DE IDADE. POSSIBILIDADE. JUSTIFICAÇÃO ADMINISTRATIVA. PODER-DEVER DA ADMINISTRAÇÃO. REABERTURA DO PROCESSO ADMINISTRATIVO. JULGAMENTO NA FORMA DO ART. 942 DO CPC.
1. Havendo amparo em prova testemunhal idônea, é possível o cômputo de período de trabalho rural realizado mesmo antes dos 12 anos de idade, para fins de reconhecimento de tempo de serviço e de contribuição pelo exercício das atividades descritas no art. 11 da Lei nº 8.213/91, sem a fixação de requisito etário, tendo em conta o que fora decidido na ACP nº 5017267-34.2013.4.04.7100.
2. Mostra-se abusiva a conduta da autoridade impetrada, que deixou de proceder à justificação administrativa, embora o segurado a tenha solicitado, apresentando início de prova material relativo ao período cujo reconhecimento postula, mormente porque tal procedimento não implica o imediato reconhecimento do interregno pleiteado, mas serve de subsídio para análise do pedido de concessão de benefício previdenciário, possibilitando a prolação de decisão devidamente fundamentada e motivada (art. 50, caput e § 1.º, da Lei n.º 9.784/99).
3. No caso, a realização do procedimento se trata de poder-dever da Administração, pois é medida fundamental para que o processo administrativo alcance o seu objetivo primordial de realização da justiça com a concessão do amparo previdenciário devido, notadamente ao se considerar o caráter social dos direitos em discussão e em observância aos princípios do devido processo legal, contraditório e ampla defesa (arts. 2.º, caput, da Lei n.º 9.784/99 e art. 5.º, inciso LV, da Constituição Federal).
4. Tem a parte imperante direito à reabertura do processo administrativo para que seja realizado o procedimento de justificação administrativa.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 9ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por maioria, vencidos o relator e a Juíza Federal LUÍSA HICKEL GAMBA, dar provimento ao apelo para conceder a segurança, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 10 de setembro de 2024.
Documento eletrônico assinado por PAULO AFONSO BRUM VAZ, Relator do Acórdão, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004706370v3 e do código CRC 6249b3fd.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 01/08/2024 A 08/08/2024
Apelação Cível Nº 5000861-25.2024.4.04.7205/SC
RELATOR: Desembargador Federal CELSO KIPPER
PRESIDENTE: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
PROCURADOR(A): MARCUS VINICIUS AGUIAR MACEDO
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 01/08/2024, às 00:00, a 08/08/2024, às 16:00, na sequência 553, disponibilizada no DE de 23/07/2024.
Certifico que a 9ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
APÓS O VOTO DO DESEMBARGADOR FEDERAL CELSO KIPPER NO SENTIDO DE NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO DE APELAÇÃO DA PARTE AUTORA, NO QUE FOI ACOMPANHADO PELA JUÍZA FEDERAL LUÍSA HICKEL GAMBA E A DIVERGÊNCIA INAUGURADA PELO DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO AFONSO BRUM VAZ NO SENTIDO DE DAR PROVIMENTO AO APELO PARA CONCEDER A SEGURANÇA, O JULGAMENTO FOI SOBRESTADO NOS TERMOS DO ART. 942 DO CPC/2015.
Votante: Desembargador Federal CELSO KIPPER
Votante: Juíza Federal LUÍSA HICKEL GAMBA
Votante: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
ALEXSANDRA FERNANDES DE MACEDO
Secretária
MANIFESTAÇÕES DOS MAGISTRADOS VOTANTES
Acompanha o(a) Relator(a) - GAB. 93 (Des. Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ) - Juíza Federal LUÍSA HICKEL GAMBA.
Acompanho o(a) Relator(a)
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 03/09/2024 A 10/09/2024
Apelação Cível Nº 5000861-25.2024.4.04.7205/SC
RELATOR: Desembargador Federal CELSO KIPPER
PRESIDENTE: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
PROCURADOR(A): ANDREA FALCÃO DE MORAES
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 03/09/2024, às 00:00, a 10/09/2024, às 16:00, na sequência 607, disponibilizada no DE de 23/08/2024.
Certifico que a 9ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
PROSSEGUINDO NO JULGAMENTO, APÓS OS VOTOS DOS DESEMBARGADORES FEDERAIS ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL E TAIS SCHILLING FERRAZ ACOMPANHANDO A DIVERGÊNCIA, A 9ª TURMA DECIDIU, POR MAIORIA, VENCIDOS O RELATOR E A JUÍZA FEDERAL LUÍSA HICKEL GAMBA, DAR PROVIMENTO AO APELO PARA CONCEDER A SEGURANÇA, NOS TERMOS DO VOTO DO DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO AFONSO BRUM VAZ QUE LAVRARÁ O ACÓRDÃO.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
Votante: Desembargador Federal ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL
Votante: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
ALEXSANDRA FERNANDES DE MACEDO
Secretária
MANIFESTAÇÕES DOS MAGISTRADOS VOTANTES
Acompanha a Divergência - GAB. 54 (Des. Federal ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL) - Desembargador Federal ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL.
Acompanha a Divergência - GAB. 62 (Des. Federal TAÍS SCHILLING FERRAZ) - Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ.
Conferência de autenticidade emitida em 12/12/2024 15:53:19.
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