Apelação Cível Nº 5003214-86.2020.4.04.7202/SC
RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
APELANTE: ZELINDA FATIMA VIVAN ZANELLA (IMPETRANTE)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (INTERESSADO)
RELATÓRIO
Trata-se de recurso da parte impetrante, contra decisão que, nos autos de mandado de segurança, denegou a segurança postulada, no sentido de que fosse reaberta a instrução do requerimento administrativo n° 41/193.861.169-9, a fim de analisar-se o exercício da atividade rural, com a admissão de todos os meios de prova autorizados pela legislação de regência, inclusive com realização de justificação administrativa, com a prolação de nova decisão, devidamente fundamentada, nos termos da Lei 9.784/99.
Em suas razões recursais (e. 40.1), sustenta a parte impetrante, em síntese, que a autoridade impetrada não oportunizou a realização de justificação administrativa com base apenas no valor das notas fiscais apresentadas no curso da instrução do procedimento administrativo, o que se mostra inadmissível, com ofensa aos princípios do devido processo, contraditório e ampla defesa.
A douta Procuradoria Regional da República da 4ª Região, oficiando no feito, opinou pela desnecessidade de sua intervenção no caso dos autos (e. 5.1).
É o relatório.
VOTO
Estabelece o § 3º do art. 55 da Lei nº 8.213/91, que dispõe sobre os Planos de Benefícios da Previdência Social:
Art. 55. O tempo de serviço será comprovado na forma estabelecida no Regulamento, compreendendo, além do correspondente às atividades de qualquer das categorias de segurados de que trata o art. 11 desta Lei, mesmo que anterior à perda da qualidade de segurado:
§ 3º A comprovação do tempo de serviço para os efeitos desta Lei, inclusive mediante justificação administrativa ou judicial, conforme o disposto no art. 108, só produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no Regulamento.
O art. 108 da referida norma, por sua vez, prevê:
Art. 108. Mediante justificação processada perante a Previdência Social, observado o disposto no § 3º do art. 55 e na forma estabelecida no Regulamento, poderá ser suprida a falta de documento ou provado ato do interesse de beneficiário ou empresa, salvo no que se refere a registro público.
No mesmo sentido, o art. 151, do Decreto 3.048, de 06/05/99, que aprova o Regulamento da Previdência Social, afirma que o processamento da justificação administrativa somente será admitido "na hipótese de ficar evidenciada a inexistência de outro meio capaz de configurar a verdade do fato alegado, e o início de prova material apresentado levar à convicção do que se pretende comprovar".
Os dispositivos transcritos indicam, em suma, que o processamento da justificação administrativa somente será admitida caso existente início de prova material. Tal ocorre, sobretudo, pela impossibilidade de reconhecimento, em regra, de tempo de serviço mediante a produção de prova exclusivamente testemunhal.
A propósito, cito os seguintes julgados de Turmas Recursais e do Tribunal Regional Federal da 4ª Região:
PREVIDENCIÁRIO. TEMPO DE SERVIÇO URBANO. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. EMPREGADA DOMÉSTICA. PROVA. IMPOSSIBILIDADE DE COMPROVAÇÃO COM MERA PROVA TESTEMUNHAL. SENTENÇA MANTIDA. APELAÇÃO IMPROVIDA. 1. As anotações na CTPS fazem prova plena dos vínculos empregatícios registrados. 2. O art. 55 da LBPS preceitua que para a comprovação do tempo de serviço para os efeitos desta Lei, inclusive mediante justificação administrativa ou judicial, conforme o disposto no art. 108, só produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no Regulamento. 3. Não tendo a segurada apresentado início de prova material para comprovação dos supostos vínculos como trabalhadora urbana - doméstica -, é de ser mantida a sentença de improcedência. (TRF4, AC 5018114-98.2015.4.04.9999, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, Relator FERNANDO QUADROS DA SILVA, juntado aos autos em 05/09/2017)
PREVIDENCIÁRIO. TEMPO DE TRABALHO RURAL. TEMPO ESPECIAL. INDEVIDO O BENEFÍCIO. 1. "A comprovação do tempo de serviço para os efeitos desta Lei, inclusive mediante justificação administrativa ou judicial, conforme o disposto no artigo 108, só produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no Regulamento." (artigo 55, parágrafo 3º, da Lei nº 8.213/91). 2. No caso do agente físico ruído, firmou-se no STJ o entendimento de que devem ser observados os seguintes limites: superior a 80 decibéis, na vigência do Decreto nº 53.831/64 (1.1.6), superior a 90 decibéis durante a vigência do Decreto nº 2.172/97 (DOU 06/03/1997), e superior a 85 decibéis, por força da edição do Decreto nº 4.882/03 (DOU 19/11/2003). 3. O uso de equipamentos de proteção individual - EPI, no caso de exposição a ruído, ainda que reduza os níveis do agente físico a patamares inferiores aos previstos na legislação previdenciária, não descaracteriza a especialidade do labor. 4. No caso dos autos, o autor não implementou os requisitos necessários para a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, na DER. (TRF4, AC 5047196-77.2015.4.04.9999, SEXTA TURMA, Relatora BIANCA GEORGIA CRUZ ARENHART, juntado aos autos em 08/06/2017)
Por outro lado, uma vez presentes os requisitos, a realização da justificação administrativa passa a ser um dever da Administração, para que seja assegurada a observância do devido processo legal substancial. Trata-se de medida fundamental para que o processo administrativo alcance o seu objetivo primordial de realização da justiça com a concessão do devido amparo previdenciário a quem tem esse direito.
No caso dos autos, observa-se que o motivo do indeferimento do processamento da justificação administrativa pela autoridade impetrada foi "que os altos valores das ntoas fiscais de venda de mercadoria (suinocultura, leite in natura e bovinos para abate, fls. 15), aliadas às DAP emitidas nos grupos V e E, que não são típicos de segurados especiais que utilizam a agricultura de subsistência, após crivo das bases governamentais, demonstram a preponderância da comercialização da produção em detrimento da subsistência, o que desconfigura a qualificação do grupo familiar como segurados especiais" (e. 44.2, p. 16).
Assim, consoante se depreende da própria fundamentação apresentada pelo INSS, bem como de análise dos documentos que servem de prova pré-constituída, a princípio a parte autora apresentou início de prova material relativa ao período postulado, principalmente notas fiscais (e. 6.3, pp. 18/24) e declarações do ITR do período (e. 6.3, pp. 25/26).
Nesse contexto, em que a parte apresenta início de prova material, o INSS é obrigado a realizar a justificação administrativa, sob pena de manifesta violação a direitos fundamentais do segurado.
Saliente-se, outrossim, que o processamento da justificação administrativa não implica reconhecimento do período pleiteado, mas apenas serve de subsídio para análise do pedido de concessão de benefício previdenciário em consonância com os demais elementos apresentados pelo segurado.
Assim, merece acolhida a insurgência recursal da parte autora, sendo o caso de conceder a segurança, a fim de determinar à autoridade impetrada que proceda à reabertura da instrução do requerimento administrativo n° 41/193.861.169-9, a fim de analisar-se o exercício da atividade rural no período postulado, com a realização de justificação administrativa e, por fim, prolação de nova decisão relativa ao pleito da segurada.
Honorários advocatícios
Consoante as súmulas 105 do STJ e 502 do STF, bem como nos termos do artigo 25 da Lei nº 12.016/2009, no mandado de segurança não há condenação em honorários advocatícios.
Custas processuais
Isenta a parte autora do pagamento das custas judiciais, pois beneficiária da AJG (Lei nº 1.060/50).
O INSS é isento do pagamento no Foro Federal (art. 4º, I da Lei nº 9.289/96) e na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul (artigo 11 da Lei nº 8.121/85, com a redação dada pela Lei 13.471/2010).
Dispositivo
Ante o exposto, voto por conceder a segurança, a fim de determinar à autoridade impetrada que proceda à reabertura da instrução do requerimento administrativo n° 41/193.861.169-9, para análise do exercício da atividade rural no período postulado, com a realização de justificação administrativa e prolação de nova decisão relativa ao pedido da impetrante.
Documento eletrônico assinado por PAULO AFONSO BRUM VAZ, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002162061v5 e do código CRC a515a935.Informações adicionais da assinatura:
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Apelação Cível Nº 5003214-86.2020.4.04.7202/SC
RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
APELANTE: ZELINDA FATIMA VIVAN ZANELLA (IMPETRANTE)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (INTERESSADO)
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. pedido de justificação administrativa. APRESENTAÇÃO DE DOCUMENTOS. NECESSIDADE DE REALIZAÇÃO DO PROCEDIMENTO.
Mostra-se abusiva a conduta da autoridade impetrada, que deixou de proceder à justificação administrativa, embora o segurado tenha apresentado documentação relativa ao período cujo reconhecimento postula, mormente tendo em vista que tal procedimento não implica reconhecimento do interregno pleiteado, servindo apenas de subsídio para análise do pedido de concessão de benefício previdenciário.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar de Santa Catarina do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, conceder a segurança, a fim de determinar à autoridade impetrada que proceda à reabertura da instrução do requerimento administrativo n° 41/193.861.169-9, para análise do exercício da atividade rural no período postulado, com a realização de justificação administrativa e prolação de nova decisão relativa ao pedido da impetrante, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 17 de novembro de 2020.
Documento eletrônico assinado por PAULO AFONSO BRUM VAZ, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002162062v2 e do código CRC 0c143a2e.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 10/11/2020 A 17/11/2020
Apelação Cível Nº 5003214-86.2020.4.04.7202/SC
RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
PRESIDENTE: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
APELANTE: ZELINDA FATIMA VIVAN ZANELLA (IMPETRANTE)
ADVOGADO: WILLIAN SONDA (OAB SC038083)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (INTERESSADO)
MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (MPF)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 10/11/2020, às 00:00, a 17/11/2020, às 16:00, na sequência 129, disponibilizada no DE de 28/10/2020.
Certifico que a Turma Regional suplementar de Santa Catarina, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SANTA CATARINA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, CONCEDER A SEGURANÇA, A FIM DE DETERMINAR À AUTORIDADE IMPETRADA QUE PROCEDA À REABERTURA DA INSTRUÇÃO DO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO N° 41/193.861.169-9, PARA ANÁLISE DO EXERCÍCIO DA ATIVIDADE RURAL NO PERÍODO POSTULADO, COM A REALIZAÇÃO DE JUSTIFICAÇÃO ADMINISTRATIVA E PROLAÇÃO DE NOVA DECISÃO RELATIVA AO PEDIDO DA IMPETRANTE.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
Votante: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
Votante: Juíza Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO
Votante: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
ANA CAROLINA GAMBA BERNARDES
Secretária
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