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Apelação Cível Nº 5008736-04.2023.4.04.7004/PR
RELATOR: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
APELANTE: GIVALDO GILO (IMPETRANTE)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (INTERESSADO)
RELATÓRIO
Trata-se de mandado de segurança impetrado em face do INSS, objetivando o reconhecimento do direito líquido e certo à reabertura e nova análise do processo administrativo de aposentadoria por tempo de contribuição, no qual se pleiteou o reconhecimento de tempo rural, de 10/09/1978 a 31/01/1997, e urbano, de 01/02/1997 a 02/05/1999, com a emissão de carta de exigências e/ou designação de justificação administrativa.
Na sentença, o MM. Juiz a quo decidiu:
Ante o exposto, denego a segurança e extingo o processo com resolução do mérito, nos termos do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, nos termos da fundamentação.
Custas pela impetrante observada, no entanto, a sua condição de beneficiária de justiça gratuita (CPC, art. 98, § 3º).
Sem honorários advocatícios (artigo 25 da Lei nº 12.016/2009).
Havendo interposição tempestiva de recurso de apelação, intime-se a parte contrária para contrarrazões, no prazo de 15 (quinze) dias. Em seguida, remetam-se os autos ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região, nos termos do art. 1.010, §3º, do CPC.
Intimem-se.
Com o trânsito em julgado e nada mais sendo requerido, arquivem-se os autos com as baixas necessárias.
O impetrante apela, sustentando que impetrou mandado de segurança, visando a reabertura do processo administrativo de aposentadoria por tempo de contribuição, diante da ausência de análise do período rural, de 10/09/1978 a 31/01/1997, bem como do período urbano, sem registro em CTPS, de 01/02/1997 a 02/05/1999. Afirma que apresentou diversos documentos aptos a comprovar a atividade rural e urbana, embora desconsiderados pela autarquia. Alega que a autarquia indeferiu o reconhecimento dos períodos pretendidos, sem a emissão de carta de exigências, ou a realização da justificativa administrativa. Requer a reabertura do processo administrativo, observando-se o dever de instrução e motivação.
Oportunizadas as contrarrazões, os autos subiram para julgamento.
É o relatório.
VOTO
Consoante dispõe o artigo 5º, inciso LXIX, da Constituição Federal, "conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por 'habeas-corpus' ou 'habeas-data', quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público".
Nesse mesmo sentido, o artigo 1º, da Lei 12.016/2009 preceitua: "conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por 'habeas corpus' ou 'habeas data', sempre que, ilegalmente ou com abuso de poder, qualquer pessoa física ou jurídica sofrer violação ou houver justo receio de sofrê-la por parte de autoridade, seja de que categoria for e sejam quais forem as funções que exerça".
No caso, a sentença julgou o pedido, fundamentando:
O mandado de segurança é instituto do direito processual constitucional cujo propósito é assegurar a pronta recomposição de direitos individuais ou coletivos, lesados ou ameaçados de lesão por ato ilegal ou abusivo de autoridade. Em virtude de sua natureza mandamental, os direitos a serem resguardados no writ dependem de prova pré-constituída.
Na situação em apreço, vê-se que a impetrante pretende a reabertura do pleito administrativo argumentando que houve violação ao princípio da motivação (direito líquido e certo), o que traduz-se, em espécie, na ausência de menção aos Ofícios nºs 25 e 46, bem como a Instrução Normativa 128/2022 e Portaria 990/22 e 1.079/22 na decisão administrativa impugnada. Também salientou a ausência do despacho conclusivo do anexo IV do Ofício-Circular nº 46. Por fim, postulou a abertura de exigências ou, ainda, de justificação administrativa.
O princípio da motivação dos atos administrativos impõe à administração o dever de indicar os fundamentos de fato e de direito de suas decisões, devendo seu texto guardar congruência com a realidade fática, ser claro, coerente e consistente, todas características de uma boa argumentação. Tal obrigatoriedade se fundamenta na necessidade de permitir o controle da legalidade dos atos administrativos.
Acerca da ilegitimidade dos atos administrativos, confira-se o disposto no art. 50 da Lei n. 9.784/1999:
Art. 50. Os atos administrativos deverão ser motivados, com indicação dos fatos e dos fundamentos jurídicos, quando:
I - neguem, limitem ou afetem direitos ou interesses;
(...)
§ 1o A motivação deve ser explícita, clara e congruente, podendo consistir em declaração de concordância com fundamentos de anteriores pareceres, informações, decisões ou propostas, que, neste caso, serão parte integrante do ato.
Não se vislumbra ilegalidade no ato impugnado, o qual avaliou suficientemente os elementos apresentados no processo administrativo em questão. Foi citada a legislação de referência, de modo a amparar coerentemente a conclusão, afastada a alegação de fundamentação genérica no caso. Frise-se, por oportuno, que o fato de não detalhar o indeferimento de cada documento apresentado não desnatura a motivação da decisão, sob pena de tornar inviável a avaliação documental pelo INSS.
A ilegitimidade do ato poderia ser considerada se a Administração negasse o direito da autora, ignorando por completo o dever de motivação, ou ainda se alegasse fundamentos abstratos, genéricos e ou inaplicáveis ao caso. Nada obstante, não foi essa a conduta da autarquia-ré, que concluiu pela insuficiência dos documentos apresentados.
Sobre a fundamentação dos atos administrativos, o entendimento reiterado do Tribunal Regional da 4ª Região é o seguinte:
PREVIDENCIÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. PEDIDO DE REABERTURA DE PROCESSO ADMINISTRATIVO. RECONHECIMENTO DE TEMPO RURAL. PRINCÍPIO DA MOTIVAÇÃO. ADEQUAÇÃO. 1. A Lei nº 9.784/99 estabelece as normas básicas sobre o processo administrativo na esfera da Administração Federal direta e indireta, em consonância com o disposto no artigo 37 da Constituição, acerca dos princípios que devem reger a boa Administração, incluindo também o princípio da motivação como um dos que devem nortear a Administração Pública (especialmente em seu artigo 2º e artigo 50). 2. O princípio da motivação dos atos administrativos impõe à administração o dever de indicar os fundamentos de fato e de direito de suas decisões, devendo seu texto guardar congruência com a realidade fática, ser claro, coerente e consistente, todas caracterísitcas de uma boa argumentação. Tal obrigatoriedade se fundamenta na necessidade de permitir o controle da legalidade dos atos administrativos. 3. Espécie em que restou verificado que todos os pedidos formulados no âmbito administrativo foram apreciados e decididos fundamentadamente. Não se tratando de caso de fundamentação genérica, omissa ou inexistente, não há falar em violação ao devido processo legal a justificar a reabertura dos processos administrativos para nova decisão. 4. Manutenção da sentença que denegou a segurança. (TRF4, AC 5006945-84.2020.4.04.7204, NONA TURMA, Relator SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ, juntado aos autos em 18/03/2021) (Grifou-se)
Ademais, não há uma obrigação absoluta da autarquia realizar Justificação Administrativa. É a inteligência do art. 22 da Instrução Normativa 128/2022 do INSS:
Art. 22. Na hipótese em que a documentação apresentada for insuficiente para formar convicção ao que se pretende comprovar, o INSS poderá realizar, conforme o caso, todas as ações necessárias à conclusão do requerimento, ou seja, emitir carta de exigência, tomar depoimentos, emitir Pesquisa Externa ou processar Justificação Administrativa - JA, observado o disposto nos art. 567 e 573. (Grifou-se)
Por outro lado, averiguar a fundo a qualidade da prova apresentada, bem como a necessidade de novas exigências requer dilação probatória incompatível com o rito do mandado de segurança. Como dito acima, a violação do direito líquido e certo, deve ser observável primo icto oculi, isto é, à primeira vista, sustentada pela prova pré-constituída, de modo que eventual necessidade de complementação deve ser feita perante o rito processual comum.
Embora a parte impetrante discorde da decisão administrativa e credite à ausência de justificação administrativa o indeferimento do seu pedido, o INSS fez a análise da documentação e entendeu não terem sido preenchidos os requisitos para a pretendida concessão.
Como visto acima, não se tratando de fundamentação genérica, omissa ou inexistente, não há falar em violação ao devido processo legal a justificar a reabertura do processo administrativo para nova decisão. A insurgência contra o próprio mérito da decisão administrativa deve ser formulada mediante recurso administrativo ou ação ordinária que comporte dilação probatória.
Em arremate, entende-se que a administração manifestou-se de maneira fundamentada e específica, sem ferir o dever de motivação de seus atos, de modo que a impetrante não logrou êxito em comprovar a violação ao direito líquido e certo. Por sua vez, a autoridade coatora trouxe aos autos elementos suficientes ao indeferimento da tutela mandamental, motivo pelo qual a denegação da ordem é medida que se impõe.
(...)
Entretanto, em parte, entendo presente a ilegalidade apontada na apelação.
Quanto ao período rural anterior aos 12 anos de idade, o INSS indeferiu o pedido com base em fundamentação razoável.
Veja-se:
Verificous-se que no do período de 10/09/1978 até 09/09/1984, o(a) requerente contava com menos de 12 (doze) anos de idade. Esse período não foi reconhecido e não foi somado ao tempo de contribuição, conforme entendido no processo da 1ª Vara Federal de Concórdia, PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL Nº 5003779-50.2020.4.04.7202/SC, no processo da 1ª Vara Federal de Palmeira das Missões PROCEDIMENTO COMUM Nº 5000529- 74.2019.4.04.7127/RS, no processo da 2ª Vara Federal de Santa Cruz do Sul, PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL Nº 5003616- 52.2020.4.04.7111/RS e no processo do TRIBUNAL REGIONAL FEDERA DA 4º REGIÃO Nº 5002031-88.2017.4.04.7007, os quais transcrevo abaixo:
1ª Vara Federal de Concórdia
PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL Nº 5003779- 50.2020.4.04.7202/SC
(…) O trabalho campesino desenvolvido por menores de 12 anos, mesmo nas longínquas décadas de 1960 a 1980, via de regra, não influenciava na manutenção da família. Atividades de crianças, como se quer reconhecer nestes autos, por certo eram destinadas à educação - educação em todos os aspectos, de incentivo na escolha da futura profissão - e a evitar que os menores ficassem sozinhos na residência familiar, opção correta dos genitores, e que se observa até os dias atuais (até mesmo na área urbana, em que muitos pais delegam tarefas domésticas de limpeza, arrumação etc., para que os filhos ajudem de alguma forma, sintam-se responsáveis, úteis, e mantenham-se ocupados, sem que isso possa ser considerado exploração de trabalho infantil). (...)
1ª Vara Federal de Palmeira das Missões PROCEDIMENTO COMUM Nº 5000529- 74.2019.4.04.7127/RS *
(…) Não obstante, ainda que uma parcela da jurisprudência admita a possibilidade, em tese e em casos excepcionalíssimos, de reconhecimento de tempo rural antes dos 12 anos de idade, o menor com essa idade em princípio não possui compleição física que permita a execução de trabalho rural efetivo e em caráter profissional que possa ser prestado de forma indispensável ao sustento do grupofamiliar. Dito de outra forma, sua ajuda no lar é complementar, e não indispensável.
Assim, em que pese a decisão proferida pelo TRF4, em sede de ação civil pública, admitindo o cômputo da atividade laborativa antes dos 12 anos, este Juízo vem interpretando que a referida decisão somente se aplica a casos excepcionais, porexemplo, quando esteja narrado no processo uma situação de vulnerabilidade exacerbada ou de trabalho escravo-infantil, o que não verifico na presente situação. Em regra, o trabalho anterior aos 12 anos deve ser afastado.(…)
2ª Vara Federal de Santa Cruz do Sul PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL Nº 5003616-52.2020.4.04.7111/RS
(…) Penso, dessarte, que só pode ser considerado segurado especial aquele menor de 12 anos que não teve oportunidade de brincar e de estudar, porque seu trabalho era absolutamente indispensável a seu próprio sustento e/ou da pessoa que era sua responsável (mãe ou pai viúvos, normalmente sem outros filhos). Não se aplica, à evidência à situação do menor de 12 anos que tinha irmãos e/ou ambos os pais vivos (muito menos quando a terra é pouca ou nenhuma), porque, nesse caso, se é certo que uma pessoa a mais ajuda, também é certo que consome, de modo que, ultima ratio, o trabalho não se torna absolutamente indispensável a sua sobrevivência ou a do grupo. (…)
TRIBUNAL REGIONAL FEDERA DA 4º REGIÃO TRF – 4 5002031-88.2017.4.04.7007.
(…) “Não se nega que que em períodos pretéritos era comum que as crianças acompanhassem seus pais na lavoura muito em virtude da impossibilidade de deixálas sozinhas em casa quando ambos os pais tinham atividade a serem exercidas na propriedade. Contudo pela pouca idade, os relataddos serviços a que a acriança era encarregada se limitavama atividades periféricas, de auxílio mínimo, precindíveis à conclusão do serviço pelos pais. É o que ocorre de forma semelhante com as crianças residentes na zona urbana em relação ao trabalho doméstico. Não é incomum que o transcrurso do desenvolvimento as crianças recebem tarefas progressivamente mais complexas relacionadas aos afazeres domésticos. Tal atividade, contudo, não se confunde com o trabalho reconhecido para fins previdenciários, não se equiparando a um trabalhador doméstico. A rigor, em situações normais, as atividades eventualmente exercidas por crianças em auxílio aos pais possui viés familiar inclusivo, ligados à educação dos filhos e o ensino de uma competência compatível com a idade. Não se nega que existem situações excepcionais, em que de fato há evidências da exploração do trabalho infantil, cujos pais devem ser resposabilizados criminalmente. Tais situações, porém, são excepcionais e por isso devem ser efetivamente comprovadas nos autos, não sendo possível aplicar a presunção do labor rurículo desde os 7 anos tal como ocorre em relação ao trabalho do adolescente a partir dos 12 anos de idade, quando biologicamente já possui condições mínimas de prestar auxílio produtivo ao trabalho dos pais.” (...)
Observa-se que a decisão está bem fundamentada, restando claro, inclusive, que eventual justificação administrativa realizada, neste caso, seria indiferente à averbação da atividade rural. Mesmo que as testemunhas comprovassem o trabalho do menor juntamente com os pais, diante das considerações traçadas sobre as peculiaridades da atividade realizada por uma criança, seria incabível a averbação do período requerido.
Ademais, diante da excepcionalidade da proteção, presente em casos no qual o menor esteve submetido à exploração de trabalho infantil, devem ser fornecidos elementos robustos de prova.
Ocorre que, em nenhum momento as informações constantes do processo administrativo demonstram ser essa a hipótese analisada. Entendo que ao impetrante cabia ao menos indicar, fundamentadamente, a existência de trabalho excepcional desempenhado na infância, a fim de que o INSS expedisse carta de exigências ou designasse justificação administrativa para elucidar a questão.
Dessa forma, no ponto, não vejo razões para determinar a reabertura do processo administrativo.
Por outro lado, quanto ao período rural, de 10/09/1984 a 31/01/1997, e urbano, de 01/02/1997 a 02/05/1999, a conclusão é outra.
Percorrendo o processo administrativo do impetrante percebe-se que o pedido foi instruído com autodeclaração rural, além de considerável quantidade de documentos contemporâneos para comprovar a atividade rurícola em regime de economia familiar, além de provas materiais da atividade urbana.
Apesar disso, e sem expedir qualquer exigência, o INSS emitiu relatório conclusivo:
7. O período rural de 01/09/1978 até 21/08/1990, período anterior a emissão da primeira nota encontrada no processo, (Nota nº 5572, data da emissão em 22/08/1990), também, não foi validado por não ter não foi localizado no processo, documentos que comprovassem o afetivo labor rural, tais como: Notas de Venda da Produtor Rural, Notas de Entrada em Estabelecimentos Comerciais, etc.., quer em nome do requerente, quer em nome dos compronentes do Grupo Familiar. Ocorre que, a propriedade, a posse e a titularidade da terra, por si só, não são elementos suficientes para qualificar a requerente como Segurado Especial, que deve comprovar o efetivo exercício da atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, conforme Parágrafo 2º, Art; 48 da Lei 8.213, de 24 de julho de 1991.
8. O período rural de 22/08/1990 até 31/01/1997 é passivo de validação e perfaz, no entanto, o período de 01/11/1991 até 31/01/1997, necessita de idenização (pagamento) ao Instituto Nacional do Seguro Social – INSS. Foi requerido a emissão da Guia de Recolhimento á Previdência Social – GRPS, que foi emitida e incluída no processo para pagamento. Conforme Decreto 10.410/2020 e portaria INSS/PRES 1382/2022, a indenização só surtirá efeito a data do efetivo pagamento da GPS. Portanto, após o pagamento da GPS, o requerente poderá agendar novamente o benefício.
9. Foi requerido na Inicial o processamento de Justificação Administrativa – JA, e pelo fato de que requerente não implementaria as condições para o benefício pleiteado em nenhuma das regras transitórias Emenda Constitucional nº. 103/2019 e não possuir direito adquirido ao benefício na regra anterior, descrita no art. 51 do Decreto nº. 3.048/99, não será processado a Justificação Administrativa – JA e não será realizada a oitiva das testemunhas.
(...)
Inicialmente, esclareço que, devido à alteração legislativa introduzida pela MP 871/2019, convertida na Lei n. 13.846, a qual modificou os arts. 106 e § 3º e 55 da Lei n. 8.213/91, a comprovação da atividade do segurado especial passou a ser determinada por meio de autodeclaração, corroborada por documentos que se constituam em início de prova material de atividade rural e/ou consulta às entidades públicas credenciadas.
Segundo o Ofício Circular nº 46/DIRBEN/INSS, de 13/09/2019, a ratificação da autodeclaração do segurado especial é admitida para a aposentadoria por tempo de contribuição, devendo ser corroborado, no mínimo, por um instrumento ratificador (base governamental ou documento) contemporâneo, observado o limite de eficácia temporal fixado em 7 anos e 6 meses.
Consequentemente, em regra não há razão para a produção de prova testemunhal, mas somente após o esgotamento da produção de prova documental e/ou em bancos de dados disponíveis é que se justifica a oitiva de testemunhas, caso necessário em razão de fundada dúvida a respeito do efetivo exercício de atividade rural.
Assim, de imediato se percebe que os argumentos desenvolvidos pelo INSS são inconsistentes, pois deixa de analisar provas contemporâneas ao período rural, de 10/09/1984 a 21/08/1990, juntadas ao processo e aptas a comprovar a atividade, nos termos estabelecidos na nova sistemática legal, e incompletos, tendo em vista que apenas declara ser "passivo de validação" o período rural, de 22/08/1990 a 31/01/1997, característivas incompatíveis com uma adequada fundamentação.
No que diz respeito ao pedido de reconhecimento do período urbano, de 01/02/1997 a 02/05/1999, a autarquia simplesmente não o analisou.
Consigno que compete ao INSS a operacionalização do reconhecimento dos direitos dos segurados do Regime Geral de Previdência Social, sendo que no exercício desse mister seus servidores devem analisar e decidir de forma motivada sobre os pedidos que lhe são apresentados (artigo 50 da Lei nº 9.784/1999).
O princípio da motivação dos atos administrativos impõe à administração o dever de indicar os fundamentos de fato e de direito de suas decisões, devendo seu texto guardar congruência com a realidade fática, ser claro, coerente e consistente, todas caracterísitcas de uma boa argumentação.
Revela-se, pois, ilegal e irrazoável o encerramento do processo administrativo sem a adequada análise de todos os pedidos formulados pelo demandante e das provas constantes dos autos, bem assim a prolação de decisão fundamentada, nos termos dos Art. 574, §§1º e 2º da IN nº. 128/2022, in verbis:
Art. 574. A decisão administrativa, em qualquer hipótese, deverá conter despacho sucinto do objeto do requerimento administrativo, fundamentação com análise das provas constantes nos autos, bem como conclusão deferindo ou indeferindo o pedido formulado, sendo insuficiente a mera justificativa do indeferimento constante no sistema corporativo do INSS.
§ 1º A motivação deve ser clara e coerente, indicando quais requisitos legais foram ou não atendidos, podendo fundamentar-se em decisões anteriores, bem como em notas técnicas e pareceres do órgão consultivo competente, os quais serão parte do processo se não estiverem disponíveis ao público e não forem de circulação restrita aos servidores do INSS.
[...]
Além disso, incumbe à autarquia direcionar o processo administrativo, orientando o segurado e emitindo, em sendo o caso, carta de exigências ou demais medidas para adequar o requerimento administrativo.
A Portaria INSS/DIRBEN Nº 993 DE 28/03/2022 estabelece:
Art. 3º Os atos que compõem o Processo Administrativo Previdenciário devem observar formalidades essenciais à garantia dos direitos dos interessados e ser organizados em sequência lógica e cronológica crescente, objetivando a decisão final de forma fundamentada e padronizada.
[...]
Art. 109. A Administração tem o dever de explicitamente emitir decisão nos Processos Administrativos e sobre solicitações ou reclamações em matéria de sua competência.
(...)
§ 4º Considera-se concluída a instrução do Processo Administrativo quando estiverem cumpridas todas as exigências, se for o caso, e não houver mais diligências ou provas a serem produzidas.
Quanto à justificação administrativa, frise-se que, existindo início de prova material, há fundamento suficiente para que a instrução do processo seja concluída por meio desse procedimento.
Nesses termos:
PREVIDENCIÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO. REABERTURA. NECESSIDADE DE NOVA DECISÃO. 1. Tem a parte impetrante direito à reabertura do procedimento administrativo de concessão do benefício previdenciário para que seja realizada análise dos documentos acostados para fins de cômputo de período rural, e, caso necessária, a autorização para justificação administrativa, bem como que seja prolatada nova decisão fundamentada. 2. Mantida a sentença que concedeu a segurança. (TRF4 5003475-37.2023.4.04.7205, NONA TURMA, Relatora GABRIELA PIETSCH SERAFIN, juntado aos autos em 14/12/2023)
PREVIDENCIÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. DEVIDO PROCESSO ADMINISTRATIVO. VIOLAÇÃO AO CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. PROCEDIMENTO DE JUSTIFICAÇÃO ADMINISTRATIVA. CABIMENTO. REABERTURA DO PROCESSO ADMINISTRATIVO. 1. Existindo início de prova material, há fundamento suficiente para que a instrução do processo seja concluída por meio do procedimento de justificação administrativa, que continua previsto no artigo 55, §3º, e 108, ambos da Lei nº 8.213/91. 2. As modificações legislativas, trazidas pela Lei nº 13.846/2019, em matéria de comprovação da atividade rural visaram tornar mais ágil o processo de reconhecimento do direito ao tempo rural e não podem ser utilizadas em sentido diverso, isto é, em detrimento do segurado, cerceando o seu direito de produção probatória e ao devido processo legal administrativo. 3. Verificado que houve a violação ao princípio do devido processo administrativo e seus corolários do contraditório e da ampla defesa, resta maculada a decisão administrativa. 4. Mantida a sentença que concedeu em parte a segurança, a fim de determinar a reabertura do processo administrativo, oportunizando-se, assim, a complementação da instrução processual mediante procedimento de justificação administrativa. (TRF4 5003547-68.2021.4.04.7213, NONA TURMA, Relator SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ, juntado aos autos em 26/07/2022)
Infere-se, portanto, o direito líquido e certo do impetrante à reabertura do processo administrativo, para o correto processamento do pedido de reconhecimento do período rural, de 10/09/1984 a 31/01/1997, e urbano, de 01/02/1997 a 02/05/1999, com a emissão de carta de exigências e/ou realização de justificação administrativa, em sendo o caso, e proferimento de nova decisão administrativa, com base em toda a documentação apresentada, nos termos do art. 574, §§1º, da IN INSS/PRES nº 128/2022.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento à apelação.
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Apelação Cível Nº 5008736-04.2023.4.04.7004/PR
RELATOR: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
APELANTE: GIVALDO GILO (IMPETRANTE)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (INTERESSADO)
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. PEDIDO DE REABERTURA DE PROCESSO ADMINISTRATIVO. FUNDAMENTAÇÃO GENÉRICA, OMISSA OU INEXISTENTE. carta de exigências. JUSTIFICAÇÃO ADMINISTRATIVA. NECESSIDADE DE NOVA DECISÃO.
1. A reabertura do processo administrativo é possível quando há fundamentação genérica, omissa ou inexistente que configure violação ao devido processo legal. Em casos tais, há legítimo interesse de agir na impetração do mandado de segurança.
2. O princípio da motivação dos atos administrativos impõe à administração o dever de indicar os fundamentos de fato e de direito de suas decisões, devendo seu texto guardar congruência com a realidade fática, ser claro, coerente e consistente, todas caracterísitcas de uma boa argumentação. Tal obrigatoriedade se fundamenta na necessidade de permitir o controle da legalidade dos atos administrativos.
3. Incumbe à autarquia direcionar o processo administrativo, orientando o segurado e promovendo todas as medidas necessárias à adequação do requerimento administrativo.
4. O artigo 566 da Instrução Normativa PRES/INSS n. 128/2022 expressamente estabelece que a insuficiência da documentação apresentada não pode dar ensejo ao indeferimento sumário do pedido, ainda que verificável de plano ser incabível, determinando expressamente a emissão de carta de exigências ao requerente, oportunizando a complementação da documentação.
5. Existindo início de prova material, há fundamento suficiente para que a instrução do processo seja concluída por meio do procedimento de justificação administrativa, que continua previsto no artigo 55, §3º, e 108, ambos da Lei nº 8.213/91.
6. Hipótese em que não houve decisão administrativa fundamentada, nem justificativa para o não acolhimento das provas anexadas, bem como não foi oportunizada a complementação da documentação, mediante emissão de carta de exigências, ou justificação administrativa. Determinada a reabertura do processo administrativo.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 10ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Curitiba, 06 de agosto de 2024.
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 30/07/2024 A 06/08/2024
Apelação Cível Nº 5008736-04.2023.4.04.7004/PR
RELATOR: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
PRESIDENTE: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
PROCURADOR(A): ALEXANDRE AMARAL GAVRONSKI
APELANTE: GIVALDO GILO (IMPETRANTE)
ADVOGADO(A): PEDRO HENRIQUE ALVARENGA QUADRADO (OAB PR095728)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (INTERESSADO)
MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (MPF)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 30/07/2024, às 00:00, a 06/08/2024, às 16:00, na sequência 148, disponibilizada no DE de 19/07/2024.
Certifico que a 10ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 10ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
Votante: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
Votante: Juíza Federal FLÁVIA DA SILVA XAVIER
Votante: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
SUZANA ROESSING
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 14/08/2024 04:01:20.