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Apelação Cível Nº 5000577-29.2024.4.04.7007/PR
RELATOR: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
APELANTE: ROSEMARI TEREZINHA ROOS BRANDIELLE (IMPETRANTE)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (INTERESSADO)
RELATÓRIO
Trata-se de mandado de segurança impetrado em face do INSS, objetivando o reconhecimento de direito líquido e certo à reabertura e nova análise de processo administrativo de aposentadoria por tempo de contribuição.
Na sentença, o MM. Juiz a quo decidiu:
Diante do exposto, julgo improcedente o pedido e denego a segurança pretendida, julgando o processo com resolução do mérito, conforme artigo 487, I, do CPC.
Condeno a parte impetrante a suportar as custas processuais, SUSPENDO, entretanto, a execução dessa verba em face do benefício da gratuidade da justiça.
Sem honorários (art. 25 da Lei nº 12.016/2009).
Intimem-se, inclusive a autoridade coatora para fins do art. 14, §2º,d a Lei nº 12.016/2009.
Sentença não sujeita a reexame necessário.
Havendo recurso(s) de apelação desta sentença, intime-se o recorrido para apresentar as contrarrazões, no prazo legal (art. 1.010, §1º, do CPC). Após, remetam-se ao TRF4.
A impetrante apela, sustentando que requereu administrativamente o reconhecimento do tempo rural, na condição de segurada especial, no período de 16/10/1986 a 31/12/1998. Afirma que apresentou diversos documentos aptos a comprovar a atividade rural, além da autodeclaração de segurado especial. Alega que a fundamentação apresentada na decisão foi inadequada. Requer a reabertura do processo administrativo, a fim de que sejam analisados todos os documentos rurais anexados ao processo, bem como seja designada data para a realização de justificação administrativa.
Oportunizadas as contrarrazões, os autos subiram para julgamento.
É o relatório.
VOTO
Consoante dispõe o artigo 5º, inciso LXIX, da Constituição Federal, "conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por 'habeas-corpus' ou 'habeas-data', quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público".
Nesse mesmo sentido, o artigo 1º, da Lei 12.016/2009 preceitua: "conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por 'habeas corpus' ou 'habeas data', sempre que, ilegalmente ou com abuso de poder, qualquer pessoa física ou jurídica sofrer violação ou houver justo receio de sofrê-la por parte de autoridade, seja de que categoria for e sejam quais forem as funções que exerça".
A impetrante busca a análise fundamentada do seu pedido administrativo de concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, mediante o reconhecimento de atividade rural.
A sentença julgou o pedido, fundamentando:
O impetrante postula a reabertura do processo administrativo a fim de determinar o exame adequado do pedido de averbação da atividade rural entre 16/10/1986 a 15/10/1994.
O rito do Mandado de Segurança pressupõe que a liquidez e certeza do direito pleiteado esteja amparada em prova pré-constituída. Ou seja, a ilegalidade ou abuso de poder deve estar demonstrado de plano, sem ensejar qualquer dúvida ou a necessidade de dilação probatória.
Ao indeferir o pedido, a autoridade teceu considerações sobre a inviabilidade da averbação da atividade por todo o período requerido. Tanto que uma parte do labor rural foi reconhecido. (
).Observa-se que a autoridade apresentou uma decisão fundamentada, restando claro que houve exame adequado da pretensão, inexistindo arbitrariedade a ser considerada no caso.
Descabe determinar a reabertura do processo para viabilizar um novo exame das provas, pois é incabível discutir sobre o mérito do ato administrativo, interferindo no entendimento exposto pela autoridade ou na conveniência das provas, sobretudo porque a oitiva de testemunhas por justificação administrativa não iria alterar o entendimento, havendo, ainda, possibilidade de recurso administrativo ou impugnação judicial da decisão a fim de indicar que haveria provas diversas do processo anterior.
Inexistindo ilegalidade ou abuso de poder cometido pela autoridade impetrante, é indevida a ordem postulada.
(...)
Entretanto, em que pese o entendimento exposto acima, considero presente, em parte, a ilegalidade apontada na apelação.
Devido à alteração legislativa introduzida pela MP 871/2019, convertida na Lei n. 13.846, que modificou os arts. 106 e § 3º e 55 da Lei n. 8.213/91, a comprovação da atividade do segurado especial passou a ser determinada por meio de autodeclaração, corroborada por documentos que se constituam em início de prova material de atividade rural e/ou consulta às entidades públicas credenciadas.
Segundo o Ofício Circular nº 46/DIRBEN/INSS, de 13/09/2019, a ratificação da autodeclaração do segurado especial é admitida para a aposentadoria por tempo de contribuição, devendo ser corroborado, no mínimo, por um instrumento ratificador (base governamental ou documento) contemporâneo, observado o limite de eficácia temporal fixado em 7 anos e 6 meses.
Consequentemente, em regra não há razão para a produção de prova testemunhal, mas somente após o esgotamento da produção de prova documental e/ou em bancos de dados disponíveis é que se justifica a oitiva de testemunhas, caso necessário em razão de fundada dúvida a respeito do efetivo exercício de atividade rural.
Percorrendo o processo administrativo da impetrante percebe-se que o pedido foi instruído com autodeclaração rural, além de considerável quantidade de documentos para comprovar a atividade rurícola da segurada.
Analisando o pedido de aposentadoria, a decisão administrativa consignou:
(...) 6. Foram apresentados documentos para comprovação de Atividade Rural, e os períodos requeridos foram parcialmente reconhecidos.
6.1. Os documentos referentes ao período inferior ao 12 anos de idade da Requerente não foram considerados. Ressalta-se que, ainda que uma parcela da jurisprudência admita a possibilidade, em tese e em casos excepcionalíssimos, de reconhecimento de tempo rural antes dos 12 anos de idade, o menor com essa idade em princípio não possui compleição física que permita a execução de trabalho rural efetivo e em caráter profissional que possa ser prestado de forma indispensável ao sustento do grupo familiar. Dito de outra forma, sua ajuda no lar é complementar, e não indispensável. Assim, em que pese a decisão proferida pelo TRF4, em sede de ação civil pública, admitindo o cômputo da atividade laborativa antes dos 12 anos, a referida decisão somente se aplica a casos excepcionais, por exemplo, quando esteja narrado no processo uma situação de vulnerabilidade exacerbada ou de trabalho escravo infantil, o que não se verifica na presente situação. Em regra, o trabalho anterior aos 12 anos deve ser afastado.
6.2. Além disso, no período de 05/10/1988 até 15/12/1998, a idade mínima permitida por lei para o trabalho é de 14 anos.
6.3. Foi validado o período de Segurada Especial de 16/10/1994 a 31/12/1998 pelos seguintes documentos:
6.3.1. Comprovante de pagamento do Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural - ITR em nome do pai de 1994 (fls. 39).
6.3.2. Notas Fiscais de entrada em nome do pai com Data de Emissão de 04/08/95, 09/09/96, 26/03/97 e 04/03/98 (fls. 41 a 46).
6.3.3. Informamos que, no caso de Aposentadoria por Tempo de Contribuição, o período de Segurada Especial não foi reconhecido em razão da não indenização de período comprovado a partir de Novembro/1991, nos termos do §2º, art. 55 da Lei nº 8.213/91, e inciso II, art. 215 da Instrução Normativa nº 128/2022. Também foi dispensada a exigência de indenização, pois a Requerente não completaria os requisitos de Tempo de Contribuição e/ou Carência necessários para a concessão do benefício.
(...)
Ocorre que, também foram juntados documentos rurais em nome do genitor da segurada (ITR e nota fiscal de produção), com data de emissão contemporânea ao período não reconhecido administrativamente, de 16/10/1992 (12 anos de idade) a 15/10/1994, mas que foram desconsiderados pelo INSS.
Tais documentos são hábeis à comprovação do período rural, nos termos da nova sistemática estabelecida na lei.
Compete ao INSS a operacionalização do reconhecimento dos direitos dos segurados do Regime Geral de Previdência Social, sendo que no exercício desse mister seus servidores devem analisar e decidir de forma motivada sobre os pedidos que lhe são apresentados (artigo 50 da Lei nº 9.784/1999).
O princípio da motivação dos atos administrativos impõe à administração o dever de indicar os fundamentos de fato e de direito de suas decisões, devendo seu texto guardar congruência com a realidade fática, ser claro, coerente e consistente, todas caracterísitcas de uma boa argumentação.
Revela-se, pois, ilegal o encerramento do processo administrativo sem a adequada análise dos pedidos formulados pela demandante e das provas constantes dos autos, bem assim a prolação de decisão fundamentada, nos termos do Art. 574 e §1º da IN nº. 128/2022, in verbis:
Art. 574. A decisão administrativa, em qualquer hipótese, deverá conter despacho sucinto do objeto do requerimento administrativo, fundamentação com análise das provas constantes nos autos, bem como conclusão deferindo ou indeferindo o pedido formulado, sendo insuficiente a mera justificativa do indeferimento constante no sistema corporativo do INSS.
§ 1º A motivação deve ser clara e coerente, indicando quais requisitos legais foram ou não atendidos, podendo fundamentar-se em decisões anteriores, bem como em notas técnicas e pareceres do órgão consultivo competente, os quais serão parte do processo se não estiverem disponíveis ao público e não forem de circulação restrita aos servidores do INSS.
[...]
Infere-se, portanto, o direito líquido e certo da impetrante à reabertura do processo administrativo, para o correto processamento do pedido, a fim de apurar a atividade rural realizada no intervalo de 16/10/1992 a 15/10/1994.
A nova decisão administrativa deve considerar toda a documentação apresentada, com fulcro no art. 574 e §1º da IN INSS/PRES nº 128/2022.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento à apelação.
Documento eletrônico assinado por LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004590962v26 e do código CRC db53ce7a.Informações adicionais da assinatura:
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Apelação Cível Nº 5000577-29.2024.4.04.7007/PR
RELATOR: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
APELANTE: ROSEMARI TEREZINHA ROOS BRANDIELLE (IMPETRANTE)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (INTERESSADO)
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. PEDIDO DE REABERTURA DE PROCESSO ADMINISTRATIVO. PROVAS NÃO ANALISADAS. NECESSIDADE DE NOVA DECISÃO.
1. A reabertura do processo administrativo é possível quando há fundamentação genérica, omissa ou inexistente que configure violação ao devido processo legal. Em casos tais, há legítimo interesse de agir na impetração do mandado de segurança.
2. O princípio da motivação dos atos administrativos impõe à administração o dever de indicar os fundamentos de fato e de direito de suas decisões, devendo seu texto guardar congruência com a realidade fática, ser claro, coerente e consistente, todas caracterísitcas de uma boa argumentação. Tal obrigatoriedade se fundamenta na necessidade de permitir o controle da legalidade dos atos administrativos.
3. Hipótese em que não houve decisão administrativa fundamentada, em relação à parte do período rural pretendido. Determinada a reabertura do processo administrativo, a fim de que seja proferida nova decisão, de tal forma a considerar toda a documentação apresentada, com fulcro no art. 574 e §1º da IN INSS/PRES nº 128/2022.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 10ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Curitiba, 06 de agosto de 2024.
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 30/07/2024 A 06/08/2024
Apelação Cível Nº 5000577-29.2024.4.04.7007/PR
RELATOR: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
PRESIDENTE: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
PROCURADOR(A): ALEXANDRE AMARAL GAVRONSKI
APELANTE: ROSEMARI TEREZINHA ROOS BRANDIELLE (IMPETRANTE)
ADVOGADO(A): JAQUELINE BATISTELLA (OAB PR099720)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (INTERESSADO)
MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (MPF)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 30/07/2024, às 00:00, a 06/08/2024, às 16:00, na sequência 147, disponibilizada no DE de 19/07/2024.
Certifico que a 10ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 10ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
Votante: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
Votante: Juíza Federal FLÁVIA DA SILVA XAVIER
Votante: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
SUZANA ROESSING
Secretária
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