
Apelação/Remessa Necessária Nº 5019873-13.2019.4.04.7201/SC
RELATOR: Desembargador Federal CELSO KIPPER
APELANTE: CREUZA GALDINO DOS ANJOS (IMPETRANTE)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (INTERESSADO)
RELATÓRIO
Cuida-se de mandado de segurança objetivando, inclusive em liminar, que a Autarquia Previdenciária reabra o prazo para cumprimento de diligências, visando assegurar que a autoridade coatora receba os documentos (PPPs e requerimento de complementação de contribuições) e reanalise o pedido de aposentadoria por tempo de contribuição da impetrante.
A liminar foi indeferida; o INSS manifestou interesse no feito; a autoridade coatora não prestou informações; e o órgão do Ministério Público Federal deixou de se manifestar sobre o mérito.
Em sentença proferida no dia 27-02-2020, a magistrada a quo denegou a segurança e julgou o pedido improcedente com resolução do mérito (art. 487, inciso I, do CPC). Sem condenação em custas e honorários advocatícios (Súmulas n. 512 do STF e 105 do STJ).
Apela a parte autora referindo que o art. 3º da Lei n. Lei 9.784/99 autoriza o administrado a apresentar documentos antes da decisão, os quais serão objeto de consideração pelo órgão competente, razão pela qual requer seja reformada a decisão de primeiro grau, determinando-se que o INSS reabra o processo administrativo para nova análise, considerando-se os documentos apresentados e não juntados pela própria Autarquia.
Apresentadas as contrarrazões, vieram os autos a esta Corte para julgamento.
Nesta instância, o MPF deixou de se manifestar quanto ao mérito.
É o relatório.
VOTO
Trata-se de mandado de segurança em que a parte impetrante pretende que seja determinada a reabertura do prazo que lhe foi deferido para cumprimento de diligências no âmbito do seu processo administrativo, e para que a autarquia aceite os documentos que pretende juntar ao processo, efetuando, por consequência, a reanálise do seu pedido de aposentadoria por tempo de contribuição.
Sustenta que o INSS agendou data para cumprimento das exigências, ocasião em que a impetrante apresentou parte da documentação exigida, tendo agendado novo horário para levar o restante da documentação, ocasião em que, apesar de ter apresentado PPPs e requerimento para complementação das contribuições, o INSS não juntou referidos documentos e, portanto, não os analisou, o que implicou no indeferimento do pedido.
Veja-se o teor da sentença que denegou a segurança (evento 18, SENT1):
Consta do processo administrativo do NB 42/191.868.120-9 apresentado no evento 1, PROCADM10, fl. 29 a seguinte informação:
"Para dar andamento ao processo, solicitamos a apresentação dos documentos descritos abaixo:
- CARTEIRA(S) DE TRABALHO(S)- FORMULARIOS DE EXERCICIO DE ATIVIDADE ESPECIAL; - Requerimento de justificação administrativa ou Declaração Sindical Rural, se os documentos a serem localizados no NB do irmão não forem em nome da requerente ano a ano;
Para o cumprimento desta exigência se faz necessário o agendamento do serviço "Cumprimento de exigência" para o atendimento presencial na Agência. O agendamento poderá ser feito pelo Meu INSS (meu.inss.gov.br) ou Central135 de segunda a sábado, das 7h às 22h (horário de Brasília).
Comunicamos que a não apresentação dos documentos solicitados até o dia 25/07/2019 (30 dias de prazo), poderá acarretar o indeferimento do benefício."
Vê-se, dessa maneira, que o INSS solicitou da impetrante a apresentação de documentos com o desiderato de comprovar os períodos de atividade rural e especial.
Conforme informação acima, foi dado o prazo de 30 (trinta) dias para o cumprimento das exigências.
A impetrante protocolou requerimento em 26.07.2019, com atendimento presencial em 05.08.2019, conforme fl. 122 do PROCADM11 (evento1).
Ressalto que a carta de exigências tem o prazo de 30 dias para ser cumprida, com a possibilidade de prorrogação por mais 30 - nesse caso, antes do esgotamento do prazo, o segurado deverá postular a prorrogação do período.
Pois bem, sem adentrar na questão acerca da suficiência do prazo, verifico que a impetrante juntou os documentos somente após o decurso do prazo, sem, contudo, requerer a dilação do prazo, o que motivou o indeferimento do requerimento de concessão da aposentadoria.
Ainda que se considerasse insuficiente o prazo de 30 dias, a impetrante deveria ter protocolado pedido para a prorrogação dele, fato este que demonstraria sua não inércia quanto ao atendimento da diligência solicitada. No entanto, não o fez, o que, frise-se, ensejou o encerramento da análise e o consequente indeferimento do benefício.
O fato da parte autora ter apresentado os documentos após o decurso do prazo e antes da comunicação de decisão de indeferimento do benefício, não obriga a análise por parte do INSS.
Não vejo qualquer ilegalidade na conduta da autarquia, mormente porque ela facultou prazo à impetrante, sendo que esta se conformou, já que não postulou sua prorrogação.
Assim, não há no caso sub judice o direito líquido e certo a amparar a presente ação mandamental.
No caso em apreço, a parte autora requereu, na via administrativa, a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, tendo o INSS, em 24-06-2019, emitido carta de exigências, ocasião em que lhe foi deferido prazo até o dia 25-07-2019 para cumprimento. Na referida carta, constou que, para o cumprimento desta exigência se faz necessário o agendamento do serviço "Cumprimento de exigência" para o atendimento presencial na Agência (evento 1, PROCADM10, p. 29):
A impetrante realizou agendamento eletrônico em 26-07-2019, e o atendimento presencial foi marcado para 05-08-2019 (evento 1, PROCADM11, p. 122), ocasião em que foram juntados alguns documentos (CTPS, v. g.).
Foi agendado, pela impetrante, novo horário para atendimento presencial, marcado para o dia 03-09-2019 (evento 1, OUT4), visando ao cumprimento do restante das exigências. Contudo, na mesma data, porém antes do horário previsto para atendimento presencial, o INSS indeferiu o benefício requerido (evento 1, PROCADM12, p. 13), não recebendo, assim, os documentos da parte autora.
Como se verifica, a segurada não requereu a prorrogação do prazo para cumprimento da exigência, o qual se extinguiu em 25-07-2019, tendo requerido apenas em 26-07-2019 o agendamento de data para apresentação dos documentos solicitados.
Muito embora coubesse à impetrante o dever de solicitar a prorrogação do prazo, o que não fez, correto também não está o procedimento adotado pelo INSS.
A Lei n. 9.784/99, que regula o processo administrativo, no art. 3º, assim dispõe:
Art. 3o O administrado tem os seguintes direitos perante a Administração, sem prejuízo de outros que lhe sejam assegurados:
(...)
III - formular alegações e apresentar documentos antes da decisão, os quais serão objeto de consideração pelo órgão competente;
(...)
Portanto, não há dúvida de que a lei faculta ao administrado a possibilidade de juntar documentos antes da decisão final, assim como determina que é dever da Administração analisar tais documentos.
Na sistemática atual, a apresentação de quaisquer documentos, pelo segurado, na agência da Previdência Social, deve ser feita mediante agendamento eletrônico, sendo inviável o simples comparecimento pessoal à agência sem que tenha sido realizado o prévio agendamento.
No caso em apreço, a impetrante juntou, em 05-08-2019, parte da documentação solicitada, agendando nova data para apresentação dos demais documentos, ocasião em que foi marcado o dia 03-09-2019 para novo atendimento presencial. Nesse norte, cabia ao INSS aguardar a data agendada, juntar os documentos apresentados pela segurada, para, somente após, proferir decisão final fundamentada, com a apreciação dos documentos juntados.
A Atuarquia, no entanto, às 07h37min do dia 03-09-2019 (evento 1, PROCADM12, p. 13), ou seja, poucos minutos antes do horário agendado para o atendimento presencial, que ocorreria às 08h15min do mesmo dia 03-09-2019 (evento 1, OUT4), proferiu decisão indeferindo o benefício previdenciário.
Entendo, pois, que há ilegalidade no procedimento adotado pelo INSS, que, frente ao disposto no art. 3º da Lei n. 9.784/99, deveria ter considerado os documentos já juntados pela impetrante, ainda que fora do prazo para cumprimento das diligências, e deveria ter aguardado a data agendada para a apresentação do restante dos documentos, proferindo decisão final apenas após a juntada e análise destes.
Veja-se que a Administração Pública rege-se por uma série de princípios, entre os quais o da eficiência, insculpido no art. 37, caput, da Constituição Federal e no art. 2º, caput, da Lei n. 9.784/99. CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO demonstra que o princípio da eficiência é uma faceta de um princípio mais amplo, o da "boa administração":
"A Constituição se refere, no art. 37, ao princípio da eficiência. Advirta-se que tal princípio não pode ser concebido (entre nós nunca é demais fazer ressalvas óbvias) senão na intimidade do princípio da legalidade, pois jamais uma suposta busca de eficiência justificaria postergação daquele que é o dever administrativo por excelência. O fato é que o princípio da eficiência não parece ser mais do que uma faceta de um princípio mais amplo já superiormente tratado, de há muito, no Direito italiano: o princípio da "boa administração". Este último significa, como resulta das lições de Guido Falzone, em desenvolver a atividade administrativa "do modo mais congruente, mais oportuno e mais adequado aos fins a serem alcançados, graças à escolha dos meios e da ocasião de utilizá-los, concebíveis como os mais idôneos para tanto". Tal dever, como assinala Falzone, "não se põe simplesmente como um dever ético ou como mera aspiração deontológica, senão como um dever atual e estritamente jurídico". Em obra monográfica, invocando lições do citado autor, assinalamos este caráter e averbamos que, nas hipóteses em que há discrição administrativa, "a norma só quer a solução excelente". Juarez Freitas, em oportuno e atraente estudo - no qual pela primeira vez entre nós é dedicada toda uma monografia ao exame da discricionariedade em face do direito à boa administração -, com precisão irretocável, afirmou o caráter vinculante do direito fundamental à boa administração. (Bandeira de Mello, Celso Antonio. Curso de Direito Administrativo, 26ª edição, Ed. Malheiros, 2009, págs. 122-123)
Assim, ainda que não houvesse dispositivo de lei a respaldar a pretensão da parte autora, parece-me flagrante que a decisão da Autarquia fere não apenas os princípios da eficiência e da razoabilidade, mas atenta contra a concretização de direitos relativos à seguridade social.
Resta demonstrado, pois, o direito líquido e certo da parte impetrante a ser amparado por mandado de segurança, impondo-se a concessão da segurança para que o INSS reabra o procedimento administrativo, receba os documentos juntados pela parte autora no evento 1, PPP5 a PPP8, e OUT9, e profira nova decisão com a análise destes.
Ante o exposto, voto por dar provimento à apelação da impetrante.
Documento eletrônico assinado por ELIANA PAGGIARIN MARINHO, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001869036v15 e do código CRC b5b64976.Informações adicionais da assinatura:
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Data e Hora: 21/7/2020, às 17:5:33
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Apelação/Remessa Necessária Nº 5019873-13.2019.4.04.7201/SC
RELATOR: Desembargador Federal CELSO KIPPER
APELANTE: CREUZA GALDINO DOS ANJOS (IMPETRANTE)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (INTERESSADO)
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. PRAZO PARA CUMPRIMENTO DE DILIGÊNCIAS, pelo segurado, no âmbito do processo administrativo. ART. 3º DA LEI N. 9.784/99. juntada de documentos. princípios da razoabilidade e da eficiência. reabertura do procedimento administrativo.
1. O art. 3º da Lei n. 9.784/99, que regula os procedimentos administrativos, faculta ao administrado a possibilidade de juntar documentos antes da decisão final, assim como determina que é dever da Administração analisar tais documentos.
2. Muito embora coubesse à impetrante o dever de solicitar a prorrogação do prazo para cumprimento de diligências, o que não fez, há ilegalidade no procedimento adotado pelo INSS, que, frente ao disposto no art. 3º da Lei n. 9.784/99, deveria ter considerado os documentos já juntados pela impetrante, ainda que fora do prazo para cumprimento das diligências, e deveria ter aguardado a data agendada para a apresentação do restante dos documentos, proferindo decisão final apenas após a juntada e análise destes.
3. Ainda que não houvesse dispositivo de lei a respaldar a pretensão da parte autora, é flagrante que a decisão da Autarquia fere não apenas os princípios da eficiência e da razoabilidade, mas atenta contra a concretização de direitos relativos à seguridade social.
4. Apelação da impetrante provida para determinar que o INSS reabra o procedimento administrativo, receba os documentos juntados pela parte autora no evento 1, PPP5 a PPP8, e OUT9, e profira nova decisão com a análise destes.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar de Santa Catarina do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar provimento à apelação da impetrante, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 29 de julho de 2020.
Documento eletrônico assinado por ELIANA PAGGIARIN MARINHO, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001869037v3 e do código CRC c4848039.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): ELIANA PAGGIARIN MARINHO
Data e Hora: 31/7/2020, às 14:49:52
Conferência de autenticidade emitida em 08/08/2020 06:55:35.

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Telepresencial DE 29/07/2020
Apelação/Remessa Necessária Nº 5019873-13.2019.4.04.7201/SC
RELATORA: Juíza Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO
PRESIDENTE: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
PROCURADOR(A): WALDIR ALVES
SUSTENTAÇÃO ORAL PRESENCIAL: CAIO CESAR AUADA por CREUZA GALDINO DOS ANJOS
APELANTE: CREUZA GALDINO DOS ANJOS (IMPETRANTE)
ADVOGADO: CLEITON MIGUEL WESTRUPP (OAB SC035040)
ADVOGADO: CAIO CESAR AUADA (OAB SC034838)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (INTERESSADO)
MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (MPF)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Telepresencial do dia 29/07/2020, na sequência 5, disponibilizada no DE de 20/07/2020.
Certifico que a Turma Regional suplementar de Santa Catarina, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SANTA CATARINA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA IMPETRANTE.
RELATORA DO ACÓRDÃO: Juíza Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO
Votante: Juíza Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO
Votante: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
Votante: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
ANA CAROLINA GAMBA BERNARDES
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 08/08/2020 06:55:35.