Apelação Cível Nº 5005999-52.2014.4.04.7001/PR
RELATOR: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
APELANTE: GENESIO MAZAR CASTRO (IMPETRANTE)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (INTERESSADO)
RELATÓRIO
Trata-se de mandado de segurança em que a impetrante pretende que a Autoridade Impetrada seja compelida a lhe fornecer cópias ou carga dos autos dos processos administrativos referentes aos pedidos de benefícios previdenciários nºs 127.861.652-4 e 131.341.484-8.
Sobreveio sentença que julgou improcendente os pedidos, declarando o processo extinto com resolução do mérito, nos termos do art. 269, I, do Código de Processo Civil (ev. 66).
Apela o impetrante alegando em síntese, que, os documentos trazidos aos autos reconstituídos não serviriam para a finalidade pretendida, qual seja, extrair provas para pleitear a revisão do benefício previdenciário, prejudicando o direito do impetrante. (ev. 75).
Sem contrarrazões, vieram os autos a esta Corte.
O Ministério Público Federal apresentou parecer pelo desprovimento do apelo (ev. 4).
É o relatório. Peço dia.
VOTO
Inicialmente, cumpre o registro de que a sentença recorrida foi publicada em data anterior a 18.3.2016, quando passou a vigorar o novo Código de Processo Civil (Lei nº 13.105, de 16.3.2015).
Mérito
O mandado de segurança é o remédio cabível para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas-corpus ou habeas-data, sempre que, ilegalmente ou com abuso do poder, qualquer pessoa física ou jurídica sofrer violação ou houver justo receio de sofrê-la por parte de autoridade, seja de que categoria for e sejam quais forem as funções que exerça, segundo o art. 1º da Lei nº 12.016/09.
O direito líquido e certo a ser amparado por meio de mandado de segurança é aquele que se apresenta manifesto na sua existência, insuscetível de controvérsia.
Evidenciando-se a desnecessidade da construção de nova fundamentação jurídica, destinada à confirmação da bem lançada sentença, transcrevo e adoto como razões de decidir os seus fundamentos, verbis:
Como bem demonstrado no relatório desta sentença, o atendimento ao requerimento do impetrante de obtenção de carga ou cópia dos autos dos processos administrativos relacionados aos benefícios previdenciários de nºs 127.861.652-4 e 131.341.484-8 restou frustrado pelo fato de o INSS, confessadamente, ter extraviado os aludidos autos, o que deu ensejo às suas reconstituições parciais, mediante a impressão das telas extraídas dos cadastros informatizados da autarquia.
Não há dúvida a respeito do direito do impetrante de ter pleno acesso à documentação pretendida, nos termos do art. 5º, XXXIII, da Constituição e do art. 46 da Lei nº 9.784/99, citados na sequência:
Art. 5º. (...)
(...)
XXXIII - todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado;
Art. 46. Os interessados têm direito à vista do processo e a obter certidões ou cópias reprográficas dos dados e documentos que o integram, ressalvados os dados e documentos de terceiros protegidos por sigilo ou pelo direito à privacidade, à honra e à imagem.
Neste caso concreto, todavia, restou demonstrado que o extravio dos autos dos processos administrativos pretendidos pelo impetrante obsta de forma absoluta o atendimento ao seu direito. Isso significa que o acolhimento de sua pretensão tornou-se materialmente impossível.
Neste ponto, é importante observar que a natureza do provimento jurisdicional requerido e emanado de um mandado de segurança é essencialmente mandamental, de maneira que a autoridade impetrada, sendo acolhido o pedido do impetrante, é ordenada a praticar ou a se abster da prática de um ato. Sendo assim, na completa inviabilidade material de a referida ordem ser atendida, a segurança que seria concedida perde todo o seu significado.
Na situação em análise, aliás, em que se imputa à autoridade impetrada uma omissão ilegal (não disponibilização dos autos dos processos administrativos ao segurado), não se pode falar, a rigor, em omissão abusiva, ilícita ou arbitrária, já que ela tem uma causa de justificação, que consiste justamente no extravio dos documentos pretendidos. Ainda que venha a se considerar a perda dos autos como um ilícito, a sua não disponibilização, ato subsequente ao desaparecimento, não o é.
Considerando que refoge ao âmbito deste mandado de segurança tratar das consequências do extravio da documentação almejada pelo impetrante, já que o pedido formulado foi simplesmente o de disponibilização dos autos, a questão somente poderá ser discutida em ação apropriada, de maneira que não há como acolher o pedido formulado na petição inicial.
Neste sentido, trago os seguintes precedentes do Tribunal Regional Federal da 4ª Região:
CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. REQUERIMENTO DE CÓPIA DE PROCESSO ADMINISTRATIVO FÍSICO. ALEGAÇÃO DE EXTRAVIO, PELO INSS. IMPOSSIBILIDADE DE CUMPRIMENTO DA SOLICITAÇÃO COMPROVADA. DISPOSIÇÃO DE FORNECIMENTO DE DADOS CONSTANTES EM SISTEMA ELETRÔNICO.1. Em caso de alegação de extravio/desaparecimento de documento/procedimento sob guarda de órgão público, a solução conferida pela Sexta Turma tem por fundamentos três pressupostos: a) a presunção de veracidade da alegação; b) o princípio ad impossibilia nemo tenetur; e c) a impossibilidade de declaração dos efeitos de tal circunstância quanto ao reconhecimento de fato ou Direito. 2. Considerando se tratar de mandado de segurança, que há prova de adoção de providências (há mais de vinte e cinco anos) contemporâneas à época do desaparecimento dos documentos, e a circunstância de haver os dados que interessam no sistema eletrônico do INSS, que se dispõe fornecê-los, prevalece a equilibrada e justa solução preconizada pelo Ministério Público, determinando-se o fornecimento de tais dados ao impetrante. 3. Caso os dados havidos se mostrem insuficientes para conferência da amplitude dos direitos do segurado, tal aspecto não tem como ser suprido com a presente ação. (TRF4, APELREEX 5006665-43.2011.404.7200, Sexta Turma, Relator p/ Acórdão João Batista Pinto Silveira, juntado aos autos em 07/06/2013)
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CAUTELAR DE EXIBIÇÃO DE DOCUMENTO. ALEGAÇÃO DE EXTRAVIO PELO ENTE ADMINISTRATIVO. AUSÊNCIA DE PROVA EM CONTRÁRIO DO INTERESSADO. PRESUNÇÃO DE VERACIDADE. IMPOSSIBILIDADE DE SE EXIGIR O QUE NÃO EXISTE. ALEGAÇÃO DE PREJUÍZO EM FUTURA AÇÃO PELA AUSÊNCIA DOS DOCUMENTOS EXTRAVIADOS. 1. É caso de se julgar improcedente a ação cautelar de exibição de documento (no caso: processo administrativo em que requerida prorrogação de auxílio-doença a trabalhadora rural) quando o requerido assevera ter ocorrido extravio e o promovente não prova a inverdade da alegação (CPC, art. 357), certo que, por um lado, é presumivelmente verdadeira a informação dada pela Administração Pública (TRF 4ªR., AC nº 0003403-66.2008.404.7204, Rel. Hermes Siedler da Conceição Júnior, D.E. 14/06/20100) e, por outro, ad impossibilia nemo tenetur (STJ, REsp nº 429.216/RS, Rel. Teori Albino Zavascki, DJ 07/06/2004, p. 159). 2. Afastada a alegação de que a recusa do ente administrativo implicará, automaticamente, em impossibilidade de comprovação da condição de trabalhadora rural pois, em primeiro lugar, a questão não figura como controversa para o demandado; por outro lado, tal questão cabe ser definida somente em processo diverso pelo juízo competente, que definirá como tratar eventual óbice manifestado pelo INSS, à vista da responsabilidade do desaparecimento de documentos ser de responsabilidade do próprio demandado. (AC nº 0014241-54.2010.404.9999, Rel. João Batista Pinto Silveira, D.E. 17/02/2011).
PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CAUTELAR. EXIBIÇÃO DE DOCUMENTOS. EXTRAVIO DO PROCESSO ADMINISTRATIVO RECLAMADO. 1. Em ação cautelar de exibição de documento ou coisa, nas hipóteses de perda ou extravio do documento, a busca e apreensão ou a aplicação de multa como decorrência do não-atendimento da respectiva ordem pode restar inviável, configurando a impossibilidade material. 2. Incabível a presunção de veracidade dos fatos na via cautelar, por extravasar seus limites. Nesse contexto, cabe à requerente, mediante ação própria, buscar a comprovação dos fatos decorrentes da não apresentação do documento, restando a cargo daquele Juízo o reconhecimento ou não da presunção de veracidade.-(AC nº 5001327-49.2011.404.7116, Rel. Néfi Cordeiro, D.E. 04/02/2013).
PROCESSUAL CIVIL. CAUTELAR. EXIBIÇÃO DE DOCUMENTOS. EXTRAVIO DE DOCUMENTO. NÃO FIXAÇÃO DE MULTA. HONORÁRIOS. Não obstante a expressa remissão legal do art. 845 do CPC, a doutrina e a jurisprudência divergem no que tange à incidência da presunção de veracidade (art. 359, CPC) ao procedimento cautelar. Com efeito, a natureza do pedido cautelar, onde se postula a exibição do documento ou da coisa, não implica a veracidade do fato, desvinculado de uma pretensão própria. Nesse sentido: "No processo cautelar, o desatendimento da determinação de que se exiba documento ou coisa não acarreta a conseqüência prevista no artigo 359 do Código de Processo Civil" (STJ, RESP nº 204807/SP, Rel. Min. Eduardo Ribeiro. DJ de 06/06/2000). Ocorre que, em certas hipóteses, esta solução não é suficiente. A busca e apreensão pelo não atendimento da ordem pode restar frustrada em caso de perda ou extravio do documento. Na hipótese, a situação criada permanecerá desamparada da tutela judicial. Ou seja: existirá a ordem para exibição de documento, mas tendo em vista a impossibilidade material, inviável será a busca e apreensão, bem como a cominação de multa. Tal particularidade impede a adoção de qualquer medida tendente ao cumprimento da obrigação de fazer (busca e apreensão ou multa). Neste passo, a única solução plausível para atender os interesses da requerente é admitir a presunção de veracidade dos fatos. Todavia, esse reconhecimento não é passível na via cautelar, por extravasar seus limites. Nesse contexto, cabe à requerente, mediante ação própria, buscar a comprovação dos fatos decorrentes da não apresentação do documento, restando a cargo daquele Juízo o reconhecimento ou não da presunção de veracidade. Honorários advocatícios fixados em R$ 465,00 (quatrocentos e sessenta e cinco reais). (AC nº 2007.70.00.024107-3, Rel. Sebastião Ogê Muniz, D.E. 04/08/2009).
3. DISPOSITIVO
Diante de todo o exposto, julgo improcedentes os pedidos formulados na petição inicial, declarando o processo extinto com resolução do mérito, nos termos do art. 269, I, do Código de Processo Civil. (...)
Acrescento que trecho do parecer do MPF que bem pontuou acerca da questão suscitada nos autos:
No caso dos autos, o impetrante, ora recorrente, pretende obter pela via do mandado de segurança a concessão da ordem de acesso aos autos dos processos administrativos que informa. Ocorre que o objeto da demanda não se encontra mais disponível diante da alegação do INSS de que os autos dos processos administrativos foram perdidos ou extraviados sendo, posteriormente, reconstituídos em parte (evento 46). A providência almejada constitui-se, pois, em obrigação cujo objeto é fisicamente impossível, cabendo observar que a obtenção dos documentos extraviados está sendo ultimada por meio de regular procedimento de reconstituição.
Assim, não havendo como exigir o que se tornou inexistente, o apelo não deve ser provido. Quanto à alegação de prejuízo a eventual direito do recorrente oriundo do desaparecimento ou extravio dos autos administrativos é cabível a apuração em demanda própria, visto que não consiste em objeto da presente ação. (...)
Assim, impõe-se a confirmação da sentença que reconheceu a impossibilidade material da pretensão do impetrante, diante da demonstração no caso do extravio dos autos dos processo administrativos pretendidos. As consequências do extravio da documentação almejada e eventual prejuízo ao demandante é matéria que refoge ao mandado de segurança.
Portanto, há de ser mantida íntegra a sentença que denegou a segurança pleiteada.
Consectários da Sucumbência
Honorários Advocatícios
Incabível a condenação ao pagamento de honorários advocatícios em sede de mandado de segurança, consoante entendimento consolidado pela jurisprudência pátria, a teor do disposto no art. 25 da Lei nº 12.016/09 e nas Súmulas nºs 512 do STF e 105 do STJ.
Custas Processuais
O INSS é isento do pagamento das custas processuais no Foro Federal (artigo 4.º, I, da Lei n.º 9.289/96).
Prequestionamento
Objetivando possibilitar o acesso das partes às Instâncias Superiores, considero prequestionadas as matérias constitucionais e legais suscitadas nos autos, conquanto não referidos expressamente os respectivos artigos na fundamentação do voto.
Conclusão
Apelação da parte impetrante desprovida.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação.
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Apelação Cível Nº 5005999-52.2014.4.04.7001/PR
RELATOR: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
APELANTE: GENESIO MAZAR CASTRO (IMPETRANTE)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (INTERESSADO)
EMENTA
mandado de segurança. processo civil. requerimento de cópia de processo administrativo. extravio pelo inss. impossibilidade de atendimento da obrigação.
Diante da demonstração de extravio dos processos administrativos é materialmente impossível de ser atendido o pedido no mandado de segurança.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar do Paraná do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, decidiu negar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Curitiba, 18 de julho de 2018.
Documento eletrônico assinado por OSCAR VALENTE CARDOSO, Juiz Federal Convocado, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40000562316v4 e do código CRC 28c849a3.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 18/07/2018
Apelação Cível Nº 5005999-52.2014.4.04.7001/PR
RELATOR: Juiz Federal OSCAR VALENTE CARDOSO
PRESIDENTE: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
APELANTE: GENESIO MAZAR CASTRO (IMPETRANTE)
ADVOGADO: LUIZ ANTONIO FÁVERO
ADVOGADO: JOSE ROBERTO ESPOSTI
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (INTERESSADO)
MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (MPF)
Certifico que este processo foi incluído no 1º Aditamento do dia 18/07/2018, na seqüência 898, disponibilizada no DE de 09/07/2018.
Certifico que a Turma Regional suplementar do Paraná, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A Turma Regional Suplementar do Paraná, por unanimidade, decidiu negar provimento à apelação.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Juiz Federal OSCAR VALENTE CARDOSO
Votante: Juiz Federal OSCAR VALENTE CARDOSO
Votante: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
Votante: Desembargador Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA
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