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PREVIDENCIÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. REVISÃO ADMINISTRATIVA DE BENEFÍCIO. CURADOR DO BENEFICIÁRIO. MÁ-FÉ NÃO DEMONSTRADA. DESCONTOS INDEVIDOS. TRF4. 50019...

Data da publicação: 24/09/2021, 23:01:29

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. REVISÃO ADMINISTRATIVA DE BENEFÍCIO. CURADOR DO BENEFICIÁRIO. MÁ-FÉ NÃO DEMONSTRADA. DESCONTOS INDEVIDOS. 1. A possibilidade do INSS rever e anular os atos de concessão de benefícios, quando eivados de vícios que o tornem ilegais (buscando ou não a devolução de valores percebidos indevidamente) é consagrada nas Súmulas 346 e 473 do Supremo Tribunal Federal, bem como tem previsão legal expressa, atualmente contida nos artigos 53 da Lei nº 9.784/99 e 103-A, da Lei nº 8.213/91, introduzido pela Lei nº 10.839/04. 2. A simples má aplicação de norma jurídica, a interpretação equivocada e o erro da administração, por parte da Autarquia, não autoriza, por si só, a devolução de valores recebidos indevidamente a título de benefício previdenciário, já que, em tese, foram recebidos de boa-fé pelos segurados/beneficiários. 3. Tendo em vista que não ficou demonstrada a má-fé do curador na obtenção do benefício, são indevidos os descontos realizados em sua aposentadoria por tempo de contribuição. (TRF4 5001944-26.2018.4.04.7031, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, Relator LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO, juntado aos autos em 17/09/2021)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Rua Otávio Francisco Caruso da Rocha, 300, Gabinete do Des. Federal Penteado - Bairro: Praia de Belas - CEP: 90019-395 - Fone: (51)3213-3484 - www.trf4.jus.br - Email: gpenteado@trf4.jus.br

Remessa Necessária Cível Nº 5001944-26.2018.4.04.7031/PR

RELATOR: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO

PARTE AUTORA: FRANCISCA CAMACHO SANCHES (IMPETRANTE)

PARTE RÉ: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (INTERESSADO)

RELATÓRIO

Trata-se de mandado de segurança por meio do qual a autora pleiteia a suspensão do desconto de 30% (trinta por cento) do valor incidente sobre seu benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, e a restituição dos valores descontados de seu benefício a partir da competência 10/2018.

Foi proferida sentença, publicada em 25/06/2019, cujo dispositivo ficou assim redigido:

Ante o exposto, com fundamento no artigo 487, I, do CPC, confirmo a liminar deferida no evento 3 e julgo parcialmente procedentes os pedidos formulados na inicial para:

a) determinar à Autoridade Impetrada que se abstenha de realizar descontos mensais no benefício de aposentadoria por idade da Impetrante (NB 42/109.606.295-7), em razão do débito apurado nos benefícios de pensão por morte objetos dos autos (NB 21/138.188.988-0 e NB 21/139.270.854-8);

b) declarar o direito da Impetrante à restituição do valor descontado relativamente à competência 11/2018 (R$543,58).

Sem honorários advocatícios (art. 25 da Lei nº 12.016/2009 e súmula 512 STF).

Dada a sucumbência mínima da Impetrante, condeno o INSS ao pagamento das custas processuais, observando-se, no entanto, a isenção prevista no art. 14, § 1º, da Lei 12.016/2009.

Sentença publicada e registrada eletronicamente. Intimem-se.

4. Havendo interposição de recurso, dê-se vista à parte recorrida para oferecimento de contrarrazões, no prazo legal. Em seguida, promova-se a remessa eletrônica ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região.

5. Sentença sujeita ao duplo grau de jurisdição (artigo 14, § 1º, da Lei nº 12.016/2009).

Vieram os autos a esta Corte, para análise da remessa necessária.

É o relatório.

Peço dia para julgamento.

VOTO

RESTITUIÇÃO DE VALORES RECEBIDOS INDEVIDAMENTE

Sobre o tema, cumpre tecer algumas observações iniciais.

Como visto, a possibilidade de o INSS rever e anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que o tornem ilegais (buscando ou não a devolução de valores percebidos indevidamente) é consagrada nas Súmulas 346 e 473 do Supremo Tribunal Federal, passando posteriormente a contar com previsão legal expressa (artigo 53 da Lei nº 9.784/99 e art. 103-A, da Lei nº 8.213/91, introduzido pela Lei nº 10.839/04).

Inobstante, consolidada a jurisprudência no sentido de que a simples má aplicação de norma jurídica, a interpretação equivocada e o erro da administração, por parte da Autarquia, não autoriza, por si só, a devolução de valores recebidos indevidamente a título de benefício previdenciário, já que, em tese, foram recebidos de boa-fé pelos segurados/beneficiários.

Ademais, os valores recebidos de boa-fé pelo segurado/beneficiário, em face da natureza alimentar das prestações previdenciárias, são irrepetíveis, o que implica na relativização do estabelecido nos artigos 115 da Lei nº 8.213/91 e 154 do Decreto nº 3.048/99.

Nesse passo, indispensável que seja demonstrada a má-fé do beneficiário ou, no revés, que seja afastada a boa-fé da pessoa que alegadamente recebeu de forma indevida determinado benefício previdenciário.

Esta identificação é fundamental para autorizar a administração a adotar medidas para fazer cessar a ilicitude, bem como buscar a via judicial para obter a restituição de verba indevidamente paga, quando os benefícios previdenciários são obtidos, comprovadamente, mediante fraude, dolo e má-fé e, em caso contrário, preservar a condição do beneficiário que agiu de boa-fé, hipótese em que o erro se imputa ao ente público.

Essa é a orientação jurisprudencial:

PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 1973. APLICABILIDADE. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. BENEFÍCIO RECEBIDO INDEVIDAMENTE POR ERRO DA ADMINISTRAÇÃO. BOA-FÉ. VERBA DE CARÁTER ALIMENTAR. RESTITUIÇÃO DE VALORES. IMPOSSIBILIDADE. I - Consoante o decidido pelo Plenário desta Corte na sessão realizada em 09.03.2016, o regime recursal será determinado pela data da publicação do provimento jurisdicional impugnado. Assim sendo, in casu, aplica-se o Código de Processo Civil de 1973. II - Por força do princípio da irrepetibilidade dos alimentos, e, sobretudo, em razão da diretriz da boa-fé objetiva do segurado, não cabe a devolução de valores recebidos, a título de benefício previdenciário, por força de interpretação equivocada, má aplicação da lei ou erro da administração. III - Recurso Especial não provido.

(REsp 1550569/SC, STJ, 1ª Turma, Rel. Ministra REGINA HELENA COSTA, publicado em 18-5-2016)

Ainda, de acordo com os critérios estabelecidos no Tema 979/STJ (REsp 1.381.734-RN, Rel. Min. Benedito Gonçalves, Primeira Seção, por unanimidade, julgado em 10/03/2021), "Os pagamentos indevidos aos segurados decorrentes de erro administrativo (material ou operacional), não embasado em interpretação errônea ou equivocada da lei pela Administração, são repetíveis, sendo legítimo o desconto no percentual de até 30% (trinta por cento) de valor do benefício pago ao segurado/beneficiário, ressalvada a hipótese em que o segurado, diante do caso concreto, comprova sua boa-fé objetiva, sobretudo com demonstração de que não lhe era possível constatar o pagamento indevido."

O informativo nº 688 do STJ, publicado em 15 de março de 2021, pontuou:

Dentro dessa perspectiva, esta Corte Superior evoluiu a sua jurisprudência passando a adotar o entendimento no sentido de que, para a não devolução dos valores recebidos indevidamente pelo beneficiário da Previdência Social, é imprescindível, além do caráter alimentar da verba e do princípio da irrepetibilidade do benefício, a presença da boa-fé objetiva daquele que recebe parcelas tidas por indevidas pela administração. Essas situações não refletem qualquer condição para que o cidadão compreenda de forma inequívoca que recebeu a maior o que não lhe era devido.

(...)

Diferentemente das hipóteses anteriores (interpretação errônea e má aplicação da lei), onde o elemento objetivo é, por si, suficiente para levar à conclusão de que o segurado recebeu o benefício de boa-fé, assegurando-lhe o direito da não devolução do valor recebido indevidamente, a hipótese de erro material ou operacional deve ser analisado caso a caso, de modo a averiguar se o beneficiário/segurado tinha condições de compreender a respeito do não pertencimento dos valores recebidos, de modo a se lhe exigir comportamento diverso, diante do seu dever de lealdade para com a Administração Previdenciária.

Nesse contexto, é possível afirmar que há erros materiais ou operacionais que se mostram incompatíveis com a indispensável boa-fé objetiva, dando ensejo ao ressarcimento do indébito, situação que foi muito bem retratada no MS n. 19.260/DF, da relatoria do Ministro Herman Benjamin, DJe 03/09/2014, ao exemplificar uma situação hipotética de um servidor que não possui filhos e recebeu, por erro da Administração, auxílio natalidade.

Assim, os erros materiais ou operacionais cometidos pela Administração Previdenciária que não se enquadrem nas hipóteses de interpretação errônea e má aplicação da lei e não sejam capazes de despertar no beneficiário inequívoca compreensão da irregularidade do pagamento abrem a possibilidade do ressarcimento.

Dessa forma, pode-se afirmar com segurança que no caso de erro material ou operacional, para fins de ressarcimento administrativo do valor pago indevidamente, deve-se averiguar a presença da boa-fé do segurado/beneficiário, concernente na sua aptidão para compreender, de forma inequívoca, a irregularidade do pagamento.

Conforme acórdão proferido no Recurso especial n. 1.381.734, publiado em 23/04/2021, o STJ definiu:

PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. TEMA 979. ARTIGO 1.036 DO CPC/2015. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. ARTIGOS 884 E 885 DO CÓDIGO CIVIL/2002. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA 211 DO STJ. ART. 115, II, DA LEI N. 8.213/1991. DEVOLUÇÃO DE VALORES RECEBIDOS POR FORÇA DE INTERPRETAÇÃO ERRÔNEA E MÁ APLICAÇÃO DA LEI. NÃO DEVOLUÇÃO. ERRO MATERIAL DA ADMINISTRAÇÃO. POSSIBILIDADE DE DEVOLUÇÃO SOMENTE NA HIPÓTESE DE ERRO EM QUE OS ELEMENTOS DO CASO CONCRETO NÃO PERMITAM CONCLUIR PELA INEQUÍVOCA PRESENÇA DA BOA-FÉ OBJETIVA.
1. Da admissão do recurso especial: Não se conhece do recurso especial quanto à alegada ofensa aos artigos 884 e 885 do Código Civil, pois não foram prequestionados. Aplica-se à hipótese o disposto no enunciado da Súmula 211 do STJ. O apelo especial que trata do dissídio também não comporta conhecimento, pois não indicou as circunstâncias que identifiquem ou assemelhem os precedentes colacionados e também por ausência de cotejo analítico e similitude entre as hipóteses apresentadas. Contudo, merece conhecimento o recurso quanto à suposta ofensa ao art. 115, II, da lei n.
8.213/1991.
2. Da limitação da tese proposta: A afetação do recurso em abstrato diz respeito à seguinte tese: Devolução ou não de valores recebidos de boa-fé, a título de benefício previdenciário, por força de interpretação errônea, má aplicação da lei ou erro da Administração da Previdência Social.
3. Irrepetibilidade de valores pagos pelo INSS em razão da errônea interpretação e/ou má aplicação da lei: O beneficiário não pode ser penalizado pela interpretação errônea ou má aplicação da lei previdenciária ao receber valor além do devido. Diz-se desse modo porque também é dever-poder da Administração bem interpretar a legislação que deve por ela ser aplicada no pagamento dos benefícios. Dentro dessa perspectiva, esta Corte Superior evoluiu a sua jurisprudência passando a adotar o entendimento no sentido de que, para a não devolução dos valores recebidos indevidamente pelo beneficiário da Previdência Social, é imprescindível que, além do caráter alimentar da verba e do princípio da irrepetibilidade do benefício, a presença da boa-fé objetiva daquele que recebe parcelas tidas por indevidas pela administração. Essas situações não refletem qualquer condição para que o cidadão comum compreenda de forma inequívoca que recebeu a maior o que não lhe era devido.
4. Repetição de valores pagos pelo INSS em razão de erro material da Administração previdenciária: No erro material, é necessário que se averigue em cada caso se os elementos objetivos levam à conclusão de que houve boa-fé do segurado no recebimento da verba. Vale dizer que em situações em que o homem médio consegue constatar a existência de erro, necessário se faz a devolução dos valores ao erário.
5. Do limite mensal para desconto a ser efetuado no benefício: O artigo 154, § 3º, do Decreto n. 3.048/1999 autoriza a Administração Previdenciária a proceder o desconto daquilo que pagou indevidamente; todavia, a dedução no benefício só deverá ocorrer quando se estiver diante de erro da administração. Nesse caso, caberá à Administração Previdenciária, ao instaurar o devido processo administrativo, observar as peculiaridades de cada caso concreto, com desconto no beneficio no percentual de até 30% (trinta por cento).
6. Tese a ser submetida ao Colegiado: Com relação aos pagamentos indevidos aos segurados decorrentes de erro administrativo (material ou operacional), não embasado em interpretação errônea ou equivocada da lei pela Administração, são repetíveis os valores, sendo legítimo o seu desconto no percentual de até 30% (trinta por cento) do valor do benefício mensal, ressalvada a hipótese em que o segurado, diante do caso concreto, comprova sua boa-fé objetiva, sobretudo com demonstração de que não lhe era possível constatar o pagamento indevido.
7. Modulação dos efeitos: Tem-se de rigor a modulação dos efeitos definidos neste representativo da controvérsia, em respeito à segurança jurídica e considerando o inafastável interesse social que permeia a questão sub examine, e a repercussão do tema que se amolda a centenas de processos sobrestados no Judiciário. Desse modo somente deve atingir os processos que tenham sido distribuídos, na primeira instância, a partir da publicação deste acórdão.
8. No caso concreto: Há previsão expressa quanto ao momento em que deverá ocorrer a cessação do benefício, não havendo margem para ilações quanto à impossibilidade de se estender o benefício para além da maioridade da beneficiária. Tratou-se, em verdade, de simples erro da administração na continuidade do pagamento da pensão, o que resulta na exigibilidade de tais valores, sob forma de ressarcimento ao erário, com descontos nos benefícios, tendo em vista o princípio da indisponibilidade do patrimônio público e em razão da vedação ao princípio do enriquecimento sem causa.
Entretanto, em razão da modulação dos efeitos aqui definidos, deixa-se de efetuar o descontos dos valores recebidos indevidamente pelo segurado.
9. Dispositivo: Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, não provido.
Acórdão sujeito ao regime previsto no artigo 1.036 e seguintes do CPC/2015.
(REsp 1381734/RN, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 10/03/2021, DJe 23/04/2021)

CASO CONCRETO

Adoto os próprios fundamentos da sentença como razões para decidir:

No evento 3, ao apreciar o pedido liminar, foi proferida a seguinte decisão:

"2. A Impetrante formula pedido liminar no seguinte sentido: "que seja concedida a liminar nos termos do Art. 7º, inciso III da Lei nº 12.016/2009, para suspender o ato da Gerência Executiva da Agência da Previdência Social Arapongas/PR que determinou o desconto de 30% (trinta por cento) do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição da impetrante de nº 106.606.295-7 até prolação da sentença".

Segundo consta dos autos, encontra-se em curso perante a 1ª Vara Federal desta Subseção Judiciária a ação nº 5015351-29.2017.4.04.7001, em que se postula o restabelecimento dos benefícios de pensão por morte recebidos pelo irmão da Impetrante, bem como a declaração de inexigibilidade do débito em cobrança, ao argumento de que foi recebido de boa-fé.

Do que se extrai dos documentos juntados aos autos (evento 1/OFÍCIO C4), o INSS, em revisão administrativa, identificou recebimento indevido nos Benefícios nº 138.188.988-0 e 139.270.854-8, no período de 06/04/2012 a 31/03/2017, notificando a Impetrante, na qualidade de curadora do beneficiário dos alegados benefícios, a quitar, solicitar o parcelamento ou indicar outro benefício em manutenção, autorizando-o a realizar a consignação do valor no benefício ativo.

Houve recurso administrativo em relação ao Benefício nº 138.188.988-0, sem êxito porém. Diante disso, o INSS oficiou à Impetrante comunicando o desconto, no percentual de 30% do valor da Renda Mensal de seu Benefício nº 109.606.2975-7.

Pois bem. Do que até agora consta nos autos, tenho como ilegal o desconto efetivado pelo INSS sobre o benefício de aposentadoria da Impetrante, em razão de benefícios tidos como irregulares e recebidos por seu irmão, em relação aos quais consta o seu nome (da Impetrante) apenas na qualidade de curadora.

Do que se depreende do "Relatório Conclusivo da Apuração do item benefício" (evento 1/OFICIO C4, págs. 14/15), a cessação dos benefícios do curatelado decorreu da retificação da DII de 01/01/1984 para 01/11/2002, o que levou à conclusão de que na data do óbito de seu pai, em 17/09/2005, não ostentava a qualidade de dependente no âmbito do RGPS. Confira-se:

Importa destacar que na decisão mencionada restou anotado que não houve detecção de fraude ou má-fé:

De outro lado, importante anotar, também, que esta ação não tem por objeto a análise da alegada irregularidade dos benefícios concedidos ao irmão da Impetrante, seu curatelado. De fato, esta questão, como referi acima, está sendo analisada pela 1ª Vara Federal desta Subseção Judiciária, por meio da ação nº 5015351-29.2017.4.04.7001, em que se postula o restabelecimento dos benefícios de pensão por morte por ele recebidos.

De qualquer forma, o "fumus boni iuris" pode ser ser extraído, no caso presente, a partir da conclusão administrativa acima citada, no sentido de que não teria sido constatados indícios de fraude ou má-fé.

Em que pese esta afirmação tenha sido direcionada, num primeiro plano, ao titular do benefício (irmão da Impetrante), a presunção de boa-fé também se estende à Impetrante, que nem sequer é a destinatária dos valores, na medida em que figura como mera curadora do beneficiário.

Também por essa razão (por não ter sido ela, Impetrante, quem de fato recebeu os valores das pensões por morte), não se mostra razoável que se impute a ela a responsabilidade de responder pela repetição do alegado indébito, especialmente quando ainda está em curso ação que discute a regularidade da concessão dos benefícios cancelados.

Não há fundamento jurídico algum para que o INSS impute a terceiro (no caso, a representante legal do beneficiário) a responsabilidade de débito atribuído ao pensionista, sem que se verifique qualquer participação da impetrante ou do curatelado na suposta irregularidade das concessões das pensões por morte.

Conforme visto acima, não foi o pensionista o causador de eventual prejuízo ao INSS. Conforme o "Relatório Conclusivo da Apuração do item benefício", acima mencionado, as possíveis irregularidades na concessão das pensões decorreram tão somente dos aventados equívocos na fixação da data de início da incapacidade do beneficiário, sem qualquer participação deste. Se houve, de fato, irregularidade no deferimento dos benefícios previdenciários (o que, repita-se, é questão já tratada em processo específico), isso se deu por conta dos critérios técnicos de avaliação da incapacidade.

Em casos tais, a jurisprudência já está sedimentada no sentido da impossibilidade de cobrança de indébitos relacionados a benefícios previdenciários concedidos irregularmente por falha da Administração, em hipóteses nos quais os beneficiários estão de boa fé. Neste sentido:

PROCESSUAL CIVIL. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. VIOLAÇÃO AOS ARTS. 884 E 885 DO CÓDIGO CIVIL E AO ART. 154 DO DECRETO 3.048/1999. FALTA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA 211/STJ. PAGAMENTO INDEVIDO. BOA-FÉ COMPROVADA. ERRO DA ADMINISTRAÇÃO. VERBA DE CARÁTER ALIMENTAR. FUNDAMENTO AUTÔNOMO NÃO IMPUGNADO. DEFICIÊNCIA NA FUNDAMENTAÇÃO. SÚMULAS 283 E 284 DO STF. RESTITUIÇÃO DE VALORES. IMPOSSIBILIDADE. REVISÃO DO CONTEXTO FÁTICO-PROBATÓRIO. SÚMULA 7/STJ. REQUISITOS. ART. 203, V, DA CF/1988. LEI 8.742/93, ART. 20, § 3º. MISERABILIDADE AFERIDA POR OUTROS CRITÉRIOS QUE NÃO A LIMITAÇÃO DA RENDA PER CAPITA FAMILIAR. REEXAME DE PROVAS. SÚMULA 7/STJ. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL. ANÁLISE PREJUDICADA.
1. Cuida-se, na origem, de ação ordinária em que a parte autora requereu o restabelecimento do benefício de amparo social, bem como a declaração de inexistência de débito perante a Previdência Social.
A sentença julgou parcialmente procedente o pedido apenas para declarar a inexistência de débito do autor perante o INSS.
(...) 3. Nas razões do Recurso Especial, o INSS sustenta apenas a necessidade de restituição do benefício previdenciário indevidamente pago, sendo esta a interpretação dos arts. 115, II, parágrafo único, da Lei 8.213/1991 e 154, II, § 3°, do Decreto 3.048/1999. Todavia, no enfrentamento da matéria, o Tribunal de origem consignou que "o benefício foi requerido e recebido de boa-fé"e que "não pode agora a autarquia exigir a repetição dos respectivos valores, notadamente por terem caráter alimentar" (fl. 424, e-STJ).
4. Sendo assim, como o fundamento não foi atacado pela parte recorrente e é apto, por si só, para manter o decisum combatido, permite-se aplicar na espécie, por analogia, os óbices das Súmulas 284 e 283 do STF, ante a deficiência na motivação e a ausência de impugnação de fundamento autônomo.
5. Ademais, a jurisprudência do STJ se firmou no sentido de que, em razão do caráter alimentar dos proventos aliado à percepção de boa-fé, é impossível a devolução de valores recebidos a título de benefício previdenciário por razão de erro da Administração, aplicando-se ao caso o princípio da irrepetibilidade dos alimentos.
6. Tendo o Tribunal de origem reconhecido a boa-fé em relação ao recebimento do benefício objeto da insurgência, descabe ao STJ iniciar juízo valorativo a fim de alterar tal entendimento, ante o óbice da Súmula 7/STJ.
(...)
(REsp 1666580/PE, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 27/06/2017, DJe 30/06/2017)

Assim, sob qualquer perspectiva, delineado está o “fumus boni iuris”. O “periculum in mora”, por sua vez, reside na iminência de ser descontado do valor mensal de sua atual aposentadoria débito originário de benefício previdenciário recebido por terceiro, cuja exigibilidade ainda encontra-se questionada judicialmente.

3. Ante o exposto, defiro o pedido liminar para determinar que a Autoridade Impetrada se abstenha de realizar descontos mensais no benefício de aposentadoria por idade da Impetrante (NB 42/109.606.295-7), em razão do débito apurado nos benefícios de pensão por morte objetos dos autos (NB 21/138.188.988-0 e NB 21/139.270.854-8) até ulterior deliberação deste Juízo.

3.1. Intime-se a autoridade impetrada, a APS/ADJ e a Agência responsável pela administração do benefício previdenciário, com urgência, para o cumprimento desta liminar."

Pois bem. Após o regular processamento deste mandado de segurança, não vieram aos autos elementos aptos a modificar o entendimento que pautou a decisão liminar. Aliás, como foi relatado, sequer foram prestadas informações e o INSS também não se insurgiu contra a decisão do evento 3.

Quanto ao pedido de restituição dos valores descontados, a pretensão pode ser acolhida apenas em relação aos descontos efetivados após o ajuizamento do mandado de segurança (19/11/2018), consoante a Súmula 271 do Supremo Tribunal Federal, que tem o seguinte teor:

Súmula 271 - Concessão de mandado de segurança não produz efeitos patrimoniais em relação a período pretérito, os quais devem ser reclamados administrativamente ou pela via judicial própria.

De acordo com o Histórico de Créditos apresentado no evento 14 (HISCRE2), o pagamento da competência 10/2018 (com o respectivo desconto) ocorreu em 08/11/2018 e o pagamento da competência 11/2018 (com o desconto) ocorreu em 07/12/2018.

Com efeito, procedem em parte os pedidos formulados na inicial para que a Autoridade Impetrada se abstenha de realizar descontos mensais no benefício de aposentadoria por idade da Impetrante (NB 42/109.606.295-7), em razão do débito apurado nos benefícios de pensão por morte objetos dos autos (NB 21/138.188.988-0 e NB 21/139.270.854-8), bem como para que seja declarado o direito à restituição do valor descontado da competência 11/2018 (R$543,58).

CONCLUSÃO

Remessa necessária improvida, nos termos da fundamentação.

DISPOSITIVO

Ante o exposto, voto no sentido de negar provimento à remessa necessária.



Documento eletrônico assinado por LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002754474v6 e do código CRC 1ccbacc3.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
Data e Hora: 17/9/2021, às 12:54:17


5001944-26.2018.4.04.7031
40002754474.V6


Conferência de autenticidade emitida em 24/09/2021 20:01:28.

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

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Remessa Necessária Cível Nº 5001944-26.2018.4.04.7031/PR

RELATOR: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO

PARTE AUTORA: FRANCISCA CAMACHO SANCHES (IMPETRANTE)

PARTE RÉ: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (INTERESSADO)

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. REVISÃO ADMINISTRATIVA DE BENEFÍCIO. CURADOR DO BENEFICIÁRIO. má-fé não demonstrada. descontos indevidos.

1. A possibilidade do INSS rever e anular os atos de concessão de benefícios, quando eivados de vícios que o tornem ilegais (buscando ou não a devolução de valores percebidos indevidamente) é consagrada nas Súmulas 346 e 473 do Supremo Tribunal Federal, bem como tem previsão legal expressa, atualmente contida nos artigos 53 da Lei nº 9.784/99 e 103-A, da Lei nº 8.213/91, introduzido pela Lei nº 10.839/04.

2. A simples má aplicação de norma jurídica, a interpretação equivocada e o erro da administração, por parte da Autarquia, não autoriza, por si só, a devolução de valores recebidos indevidamente a título de benefício previdenciário, já que, em tese, foram recebidos de boa-fé pelos segurados/beneficiários.

3. Tendo em vista que não ficou demonstrada a má-fé do curador na obtenção do benefício, são indevidos os descontos realizados em sua aposentadoria por tempo de contribuição.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar do Paraná do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à remessa necessária, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Curitiba, 14 de setembro de 2021.



Documento eletrônico assinado por LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002754475v8 e do código CRC 6725427e.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
Data e Hora: 17/9/2021, às 12:54:17


5001944-26.2018.4.04.7031
40002754475 .V8


Conferência de autenticidade emitida em 24/09/2021 20:01:28.

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 06/09/2021 A 14/09/2021

Remessa Necessária Cível Nº 5001944-26.2018.4.04.7031/PR

RELATOR: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO

PRESIDENTE: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI

PROCURADOR(A): MAURICIO GOTARDO GERUM

PARTE AUTORA: FRANCISCA CAMACHO SANCHES (IMPETRANTE)

ADVOGADO: MARCIA CRISTINA DOS SANTOS (OAB PR057531)

ADVOGADO: PEDRO HENRIQUE WALDRICH NICASTRO (OAB PR057234)

PARTE RÉ: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (INTERESSADO)

MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (MPF)

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 06/09/2021, às 00:00, a 14/09/2021, às 16:00, na sequência 513, disponibilizada no DE de 26/08/2021.

Certifico que a Turma Regional suplementar do Paraná, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PARANÁ DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À REMESSA NECESSÁRIA.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO

Votante: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO

Votante: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI

Votante: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA

SUZANA ROESSING

Secretária



Conferência de autenticidade emitida em 24/09/2021 20:01:28.

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