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PREVIDENCIÁRIO. MANUTENÇÃO DO BENEFÍCIO DE PENSÃO POR MORTE APÓS SER CONTRAÍDO NOVO CASAMENTO. PROVA DE MÁ-FÉ NA CONDUTA DA PENSIONISTA NÃO EVIDENCIADA....

Data da publicação: 01/07/2020, 00:01:52

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. MANUTENÇÃO DO BENEFÍCIO DE PENSÃO POR MORTE APÓS SER CONTRAÍDO NOVO CASAMENTO. PROVA DE MÁ-FÉ NA CONDUTA DA PENSIONISTA NÃO EVIDENCIADA. IRREPETIBILIDADE DOS VALORES. 1. A boa-fé é um princípio geral de Direito, segundo o qual todos devem se comportar de acordo com um padrão ético de confiança e lealdade. Gera deveres secundários de conduta, que impõe às partes comportamentos necessários. Se o agente sabe que está descumprindo obrigação jurídica, aí está a má-fé. Há, portanto, consciência de que o agente está descumprindo dever advindo de sua posição de beneficiário do sistema previdenciário do qual faz parte. Ou seja, a má-fé está justamente neste descumprimento que ele sabe ser indevido. 2. Exsurge dos autos que assim que foi notificada pelo INSS sobre o cancelamento do benefício, a segurada buscou prestação jurisdicional no sentido de que fosse dirimida a questão, pois no seu entender, somente com forte melhoria da situação financeira-econômica advinda de novas núpcias é que poderia deixar de receber a proteção previdenciária. 3. De outro lado, o fato de não haver comprovação de melhoria da situação econômica com as segundas núpcias, diga-se posteriormente rompida por divórcio consensual, não se mostra hábil a afirmar que a pensionista comportou-se de forma atentatória aos padrões de ética e com a propalada ma-fé. 4. Assim, não havendo nos autos elementos capazes de evidenciar a má-fé da segurada ao receber o benefício, não é possível presumi-la. Em se tratando de verba de natureza alimentar, recebida de boa-fé, não há falar em restituição dos valores recebidos. (TRF4, AC 5008573-21.2014.4.04.7204, SEXTA TURMA, Relatora SALISE MONTEIRO SANCHOTENE, juntado aos autos em 27/10/2016)


APELAÇÃO CÍVEL Nº 5008573-21.2014.4.04.7204/SC
RELATOR
:
SALISE MONTEIRO SANCHOTENE
APELANTE
:
INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO
:
ARLETE OLIVEIRA DE SOUZA
ADVOGADO
:
CLAUDIONOR DA SILVA COLARES
:
JOSÉ FERNANDO BORGES DA SILVA
:
TATIANA BORGES DA SILVA
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. MANUTENÇÃO DO BENEFÍCIO DE PENSÃO POR MORTE APÓS SER CONTRAÍDO NOVO CASAMENTO. PROVA DE MÁ-FÉ NA CONDUTA DA PENSIONISTA NÃO EVIDENCIADA. IRREPETIBILIDADE DOS VALORES.
1. A boa-fé é um princípio geral de Direito, segundo o qual todos devem se comportar de acordo com um padrão ético de confiança e lealdade. Gera deveres secundários de conduta, que impõe às partes comportamentos necessários. Se o agente sabe que está descumprindo obrigação jurídica, aí está a má-fé. Há, portanto, consciência de que o agente está descumprindo dever advindo de sua posição de beneficiário do sistema previdenciário do qual faz parte. Ou seja, a má-fé está justamente neste descumprimento que ele sabe ser indevido. 2. Exsurge dos autos que assim que foi notificada pelo INSS sobre o cancelamento do benefício, a segurada buscou prestação jurisdicional no sentido de que fosse dirimida a questão, pois no seu entender, somente com forte melhoria da situação financeira-econômica advinda de novas núpcias é que poderia deixar de receber a proteção previdenciária. 3. De outro lado, o fato de não haver comprovação de melhoria da situação econômica com as segundas núpcias, diga-se posteriormente rompida por divórcio consensual, não se mostra hábil a afirmar que a pensionista comportou-se de forma atentatória aos padrões de ética e com a propalada ma-fé. 4. Assim, não havendo nos autos elementos capazes de evidenciar a má-fé da segurada ao receber o benefício, não é possível presumi-la. Em se tratando de verba de natureza alimentar, recebida de boa-fé, não há falar em restituição dos valores recebidos.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Sexta Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que integram o presente julgado.
Porto Alegre/RS, 26 de outubro de 2016.
Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE
Relatora


Documento eletrônico assinado por Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8585332v8 e, se solicitado, do código CRC FCF25FF4.
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Data e Hora: 27/10/2016 09:51




APELAÇÃO CÍVEL Nº 5008573-21.2014.4.04.7204/SC
RELATOR
:
SALISE MONTEIRO SANCHOTENE
APELANTE
:
INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO
:
ARLETE OLIVEIRA DE SOUZA
ADVOGADO
:
CLAUDIONOR DA SILVA COLARES
:
JOSÉ FERNANDO BORGES DA SILVA
:
TATIANA BORGES DA SILVA
RELATÓRIO
Trata-se de apelação interposta pelo INSS em face de sentença (evento 16 - SENT1 do eProc originário) que julgou improcedente o pedido de verem ressarcidos valores pagos a título de pensão por morte após ter sido contraído novo matrimônio, no período de fevereiro de 2003 a abril de 2008 (NB nº 21/079.410.437-3).
Nas razões (evento 21) sustenta que o INSS deflagrou processo administrativo de apuração de irregularidades, tendo notificado a ré para apresentar documentos alusivos ao novo matrimônio. Em 13.03.2008, esta confessou ter casado novamente em 1988, mas que teria se separado poucos anos depois (fl. 25 do Processo Administrativo em anexo). No dia 19.03.2008, juntou certidão de casamento referente o matrimônio com Antonio Alves da Silveira, ocorrido em 16.01.1988, com averbação de separação judicial, convertida em divórcio, datada de 19.03.2002 (fl. 27/27-verso do PA anexo aos autos). Diante da confirmação do novo matrimônio e da irregularidade da manutenção da pensão por morte, a autarquia notificou-a para apresentar defesa administrativa, no prazo de dez dias, a contar de 24.03.2008 (fl. 30 do PA). Idêntica notificação foi recebida pela ex-pensionista em 11.06.2008 (fl. 33 do PA). Não houve apresentação de defesa. Alude que foi observada a regra do art. 69 da LB no tocante à possibilidade de revisão da concessão irregular de qualquer benefício previdenciário. Registra que, quando há erro da administração, concebe-se apenas que a devolução seja feita de forma parcelada. Refere que no ano de 2008, a recorrida moveu ação judicial (2008.72.54.008112-1) postulando o restabelecimento da pensão por morte. O pedido foi julgado improcedente, com a sentença confirmada pela 2ª Turma Recursal de Santa Catarina, tendo o feito transitado em julgado em 01-07-2011. Diz que a irregularidade na manutenção do benefício era patente. Menciona que o disposto no art. 115 da Lei 8.213/91 e o art. 884 do Código Civil autorizam a busca pela restituição de valores recebidos indevidamente pelo segurado, quando este atua com fraude, dolo ou má-fé e com enriquecimento sem causa. Diz que, no caso, ao contrário da sentença, a ilicitude restou configurada, tendo sido comprovado que, após o novo matrimônio (16.01.1988), a ré não poderia continuar a receber a pensão por morte (21/076.410.437-3). O prejuízo, neste caso, é manifesto, uma vez que, em função da má-fé da demandada, que não comunicou ao INSS o novo casamento, os gastos foram indevidamente suportados pelo fundo de previdência social do regime geral, fora das premissas que orientam o equilíbrio financeiro e atuarial (artigo 201 da CF). Pede a reforma da sentença para condenar a demandada a ressarcir os valores recebidos indevidamente, condenando-a ainda ao pagamento do ônus da sucumbência.
Não houve apresentação de contrarrazões.
O feito eletrônico alçou a esta Corte, ocasião em que foi autuado e distribuído.
É o relatório.
VOTO
É cediço que a Seguridade Social é um amplo sistema de proteção social inserido na Constituição Federal. Por esta razão, a proteção previdenciária oriunda de um sistema contributivo em que todos devem colaborar merece uma atenção destacada, de modo que os recursos financeiros sejam distribuídos com justiça e igualdade.
Assim, a Previdência Social pode buscar a devolução de valores percebidos indevidamente, em razão de três fundamentos jurídicos: a) poder/dever de auto-tutela da Administração Pública; b) supremacia do interesse público sobre o interesse privado e; c) vedação do enriquecimento sem causa do segurado.
A autorização legal para tal desiderato está estampada nos artigos 115 da Lei 8.213/91 e 154 do Decreto 3.048/99, in verbis:
Lei nº 8.213/91
Art. 115. Podem ser descontados dos benefícios:
I - contribuições devidas pelo segurado à Previdência Social;
II - pagamento de benefício além do devido; (...)
§ 1o Na hipótese do inciso II, o desconto será feito em parcelas, conforme dispuser o regulamento, salvo má-fé. (Incluído pela Lei nº 10.820, de 17.12.2003)
§ 2o Na hipótese dos incisos II e VI, haverá prevalência do desconto do inciso II. (Incluído pela Lei nº 10.820, de 17.12.2003)
Decreto nº 3.048/99
Art. 154. O Instituto Nacional do Seguro Social pode descontar da renda mensal do benefício:
I - contribuições devidas pelo segurado à previdência social;
II - pagamentos de benefícios além do devido, observado o disposto nos §§ 2º ao 5º;
§ 2º A restituição de importância recebida indevidamente por beneficiário da previdência social, nos casos comprovados de dolo, fraude ou má-fé, deverá ser feita de uma só vez, atualizada nos moldes do art. 175, independentemente de outras penalidades legais.
§ 2º A restituição de importância recebida indevidamente por beneficiário da previdência social, nos casos comprovados de dolo, fraude ou má-fé, deverá ser atualizada nos moldes do art. 175, e feita de uma só vez ou mediante acordo de parcelamento na forma do art. 244, independentemente de outras penalidades legais. (Redação dada pelo Decreto nº 5.699, de 2006)
§ 3º Caso o débito seja originário de erro da previdência social, o segurado, usufruindo de benefício regularmente concedido, poderá devolver o valor de forma parcelada, atualizado nos moldes do art. 175, devendo cada parcela corresponder, no máximo, a trinta por cento do valor do benefício em manutenção, e ser descontado em número de meses necessários à liquidação do débito.
§ 4º Se o débito for originário de erro da previdência social e o segurado não usufruir de benefício, o valor deverá ser devolvido, com a correção de que trata o parágrafo anterior, da seguinte forma:
Logo, para a manutenção do equilíbrio financeiro do regime geral, tão caro à sociedade brasileira, o princípio da supremacia do interesse público deve ser invocado pela Autarquia Previdenciária para fazer retornar ao sistema da seguridade social valores que foram indevidamente pagos.
De outro lado, não se desconhece a remansosa jurisprudência pátria consolidada no sentido de que, havendo por parte da Autarquia má aplicação de norma jurídica, interpretação equivocada e erro da administração, não se autoriza, por si só, a devolução de valores recebidos indevidamente a título de benefício previdenciário, já que, em tese, foram recebidos de boa-fé pelos segurados. Afora isso, tais valores são considerados de natureza alimentar, sendo, portanto, irrepetíveis.
Nesse sentido, os seguintes julgados do STJ:
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 1973. APLICABILIDADE. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. BENEFÍCIO RECEBIDO INDEVIDAMENTE POR ERRO DA ADMINISTRAÇÃO. BOA-FÉ. VERBA DE CARÁTER ALIMENTAR. RESTITUIÇÃO DE VALORES. IMPOSSIBILIDADE. I - Consoante o decidido pelo Plenário desta Corte na sessão realizada em 09.03.2016, o regime recursal será determinado pela data da publicação do provimento jurisdicional impugnado. Assim sendo, in casu, aplica-se o Código de Processo Civil de 1973. II - Por força do princípio da irrepetibilidade dos alimentos, e, sobretudo, em razão da diretriz da boa-fé objetiva do segurado, não cabe a devolução de valores recebidos, a título de benefício previdenciário, por força de interpretação equivocada, má aplicação da lei ou erro da Administração. III - Recurso Especial não provido. (REsp 1550569/SC, Rel. Ministra REGINA HELENA COSTA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 03/05/2016, DJe 18/05/2016)
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. PAGAMENTO INDEVIDO. BOA-FÉ. ERRO DA ADMINISTRAÇÃO. VERBA DE CARÁTER ALIMENTAR. RESTITUIÇÃO DE VALORES. IMPOSSIBILIDADE. 1. Conforme a jurisprudência do STJ é incabível a devolução de valores percebidos por pensionista de boa-fé por força de interpretação errônea, má aplicação da lei ou erro da Administração. 2. É descabido ao caso dos autos o entendimento fixado no Recurso Especial 1.401.560/MT, julgado sob o rito do art. 543-C do CPC, pois não se discute na espécie a restituição de valores recebidos em virtude de antecipação de tutela posteriormente revogada. 3. Recurso Especial não provido. (REsp 1553521/CE, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 03/11/2015, DJe 02/02/2016)
No entanto, quando os benefícios previdenciários são obtidos, comprovadamente, mediante fraude, dolo e má-fé, há previsão legal autorizando a administração a adotar medidas administrativas para fazer cessar a ilicitude, bem como a buscar a via judicial para obter a restituição da verba indevidamente paga.
Nessa direção, deve-se mencionar os seguintes arestos:
PREVIDENCIÁRIO. PAGAMENTOS FEITOS INDEVIDAMENTE. AUSÊNCIA DE BOA-FÉ. DEVOLUÇÃO. POSSIBILIDADE. A despeito da manifesta natureza alimentar da prestação, evidenciada a má-fé, impõe-se a condenação da requerida na devolução dos valores recebidos indevidamente. (TRF4 5006912-07.2014.404.7204, QUINTA TURMA, Relator ROGERIO FAVRETO, juntado aos autos em 15/06/2016)
PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. VALORES RECEBIDOS INDEVIDAMENTE. OCORRÊNCIA DE FRAUDE. RESTITUIÇÃO DA QUANTIA APÓS PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO. POSSIBILIDADE. DESCONTO DOS VALORES. REGULARIDADE. I - (...) V - Entendendo-se pela caracterização da má-fé do requerente no recebimento dos valores, não há como se obstar a conduta da Administração de procurar reaver os valores pagos indevidamente. VI - Apelação improvida. Extinção do processo com resolução do mérito. (TRF5, AC 000066558.2012.405.8200, 2ª Turma, Rel. Des. Federal Ivan Lira de Carvalho, publicado no DJE de 30-06-2016).
O INSS em sua pretensão afirma estar comprovada a má-fé da segurada, uma vez que, durante extenso interregno temporal, recebeu pensão por morte de seu falecido ex-cônjuge, mesmo tendo contraído novo matrimônio.
Consoante constatado na instrução processual, após receber denúncia anônima, o INSS instaurou procedimento administrativo para verificação da regularidade do pagamento da pensão à recorrida. Na data de 13-08-2008, firmando declaração (fl. 25 do evento 1 -PROCADM2 do eProc originário) perante a Autarquia, Arlete Oliveira Souza confirmou que havia se casado após 10 anos após o óbito do seu 1º marido. A certidão do segundo casamento ( fl. 27 do mesmo feito administrativo) dá conta que, efetivamente, no dia 16.01.1988, Arlete contraiu novas núpcias. O novo matrimônio foi rompido de forma consensual em 16.11.1998 (averbação - fl. 28 do evento 1 - PROCADM2).
O benefício previdenciário estava sendo recebido pela recorrida desde o dia 26.01.1983. A pensão foi suspensa em 26-04-2008.
Todavia, examinando os elementos probantes do feito, tenho que a recorrida não obrou com comprovada má-fé, como alude o INSS.
No ponto, mostra-se correta a sentença, cujos fundamentos adoto, também, como razões de decidir (evento 16 - SENT1):
2. Da pensão por morte
Cumpre sinalar, inicialmente, que não existe qualquer controvérsia quanto à inexistência do direito da ré à concessão/restabelecimento do benefício referido na exordial.
De fato, tal matéria foi analisada conclusivamente nos autos nº 2008.72.54.008112-1, nos quais o pedido para restabelecimento da pensão por morte foi julgado improcedente. Ainda, o decisum de primeiro grau foi mantido pela Turma Recursal, cujo acórdão transitou em julgado em 06/2011.
Por conseguinte, partindo da premissa de que o benefício realmente não era devido à ré, resta perquirir se os valores percebidos a tal título devem ser restituídos à autarquia.
3. Do débito
O INSS busca a devolução dos valores compreendidos entre 05/2003 e 04/2008, auferidos pela parte ré em decorrência da pensão por morte nº. 21/076.410.437-3. Como relatado, a autarquia sustenta que a ré auferiu o benefício em má-fé após contrair novo matrimônio em 1988, muito embora o dever de devolução, no seu entender, deva existir mesmo nos casos de boa-fé.
O INSS assenta sua pretensão na Lei nº 8.213/91, nos dispositivos seguintes:
Art. 115. Podem ser descontados dos benefícios:
I - contribuições devidas pelo segurado à Previdência Social;
II - pagamento de benefício além do devido;
III - Imposto de Renda retido na fonte;
IV - pensão de alimentos decretada em sentença judicial;
V - mensalidades de associações e demais entidades de aposentados legalmente reconhecidas, desde que autorizadas por seus filiados.
Demais disso, no seu entender, o dever de restituição encontraria assento nos artigos 876 e 884 do Código Civil.
(...)
Todavia, no caso concreto, não se pode olvidar a irrepetibilidade da verba previdenciária percebida em boa-fé, pois, segundo jurisprudência predominante no TRF4, a devolução de valores dessa natureza só é possível nas hipóteses de comprovada má-fé do beneficiário.(...)
Impende ressaltar, ainda, que o ônus da prova quanto à existência de má-fé é imponível ao próprio INSS, conforme a abalizada doutrina dos autores Daniel Machado da Rocha e José Paulo Baltazar Junior, da qual se extrai:
Em caso de má-fé, o desconto é integral (RPS, art. 154, § 2º), ainda que em decorrência disto o beneficiário nada receba, por meses a fio, até que o total seja descontado. Evidentemente, o beneficiário poderá questionar judicialmente o entendimento administrativo no sentido da existência de má-fé, sendo do Instituto o ônus de prová-la, uma vez que a má-fé não se presume. (Comentários à Lei de Benefícios da Previdência Social. 5ª edição. p. 359).
O TRF4 também atribui ao INSS o ônus de provar a existência de fraude ou má-fé por parte do beneficiário, como segue:
ADMINISTRATIVO. SERVIDOR. VALORES PAGOS INDEVIDAMENTE. SUPRESSÃO DA PARCELA. CABIMENTO. DESCONTO NOS VENCIMENTOS. IMPOSSIBILIDADE. PRESUNÇÃO DE BOA-FÉ. ESGOTAMENTO DA VIA ADMINISTRATIVA. Não se exige o esgotamento do processo na via administrativa para que o interessado ingresse com a ação correspondente. No seu sistema de autocontrole, a administração pública tem o poder-dever de suprimir o pagamento de parcela cujo pagamento foi considerado ilegal. Hipótese em que se constata a observância dos princípios da segurança jurídica e boa-fé, bem como do devido processo legal na atuação da Administração, que culminou com a redução nos proventos de aposentadoria. O recebimento da parcela com a alegada boa-fé, por si só, não obsta a supressão de parcela ilegal pela Administração. Não é cabível a repetição dos valores ao Erário quando o pagamento se tiver dado por erro da Administração Pública e o servidor estiver de boa-fé, máxime em se tratando de verba de natureza alimentar. É princípio geral do direito que a boa-fé se presume e a má-fé depende de prova, sendo que os elementos de convicção constantes dos autos não autorizam um juízo de certeza sobre a má-fé do autor, indispensável à determinação de restituição dos valores percebidos. (TRF4, AC 5000865-55.2012.404.7214, Quarta Turma, Relator p/ Acórdão Candido Alfredo Silva Leal Junior, D.E. 19/12/2012) (grifei) (...)
Partindo dessa premissa, portanto, observo que tanto o processo administrativo quanto estes autos não contêm qualquer elemento a evidenciar a existência de má-fé por parte da ré. Em verdade, há de se concluir exatamente o contrário, pois não é razoável exigir que ela possuise conhecimento sobre a impossibilidade de manutenção da pensão após contrair novas núpcias. Assim concluo, notadamente, por se tratar de questão relativamente complexa do direito intertemporal previdenciário, tanto que tal restrição sequer foi mantida pela Lei nº. 8.213/91.
Destarte, diante da ausência de prova de má-fé da ré, é forçoso concluir que os valores exigidos pela autarquia constituem verbas irrepetíveis.
Com efeito. A boa-fé é um princípio geral de Direito, segundo o qual todos devem se comportar de acordo com um padrão ético de confiança e lealdade. Gera deveres secundários de conduta, que impõe às partes comportamentos necessários. Se o agente sabe que está descumprindo obrigação jurídica, aí está configurada a má-fé. Há, portanto, consciência de que o indivíduo está descumprindo dever advindo de sua posição de beneficiário do sistema previdenciário, do qual faz parte. Ou seja, a má-fé está justamente neste descumprimento do que o indivíduo sabe ser indevido.
No caso, constata-se que o fato de ter a pensionista contraído novo casamento, não constituiu, por si só, causa para a decretação automática da devolução dos valores recbidos a título de benefício previdenciário, mormente porque, ao que parece, a recorrida desconhecia a impossibilidade de manutenção do recebimento da aludida pensão por morte, quando se contrai novo matrimônio.
Exsurge dos autos que, tão logo foi notificada pelo INSS sobre o cancelamento do benefício, Arlete buscou prestação jurisdicional no sentido de que fosse dirimida a questão, pois no seu entender, somente com forte melhoria da situação econômico-financeira advinda de novas núpcias é que poderia deixar de receber a proteção previdenciária.
Em verdade, o INSS não conseguiu amealhar provas consistentes e robustas sobre a intenção maliciosa da conduta da recorrida, de modo que se mostra inviável a cobrança dos valores dispensados no período de 02/2003 a 04/2008, a título de pensão por morte do primeiro ex-marido falecido.
A propósito, o art. 77 da Lei 8.213/91 dispõe que o novo casamento não constitui causa automática da extinção do direito à pensão. A jurisprudência pátria consolidou tal compreensão. Veja-se:
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. NOVO MATRIMÔNIO. PERMANÊNCIA DO BENEFÍCIO. SITUAÇÃO ECONÔMICO-FINANCEIRA. PROVA. ÔNUS. 1. Contraído novo casamento, a pensão por morte do primeiro cônjuge só pode ser mantida caso haja comprovação de não ter ocorrido alteração na situação econômico-financeira do beneficiário. 2. Sendo a presunção de dependência decorrente da relação marital, com o novo casamento, é ônus do cônjuge sobrevivente demonstrar a necessidade de manutenção da pensão. Não comprovada, deve ser cancelado o benefício. 3. Negado provimento à apelação. (AC 200104010799064, LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO, TRF4 - SEXTA TURMA, DJ 28/08/2002 PÁGINA: 818.)
PREVIDENCIÁRIO. ADMINISTRATIVO. PENSÃO POR MORTE. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA PRESUMIDA. NOVO MATRIMÔNIO. AUSÊNCIA DE MELHORIA DA SITUAÇÃO ECONÔMICO-FINANCEIRA DA VIÚVA. SENTENÇA MANTIDA. 1. Em caso de pensão por morte concedida sob a égide do Decreto 83.080/79, é de se observar que a extinção da parcela individual do benefício em razão do novo matrimônio da titular requer a comprovação de que esse fato tenha ensejado a melhoria de sua condição econômica. Precedente. 2. As testemunhas foram uniformes ao informarem a ausência de melhora das condições da situação econômica-financeira da parte autora, consoante se depreende dos depoimentos de fls. 38 e 39. 3. No que diz respeito aos critérios de pagamento de juros moratórios e de correção monetária, deve ser observado o Manual de Cálculos da Justiça Federal, aprovado pela Resolução/CJF nº 134, de 21.12.2010, e alterado pela Resolução/CJF nº 267, de 02.12.2013, o qual já prevê a aplicação do art. 1º-F da Lei n. 9.494/97, com redação dada pela Lei n. 11.960/2009, em conformidade com a declaração parcial de inconstitucionalidade pelo Supremo Tribunal Federal na ADI 4.357/DF. 4. Apelação não provida. Remessa oficial parcialmente provida. (TRF1, 1ª Turma, AC 2006.38.14.000853-6, Rel. Juiz Federal Rafael Paulo Soares Pinto, publicado no e-DJF1 de 14-01-2016)
No caso, extrai-se dos elementos jungidos aos autos que Arlete acreditava fazer jus ao benefício.
O fato de não haver comprovação de melhoria da situação econômica com as segundas núpcias, diga-se, posteriormente rompida por divórcio consensual, não se mostra hábil a afirmar que a pensionista comportou-se de forma atentatória aos padrões de ética e com a propalada ma-fé.
Assim, não havendo nos autos elementos capazes de evidenciar a má-fé da segurada ao receber o benefício, não é possível presumi-la. Em se tratando de verba de natureza alimentar, recebida de boa-fé, não há falar em restituição dos valores recebidos.
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação.
Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE
Relatora


Documento eletrônico assinado por Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8585331v33 e, se solicitado, do código CRC 3CB21026.
Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): Salise Monteiro Sanchotene
Data e Hora: 27/10/2016 09:51




EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 26/10/2016
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5008573-21.2014.4.04.7204/SC
ORIGEM: SC 50085732120144047204
RELATOR
:
Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE
PRESIDENTE
:
Desembargadora Federal Vânia Hack de Almeida
PROCURADOR
:
Procuradora Regional da República Adriana Zawada Melo
APELANTE
:
INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO
:
ARLETE OLIVEIRA DE SOUZA
ADVOGADO
:
CLAUDIONOR DA SILVA COLARES
:
JOSÉ FERNANDO BORGES DA SILVA
:
TATIANA BORGES DA SILVA
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 26/10/2016, na seqüência 520, disponibilizada no DE de 10/10/2016, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.
RELATOR ACÓRDÃO
:
Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE
VOTANTE(S)
:
Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE
:
Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
:
Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
Gilberto Flores do Nascimento
Diretor de Secretaria


Documento eletrônico assinado por Gilberto Flores do Nascimento, Diretor de Secretaria, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8679743v1 e, se solicitado, do código CRC D4A1905E.
Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): Gilberto Flores do Nascimento
Data e Hora: 27/10/2016 08:33




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