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PREVIDENCIÁRIO. NÃO CONHECIMENTO DA REMESSA NECESSÁRIA. NULIDADE DA SENTENÇA. EXERCÍCIO DE ATIVIDADE ESPECIAL. EXPOSIÇÃO A AGENTES QUÍMICOS. PRODUTOS DE LI...

Data da publicação: 11/05/2022, 07:34:19

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. NÃO CONHECIMENTO DA REMESSA NECESSÁRIA. NULIDADE DA SENTENÇA. EXERCÍCIO DE ATIVIDADE ESPECIAL. EXPOSIÇÃO A AGENTES QUÍMICOS. PRODUTOS DE LIMPEZA. HIDROCARBONETOS. CORREÇÃO MONETÁRIA. APLICAÇÃO DO INPC. ÍNDICES NEGATIVOS DE INFLAÇÃO. MULTA PELA OPOSIÇÃO DE EMBARGOS DECLARATÓRIOS. 1. A remessa necessária não deve ser admitida quando se puder constatar que, a despeito da iliquidez da sentença, o proveito econômico obtido na causa será inferior a 1.000 (mil) salários (art. 496, § 3º, I, CPC) - situação em que se enquadram, invariavelmente, as ações destinadas à concessão ou ao restabelecimento de benefício previdenciário pelo Regime Geral de Previdência Social. 2. É nula, por falta de fundamentação, a sentença que não enfrenta matéria deduzida na contestação capaz de, em tese, afetar o direito da parte autora. 3. Incorre em omissão a sentença que não analisa o ponto referente à aplicação dos índices negativos de inflação, embora não suscitado na contestação, já que os consectários legais podem ser examinados de ofício. 4. A utilização de produtos de limpeza como detergente, desinfetante e água sanitária, em ambiente diverso do hospitalar ou de sanitários públicos, com grande circulação diária de pessoas, não permite o enquadramento da atividade como especial, devido à reduzida concentração dos agentes químicos. 5. O contato com hidrocarbonetos derivados do petróleo deve ser comprovado com base nas atividades desempenhadas pelo segurado, descritas no perfil profissiográfico previdenciário, principalmente no caso em que a exposição a esses agentes químicos não é inerente ao cargo. 6. Nas ações previdenciárias, após 30 de junho de 2009, aplica-se o INPC como índice de correção monetária (Tema 905 do Superior Tribunal de Justiça). 7. Aplicam-se os índices de deflação na correção monetária de crédito oriundo de título executivo judicial, preservado o seu valor nominal (Tema 678 do Superior Tribunal de Justiça). 8. Havendo omissão na sentença, é injustificada a condenação ao pagamento de multa pela oposição de embargos declaratórios. (TRF4 5032180-78.2018.4.04.9999, QUINTA TURMA, Relator OSNI CARDOSO FILHO, juntado aos autos em 04/05/2022)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação/Remessa Necessária Nº 5032180-78.2018.4.04.9999/RS

RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

APELADO: GILBERTO CARDOSO

ADVOGADO: Caroline Bozzetto (OAB RS075567)

RELATÓRIO

A sentença proferida na ação ajuizada por Gilberto Cardoso contra o INSS julgou o pedido parcialmente procedente, para condenar o réu a: a) reconhecer o tempo de atividade especial nos períodos de 01/04/1985 a 31/08/1988, de 26/10/1988 a 05/03/1997 e de 01/08/2000 a 22/12/2011 e proceder à conversão do tempo especial em comum pelo fator 1,4; b) conceder ao autor o benefício de aposentadoria integral por tempo contribuição, com proventos integrais, conforme o cálculo que melhor aproveitar ao autor em razão de seu direito adquirido; c) pagar as prestações vencidas desde a data do requerimento administrativo (22/12/2011), com atualização monetária pelo IPCA a contar do vencimento de cada parcela, bem como juros moratórios calculados com base no índice oficial de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança, a partir da citação. As partes foram condenadas, na proporção de 80% para o INSS e de 20% para o autor, ao pagamento das custas processuais, despesas e emolumentos e honorários advocatícios, contudo foi declarada a isenção do INSS em relação às custas processuais. Os honorários foram fixados em 10% do valor das parcelas vencidas até a data da sentença.

Os embargos de declaração opostos pelo INSS foram rejeitados, com a imposição de multa arbitrada em 1% sobre o valor atualizado da causa.

O INSS interpôs apelação. Arguiu preliminarmente a nulidade da sentença por negativa de prestação jurisdicional e ofensa ao devido processo legal. Afirmou que o juízo, embora tenha sido instado a suprir as omissões em embargos de declaração, não examinou as questões referentes à impossibilidade de conversão de tempo especial em comum durante os períodos de gozo de auxílio-doença, à dedução do beneficio inacumulável e à aplicação dos índices negativos de inflação. No mérito, deduziu que não se opõe à conversão do tempo especial em comum nos períodos de 01/04/1985 a 31/08/1988 e de 26/10/1988 a 05/03/1997, porém não se conforma com o reconhecimento do tempo especial no intervalo de 01/08/2000 a 22/12/2011. Alegou que as atividades descritas no perfil profissiográfico previdenciário demonstram que não havia exposição habitual e permanente a agentes químicos em intensidade e concentração nocivas à saúde e à integridade física, nem a exposição a hidrocarbonetos derivados de petróleo. Sustentou que a utilização de produtos de limpeza (detergente, desinfetante, água sanitária, etc.) não permite o enquadramento da atividade como especial para fins previdenciários, devido à reduzida concentração dos agentes químicos. Destacou que o laudo judicial foi realizado com base em informações unilaterais da parte interessada, que sequer constam no PPP emitido pelo empregador. Ponderou que, se houve contato com hidrocarbonetos, a exposição se deu em caráter eventual e intermitente e a utilização de equipamentos de proteção individual neutralizou o contato eventual com os agentes nocivos. Argumentou que os períodos de gozo de auxílio-doença previdenciário (08/03/1995 a 20/08/1995 e 13/10/2009 a 01/04/2011) não podem ser computados no tempo de serviço especial, visto que somente os benefícios acidentários são considerados para essa finalidade. Preconizou o desconto integral dos valores recebidos pelo autor, em razão da concessão de aposentadoria a partir de 1º de março de 2014, inclusive para a apuração dos honorários de sucumbência, porquanto se trata de benefício inacumulável. Defendeu a incidência dos índices negativos de inflação no cálculo de liquidação das parcelas vencidas, conforme a orientação do Manual de Cálculos do Conselho da Justiça Federal. Insurgiu-se contra a aplicação da multa prevista no art. 1.026, §2°, do Código de Processo Civil, diante da inexistência de manifesto propósito protelatório pela oposição de embargos declaratórios. Apontou que a impossibilidade de conversão de tempo especial em comum durante os períodos de gozo de auxilio-doença foi expressamente arguida na contestação. Quanto à dedução do benefício inacumulável, explicou que, embora a questão não tivesse sido alegada antes da sentença, tencionava resolver o ponto na fase de conhecimento, a fim de evitar tumulto em sede de cumprimento de sentença. Em relação ao terceiro ponto discutido nos embargos de declaração, referiu que o art. 1.022, parágrafo único, inciso I, do CPC, considera omissa a sentença que não se manifestou sobre tese firmada em sede de recurso especial repetitivo. Mencionou que o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp 1.361.191, submetido à sistemática do art. 543-C do CPC de 1973, firmou tese no sentido de que são aplicáveis os índices de deflação na correção monetária de crédito oriundo de título executivo judicial, preservado o seu valor nominal.

A parte autor não ofereceu contrarrazões.

A sentença foi publicada em 17 de abril de 2018.

VOTO

Não conhecimento da remessa necessária

De início, cabe salientar que as disposições do artigo 475 do antigo Código de Processo Civil não se aplicam às sentença proferidas após 18 de março de 2016, quando entrou em vigor o novo CPC (Lei nº 13.105).

Conforme o artigo 29, §2º, da Lei nº 8.213, o valor do salário de benefício não será inferior ao de um salário mínimo, nem superior ao do limite máximo do salário de contribuição na data de início do benefício.

De acordo com a Portaria do Ministério da Fazenda nº 15, de 16 de janeiro de 2018, o valor máximo do salário de benefício e do salário de contribuição, a partir de 1º de janeiro de 2018, é de R$ 5.645,80 (cinco mil seiscentos e quarenta e cinco reais e oitenta centavos).

No âmbito do Superior Tribunal de Justiça há entendimento sedimentado no sentido de que a sentença ilíquida está sujeita a reexame necessário (Súmula 490). Importa atentar, no entanto, que é excluída da ordem do duplo grau de jurisdição a sentença contra a União e respectivas autarquias e fundações de direito público que esteja a contemplar condenação ou proveito econômico na causa por valor certo e líquido inferior a 1.000 (mil) salários mínimos, por força do artigo 496, §3º, inciso I, do Código de Processo Civil.

Em ações de natureza previdenciária, o valor da condenação ou do proveito econômico à parte, com correção monetária e juros de mora, em nenhuma situação alcançará o valor de 1.000 (um mil) salários mínimos. É o que se dá mesmo na hipótese em que a renda mensal inicial (RMI) do benefício previdenciário deferido seja fixada no valor máximo (teto) e bem assim seja reconhecido o direito do beneficiário à percepção de parcelas em atraso, a partir daquelas correspondentes a 5 (cinco) anos que antecedem a propositura da ação (art. 103, parágrafo único da Lei nº 8.213/91).

Assim, no presente caso, não se pode fazer projeção alguma de montante exigível que legalmente releve a decisão proferida a reexame necessário.

Nesse contexto, a remessa necessária não deve ser conhecida.

Nulidade da sentença

Na contestação, o INSS alegou que os períodos de recebimento de auxílio-doença pela parte autora, entre 08/03/1995 a 20/08/1995 e 13/10/2009 a 01/04/2011, não podem ser reconhecidos como tempo de serviço especial. Aduziu que, além de inexistir exposição a agentes insalubres nesses intervalos, o art. 65 do Decreto nº 3.048/1999, alterado pelo Decreto nº 4.882/2003, prevê somente o cômputo do tempo de gozo de benefício acidentário como atividade especial.

A sentença silenciou a respeito da matéria exposta na contestação. O juízo de primeiro grau, embora tenha sido provocado por meio de embargos de declaração, não supriu a omissão (evento 3, sent27).

Segundo dispõe o art. 489, §1º, inciso IV, do Código de Processo Civil, não se considera fundamentada a decisão judicial que não enfrentar todos os argumentos deduzidos no processo capazes de, em tese, infirmar a conclusão adotada pelo julgador.

Tendo em vista que a exclusão dos períodos de gozo de auxílio-doença da contagem do tempo especial poderia afetar o direito da parte autora ao benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, o pronunciamento judicial é carente de fundamentação, por não decidir sobre ponto essencial da causa.

Quanto à aplicação dos índices negativos de inflação no cálculo de liquidação e à dedução dos valores do benefício de aposentadoria pagos na via administrativa, verifica-se que, de fato, não foram debatidas na contestação. No entanto, consoante a interpretação que se extrai do art. 491 do CPC, os consectários legais podem ser examinados de ofício. Já o desconto de benefício inacumulável, embora possa ser dirimido na fase de cumprimento de sentença, nada impede que o juízo disponha desde já a respeito.

Malgrado seja nula a sentença por falta de fundamentação, o tribunal pode decidir desde logo o mérito, com base no art. 1.013, §3º, inciso IV, do Código de Processo Civil, já que o processo está em condições de imediato julgamento.

Assim, decreto a nulidade da sentença por falta de fundamentação, quanto aos argumentos de impossibilidade de reconhecimento do tempo especial durante os períodos de gozo de auxílio-doença, aplicação dos índices negativos de inflação e dedução de benefício inacumulável, e prossigo para decidir o mérito.

Tempo de atividade especial

O reconhecimento da especialidade obedece à disciplina legal vigente na época em que a atividade foi exercida, passando a integrar, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador. Desse modo, havendo a prestação laboral sob a vigência de certa legislação, o segurado adquire o direito à contagem do tempo de serviço especial na forma estabelecida, bem como à comprovação das condições de trabalho como então exigido, não se aplicando retroativamente lei nova que venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial. Nesse sentido, a orientação adotada pela Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça (AR 3320/PR, Relatora Ministra Maria Thereza de Assis Moura, DJe 24-09-2008) e pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (EINF 2005.71.00.031824-5/RS, Terceira Seção, Luís Alberto D'Azevedo Aurvalle, D.E. 18-11-2009).

A evolução legislativa da matéria apresenta os seguintes marcos temporais:

a) até 28 de abril de 1995, quando esteve vigente a Lei nº 3.807 (Lei Orgânica da Previdência Social) e suas alterações e, posteriormente, a Lei nº 8.213 (Lei de Benefícios da Previdência Social), em sua redação original (artigos 57 e 58), a especialidade do tempo de serviço decorria do exercício de atividade profissional prevista como especial nos Decretos nº 53.831/1964 e nº 83.080/1979 e/ou na legislação especial. As normas regulamentares classificavam as atividades de duas formas: segundo os grupos profissionais, presumindo-se a sujeição do trabalhador a condições prejudiciais à saúde ou à integridade física; e segundo os agentes nocivos, caso em que deve ser demonstrada a exposição ao agente por qualquer meio de prova. Para os agentes nocivos ruído e calor, é necessário mensurar os seus níveis por meio de perícia técnica, documentada nos autos ou informada em formulário emitido pela empresa, a fim de verificar o grau de nocividade dos agentes envolvidos;

b) entre 29 de abril de 1995 a 5 de março de 1997, período em que estavam vigentes as alterações introduzidas pela Lei nº 9.032 no artigo 57 da LBPS, torna-se necessária a demonstração efetiva da exposição, de forma permanente, não ocasional nem intermitente, a agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, por qualquer meio de prova, considerando-se suficiente, para tanto, a apresentação de formulário-padrão preenchido pela empresa, sem a exigência de embasamento em laudo técnico, ressalvados os agentes nocivos ruído e calor, em relação aos quais é imprescindível a realização de perícia técnica, conforme visto acima. Foi definitivamente extinto o enquadramento por categoria profissional - à exceção das atividades a que se refere a Lei nº 5.527, cujo enquadramento por categoria deve ser feito até 13 de outubro de 1996, data imediatamente anterior à publicação da Medida Provisória nº 1.523, que a revogou expressamente;

c) a partir de 6 de março de 1997, data da entrada em vigor do Decreto nº 2.172/1997, que regulamentou as disposições introduzidas no artigo 58 da LBPS pela Medida Provisória nº 1.523 (convertida na Lei nº 9.528), passou a ser exigida, para fins de reconhecimento de tempo de serviço especial, a comprovação da efetiva sujeição do segurado a agentes agressivos por meio da apresentação de formulário-padrão, embasado em laudo técnico de condições ambientais do trabalho, ou por meio de perícia técnica.

Para que se caracterize a habitualidade e a permanência do tempo de trabalho em condições especiais prejudiciais à saúde ou à integridade física (referidas no artigo 57, §3º, da Lei n° 8.213), a exposição ao agente nocivo deve ser ínsita ao desenvolvimento das atividades cometidas ao trabalhador, integrada à sua rotina de trabalho. Exegese diversa levaria à inutilidade da norma protetiva, pois em raras atividades a sujeição direta ao agente nocivo se dá durante toda a jornada de trabalho e, em muitas delas, a exposição em tal intensidade seria absolutamente impossível (EINF n.º 0003929-54.2008.404.7003, TRF 4ª Região, 3ª Seção, Rel. Des. Federal Rogério Favreto, D.E. 24-10-2011; EINF n.º 2007.71.00.046688-7, TRF 4ª Região, 3ª Seção, Rel. Des. Federal Celso Kipper, D.E. 07-11-2011). Em suma, somente se a exposição ao agente nocivo for eventual ou ocasional, está afastada a especialidade do tempo de serviço.

Além disso, conforme o tipo de atividade, a exposição ao agente nocivo, ainda que não diuturna, configura atividade apta à concessão de aposentadoria especial, tendo em vista que a intermitência na exposição não reduz os danos ou riscos inerentes à atividade. Não é razoável que se retire do trabalhador o direito à redução do tempo de serviço para a aposentadoria, deixando-lhe apenas os ônus da atividade perigosa ou insalubre (EINF n° 2005.72.10.000389-1, TRF 4ª Região, 3ª Seção, Rel. Des. Federal João Batista Pinto Silveira, D.E. 18-05-2011; EINF n° 2008.71.99.002246-0, TRF 4ª Região, 3ª Seção, Rel. Des. Federal Luís Alberto D'Azevedo Aurvalle, D.E. 08-01-2010).

É possível a conversão do tempo especial em comum, independente da data da prestação do trabalho ou do requerimento de benefício, uma vez que a prestação de trabalho em condições especiais incorpora-se ao patrimônio jurídico do trabalhador. Embora o art. 28 da Medida Provisória nº 1.663-10 tenha revogado o artigo 57, §5º, da Lei nº 8.213, a lei de conversão (Lei nº 9.711) não manteve o dispositivo, permanecendo a possibilidade de soma do tempo de serviço especial, após a respectiva conversão, ao tempo de atividade comum, para a concessão de qualquer benefício. Sobre a matéria, o Superior Tribunal de Justiça fixou a seguinte tese:

Tema 422 - Permanece a possibilidade de conversão do tempo de serviço exercido em atividades especiais para comum após 1998, pois a partir da última reedição da MP n. 1.663, parcialmente convertida na Lei 9.711/1998, a norma tornou-se definitiva sem a parte do texto que revogava o referido § 5º do art. 57 da Lei n. 8.213/1991. (REsp 1151363/MG, Rel. Ministro JORGE MUSSI, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 23/03/2011, DJe 05/04/2011)

A atual redação do artigo 70 do Decreto nº 3.048/1999 estabelece que as regras de conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de atividade comum aplicam-se ao trabalho prestado em qualquer período. Contudo, o fator de conversão do tempo especial em comum a ser utilizado é o previsto na legislação vigente na data da concessão do benefício, e não aquele em vigor quando o serviço foi prestado.

De acordo com o art. 70 do Decreto nº 3.048/1999, com a redação dada pelo Decreto nº 4.827/2003, o fator de conversão a ser observado é de 1,4 para o homem e de 1,2 para a mulher (considerando, em ambos os casos, o exercício de atividade que ensejaria a aposentadoria especial em 25 anos).

Cômputo do período em gozo de auxílio-doença como tempo especial

A controvérsia diz respeito à interpretação do art. 65, parágrafo único, do Decreto nº 3.048/1999, incluído pelo Decreto nº 4.882/2003, que assim dispõe:

Art. 65. Considera-se trabalho permanente, para efeito desta Subseção, aquele que é exercido de forma não ocasional nem intermitente, no qual a exposição do empregado, do trabalhador avulso ou do cooperado ao agente nocivo seja indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço.

Parágrafo único. Aplica-se o disposto no caput aos períodos de descanso determinados pela legislação trabalhista, inclusive férias, aos de afastamento decorrentes de gozo de benefícios de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez acidentários, bem como aos de percepção de salário-maternidade, desde que, à data do afastamento, o segurado estivesse exercendo atividade considerada especial.

O Superior Tribunal de Justiça, em recurso especial repetitivo, fixou entendimento no sentido de que o período de afastamento por doença, mesmo que não decorra de acidente de trabalho ou doença relacionada ao trabalho, deve ser considerado como tempo especial, quando o trabalhador exercia atividade em condições especiais antes da concessão do auxílio-doença. Esta é a redação da tese firmada:

Tema 998 - O Segurado que exerce atividades em condições especiais, quando em gozo de auxílio-doença, seja acidentário ou previdenciário, faz jus ao cômputo desse mesmo período como tempo de serviço especial (REsp 1.759.098/RS e REsp 1.723.181/RS, Relator Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 26/06/2019, DJe 01/08/2019).

Logo, não há óbice para o cômputo de tempo de serviço especial de períodos em que o segurado esteve em gozo de auxílio-doença, quando o afastamento ocorrer durante o exercício de atividade sujeita a condições nocivas à saúde do trabalhador.

Utilização de equipamento de proteção individual

A respeito da utilização de equipamento de proteção individual (EPI), a Medida Provisória nº 1.729, de 2 de dezembro de 1998, convertida na Lei nº 9.732, modificou a redação do art. 58, §2º, da Lei nº 8.213, estabelecendo que a existência de tecnologia de proteção individual eficaz, que comprovadamente neutralize os agentes nocivos ou diminua a sua intensidade a limites de tolerância, afasta o efetivo prejuízo à saúde ou integridade física do trabalhador, razão pela qual a atividade não pode ser qualificada como especial. Note-se que a questão atinente ao uso do EPI só passou a ter relevância, para fins de reconhecimento das atividades exercidas em condições especiais, a partir de 3 de dezembro de 1998, data da publicação da MP nº 1.729.

O Supremo Tribunal Federal, em julgado com repercussão geral, firmou entendimento no sentido de que, se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não há direito à aposentadoria especial. Contudo, havendo demonstração de que o uso do EPI, no caso concreto, não é suficiente para afastar a nocividade, deve ser reconhecida a especialidade do trabalho. Em relação ao ruído, o STF considerou que a exposição a níveis superiores aos limites de tolerância causa prejuízos ao organismo humano que vão além dos relacionados à perda das funções auditivas. Assim, a utilização do EPI não garante a eliminação dos efeitos do agente nocivo ruído, pois existem fatores de difícil ou impossível controle que influenciam a sua efetividade. Esta é a redação da tese firmada no Tema 555:

I - O direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo a sua saúde, de modo que, se o Equipamento de Proteção Individual (EPI) for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial; II - Na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria. (ARE 664335, Relator(a): Min. LUIZ FUX, Tribunal Pleno, julgado em 04/12/2014, ACÓRDÃO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-029 DIVULG 11-02-2015 PUBLIC 12-02-2015)

No período posterior à MP nº 1.729/1998, o uso de EPI se revela, de per si, ineficaz para neutralizar os danos causados ao organismo humano pelo ruído. Com efeito, consoante já identificado pela medicina do trabalho, a exposição a níveis elevados de ruído não causa danos apenas à audição, de sorte que protetores auriculares não são capazes de neutralizar os riscos à saúde do trabalhador. Os ruídos ambientais não são absorvidos apenas pelos ouvidos e suas estruturas condutivas, mas também pela estrutura óssea da cabeça, sendo que o protetor auricular reduz apenas a transmissão aérea e não a óssea, daí que a exposição, durante grande parte do tempo de serviço do segurado produz efeitos nocivos a longo prazo, como zumbidos e distúrbios do sono.

Por essa razão, a declaração do empregador sobre a eficácia do EPI não tem o condão de afastar o reconhecimento da especialidade com base no agente nocivo ruído, conforme a tese firmada no Tema 555 do STF.

Agentes químicos

Os Decretos nº 2.172/1997 e nº 3.048/1999, no Anexo IV, arrolam os agentes químicos nocivos à saúde, nos códigos 1.0.1 a 1.0.19. Conforme o Decreto nº 3.265, de 29 de novembro de 1999, o rol de agentes nocivos é exaustivo, enquanto que as atividades listadas nas quais pode haver a exposição é exemplificativa.

No entanto, mesmo que os atos normativos infralegais não enquadrem determinada substância química como nociva, se for constatado o efetivo prejuízo à saúde do segurado, é possível o reconhecimento da especialidade do labor desempenhado. Isso porque, consoante entendimento sedimentado pelo Superior Tribunal de Justiça, em recurso representativo de controvérsia, fixou a seguinte tese:

Tema 534 - As normas regulamentadoras que estabelecem os casos de agentes e atividades nocivos à saúde do trabalhador são exemplificativas, podendo ser tido como distinto o labor que a técnica médica e a legislação correlata considerarem como prejudiciais ao obreiro, desde que o trabalho seja permanente, não ocasional, nem intermitente, em condições especiais (art. 57, § 3º, da Lei 8.213). (REsp 1.306.113/SC, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 14/11/2012, DJe 07/03/2013)

Desse modo, constatando-se, concretamente, a insalubridade de determinada atividade, é imperioso o reconhecimento da sua especialidade, ainda que o agente nocivo não esteja elencado no respectivo ato regulamentar. Nesse sentido, aliás, já dispunha a Súmula 198 do extinto Tribunal Federal de Recursos: Atendidos os demais requisitos, é devida a aposentadoria especial, se perícia judicial constata que a atividade exercida pelo segurado é perigosa, insalubre ou penosa, mesmo não inscrita em Regulamento.

Embora o Decreto nº 3.265/1999 estabeleça que o direito ao benefício decorre da exposição ao agente nocivo em nível de concentração superior aos limites de tolerância, a avaliação quantitativa é desnecessária para os agentes nocivos previstos nos Anexos 6, 13, 13-A e 14 da NR-15, segundo dispõe o art. 157, §1º, inciso I, da Instrução Normativa INSS/DC nº 118/2005 e os atos normativos posteriores. Vale notar, ainda, que os limites de tolerância fixados no Anexo 11 da NR-15 são válidos apenas para absorção por via respiratória. Se a substância química também for absorvida pela pele, não há como determinar o limite seguro de exposição.

Nesse sentido, já decidiu este Tribunal Regional Federal:

REVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. REVISÃO. POSSIBILIDADE. 1. Constando dos autos a prova necessária a demonstrar o exercício de atividade sujeita a condições especiais, conforme a legislação vigente na data da prestação do trabalho, o respectivo tempo de serviço deve ser computado, juntamente com os períodos de labor urbano reconhecidos pelo INSS, para fins de revisão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição. Direito adquirido do autor à concessão do melhor benefício (RE nº 630.501/RS, Relatora Ministra Ellen Gracie, Plenário, DJE 26/08/2013). 2. Embora os agentes químicos a que a parte autora esteve exposta não estejam contemplados no elenco dos Decretos nºs 2.172/97 e 3.048/99 como agentes nocivos a ensejar a concessão de aposentadoria especial, o enquadramento da atividade dar-se-á pela verificação da especialidade no caso concreto, através de perícia técnica confirmatória da condição insalutífera, por força da Súmula nº 198 do extinto Tribunal Federal de Recursos. O rol de agentes agressivos previsto nos decretos regulamentares é exemplificativo. Precedente STJ. 3. Os equipamentos de proteção individual não são suficientes para descaracterizar a especialidade da atividade exercida, porquanto não comprovada a sua real efetividade por meio de perícia técnica especializada e não demonstrado o uso permanente pelo empregado durante a jornada de trabalho. (TRF4, AC 5018515-92.2018.4.04.9999, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SC, Relator PAULO AFONSO BRUM VAZ, juntado aos autos em 20/02/2020)

Caso concreto

A controvérsia diz respeito ao exercício de atividade especial pelo autor no período de 01/08/2000 a 22/12/2011.

Consta no perfil profissiográfico previdenciário emitido pelo empregador, Prettto Veículos Ltda., que o autor exerceu o cargo de serviços de limpeza, no setor oficina (evento 3, anexospet4, p. 47/48).

As atividades desempenhadas pelo trabalhador, descritas no PPP, são: conservar a limpeza de logradouros por meio de coleta de lixo, varrições, lavagens, aparo de gramas e corte de árvores, etc; lavar vidros, janelas e fachadas externas; executar reparos de manutenção e serviços de manutenção em dependências de edificações; zelar pela segurança do patrimônio e das pessoas, solicitando meio e tomando providências para a realização dos serviços.

Na seção de registros ambientais do documento, não há informação sobre exposição a fatores de risco.

O juízo de primeiro grau acolheu o argumento da parte autora de que a documentação técnica da empresa Pretto Veículos não refletia as suas reais condições de trabalho e determinou a realização de prova pericial.

O perito judicial efetuou a avaliação do ambiente de trabalho na própria empresa Pretto Veículos. Segundo o laudo pericial, o autor executava as seguintes atividades: efetuar a limpeza geral das dependências da empresa (oficina mecânica, chapeação e pintura, lavagem e sanitários dos setores de lavagem e oficina mecânicalvestiário); efetuar a manutenção do pátio (varrição, cortar grama, aplicar veneno para formigas, pintar cerca metálica e outras atividades afins); efetuar o recolhimento e destinação de óleo usado de motores no depósito de residuos (óleo queimado).

O laudo pericial atestou a exposição do autor aos seguintes agentes químicos: álcalis cáusticos, por utilizar detergente alcalino, desinfetantes, água sanitária a base de hipoclorito de sódio e outros nas atividades de limpeza em geral das dependências da empresa; hidrocarbonetos derivados do petróleo, em razão do contato com óleo queimado oriundo da troca de óleo da oficina mecânica, bem como da destinação dos resíduos em tambores para reciclagem. Também considerou que a atividade era perigosa, com fundamento no Anexo 2 da NR-16, porque o autor adentrava em áreas de risco (tanque contendo 2.000 litros de óleo queimado e depósito de líquidos inflamáveis contendo em média 1.300 de latas de tintas e solventes automotivos).

As conclusões do perito judicial não estão amparadas na legislação previdenciária e trabalhista.

Em relação aos álcalis cáusticos, não se caracteriza a exposição a agentes prejudiciais à saúde nos termos da legislação previdenciária. As atividades que ensejam o enquadramento da atividade como especial, previstas no Anexo 13 da NR-15, são a fabricação e manuseio de álcalis cáusticos em estado puro. Os produtos usados na desinfecção de banheiros e desentupimento de vasos e ralos contêm hipoclorito de sódio e hidróxido de sódio de forma diluída, com baixa concentração, sendo empregados inclusive na limpeza doméstica.

Em conformidade com a jurisprudência deste tribunal, as atividades de limpeza realizadas em ambiente diverso do hospitalar ou de sanitários com grande circulação diária de pessoas não encontram, em geral, correspondência em nenhuma das hipóteses arroladas na legislação previdenciária, uma vez que os produtos utilizados nos serviços de limpeza, como, por exemplo, desinfetantes, águas sanitárias, detergentes etc., são de uso doméstico, encontrando-se diluídos em quantidades seguras. Note-se que a atividade de limpeza de banheiros de uso privado não caracteriza a atividade como especial. Neste sentido, confira-se:

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA ESPECIAL. REQUISITOS PREENCHIDOS. 1. Não é possível o enquadramento, como especial, das atividades exercidas pela autora descritas no formulário PPP, se não indicam a sujeição a agentes químicos e/ou biológicos, na forma exigida pela legislação previdenciária. O manuseio de produtos comumente utilizados para limpeza não gera presunção de insalubridade e tampouco obrigatoriedade de reconhecimento da especialidade do labor, uma vez que a concentração destas substâncias químicas ocorre de forma reduzida, porquanto são todos produtos de utilização doméstica, não expondo a trabalhadora a condições prejudiciais à sua saúde. Autora trabalhou como ajudante de limpeza, de modo que o contato com produtos químicos refere-se à utilização de produtos de limpeza ordinariamente empregados nesse mister, não configurando exposição a agentes agressivos. Não há falar em sujeição a agentes biológicos pela limpeza de banheiros por ausência de correspondência às situações previstas nos decretos regulamentares. Também não se caracteriza sujeição à umidade excessiva. (...) (TRF4, AC 5002484-50.2017.4.04.7212, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SC, Relator PAULO AFONSO BRUM VAZ, juntado aos autos em 14/12/2018)

PREVIDENCIÁRIO. PRODUÇÃO DE PROVA. EXERCÍCIO DE ATIVIDADE ESPECIAL. AGENTES BIOLÓGICOS E QUÍMICOS. ATIVIDADE DE LIMPEZA. AMBIENTE PRIVADO. 1. A dilação probatória é prescindível, no caso em que as provas necessárias para o julgamento da questão encontram-se juntadas aos autos. 2. A exposição ocupacional a agentes nocivos biológicos caracteriza-se devido ao exercício das atividades arroladas no código 3.0.1 dos Decretos nº 2.172/1997 e nº 3.038/1999. 3. A coleta de lixo proveniente de ambiente de uso privado não é enquadrada como atividade especial. 4. Os produtos contendo hipoclorito de sódio e hidróxido de sódio, usados na desinfecção de banheiros e desentupimento de vasos e ralos, apresentam pouca concentração de agentes químicos, não ocasionando a exposição a agentes prejudiciais à saúde, nos termos da legislação previdenciária. (TRF4, AC 5015512-02.2014.4.04.7112, QUINTA TURMA, Relator OSNI CARDOSO FILHO, juntado aos autos em 13/12/2020)

Transcreve-se, por oportuno, precedentes do Tribunal Superior do Trabalho, associados ao adicional de insalubridade e aos agentes de limpeza:

I - AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA . RECLAMADA. LEI Nº 13.467/2017. TRANSCENDÊNCIA. (...) ADICIONAL DE INSALUBRIDADE. CONTATO COM ÁLCALIS CÁUSTICOS . 1 - Esta Corte Superior tem entendido que o adicional de insalubridade somente é devido quando o contato com álcalis cáustico ocorre em sua composição original, sem nenhuma diluição ou mistura, o que não é o caso dos produtos comuns de limpeza, ainda que no laudo pericial haja manifestação em sentido diverso, nos termos da OJ n° 4 da SBDI-1 desta Corte (Súmula n° 448 do TST). Há julgados. 2 - Recurso de revista de que se conhece e a que se dá provimento. (RR-20209-66.2016.5.04.0333, Sexta Turma, Relatora Ministra Kátia Magalhães Arruda, DEJT 08/05/2020)

AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO PELO RECLAMANTE. ADICIONAL DE INSALUBRIDADE. O Tribunal Regional consignou que, não obstante as conclusões do laudo pericial, a análise das provas oral e documental demonstrou que o reclamante recebia luvas de látex para o manuseio de produtos de limpeza de uso doméstico, nos quais os álcalis cáusticos eram apenas elementos encontrados em sua composição, além de que não realizava a limpeza de banheiros de uso coletivo e de grande circulação, razão pela qual excluiu o pagamento de adicional de insalubridade. Nesse contexto, não está caracterizada a existência de " instalações sanitárias de uso público ou coletivo de grande circulação ", de que trata a Súmula nº 448, II, do TST , ou a insalubridade pelo contato com álcalis cáusticos presentes em produtos de limpeza de uso doméstico, pois, nesse caso, não há enquadramento da atividade no Anexo 13 da NR-15 da Portaria nº 3.214/78 do Ministério do Trabalho e Emprego, o qual pressupõe o contato com a referida substância química no seu estado bruto. Incólumes, assim, o art. 189 da CLT e a Súmula nº 448, II, do TST. Agravo de instrumento conhecido e não provido. (AIRR-1000827-32.2017.5.02.0320, Oitava Turma, Relatora Ministra Dora Maria da Costa, DEJT 04/05/2020)

Portanto, no caso em análise, as atividades limpeza em geral realizadas pelo autor não o sujeitavam aos efeitos nocivos de agentes químicos.

Em relação ao contato com hidrocarbonetos aromáticos e ao exercício de trabalho em condições de periculosidade, a conclusão do laudo pericial não se ampara nas atividades efetuadas pela parte autora, descritas no campo profissiografia do formulário juntado aos autos. De fato, não se encontra, entre as atribuições do trabalhador, realizar a coleta de óleo usado de motores e a destinação dos resíduos para os tambores de reciclagem, que exigiria o ingresso e a permanência em área de risco. Depreende-se que o perito levou em consideração unicamente o relato do próprio autor, sem que a informação fosse confirmada documentalmente. Logo, não é possível enquadrar a atividade pela exposição a hidrocarbonetos e à periculosidade, inclusive porque a exposição a esses agentes não é inerente ao cargo.

Por esses fundamentos, acolhe-se a apelação do INSS, para julgar improcedente o pedido de reconhecimento do tempo de serviço especial no período de 01/08/2000 a 22/12/2011.

Requisitos para aposentadoria por tempo de contribuição

Cabe examinar se, com a exclusão do tempo de serviço especial entre 01/08/2000 a 22/12/2011, o autor preenche os requisitos para aposentadoria por tempo de contribuição.

Na data do requerimento administrativo (22/12/2011), o INSS contou o tempo de contribuição de 33 anos, 1 mês e 14 dias e a carência de 294 meses.

A conversão do tempo de atividade especial pelo fator 1,4, acresce ao tempo de contribuição: 1 ano, 4 meses e 12 dias (01/04/1985 a 31/08/1988) e 3 anos, 4 meses e 4 dias (26/10/1988 a 05/03/1997).

A soma do tempo de contribuição resulta em 37 anos e 10 meses.

Portanto, em 22 de dezembro de 2011 (DER), a parte autora cumpriu os requisitos para o benefício de aposentadoria integral por tempo de contribuição, de acordo com as regras do art. 201, §7º, da Constituição Federal.

O cálculo do benefício deve ser feito de acordo com a Lei nº 9.876, com a incidência do fator previdenciário.

Correção monetária e juros de mora

A questão atinente aos consectários legais pode ser examinada de ofício, consoante a interpretação do art. 491 do CPC.

O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Tema 810, declarou a inconstitucionalidade do art. 1º-F da Lei nº 9.494, com a redação dada pela Lei nº 11.960, na parte em que disciplina a atualização monetária das condenações impostas à Fazenda Pública segundo a remuneração oficial da caderneta de poupança. Em relação aos juros de mora, reputou constitucional a aplicação do índice de remuneração da caderneta de poupança (RE 870.947, Relator Ministro Luiz Fux, Tribunal Pleno, julgado em 20/09/2017).

Os embargos de declaração opostos no RE 870.947 foram rejeitados pelo STF, não sendo acolhido o pedido de modulação temporal dos efeitos da declaração de inconstitucionalidade.

Dessa forma, devem ser observados os critérios de correção monetária e juros de mora fixados no Tema 905 do Superior Tribunal de Justiça (REsp 1.495.146/MG, REsp 1.492.221/PR, REsp 1.495.144/RS, Relator Ministro Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, julgado em 22/02/2018):

3.2 Condenações judiciais de natureza previdenciária.

As condenações impostas à Fazenda Pública de natureza previdenciária sujeitam-se à incidência do INPC, para fins de correção monetária, no que se refere ao período posterior à vigência da Lei 11.430/2006, que incluiu o art. 41-A na Lei 8.213/91. Quanto aos juros de mora, incidem segundo a remuneração oficial da caderneta de poupança (art. 1º-F da Lei 9.494/97, com redação dada pela Lei n. 11.960/2009).

Assim, a correção monetária incidirá a contar do vencimento de cada parcela, conforme a variação do INPC, a partir de abril de 2006 (art. 41-A da Lei nº 8.213).

O art. 5º da Lei nº 11.960, que deu nova redação ao art. 1º-F da Lei nº 9.494, dispõe que haverá a incidência uma única vez, até o efetivo pagamento, dos índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança. Ao empregar a expressão “uma única vez”, o legislador afastou a capitalização, ou seja, a aplicação de juros sobre parcelas que já incluam juros.

Os juros moratórios incidem a contar da citação, conforme a taxa de juros da caderneta de poupança, de forma simples (não capitalizada). É indevida a cumulação do índice oficial de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança.

A partir de 9 de dezembro de 2021, nos termos do art. 3º da Emenda Constitucional nº 113, deve incidir, para os fins de atualização monetária e juros de mora, apenas a taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (SELIC), acumulada mensalmente.

Portanto, de ofício, modifica-se a sentença quanto aos consectários legais.

Índices negativos de inflação (deflação)

Há que se observar eventuais índices de deflação verificados no período abrangido pela atualização das parcelas devidas, porquanto não há ofensa aos princípios constitucionais da irredutibilidade e da preservação do valor real dos proventos.

Nesse sentido, a tese firmada pelo Superior Tribunal de Justiça, no julgamento de recurso repetitivo:

Tema 678 - Aplicam-se os índices de deflação na correção monetária de crédito oriundo de título executivo judicial, preservado o seu valor nominal. (REsp 1361191/RS, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, CORTE ESPECIAL, julgado em 19/03/2014, DJe 27/06/2014)

Dedução de benefício inacumulável

O art. 124, inciso II, da Lei nº 8.213, veda a percepção conjunta de mais de uma aposentadoria.

Na via administrativa, o autor obteve o reconhecimento do direito à aposentadoria por tempo de contribuição desde 1º de março de 2014.

Uma vez que a concessão da aposentadoria na via administrativa é anterior à data de ajuizamento desta ação (07/05/2014), o segurado não pode mais optar pelo benefício deferido em juízo, já que isso acarretaria desaposentação.

Fica prejudicada a análise da questão referente à dedução dos valores pagos a título de benefício inacumulável.

Remanesce, contudo, a possibilidade de percepção das prestações vencidas do benefício deferido judicialmente entre a data de entrada do requerimento e a data de início da aposentadoria concedida na via administrativa.

Embora exista pronunciamento deste Tribunal Regional Federal assegurando essa possibilidade (TRF4, EINF 2009.04.00.038899-6, Terceira Seção, Relator Celso Kipper, D.E. 16/03/2011), a matéria, no presente momento, é objeto do Tema 1.018 do Superior Tribunal de Justiça (Possibilidade do segurado do RGPS receber parcelas pretéritas de aposentadoria concedida judicialmente até a data inicial de aposentadoria concedida administrativamente pelo INSS enquanto pendente a mesma ação judicial).

Assim, é o caso de se diferir a deliberação sobre o tema ao juízo da execução, inclusive no que se refere à apuração dos honorários de sucumbência.

Multa do art. 1.026, §2º, do Código de Processo Civil

O juízo de primeiro grau condenou o INSS ao pagamento de multa, arbitrada em 1% sobre o valor atualizado da causa, na forma do art. 1.026, §2º, do Código de Processo Civil, por entender que a oposição de embargos declaratórios tinha evidente caráter protelatório. A decisão foi fundamentada nos seguintes termos:

Destaco que é evidente o caráter protelatório dos embargos de declaração uma vez que: 1 - Trata-se de inovação processual o requerimento de exclusão do período de gozo de auxílio-doença da conversão de tempo especial para comum; 2 - Mostra-se desnecessário o pronunciamento quanto a dedução de valores pagos administrativamente ou a aplicação da deflação, se tratando de aplicabilidade intrínseca e implícita. Ademais, em tal ponto, novamente o INSS comete inovação processual, não se manifestando sobre tais questões anteriormente ao julgamento.

Os argumentos expendidos pelo INSS são procedentes.

Consoante os fundamentos expostos no exame da preliminar de nulidade da sentença, a questão atinente à impossibilidade de conversão de tempo especial em comum, durante os períodos de gozo de auxilio-doença, foi deduzida na contestação.

No que diz respeito à aplicação dos índices negativos de inflação, apesar de inexistir alegação antes da prolação da sentença, a matéria pode ser examinada de ofício. Além disso, considerando que o tema é objeto de tese firmada em julgamento de recurso repetitivo (Tema 638 do Superior Tribunal de Justiça), a sentença incorre em omissão, caso não se manifeste sobre o ponto, conforme estabelece o art. 1.022, parágrafo único, inciso I, do CPC.

Por fim, a dedução dos valores do benefício inacumulável pagos na via administrativa consiste em impositivo legal, por haver vedação legal quanto ao recebimento de duas aposentadorias. Conquanto se admita discutir a questão em sede de cumprimento de sentença, mesmo que o título judicial não determine expressamente o desconto, o julgador pode desde já decidir acerca da matéria.

Diante das circunstâncias, constata-se que a oposição dos embargos era plenamente justificada, inexistindo manifesto propósito protelatório.

Por esses fundamentos, afasta-se a condenação do INSS ao pagamento de multa.

Honorários advocatícios

Em que pese o provimento parcial da apelação do INSS, a sucumbência das partes não se alterou significativamente, tendo em vista que foi reconhecido o direito da parte autora ao benefício de aposentadoria desde a data do requerimento administrativo.

Mantêm-se, assim, os honorários advocatícios fixados na sentença.

Conclusão

Não conheço da remessa necessária.

Dou parcial provimento à apelação do INSS, para: a) decretar a nulidade da sentença por falta de fundamentação, quanto aos argumentos de impossibilidade de reconhecimento do tempo especial durante os períodos de gozo de auxílio-doença, aplicação dos índices negativos de inflação e dedução de benefício inacumulável, e julgar o mérito, com fundamento no art. 1.013, §3º, inciso IV, do Código de Processo Civil; b) julgar improcedente o pedido de reconhecimento do tempo de serviço especial no período de 01/08/2000 a 22/12/2011; c) determinar a aplicação de eventuais índices negativos de inflação; d) afastar a condenação ao pagamento de multa; e) diferir para a fase de cumprimento de sentença a questão acerca da execução das prestações vencidas do benefício entre a data de entrada do requerimento e a data de início da aposentadoria concedida na via administrativa.

De ofício, modifica-se a sentença quanto aos consectários legais.

Em face do que foi dito, voto no sentido de dar provimento à apelação do INSS e, de ofício, modificar a sentença quanto aos consectários legais.



Documento eletrônico assinado por OSNI CARDOSO FILHO, Desembargador Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003110614v59 e do código CRC 9619f568.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): OSNI CARDOSO FILHO
Data e Hora: 4/5/2022, às 19:59:21


5032180-78.2018.4.04.9999
40003110614.V59


Conferência de autenticidade emitida em 11/05/2022 04:34:19.

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação/Remessa Necessária Nº 5032180-78.2018.4.04.9999/RS

RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

APELADO: GILBERTO CARDOSO

ADVOGADO: Caroline Bozzetto (OAB RS075567)

EMENTA

previdenciário. não conhecimento da remessa necessária. nulidade da sentença. exercício de atividade especial. exposição a agentes químicos. produtos de limpeza. hidrocarbonetos. correção monetária. aplicação do inpc. índices negativos de inflação. multa pela oposição de embargos declaratórios.

1. A remessa necessária não deve ser admitida quando se puder constatar que, a despeito da iliquidez da sentença, o proveito econômico obtido na causa será inferior a 1.000 (mil) salários (art. 496, § 3º, I, CPC) - situação em que se enquadram, invariavelmente, as ações destinadas à concessão ou ao restabelecimento de benefício previdenciário pelo Regime Geral de Previdência Social.

2. É nula, por falta de fundamentação, a sentença que não enfrenta matéria deduzida na contestação capaz de, em tese, afetar o direito da parte autora.

3. Incorre em omissão a sentença que não analisa o ponto referente à aplicação dos índices negativos de inflação, embora não suscitado na contestação, já que os consectários legais podem ser examinados de ofício.

4. A utilização de produtos de limpeza como detergente, desinfetante e água sanitária, em ambiente diverso do hospitalar ou de sanitários públicos, com grande circulação diária de pessoas, não permite o enquadramento da atividade como especial, devido à reduzida concentração dos agentes químicos.

5. O contato com hidrocarbonetos derivados do petróleo deve ser comprovado com base nas atividades desempenhadas pelo segurado, descritas no perfil profissiográfico previdenciário, principalmente no caso em que a exposição a esses agentes químicos não é inerente ao cargo.

6. Nas ações previdenciárias, após 30 de junho de 2009, aplica-se o INPC como índice de correção monetária (Tema 905 do Superior Tribunal de Justiça).

7. Aplicam-se os índices de deflação na correção monetária de crédito oriundo de título executivo judicial, preservado o seu valor nominal (Tema 678 do Superior Tribunal de Justiça).

8. Havendo omissão na sentença, é injustificada a condenação ao pagamento de multa pela oposição de embargos declaratórios.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar provimento à apelação do INSS e, de ofício, modificar a sentença quanto aos consectários legais, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 12 de abril de 2022.



Documento eletrônico assinado por OSNI CARDOSO FILHO, Desembargador Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003110615v8 e do código CRC 63bcc0a8.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): OSNI CARDOSO FILHO
Data e Hora: 4/5/2022, às 15:56:34


5032180-78.2018.4.04.9999
40003110615 .V8


Conferência de autenticidade emitida em 11/05/2022 04:34:19.

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 05/04/2022 A 12/04/2022

Apelação/Remessa Necessária Nº 5032180-78.2018.4.04.9999/RS

RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO

PRESIDENTE: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO

PROCURADOR(A): THAMEA DANELON VALIENGO

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

APELADO: GILBERTO CARDOSO

ADVOGADO: Caroline Bozzetto (OAB RS075567)

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 05/04/2022, às 00:00, a 12/04/2022, às 16:00, na sequência 50, disponibilizada no DE de 25/03/2022.

Certifico que a 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 5ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS E, DE OFÍCIO, MODIFICAR A SENTENÇA QUANTO AOS CONSECTÁRIOS LEGAIS.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO

Votante: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO

Votante: Desembargador Federal ROGER RAUPP RIOS

Votante: Juiz Federal FRANCISCO DONIZETE GOMES

LIDICE PEÑA THOMAZ

Secretária



Conferência de autenticidade emitida em 11/05/2022 04:34:19.

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