D.E. Publicado em 12/06/2017 |
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0011517-38.2014.4.04.9999/PR
RELATORA | : | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | LURDES APARECIDA BONAVIGO |
ADVOGADO | : | Rosalina Sacrini Pimentel |
REMETENTE | : | JUIZO DE DIREITO DA 1A VARA DA COMARCA DE BARRACAO/PR |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. NULIDADE DA SENTENÇA. PRELIMINAR AFASTADA. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. REQUISITOS PREENCHIDOS. PESQUISA ADMINISTRATIVA. DESCONTINUIDADE. VOCAÇÃO RURAL.
1. O INSS, devidamente intimado a comparecer à audiência de instrução e julgamento, sujeita-se ao ônus processual acarretado pela ausência de seus procuradores ao ato designado, não havendo desrespeito ao contraditório e à ampla defesa se o magistrado profere sentença em audiência sem oportunizar-lhe a apresentação de memoriais.
2. O tempo de serviço rural, cuja existência é demonstrada por testemunhas que complementam início de prova material, deve ser reconhecido ao segurado em regime de economia familiar ou individual.
3. Uma vez completada a idade mínima (55 anos para a mulher e 60 anos para o homem) e comprovado o exercício da atividade agrícola no período correspondente à carência (art. 142 da Lei nº 8.213/1991), é devido o benefício de aposentadoria por idade rural.
4. Existindo conflito entre as provas colhidas na esfera administrativa e em juízo, deve-se optar, em princípio, por estas últimas, porque produzidas com todas as cautelas legais, garantindo a imparcialidade e o contraditório.
5. Havendo elementos concretos evidenciando que o retorno ao ambiente campesino se deu com o intuito de retomada da atividade rural como fonte de subsistência, e não apenas para se valer da condição de segurado especial às vésperas do protocolo do pedido de aposentadoria por idade, poderá ser admitida a descontinuidade. Deve ser observado todo o período contributivo do segurado, de modo a qualificá-lo efetivamente como trabalhador rural e não urbano, vocacionado às lides agrícolas, justificando, dessa maneira, a redução do requisito etário.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, não conhecer da remessa oficial e negar provimento à apelação do INSS, mantida a antecipação dos efeitos da tutela, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre/RS, 31 de maio de 2017.
Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE
Relatora
Documento eletrônico assinado por Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8880406v19 e, se solicitado, do código CRC 53FBD792. | |
Informações adicionais da assinatura: | |
Signatário (a): | Salise Monteiro Sanchotene |
Data e Hora: | 05/06/2017 16:39 |
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0011517-38.2014.4.04.9999/PR
RELATORA | : | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | LURDES APARECIDA BONAVIGO |
ADVOGADO | : | Rosalina Sacrini Pimentel |
REMETENTE | : | JUIZO DE DIREITO DA 1A VARA DA COMARCA DE BARRACAO/PR |
RELATÓRIO
LURDES APARECIDA BONAVIGO ajuizou ação ordinária contra o INSS objetivando a concessão do benefício de aposentadoria por idade rural a contar do requerimento administrativo, formulado em 16/03/2012 (fl. 16).
Na sentença (19/11/2012) foi julgado procedente o pedido, condenando-se o INSS a conceder à parte autora o benefício de aposentadoria por idade rural a partir de 16/03/2012. A Autarquia foi condenada, ainda, ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios fixados em 10% das parcelas vencidas até a data da sentença.
O INSS apelou sustentando, inicialmente, a nulidade da sentença, porquanto proferida em audiência à qual não puderam comparecer seus procuradores, o que impossibilitou a apresentação de alegações finais. A Autarquia alegou, ainda, serem insuficientes as provas documentais e testemunhais constantes nos autos.
Apresentadas contrarrazões, vieram os autos para julgamento.
VOTO
Nos termos do artigo 1.046 do Código de Processo Civil (CPC), em vigor desde 18 de março de 2016, com a redação que lhe deu a Lei 13.105, de 16 de março de 2015, suas disposições aplicar-se-ão, desde logo, aos processos pendentes, ficando revogada a Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973.
Com as ressalvas feitas nas disposições seguintes a este artigo 1.046 do CPC, compreende-se que não terá aplicação a nova legislação para retroativamente atingir atos processuais já praticados nos processos em curso e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada, conforme expressamente estabelece seu artigo 14.
Remessa Oficial
Nos termos do artigo 14 do novo CPC, "a norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada".
O intuito do legislador foi salvaguardar os atos já praticados, perfeitos e acabados, aplicando-se a nova lei processual com efeitos prospectivos.
Nesse sentido, as sentenças sob a égide do CPC de 1973, sujeitavam-se a reexame obrigatório se condenassem a Fazenda Pública ou assegurassem ao autor direito equivalente ao valor de sessenta salários mínimos ou mais.
A superveniência dos novos parâmetros (NCPC, art. 496, § 3º), aumentando o limite para reexame obrigatório da sentença, traz a indagação quanto à lei aplicável às sentenças publicadas anteriormente e ainda não reexaminadas. Uma das interpretações possíveis seria a de que, em tendo havido fato superveniente à remessa - novo CPC - a suprimir o interesse da Fazenda Pública em ver reexaminadas sentenças que a houvessem condenado ou garantido proveito econômico à outra parte em valores correspondentes a até mil salários mínimos, não seria caso de se julgar a remessa. Inexistindo o interesse, por força da sobrevinda dos novos parâmetros, não haveria condição (interesse) para o seu conhecimento.
No entanto, em precedente repetido em julgamentos sucessivos, o STJ assentou que a lei vigente à época da prolação da decisão recorrida é a que rege o cabimento da remessa oficial (REsp 642.838/SP, rel. Min. Teori Zavascki).
Nesses termos, em atenção ao precedente citado, o conhecimento da remessa necessária das sentenças anteriores à mudança processual observará os parâmetros do CPC de 1973, aplicando-se o novo CPC às sentenças posteriores.
Registre-se que no caso dos autos não se pode invocar o preceito da Súmula 490 do STJ, segundo a qual a dispensa de reexame necessário, quando o valor da condenação ou do direito controvertido for inferior a sessenta salários mínimos, não se aplica a sentenças ilíquidas.
No caso concreto, o valor do proveito econômico outorgado em sentença à parte autora da demanda é mensurável por simples cálculo aritmético.
Desse modo, para aferir a aplicabilidade ou não do disposto no § 2º do art. 475 do CPC/73 em comento, é irrelevante o valor que tenha sido atribuído pela parte sua peça inicial, servindo como parâmetro o valor econômico expresso na sentença condenatória que julga a causa.
Nesse sentido:
PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. REEXAME NECESSÁRIO. INTELIGÊNCIA DO § 2º DO ART. 475 DO CPC, COM A REDAÇÃO DA LEI 10.352/01. 1. Nos termos do art. 475, § 2º, do CPC, a sentença não está sujeita a reexame necessário quando "a condenação, ou o direito o direito controvertido, for de valor certo não excedente a 60 (sessenta) salários mínimos". Considera-se "valor certo", para esse efeito, o que decorre de uma sentença líquida, tal como prevê o art. 459 e seu parágrafo, combinado com o art. 286 do CPC. 2. Os pressupostos normativos para a dispensa do reexame têm natureza estritamente econômica e são aferidos, não pelos elementos da demanda (petição inicial ou valor da causa), e sim pelos que decorrem da sentença que a julga. (...) 5. Embargos de divergência providos. (EREsp 600.596/RS, Rel. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, CORTE ESPECIAL, julgado em 04/11/2009, DJe 23/11/2009)
A sentença de 19 de novembro de 2012 condenou o INSS ao pagamento de aposentadoria no valor de um salário mínimo desde a data de 16 de março de 2012, quando manejado o requerimento administrativo (DER).
De acordo com a Planilha de Cálculos da Justiça Federal (Programa JUSPREV II - cálculo que acompanha este voto), de 16 de março de 2012 a 19 de novembro de 2012, a Autarquia Previdenciária não pagou à parte autora o valor de R$5.671,37 (cinco mil, seiscentos e setenta e um reais e trinta e sete centavos), atualizados monetariamente, quantia equivalente a pouco mais de 9 (nove) salários mínimos em 2012, resultando, portanto, na condenação em montante manifestamente inferior a 60 (sessenta) salários-mínimos.
Trata-se, como visto, de valor facilmente estimável, o que atribui liquidez ao julgado.
Cabe salientar que se a sentença sujeita a reexame necessário é a que condena a Fazenda Pública em valor não excedente a sessenta salários mínimos, impõe-se aferir o montante da condenação na data em que proferida. Valores sujeitos a vencimento futuro não podem ser considerados para este efeito, pois não é possível estimar por quanto tempo o benefício será mantido.
Não por outra razão é que se toma o valor das parcelas vencidas até a data da decisão de procedência, para fins de aferição do montante da condenação sobre o qual incidirão os honorários advocatícios, nos termos da Súmula 111 do STJ. Não se aplicam à hipótese, as regras de estimativa do valor da causa. Trata-se, no momento, de condenação.
A propósito, vale colacionar as palavras do Ministro Humberto Martins no Resp 1577902 (decisão de 16-02-2016) que bem espelha a hipótese dos autos:
(...) aplica-se o entendimento de que "É líquida a sentença que contém em si todos os elementos que permitem definir a quantidade de bens a serem prestados, dependendo apenas de cálculos aritméticos apurados mediante critérios constantes do próprio título ou de fontes oficiais públicas e objetivamente conhecidas." (REsp 937.082/MG, Rei. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONA QUARTA TURMA, julgado em 18/09/2008, DJe 13/10/2008).
(...) Dessa forma, tratando-se de titulo judicial líquido, cujo valor da condenação não supera 60 (sessenta) salários mínimos, a aplicação do disposto no art. 475, §2º, do CPC é medida que se impõe.
Ademais, apesar de o discurso da autarquia previdenciária normalmente girar em torno do argumento de que defende o interesse público, fato é que sua atuação é restrita à defesa do próprio INSS, e não do interesse público ou da sociedade." (...) (grifei)
Assim, sendo a condenação do INSS fixada em valor inferior a sessenta salários mínimos, a sentença não está sujeita ao reexame obrigatório, de forma que a remessa não deve ser conhecida nesta Corte.
Preliminar de nulidade da sentença
O INSS alegou a nulidade da sentença, porquanto proferida em audiência à qual não puderam comparecer seus procuradores, o que impossibilitou a apresentação de alegações finais.
De acordo com o art. 456 do CPC de 1973, "encerrado o debate ou oferecidos os memoriais, o juiz proferirá a sentença desde logo ou no prazo de 10 (dez) dias" (a mesma regra, com alteração do prazo estabelecido, consta no art. 366 do novo CPC).
Sendo assim, o INSS, devidamente intimado a comparecer à audiência de instrução e julgamento, sujeita-se ao ônus processual acarretado pela ausência de seus procuradores ao ato designado, não havendo desrespeito ao contraditório e à ampla defesa se o magistrado profere sentença em audiência sem oportunizar-lhe a apresentação de memoriais.
Desta forma, tenho que não há nulidade a ser sanada.
Mérito
Aos trabalhadores rurais, ao completarem 60 (sessenta) anos de idade, se homem, ou 55 (cinquenta e cinco), se mulher (Constituição Federal, art. 201, §7°, inciso II; Lei nº 8.213/1991, art. 48, §1°), é garantida a concessão de aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, desde que comprovem o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período, imediatamente anterior ao requerimento, igual ao número de meses correspondentes à carência do benefício (artigos 39, inciso I, e 48, §2°, ambos da Lei de Benefícios). A concessão do benefício independe, pois, de recolhimento de contribuições previdenciárias.
Para a verificação do tempo de atividade rural necessário, considera-se a tabela constante do art. 142 da Lei nº 8.213/1991 para os trabalhadores rurais filiados à Previdência à época da edição desta Lei; para os demais casos, aplica-se o período de 180 (cento e oitenta) meses (art. 25, inciso II). Em qualquer das hipóteses, deve ser levado em conta o ano em que o segurado implementou todas as condições necessárias para a obtenção da aposentadoria, ou seja, idade mínima e tempo de trabalho rural.
Na aplicação dos artigos mencionados, deve-se atentar para os seguintes pontos: a) ano-base para a averiguação do tempo rural; b) termo inicial do período de trabalho rural correspondente à carência; c) termo inicial do direito ao benefício.
No mais das vezes, o ano-base para a constatação do tempo de serviço necessário será aquele em que o segurado completou a idade mínima, desde que até então já disponha de tempo rural suficiente para o deferimento do benefício. Em tais casos, o termo inicial do período a ser considerado como de efetivo exercício de atividade rural, a ser contado retroativamente, é justamente a data do implemento do requisito etário, mesmo se o requerimento administrativo ocorrer em anos posteriores, em homenagem ao princípio do direito adquirido (Constituição Federal, art. 5°, XXXVI; Lei de Benefícios da Previdência Social - LBPS, art. 102, §1°).
Nada impede, entretanto, que o segurado, completando a idade necessária, permaneça exercendo atividade agrícola até a ocasião em que implementar o número de meses suficientes para a concessão do benefício, caso em que tanto o ano-base para a verificação do tempo rural quanto o início de tal período de trabalho, sempre contado retroativamente, será justamente a data da implementação do tempo equivalente à carência.
Exemplificando, se o segurado tiver implementado a idade mínima em 1997 e requerido o benefício na esfera administrativa em 2001, deverá provar o exercício de trabalho rural em um dos seguintes períodos: a) 96 (noventa e seis) meses antes de 1997; b) 120 (cento e vinte) meses antes de 2001, c) períodos intermediários - 102 (cento e dois) meses antes de 1998, 108 (cento e oito) meses antes de 1999, 114 (cento e quatorze) meses antes de 2000.
No caso em que o requerimento administrativo e o implemento da idade mínima tenham ocorrido antes de 31 de agosto de 1994 (data da publicação da Medida Provisória nº 598, que introduziu alterações na redação original do art. 143 da Lei de Benefícios, sucessivamente reeditada e posteriormente convertida na Lei nº 9.063/1995), o segurado deve comprovar o exercício de atividade rural, anterior ao requerimento, por um período de 5 (cinco) anos, ou 60 (sessenta) meses, não se aplicando a tabela do art. 142 da Lei nº 8.213/1991.
A disposição contida nos artigos 39, inciso I, 48, §2° e 143, todos da Lei nº 8.213/1991, no sentido de que o exercício da atividade rural deve ser comprovado no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, deve ser interpretada em favor do segurado. Ou seja, tal regra atende àquelas situações em que ao segurado é mais fácil ou conveniente a comprovação do exercício do trabalho rural no período imediatamente anterior ao requerimento administrativo, mas sua aplicação deve ser temperada em função do disposto no art. 102, §1°, da Lei de Benefícios e, principalmente, em atenção ao princípio do direito adquirido, como visto acima.
Em qualquer caso, o benefício de aposentadoria por idade rural será devido a partir da data do requerimento administrativo. Porém, nas ações ajuizadas antes do julgamento do Recurso Extraordinário nº 631.240/MG (03 de setembro de 2014), na hipótese de ausência de prévio requerimento administrativo, em que restar configurada a pretensão resistida por insurgência do Instituto Nacional do Seguro Social na contestação ou na apelação, ou ainda, quando apresentada a negativa administrativa no curso do processo, utiliza-se a data do ajuizamento da ação como data de entrada do requerimento para todos os efeitos legais.
O tempo de serviço rural pode ser comprovado mediante a produção de prova material suficiente, ainda que inicial, complementada por prova testemunhal idônea - quando necessária ao preenchimento de eventuais lacunas - não sendo esta admitida exclusivamente, a teor do art. 55, §3°, da Lei nº 8.213/1991, e Súmula 149 do STJ. Embora o art. 106 da Lei de Benefícios relacione os documentos aptos a essa comprovação, tal rol não é exaustivo, sendo certa a possibilidade de o segurado valer-se de provas diversas das ali elencadas. Não se exige prova plena da atividade rural de todo o período correspondente à carência, de forma a inviabilizar a pretensão, mas um início de documentação que, juntamente com a prova oral, possibilite um juízo de valor seguro acerca dos fatos que se pretende comprovar.
A respeito do trabalhador rurícola boia-fria, o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp. nº 1.321.493-PR, recebido como recurso representativo da controvérsia, traçou as seguintes diretrizes:
RECURSO ESPECIAL. MATÉRIA REPETITIVA. ART. 543-C DO CPC E RESOLUÇÃO STJ 8/2008. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. SEGURADO ESPECIAL. TRABALHO RURAL. INFORMALIDADE. BOIAS-FRIAS. PROVA EXCLUSIVAMENTE TESTEMUNHAL. ART. 55, § 3º, DA LEI 8.213/1991. SÚMULA 149/STJ. IMPOSSIBILIDADE. PROVA MATERIAL QUE NÃO ABRANGE TODO O PERÍODO PRETENDIDO. IDÔNEA E ROBUSTA PROVA TESTEMUNHAL. EXTENSÃO DA EFICÁCIA PROBATÓRIA. NÃO VIOLAÇÃO DA PRECITADA SÚMULA.
1. Trata-se de Recurso Especial do INSS com o escopo de combater o abrandamento da exigência de produção de prova material, adotado pelo acórdão recorrido, para os denominados trabalhadores rurais boias-frias.
2. A solução integral da controvérsia, com fundamento suficiente, não caracteriza ofensa ao art. 535 do CPC.
3. Aplica-se a Súmula 149/STJ ("A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeitos da obtenção de benefício previdenciário") aos trabalhadores rurais denominados "boias-frias", sendo imprescindível a apresentação de início de prova material.
4. Por outro lado, considerando a inerente dificuldade probatória da condição de trabalhador campesino, o STJ sedimentou o entendimento de que a apresentação de prova material somente sobre parte do lapso temporal pretendido não implica violação da Súmula 149/STJ, cuja aplicação é mitigada se a reduzida prova material for complementada por idônea e robusta prova testemunhal.
5. No caso concreto, o Tribunal a quo, não obstante tenha pressuposto o afastamento da Súmula 149/STJ para os "boias-frias", apontou diminuta prova material e assentou a produção de robusta prova testemunhal para configurar a recorrida como segurada especial, o que está em consonância com os parâmetros aqui fixados.
6. Recurso Especial do INSS não provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução 8/2008 do STJ. (grifo nosso)
No referido julgamento, o Superior Tribunal de Justiça manteve decisão proferida pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região que concedeu aposentadoria por idade rural a segurado que, tendo completado a idade necessária à concessão do benefício em 2005 (sendo, portanto, o período equivalente à carência de 1993 a 2005), apresentou, como prova do exercício da atividade agrícola, sua carteira de trabalho (CTPS), constando vínculo rural no intervalo de 01 de junho de 1981 a 24 de outubro de 1981, entendendo que o documento constituía início de prova material.
Ainda no que concerne à comprovação da atividade laborativa do rurícola, é tranquilo o entendimento do Superior Tribunal de Justiça pela possibilidade da extensão da prova material em nome de um cônjuge ao outro. Todavia, também é firme a jurisprudência que estabelece a impossibilidade de estender a prova em nome do consorte que passa a exercer trabalho urbano.
Esse foi o posicionamento adotado pelo Tribunal Superior no julgamento do REsp. nº 1.304.479-SP, apreciado sob o rito dos recursos repetitivos, cujo acórdão transcrevo:
RECURSO ESPECIAL. MATÉRIA REPETITIVA. ART. 543-C DO CPC E RESOLUÇÃO STJ 8/2008. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. TRABALHO RURAL. ARTS. 11, VI, E 143 DA LEI 8.213/1991. SEGURADO ESPECIAL. CONFIGURAÇÃO JURÍDICA. TRABALHO URBANO DE INTEGRANTE DO GRUPO FAMILIAR. REPERCUSSÃO. NECESSIDADE DE PROVA MATERIAL EM NOME DO MESMO MEMBRO. EXTENSIBILIDADE PREJUDICADA.
1. Trata-se de Recurso Especial do INSS com o escopo de desfazer a caracterização da qualidade de segurada especial da recorrida, em razão do trabalho urbano de seu cônjuge, e, com isso, indeferir a aposentadoria prevista no art. 143 da Lei 8.213/1991.
2. A solução integral da controvérsia, com fundamento suficiente, não evidencia ofensa ao art. 535 do CPC.
3. O trabalho urbano de um dos membros do grupo familiar não descaracteriza, por si só, os demais integrantes como segurados especiais, devendo ser averiguada a dispensabilidade do trabalho rural para a subsistência do grupo familiar, incumbência esta das instâncias ordinárias (Súmula 7/STJ).
4. Em exceção à regra geral fixada no item anterior, a extensão de prova material em nome de um integrante do núcleo familiar a outro não é possível quando aquele passa a exercer trabalho incompatível com labor rurícola, como o de natureza urbana.
5. No caso concreto, o Tribunal de origem considerou algumas prova em nome do marido da recorrida, que passou a exercer atividade urbana, mas estabeleceu que fora juntada prova material em nome desta e período imediatamente anterior ao implemento do requisito etário e em lapso suficiente ao cumprimento da carência, o que está e conformidade com os parâmetros estabelecidos na presente decisão.
6. Recurso Especial do INSS não provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução 8/2008 do STJ. (Grifo nosso).
Fixados os parâmetros de valoração da prova, passo ao exame da situação específica dos autos.
Caso concreto
A parte autora implementou o requisito etário em 06 de janeiro de 2012 (fl. 17) e requereu o benefício na via administrativa em 16 de março de 2012 (fl. 16). Assim, deve comprovar o efetivo exercício de atividades agrícolas nos 180 (cento e oitenta) meses anteriores ao implemento de qualquer dos requisitos, mesmo que de forma descontínua.
Para fins de constituição de início de prova material, a ser complementada por prova testemunhal idônea, a parte autora apresentou documentos, dentre os quais se destacam:
a) certidão do seu casamento, em 16/08/1975, com Artemio Bonavigo, qualificado como agricultor (fl. 18);
b) contrato particular de parceria rural, em que Evandro Luiz Paludo cede a Artemio Bonavigo área para cultivo no período de 31/08/1991 a 31/07/1992 (fl. 19);
c) contrato particular de compromisso de entrega firmado em 28/06/1991, em razão do qual Artemio Bonavigo "deverá entregar [...] cento e vinte [ilegível] sacas de milho" (fl. 20);
d) contrato particular em que Erni Araldi cede a Artemio Bonavigo área de 128.526 m2 "para residir e trabalhar" no período de 2 anos a contar da assinatura [documento incompleto] (fl. 21);
e) contrato particular de parceria agrícola, em que Inácio Atmar Ames ("parceiro proprietário") cede a Artemio Bonavigo ("parceiro agricultor") área de 2 hectares para plantio de milho pelo período de 1 ano (término em 26/06/2007) (fl. 22);
f) contrato particular de comodato firmado entre Américo Daniel Cosmann (comodante) e Artemio Bonavigo (comodatário), tendo por objeto área de 2 hectares para exploração agrícola no período de 23/03/2011 a 23/03/2012 (fl. 23);
g) notas de venda de produção agrícola em nome de Artemio Bonavigo no período de 2010 a 2012 (fls. 29-32);
h) históricos escolares de filhos da autora em escolas estaduais do interior de Santa Catarina (fls. 51-54);
i) declarações de Osvaldino Correa dos Reis e Ivanor José Kiesel, perante o INSS, a respeito do trabalho da autora (fls. 55-56);
j) documentos referentes a romaneio de carga (milho), por Artemio Bonavigo, no período de 2003 a 2004 (fls. 25-26);
k) nota fiscal e contrato de compra de sementes de milho por Artemio Bonavigo em 2008 (fls. 27-28);
l) certidão do nascimento, em 17/12/1976, de Melânia Teresinha Bonavigo, filha da autora e seu cônjuge (qualificado como agricultor) (fl. 34);
m) certidão do nascimento, em 15/08/1981, de Eliseu Bonavigo, filho da autora e seu cônjuge (qualificado como agricultor) (fl. 35);
n) termo de depoimento pessoal de Artemio Bonavigo em ação que promoveu contra o INSS (Processo nº 017.09.002326-5) (fl. 61) e termo de inquirição de Valdemar Caetano Constancio (fl. 63) e Erni Arldi (fl. 64);
o) sentença da ação promovida por Artemio Bonavigo contra o INSS (fls. 65-67).
De acordo com as diretrizes traçadas pelo Superior Tribunal de Justiça (REsp. nº 1.304.479-SP, representativo de controvérsia), os documentos juntados aos autos constituem início razoável de prova material.
Em consulta ao Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS e ao sistema Plenus/INSS, conforme pesquisas que acompanham este voto, observa-se que a autora não possui registro de vínculos empregatícios, fortalecendo-se a indicação de que, de fato, sobrevive unicamente das lidas rurais.
É beneficiária de pensão por morte com valor atual de R$945,30 , que teve como instituidor seu filho Eliseu Bonavigo (NB 21/1601047689; DIB: 05/05/2009; DDB: 11/07/2013). Observa-se que a concessão deste benefício decorreu de decisão judicial (Apelação Cível nº 0021692-62.2012.404.9999/SC), e a implantação ocorreu em 2013, razão pela qual não constitui óbice à concessão da aposentadoria por idade, tendo em vista que não afastou a necessidade do trabalho rural no período correspondente à carência (1997 a 2012). A autora percebe, ainda, aposentadoria por idade rural implantada em razão da determinação contida na sentença proferida nestes autos (NB 41/1598691047; DIB: 16/03/2012; DDB: 30/11/2012).
O cônjuge da autora, por sua vez, percebe aposentadoria por idade rural implantada em 2012, com valor de um salário mínimo (NB 1600954437; DIB 31/08/2009; DDB 06/07/2012).
A entrevista rural realizada pelo INSS, em 16/03/2012, para instrução do requerimento administrativo (fls. 37-38) registra: "[pretende] comprovar atividade rural em regime de economia familiar no período de 180 meses em terras de terceiros localizadas no interior de Palma Sola, SC, e interior de Salgado Filho, PR, informa que os vizinhos se chamam João Siqueira, Vilmo Constâncio, que faz 1 mês em que está nas terras do seu cunhado, antes residiu 14 anos em Palma Sola, SC, no interior, o endereço urbano declara que pertence a sua filha"; "declara que sempre foi agricultora, que seu marido também sempre foi agricultor, que nunca se afastaram da atividade rural, que nas entre-safras fazem algum serviço para terceiros"; "informa que nunca teve terras próprias, que está há 30 dias em uma propriedade do cunhado, que antes estava residindo em Palma Sola, SC, onde sempre trabalhou [sic] como arrendatários em diferentes propriedades, Erni Araldi, Américo Cosma, Dico Ramos, Ademar Hames, que já residiu na zona urbana na casa da sua filha, que parava por dois, três meses, que nas terras do sr. Dico Ramos ficou duas vezes, uma durante 4 anos e outra 3 anos, nas terras do sr. Ademar Hames durante 2 anos cuidando de uma chácara, nas terras do sr. Américo Cosma parou uma vez 3 anos e outra 2 anos, que nem sempre fazia contrato, que plantavam manualmente e com junta de bois, pagavam uma porcentagem do que produziam, o seu marido na maioria dos períodos trabalhava junto, que nunca teve empregados assalariados nas terras, que algumas vezes os proprietários pegavam diaristas para trabalhar nas propriedades"; "residiam nas terras a requerente, seu marido e os filhos, os filhos foram saindo cedo de casa, que nenhum deles trabalha na agricultura, que o trabalho é feito pela requerente atualmente pois o marido está doente, antes o mesmo ajudava"; "que eram vendidos milho, feijão, comercializavam na Cooperativa de Palma Sola, e outros comércios da cidade, quem fazia a venda era seu marido sendo pago frete"; "a fonte de renda era proveniente da venda dos grãos e dos dias que trabalhavam para terceiros"; "informa que tinha contrato porém as notas eram tiradas em nome dos proprietários da terra, que faziam contrato porém não tinham bloco de produtor rural, que os contratos não foram registrados pois não sabiam, que nunca tiveram terras próprias nem imóvel urbano, que possuem um automóvel"; "que hoje está nas terras do cunhado para cuidar do mesmo que está doente, não fez contrato, que nunca trabalhou como diarista na cidade de Palma Sola, SC."
Na audiência de instrução e julgamento, realizada em 19/11/2012, foram ouvidas duas testemunhas (fls. 111-114), as quais confirmaram o trabalho rural da parte autora no período correspondente à carência, mencionando as propriedades em que desempenhou atividade agrícola e as culturas laboradas.
A testemunha Osvaldino Correa dos Reis declarou conhecer a autora há mais de 30 anos. Disse que a autora sempre foi agricultora, e que, juntamente com seu cônjuge, plantava feijão, milho, arroz e soja. Informou que a agricultura era a única fonte de renda da autora. Questionada, a testemunha informou não ter conhecimento de que a autora tenha trabalhado no meio urbano. Declarou que recentemente a autora "trabalhou na casa de uma pessoa, cuidando ele", mas mesmo neste período não se afastou das tarefas da lavoura.
A testemunha Ivanor José Kiesel declarou que conhece a família da autora há oito anos. Disse que a autora sempre foi agricultora, e que, juntamente com seu cônjuge, plantava arroz, mandioca, soja e milho. Informou que a agricultura era a única fonte de renda da autora. Questionada, a testemunha informou que a autora nunca trabalhou no meio urbano.
A prova testemunhal, portanto, é precisa e convincente da atividade rural da parte autora, na condição de segurada especial, no período de carência legalmente exigido.
Considerando a alegação do INSS, à fl. 121, quanto à existência de comprovante de endereço no município de Salgado Filho/PR (fl. 36), ressalto que tal documento não contraria as informações prestadas pela autora na entrevista rural realizada em 16/03/2012: "[pretende] comprovar atividade rural em regime de economia familiar no período de 180 meses em terras de terceiros localizadas no interior de Palma Sola, SC, e interior de Salgado Filho, PR [...], que faz 1 mês em que está nas terras do seu cunhado, antes residiu 14 anos em Palma Sola, SC, no interior, o endereço urbano declara que pertence a sua filha"; "informa que nunca teve terras próprias, que está há 30 dias em uma propriedade do cunhado, que antes estava residindo em Palma Sola, SC, onde sempre trabalhou [sic] como arrendatários em diferentes propriedades".
O INSS alegou ainda, em contestação e no recurso em análise, que "em agosto de 2009, por ocasião do requerimento de sua aposentadoria perante a APS de São Miguel Oeste/SC, o marido da autora afirmou que ela não mais exercia a atividade rural há quatro anos", e que "outra testemunha afirmou que a autora estava afastado da lida agrícola há oito meses" (fls. 121-122).
Tais informações, contudo, não foram confirmadas pelas testemunhas inquiridas na audiência judicial. A testemunha Osvaldino Correa dos Reis declarou, inclusive, que recentemente a autora "trabalhou na casa de uma pessoa, cuidando ele", mas mesmo neste período não se afastou das tarefas da lavoura.
Ressalto que, existindo conflito entre as provas colhidas na esfera administrativa e em juízo, como na hipótese, deve-se optar, em princípio, por estas últimas, as quais são produzidas com todas as cautelas legais, garantindo a imparcialidade e o contraditório. Dispondo de elementos que pudessem dificultar a pretensão da parte autora, caberia ao INSS judicializar a prova administrativa, de forma a emprestar-lhe maior valor probante, ônus do qual não logrou se desincumbir. Além disso, o INSS apresentou, na contestação (fl. 91) e na apelação (fl. 122), apenas transcrição parcial do relatório feito pelo servidor responsável pela tomada do depoimento do cônjuge da autora em entrevista administrativa na APS de São Miguel do Oeste/SC.
Não obstante, não sendo possível identificar com precisão eventual período em que a autora teria interrompido o exercício das atividades rurais, torna-se necessário verificar se a descontinuidade do labor rural autorizaria ou não a concessão do benefício requerido.
É certo que, para a concessão do benefício de aposentadoria por idade rural, os artigos 39, inciso I, e 143, ambos da Lei de Benefícios determinam que o trabalhador rural deverá comprovar o efetivo exercício da atividade, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ou número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício.
A legislação previdenciária exige, portanto, que o segurado seja efetivamente trabalhador rural no momento do implemento das condições, não se admitindo a benesse a quem não retornou às lides agrícolas ou se afastou por longo tempo. Segundo entendimento já consolidado no âmbito do STJ, inclusive sob o regime de julgamento de recurso repetitivo, à aposentadoria por idade rural não contributiva prevista nos artigos 143 e 39, I, da Lei 8213/91, não se aplica o artigo 3º, § 1º, da Lei 10.666/03:
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL.
COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE RURAL NO PERÍODO IMEDIATAMENTE ANTERIOR AO REQUERIMENTO. REGRA DE TRANSIÇÃO PREVISTA NO ARTIGO 143 DA LEI 8.213/1991. REQUISITOS QUE DEVEM SER PREENCHIDOS DE FORMA CONCOMITANTE. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
1. Tese delimitada em sede de representativo da controvérsia, sob a exegese do artigo 55, § 3º combinado com o artigo 143 da Lei 8.213/1991, no sentido de que o segurado especial tem que estar laborando no campo, quando completar a idade mínima para se aposentar por idade rural, momento em que poderá requerer seu benefício. Se, ao alcançar a faixa etária exigida no artigo 48, § 1º, da Lei 8.213/1991, o segurado especial deixar de exercer atividade rural, sem ter atendido a regra transitória da carência, não fará jus à aposentadoria por idade rural pelo descumprimento de um dos dois únicos critérios legalmente previstos para a aquisição do direito. Ressalvada a hipótese do direito adquirido em que o segurado especial preencheu ambos os requisitos de forma concomitante, mas não requereu o benefício.
2. Recurso especial do INSS conhecido e provido, invertendo-se o ônus da sucumbência. Observância do art. 543-C do Código de Processo Civil.
(REsp 1354908/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 09/09/2015, DJe 10/02/2016)
Outrossim, a lei em tela admite a descontinuidade do tempo de serviço rural, sendo certo que, pelo menos durante o período da manutenção da qualidade de segurado previsto no artigo 15, II, §§ 1º e 2º, da Lei nº 8.213/91, é possível considerar o afastamento das atividades sem configurar o abandono do meio rurícola. Para os demais casos, deve ser valorada a vocação rural, caso a caso.
Havendo elementos concretos evidenciando que o retorno ao ambiente campesino se deu com o intuito de retomada da atividade rural como fonte de subsistência, e não apenas para se valer da condição de segurado especial às vésperas do protocolo do pedido de aposentadoria por idade, é que poderá ser admitida a descontinuidade nos termos acima propostos. Exige-se, assim, um período de tempo razoável entre o retorno e o requerimento capazes de resgatar sua origem/identidade campesina.
Deve ser observado todo o período contributivo do segurado, de modo a qualificá-lo efetivamente como trabalhador rural e não urbano, vocacionado às lides agrícolas, justificando, dessa maneira, a redução do requisito etário.
À vocação rural pode-se também agregar o preenchimento da regra prevista no artigo 24, parágrafo único, da Lei 8213/91, no sentido de que, havendo interrupção do labor rurícola no período da carência, o segurado comprove, após o seu retorno, pelo menos um terço do período total necessário para o implemento do benefício, o qual, somado ao intervalo anterior, seja suficiente ao seu deferimento. Este critério objetivo no período de carência parece razoável para embasar a preponderante inclinação agrícola do trabalhador.
De outra parte, inexistindo demonstração da efetiva retomada do trabalho rural, nada impede que o segurado venha a postular a aposentadoria com a utilização do tempo rural e/ou urbano. Porém, os requisitos a serem preenchidos serão diversos, conforme previsão do artigo 48, §§ 3 e 4º, da Lei 8213/91.
Por fim, vale referir recente julgado desta Turma (APELAÇÃO CÍVEL Nº 0004303-93.2014.404.9999, 6ª TURMA, Juíza Federal MARINA VASQUES DUARTE DE BARROS FALCÃO, POR UNANIMIDADE, D.E. 08/03/2017, PUBLICAÇÃO EM 09/03/2017) que admitiu a descontinuidade do trabalho rural por 4 (quatro) anos e 1 (um) mês no período de carência, sem prejuízo do reconhecimento da vocação às atividades rurais e consequente concessão do benefício.
Tendo em vista tais premissas, passo a analisar a situação dos autos.
A autora deve comprovar o efetivo exercício de atividades agrícolas no período de 1997 a 2012.
De acordo com a alegação do INSS, haveria indicação de que a autora não teria exercido atividade rural nos últimos 4 anos ou nos últimos 8 meses contados, retroativamente, de agosto de 2009.
No entanto, com as ressalvas feitas anteriormente às alegações do INSS, é possível concluir que, ainda que restasse comprovada a interrupção do trabalho rural no referido período de 4 anos, a parte autora comprova a sua vocação aos trabalhos rurais, pois em sua grande maioria, no período de carência, exerceu tal atividade.
O conjunto probatório, portanto, demonstra o exercício da atividade rural desde longa data (com eventual descontinuidade) até, no mínimo, a ocasião em que requerido o benefício perante o INSS.
Assim, havendo a autora completado 55 (cinquenta e cinco) anos em 06 de janeiro de 2012 (fl. 17) e demonstrado o efetivo exercício de atividade rural por período superior a 180 (cento e oitenta) meses, contados, retroativamente, de 2012, é devido o benefício de aposentadoria por idade rural a partir da data do requerimento administrativo (16 de março de 2012).
Antecipação de tutela
Mantida a antecipação da tutela, já tendo o INSS implantado o benefício em favor da parte autora (conforme informações do sistema Plenus/INSS, cuja pesquisa acompanha este voto).
Conclusão
Preliminar de nulidade da sentença afastada.
A remessa oficial não deve ser conhecida.
O apelo da autarquia resta improvido.
Mantida a antecipação da tutela.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por não conhecer da remessa oficial e negar provimento à apelação do INSS, mantida a antecipação dos efeitos da tutela.
Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE
Relatora
Documento eletrônico assinado por Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8880405v29 e, se solicitado, do código CRC 30BDFB77. | |
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APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0011517-38.2014.4.04.9999/PR
RELATORA | : | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | LURDES APARECIDA BONAVIGO |
ADVOGADO | : | Rosalina Sacrini Pimentel |
REMETENTE | : | JUIZO DE DIREITO DA 1A VARA DA COMARCA DE BARRACAO/PR |
VOTO-VISTA
Pedi vista para melhor analisar a situação fática retratada pela eminente Relatora e, após avaliar o conjunto probatório, voto por acompanhar a conclusão adotada.
Isto porque a questão atinente à descontinuidade foi referida de forma hipotética, uma vez que, a despeito de o INSS alegar, fazendo referência a depoimento prestado pelo cônjuge da requerente, de que a mesma havia se afastado há quatro anos da atividade rural, não há prova efetiva de que tenha se consumado tal afastamento.
Ao revés, pois o depoimento contido nas fls. 61-62 dos autos, consistente no depoimento pessoal prestado pelo marido da autora em 12/08/2010, faz referência de que o afastamento da requerente ocorreu por questão de capacidade laboral, uma vez que o depoente admitiu que sua esposa, "quando 'estava boa' ajudava na lida da lavoura", não fazendo referência ao período em que já se encontrava afastada.
Assim, voto no sentido de acompanhar a conclusão registrada no voto da Relatora, reconhecendo o direito da requerente à concessão do benefício de aposentadoria por idade rural desde a data do requerimento administrativo.
Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 19/04/2017
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0011517-38.2014.4.04.9999/PR
ORIGEM: PR 00018708320128160052
RELATOR | : | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
PRESIDENTE | : | Desembargadora Federal Vânia Hack de Almeida |
PROCURADOR | : | Procuradora Regional da República Solange Mendes de Souza |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | LURDES APARECIDA BONAVIGO |
ADVOGADO | : | Rosalina Sacrini Pimentel |
REMETENTE | : | JUIZO DE DIREITO DA 1A VARA DA COMARCA DE BARRACAO/PR |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 19/04/2017, na seqüência 586, disponibilizada no DE de 03/04/2017, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
APÓS O VOTO DA DES. FEDERAL SALISE MONTEIRO SANCHOTENE NO SENTIDO DE NÃO CONHECER DA REMESSA OFICIAL E NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS, MANTIDA A ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA, PEDIU VISTA A DESEMBARGADORA FEDERAL VÂNIA HACK DE ALMEIDA. AGUARDA O DESEMBARGADOR FEDERAL JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA.
PEDIDO DE VISTA | : | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
Gilberto Flores do Nascimento
Diretor de Secretaria
Documento eletrônico assinado por Gilberto Flores do Nascimento, Diretor de Secretaria, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8951202v1 e, se solicitado, do código CRC CE4DC23F. | |
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 31/05/2017
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0011517-38.2014.4.04.9999/PR
ORIGEM: PR 00018708320128160052
RELATOR | : | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
PRESIDENTE | : | Desembargadora Federal Vânia Hack de Almeida |
PROCURADOR | : | Procurador Regional da República Maurício Pessutto |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | LURDES APARECIDA BONAVIGO |
ADVOGADO | : | Rosalina Sacrini Pimentel |
REMETENTE | : | JUIZO DE DIREITO DA 1A VARA DA COMARCA DE BARRACAO/PR |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 31/05/2017, na seqüência 91, disponibilizada no DE de 15/05/2017, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
PROSSEGUINDO NO JULGAMENTO, APÓS O VOTO-VISTA APRESENTADO PELA DESEMBARGADORA FEDERAL VÂNIA HACK DE ALMEIDA, ACOMPANHANDO A RELATORA, E DO VOTO DO DESEMBARGADOR FEDERAL JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA,NO MESMO SENTIDO, A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NÃO CONHECER DA REMESSA OFICIAL E NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS, MANTIDA A ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
VOTO VISTA | : | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
Gilberto Flores do Nascimento
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