Apelação Cível Nº 5027632-73.2019.4.04.9999/SC
RELATOR: Juiz Federal HERMES SIEDLER DA CONCEIÇÃO JÚNIOR
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: IARA FRANCO PIRES
RELATÓRIO
Trata-se de apelação em face de sentença prolatada em 30/04/2019 que julgou o pedido de cancelamento dos descontos, cujo dispositivo reproduzo a seguir:
Ante o exposto, com fulcro no artigo 487, I, do CPC, JULGOPARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados por Iara Franco Pires contra o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS para DETERMINAR o cancelamento dos descontos no valor de R$ 344,07 (rubrica 203 - fl. 03) efetuados no benefício previdenciário da parte autora e CONDENAR o réu à devolução dos valores indevidamente descontados do referido benefício, a partir de novembro de 2015.
Tocante aos consectários legais, diante do recente julgamento do Recurso Extraordinário n. 870947, em 20/09/2017, pelo Tribunal Pleno, em relação aos juros moratórios, sobre os débitos de natureza não-tributária, aplica-se o art. 1ºF da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, isto é, segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança, a partir da citação. Referente à atualização monetária, aplica-se o IPCA-E, até o efetivo pagamento
Tendo em conta que a parte autora decaiu de parte mínima do pedido,
condeno o réu ao pagamento da metade das custas processuais (art. 33, § 1°, LCE156/1997) e de honorários advocatícios, os quais fixo em 10% (dez por cento) sobre as parcelas vencidas até a publicação desta sentença (Súmula 111, STJ), considerando que, na hipótese, a condenação não ultrapassará 200 salários mínimos, nos termos do art. 85, § 3º, inciso I, do Código de Processo Civil. Em que pese a iliquidez da sentença, constata-se que a condenação não ultrapassará o valor de 1.000 (mil) salários mínimos, razão pela qual deixo de submetê-la ao reexame necessário (art. 496, § 3º, I, do CPC).
A Autarquia Previdenciária alegou, em apertada síntese, que os descontos são devidos, considerando que a parte autora titulou indevidamente o benefício assistencial, pelo fato de seu esposo receber aposentadoria por tempo de serviço em desacordo com o art. 20 da Lei 8.742/93, alterada pela Lei 12.435/2011. Pugnou pela reforma da sentença e, alternativamente, que seja observada a sistemática da Lei 11.960/09 para correção de eventuais prestações devidas pelo INSS.
Oportunizada as contrarrazões, vieram os autos para julgamento.
É o relatório.
VOTO
Juízo de admissibilidade
A apelação preenche os requisitos legais de admissibilidade.
Caso concreto
A autora Iara Franco Pires ajuizou a presente "ação de cobrança" em face do INSS, que passou a efetuar descontos no valor de R$ 344,07 de seu benefício previdenciário, a partir de novembro de 2015, alegadamente em função de ter titulado de forma irregular benefício assistencial.
A controvérsia cinge-se a legalidade dos referidos descontos efetuados pelo INSS no benefício da autora.
A sentença deve ser mantida por seus próprios fundamentos:
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A autarquia previdenciária, contudo, nada trouxe aos autos a demonstrar a irregularidade na percepção do citado benefício assistencial pela parte autora e, consequentemente, a legitimidade da cobrança efetuada. Os documentos apresentados com a contestação (fls. 15/18), diga-se, não mencionam quaisquer dos motivos aventados pela parte ré para a efetivação dos descontos no valor de R$ 344,07 impugnados pela parte autora. Neste ponto, destaco que a decisão de fls. 24/25 inverteu o ônus da prova, tendo em conta a distribuição dinâmica prevista no art. 373, §1º do CPC e o fato de que o réu é quem possui os meios para obtenção das provas necessárias, bem como determinou sua intimação à apresentação do processo administrativo que autorizou o referido desconto, em relação à qual o órgão previdenciário quedou-se inerte...
Assim, dada a inexistência de comprovação, pela parte ré, da regularidade da cobrança efetuada no valor de R$ 344,07 (rubrica 203 - fl. 03) no benefício previdenciário percebido pela parte autora, a pretensão deduzida na inicial de cancelamento dos descontos e devolução dos valores indevidamente cobrados merece ser acolhida.
Acrescento, por fim, que "Não há falar de restituição em dobro dos valores indevidamente descontados pelo INSS de benefício previdenciário visto que inexiste previsão nesse sentido na Lei nº 8.213/91, sendo incabível a aplicação do Código de Defesa do Consumidor (art. 42, parágrafo único, da Lei nº 8.078/90), por não se tratar de relação de consumo". (TRF4 5002558-26.2011.4.04.7112, QUINTATURMA, Relator ROGERIO FAVRETO, juntado aos autos em 28/02/2012).
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Ademais, da análise dos autos verifico que não há indícios de que o benefício assistencial tenha sido recebido de forma irregular, pois o INSS apenas faz menção ao fato de que o esposo da autora titulava benefício de aposentadoria de valor em torno de um salário mínimo e meio.
Ora, este argumento, por si só, não lastreia a decisão do INSS em iniciar descontos no benefício de pensão por morte da autora. Desconsidera a autarquia previdenciária que a situação de vulnerabilidade social é aferida não apenas com base na renda familiar, que não deve ser considerada a única forma de se comprovar que a pessoa não possui outros meios para prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família. Deverá ser analisado o contexto socioeconômico em que o(a) autor(a) se encontra inserido(a).
Nessa quadra, totalmente indevido os descontos efetuados no benefício de pensão por morte da autora, devendo cessar imediatamente, restituindo aquilo que já fora descontado.
Não há que se falar em restituição em dobro pelos fundamentos esboçados na sentença.
Nessa esteira, a decisão recorrida que determinou que o INSS cessasse os descontos mensais na Pensão por Morte NB155.773.217-2, pagando à parte autora os valores descontados deste benefício a título de repetição de indébito relativo ao benefício NB 5520768168, merece ser mantida hígida.
Dos consectários
Segundo o entendimento das Turmas previdenciárias do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, estes são os critérios aplicáveis aos consectários:
Correção Monetária
Após o julgamento, pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal, em regime de repercussão geral, do Tema 810 (RE 870.947), e dos embargos de declaração opostos contra a decisão, rejeitados e com afirmação de inexistência de modulação de efeitos, deve a atualização monetária obedecer ao Tema 905 do Superior Tribunal de Justiça, que estabelece para as condenações judiciais de natureza previdenciária o que segue:
As condenações impostas à Fazenda Pública de natureza previdenciária sujeitam-se à incidência do INPC, para fins de correção monetária, no que se refere ao período posterior à vigência da Lei 11.430/2006, que incluiu o art. 41-A na Lei 8.213/91. Assim, a correção monetária das parcelas vencidas dos benefícios previdenciários será calculada conforme a variação dos seguintes índices, que se aplicam conforme a incidência ao período compreendido na condenação o IGP-DI, (de 5/1996 a 3/2006 (artigo 10 da Lei 9.711/1998, combinado com o artigo 20, §§5º e 6º, da Lei 8.880/1994), e o INPC a partir de 4/2006 (artigo 41-A da Lei 8.213/1991).
O Superior Tribunal de Justiça (REsp 149146) - a partir da decisão do STF e levando em conta que o recurso paradigma que originou o precedente tratava de condenação da Fazenda Pública ao pagamento de débito de natureza não previdenciária (benefício assistencial) - distinguiu os créditos de natureza previdenciária para estabelecer que, tendo sido reconhecida a inconstitucionalidade da TR como fator de atualização, deveria voltar a incidir, em relação a eles, o INPC, que era o índice que os reajustava à edição da Lei n. 11.960/2009.
É importante registrar que os índices em questão (INPC e IPCA-E) tiveram variação praticamente idêntica no período transcorrido desde 7-2009 até 9-2017 (mês do julgamento do RE n. 870.947): 64,23% contra 63,63%. Assim, a adoção de um ou outro índice nas decisões judiciais já proferidas não produzirá diferenças significativas sobre o valor da condenação.
A conjugação dos precedentes acima resulta na aplicação, a partir de 4-2006, do INPC aos benefícios previdenciários e o IPCA-E aos de natureza assistencial.
Dou provimento à apelação do INSS em relação ao ponto.
Juros moratórios
No que pertine aos juros de mora, deverão incidir a contar da citação (Súmula 204 do STJ), na taxa de 1% (um por cento) ao mês, até 29/06/2009. A partir de 30 de junho de 2009, os juros moratórios serão computados, uma única vez (sem capitalização), segundo percentual aplicável à caderneta de poupança, conforme Lei 11.960/2009, que deu nova redação ao artigo 1º-F da Lei 9.494/1997, considerado constitucional pelo STF (RE 870.947, com repercussão geral).
A partir de 9/12/2021, para fins de atualização monetária e juros de mora, deve ser observada a redação dada ao artigo 3º da EC 113/2021, a qual estabelece que haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), acumulado mensalmente.
Honorários advocatícios
Tratando-se de sentença publicada já na vigência do novo Código de Processo Civil, aplicável o disposto em seu art. 85 quanto à fixação da verba honorária.
No tocante ao cabimento da majoração de que trata o §11 do art. 85 do CPC/2015, assim decidiu a Segunda Seção do STJ, no julgamento do AgInt nos EREsp nº 1.539.725-DF (DJe de 19-10-2017):
É devida a majoração da verba honorária sucumbencial, na forma do art. 85, §11, do CPC/2015, quando estiverem presentes os seguintes requisitos, simultaneamente:
a) vigência do CPC/2015 quando da publicação da decisão recorrida, ou seja, ela deve ter sido publicada a partir de 18/03/2016;
b) não conhecimento integralmente ou desprovimento do recurso, monocraticamente ou pelo órgão colegiado competente;
c) existência de condenação da parte recorrente ao pagamento de honorários desde a origem no feito em que interposto o recurso.
No caso concreto, não estão preenchidos todos os requisitos acima elencados, sendo indevida, portanto, a majoração de que trata o §11 do art. 85 do CPC/2015. Mantidos como fixados.
Custas processuais
O INSS é isento do pagamento das custas no Foro Federal (artigo 4, inciso I, da Lei 9.289/1996) e na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul, devendo, contudo, pagar eventuais despesas processuais, como as relacionadas a correio, publicação de editais e condução de oficiais de justiça (artigo 11 da Lei Estadual 8.121/1985, com a redação da Lei Estadual 13.471/2010, já considerada a inconstitucionalidade formal reconhecida na ADIN 70038755864, julgada pelo Órgão Especial do TJ/RS); para os feitos ajuizados a partir de 2015 é isento o INSS da taxa única de serviços judiciais, na forma do estabelecido na lei estadual 14.634/2014 (artigo 5º). Tais isenções não se aplicam quando demandado na Justiça Estadual do Paraná (Súmula 20 do TRF4), devendo ser ressalvado, ainda, que no Estado de Santa Catarina (artigo 33, parágrafo único, da Lei Complementar Estadual 156/1997), a Autarquia responde pela metade do valor.
Conclusão
Dar parcial provimento à apelação do INSS no que se refere ao índice de correção monetária. Manter os honorários advocatícios como fixados.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento à apelação do INSS.
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APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: IARA FRANCO PIRES
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. Pensão por morte. Benefício assistencial. devolução de valores descontados pelo INSS. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA.
1. Na hipótese, não há indícios de que o benefício assistencial tenha sido recebido de forma irregular pela autora. Não houve sobreposição de benefício assistencial e pensão por morte.
2. O INSS faz menção ao fato de que o esposo da autora titulava benefício de aposentadoria de valor em torno de um salário mínimo e meio, que motivou os descontos. Este argumento, por si só, não lastreia a decisão do INSS em iniciar descontos no benefício de pensão por morte da autora.
3. Autarquia Previdenciária desconsiderou que a situação de vulnerabilidade social é aferida não apenas com base na renda familiar, que não deve ser considerada a única forma de se comprovar que a pessoa não possui outros meios para prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família. Deverá ser analisado o contexto socioeconômico em que o(a) autor(a) se encontra inserido(a).
4. Nessa quadra, totalmente indevido os descontos efetuados no benefício de pensão por morte da autora, devendo cessar imediatamente cessado e restituindo aquilo que já fora descontado.
5. A utilização da TR como índice de correção monetária dos débitos judiciais da Fazenda Pública (Lei 11.960/09) foi afastada pelo STF no RE 870947, com repercussão geral, confirmado no julgamento de embargos de declaração por aquela Corte, sem qualquer modulação de efeitos. O STJ, no REsp 1495146, em precedente vinculante, distinguiu os créditos de natureza previdenciária, e determinou a aplicação do INPC, aplicando-se o IPCA-E aos de caráter administrativo. Os juros de mora, a contar da citação, devem incidir à taxa de 1% ao mês, até 29/06/2009. A partir de 09/12/2021, para fins de atualização monetária e juros de mora, deve ser observada a redação dada ao art. 3º da EC 113/2021, com incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice da Taxa Referencial do Sistema Especial de Liquidação e Custódia (SELIC), acumulado mensalmente.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 11ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação do INSS, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 07 de dezembro de 2022.
Documento eletrônico assinado por HERMES SIEDLER DA CONCEICAO JUNIOR, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003618365v4 e do código CRC e71b6631.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO ORDINÁRIA DE 07/12/2022
Apelação Cível Nº 5027632-73.2019.4.04.9999/SC
RELATOR: Juiz Federal HERMES SIEDLER DA CONCEIÇÃO JÚNIOR
PRESIDENTE: Desembargador Federal CELSO KIPPER
PROCURADOR(A): MAURICIO GOTARDO GERUM
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: IARA FRANCO PIRES
ADVOGADO(A): RICARDO FARIAS ROSA (OAB SC022009)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Ordinária do dia 07/12/2022, na sequência 162, disponibilizada no DE de 23/11/2022.
Certifico que a 11ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 11ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Juiz Federal HERMES SIEDLER DA CONCEIÇÃO JÚNIOR
Votante: Juiz Federal HERMES SIEDLER DA CONCEIÇÃO JÚNIOR
Votante: Juíza Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO
Votante: Juiz Federal FRANCISCO DONIZETE GOMES
LIGIA FUHRMANN GONCALVES DE OLIVEIRA
Secretária
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