Teste grátis agora!
VoltarHome/Jurisprudência Previdenciária

PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. BENEFÍCIO CONCEDIDO. ESPOSA E COMPANHEIRA. POSSIBILIDADE DE RECEBEREM PENSÃO POR MORTE EM CONJUNTO. TRF4. 5000988-35.2017...

Data da publicação: 30/11/2020, 23:01:15

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. BENEFÍCIO CONCEDIDO. ESPOSA E COMPANHEIRA. POSSIBILIDADE DE RECEBEREM PENSÃO POR MORTE EM CONJUNTO. 1. A concessão do benefício de pensão por morte depende da ocorrência do evento morte, da demonstração da qualidade de segurado do de cujus e da condição de dependente de quem objetiva o benefício. 2. A possibilidade da divisão da pensão por morte entre esposa e companheira, ainda não é questão consolidada em definitivo na jurisprudência do STF que, sob nova composição, reconheceu recentemente a repercussão geral do tema (RE 883168). 3. Ainda que o segurado fosse casado enquanto manteve relação conjugal simultânea e estável, e houvesse impedimento à conversão da união estável em casamento, tem direito à quota-parte da pensão por morte a companheira que com ele por muitos anos conviveu. 4. O Direito não deve servir à exclusão social, e longe disso situam-se as disposições constitucionais que tratam da família, as quais, além de romperem com a presunção de que apenas o casamento daria origem à família, assumem caráter eminentemente inclusivo. 5. Pressupondo-se a validade, entre nós, do princípio da máxima efetividade das normas constitucionais, não se pode concluir que do § 3º do art. 226 da Constituição traga como condição para o seu reconhecimento, a possibilidade de conversão da união estável em casamento. (TRF4, AC 5000988-35.2017.4.04.7131, SEXTA TURMA, Relatora TAÍS SCHILLING FERRAZ, juntado aos autos em 19/11/2020)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5000988-35.2017.4.04.7131/RS

RELATORA: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ

APELANTE: FRANCISCA ROZELAINE HIBNER (AUTOR)

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

APELADO: IRACILDA DALL OGLIO DA SULVA (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de apelação interposta contra sentença que julgou improcedente pedido de pensão por morte, condenando a parte autora em honorários de 10% sobre o valor atualizado da causa, suspensa a exigibilidade em virtude da gratuidade da justiça.

A parte autora apelou (ev. 149) sustentando que lhe deve ser resguardado o direito, pelo menos, à percepção de quota parte da pensão, na qualidade de companheira, em conjunto com a legítima esposa, uma vez que, considerando a manutenção do casamento formal, restou comprovada a concomitância dos relacionamentos. Alegou que o que se pode perfeitamente apurar da realidade dos autos é que, em verdade, o de cujus mantinha ambos os relacionamentos de forma concomitante, situação que merece ser reconhecida para os pretendidos fins previdenciários, não sendo impedimento, para tanto, a existência simultânea de esposa, ainda mais que a recorrente não tinha conhecimento da continuidade da relação marital de fato, o que era veementemente negado pelo falecido.

Com contrarrazões do INSS e da corré Iracilda, subiram os autos ao Tribunal para julgamento.

É o relatório.

VOTO

Juízo de admissibilidade

O apelo preenche os requisitos de admissibilidade.

DA PENSÃO POR MORTE

A concessão do benefício de pensão por morte depende do preenchimento dos seguintes requisitos: (1) ocorrência do evento morte, (2) condição de dependente de quem objetiva a pensão e (3) demonstração da qualidade de segurado do de cujus por ocasião do óbito.

Conforme o disposto no art. 26, I, da Lei nº 8.213/1991, referido benefício independe de carência.

Ressalte-se que o benefício de pensão por morte rege-se pela legislação vigente quando da sua causa legal, em homenagem ao princípio tempus regit actum. O evento óbito, portanto, define a legislação de regência do amparo a ser outorgado aos beneficiários da pensão por morte, oportunidade em que deverão ser comprovados os requisitos necessários à concessão do benefício.

No caso, o óbito de Vilmar Afonso da Silva ocorreu em 15/08/2016, portanto sob a regência da Lei nº 13.135, de 17/06/2015, resultante da Medida Provisória nº 664, de 30 de dezembro de 2014, que alterou os arts. 16, I, III; 74, §§ 1º e 2º; 77, § 2º, incisos e parágrafos, da Lei nº 8.213/91.

Do caso concreto

No caso em apreço, a parte autora, nascida em 13/06/67, ajuizou, em 04/09/17, ação em face do INSS e de Iracilda Dallóglio da Silva, alegando que viveu, de forma pública nos últimos três anos, em união estável com Vilmar Afonso da Silva até seu óbito em 15/08/16. Aduziu que o "de cujus" era separado de fato de Iracilda Dallóglio da Silva, com quem foi casado. Postulou pela concessão do benefício de pensão por morte desde 16/12/16.

O benefício foi indeferido (DER de 16/12/16 - NB 172.764.545-1) por não comprovada a qualidade de dependente. A pensão por morte foi concedida à Iracilda.

A qualidade de segurado de Vilmar Afonso da Silva é incontroversa nos autos, porquanto, na época do óbito, era titular do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição n.º 42/150.575.386-1 (E12, PROCADM1, fl. 05), sendo a pensão hoje titularizada pela cônjuge Iracilda Dallóglio da Silva.

Assim, a controvérsia diz respeito à qualidade de dependente da parte autora, ora apelante.

A sentença analisou e decidiu a questão controversa in verbis:

Da qualidade de dependente da parte autora

A parte autora alega que ela e o de cujus conviveram em união estável por cerca de 3 anos até a data do óbito em 15/08/2016.

A união estável é entidade familiar reconhecida e amparada na Constituição Federal, nos termos do art. 226, § 3º:

Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.

(...)

§ 3º - Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento.

Os requisitos para sua caracterização vem elencados no artigo 1º da Lei nº 9.278/1996 e foram reiterados no Código Civil de 2002, em seu art. 1.723, in verbis: "É reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família.".

Necessária, assim, a comprovação da união estável mediante provas que indiquem a exteriorização da convivência pública. A propósito, no que pertine à comprovação da união estável, para fins previdenciários, a jurisprudência vem admitindo como meio de prova os testemunhos idôneos e coerentes sendo prescindível o início de prova material (Súmula 63 da TNU).

No caso concreto, para comprovar suas alegações, consta nos autos a seguinte documentação:

a) Exames laboratoriais em nome do falecido, realizados na cidade de Tunas/RS, onde reside a autora, datados de 03/03/2016 (E1, PROCADM4, fls. 15/18);

b) Histórico de mensagens trocadas entre a autora e o falecido, através de uma rede social, nos meses de janeiro/2014, março/2014 e entre julho e outubro de 2015 (E1, PROCADM4, fls. 19/34); e

c) Fotografias que demonstram o convívio entre a autora, o falecido e alguns familiares (E1, PROCADM4, fls. 35/42).

Afora isso, também figuram nos autos os seguintes documentos apresentados pela corré Iracilda:

a) Certidão de óbito de Vilmar Afonso da Silva, datada de 18/08/2016, na qual Iracilda consta como declarante (E60, CERTOBT5);

b) Certidão de casamento de Iracilda e Vilmar, datada de 08/01/1983, sem averbações relativas a divórcio e/ou separação (E60, CERTCAS6);

c) Declarações de IRPF em nome do falecido, relativas aos exercícios de 2014 a 2016, nas quais Iracilda consta como sua dependente (E60, OUT7 a OUT9);

d) Certidões de nascimento de filhos em comum do casal, datadas de 26/04/1985 e de 16/03/1987 (E60, CERTNASC14 e CERTNASC15);

e) Matrícula de imóvel em nome de Iracilda e Vilmar, adquirido pelo casal em 20/10/2005 (E60, MATRIMÓVEL16);

f) Escritura pública de doação de imóvel, datada de 16/10/2014, na qual Iracilda e Vilmar constam como donatários (E60, ESCRITURA17);

g) Declaração firmada por Renê Carlos Anesi, síndico do edifício Wilson Cignachi, dando conta que Vilmar, antigo morador do apartamento situado na rua Professor Lindau Fereira, 45, apto 2B, em Passo Fundo/RS, onde reside Iracilda, exerceu a função de síndico daquele condomínio edilício até o dia 15/08/2016, data de seu falecimento (E60, DECL18);

h) Correspondências encaminhadas a Vilmar, no endereço rua Professor Lindau Ferreira, 45, apto 2B, em Passo Fundo/RS, onde reside Iracilda, datadas dos anos de 2015 e 2016 (E60, EXTR19, fl. 05; E60, OUT20, fls. 01/03 e 05; E60, OUT21, fls. 01/05; E60, OUT22, fls. 01/06);

i) Cupons fiscais em nome de Vilmar, com registro de endereço na rua Professor Lindau Ferreira, 45, apto 2B, em Passo Fundo/RS, onde reside Iracilda, datados do ano de 2016 (E60, OUT20, fl. 04);

j) Recibo referente ao pagamento dos serviços funerários de Vilmar, emitido em nome de Amilton, filho de Iracilda e Vilmar (E60, OUT23);

k) Contrato de prestação de serviços de turismo social, pacotes turísticos e passeios, em nome de Vilmar e Iracilda, datado de 30/03/2016, referente a uma viagem para a cidade de Montevidéu (E60, CONTR24);

l) Termo de rescisão do contrato de trabalho de Vilmar, em decorrência do falecimento, com registro de endereço na rua Professor Lindau Ferreira, 45, firmado por Iracilda, o qual dá conta de que Vilmar permaneceu trabalhando na cidade de Passo Fundo/RS até o óbito (E60, OUT25);

m) Recibos de pagamento de salário em nome de Vilmar, referentes ao ano de 2016, os quais dão conta de que o falecido permaneceu trabalhando na cidade de Passo Fundo/RS até a data do óbito (E60, CHEQ26); e

n) Fotografias que demonstram a convivência de Iracilda, Vilmar e seus familiares, registrando celebrações de aniversários no ano de 2016 (E60, FOTO28 a FOTO30).

Ademais, realizou-se audiência de instrução (E120), oportunidade em que inquiridas três testemunhas arroladas pela autora e três testemunhas arroladas pela corré Iracilda.

Ante os elementos acima expostos, é possível concluir que o falecido manteve algum tipo de relação concomitantemente com a autora e a esposa, ora corré. Contudo, a partir do conjunto probatório angariado, constato que a relação da autora com o falecido não se enquadra no conceito de união estável, por incomprovada a existência de uma convivência more uxoria contínua e duradoura, tampouco o animus por parte do falecido de manter com a autora uma vida em comum, caracterizada como entidade familiar.

Veja-se que as testemunhas arroladas por Francisca, embora tenham apontado que conheceram Vilmar, referiram que somente nos finais de semana viam a autora e o falecido juntos, tecendo declarações vagas e imprecisas sobre o labor desempenhado por Vilmar ou o local em que ele se encontrava durante a semana. As testemunhas pouco souberam afirmar sobre o relacionamento mantido por Francisca e Vilmar.

Assim, militam em desfavor da tese autoral os relatos testemunhais, que, de modo geral, não confirmaram a manutenção da convivência pública, contínua e duradoura entre a demandante e Vilmar, com a intenção de constituir família. Nesse sentido, destaco que os depoimentos evidenciam relação que não se reveste das características inerentes ao instituto da união estável propriamente dito, mas sim, aparentemente, de um namoro ou relacionamento semelhante.

Além disso, não obstante a autora aponte que conviveu em união estável com o segurado falecido por mais de três anos, não acostou quaisquer comprovantes de endereço ou documentos que demonstrem que o casal residia no mesmo endereço, sendo os exames laboratoriais do evento 01 (E1, PROCADM4, fls. 15/18) ínfimos em comparação com o vasto e contemporâneo acervo probatório carreado ao feito por Iracilda, esta sim registrando fatos cotidianos de Vilmar, vinculados ao endereço em que residia com a corré, até o momento imediatamente anterior ao óbito.

Não bastasse isso, os relatos da inicial e o histórico de mensagens trocadas entre a autora e o falecido, através de uma rede social (E1, PROCADM4, fls. 19/34), deixam claro que Francisca sabia que Vilmar mantinha, durante o período de sua suposta união, matrimônio com Iracilda.

Destaco que o concubinato, como regra, não recebe a mesma proteção jurídica da união estável. Neste sentido é a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal:

COMPANHEIRA E CONCUBINA - DISTINÇÃO. Sendo o Direito uma verdadeira ciência, impossível é confundir institutos, expressões e vocábulos, sob pena de prevalecer a babel. UNIÃO ESTÁVEL - PROTEÇÃO DO ESTADO. A proteção do Estado à união estável alcança apenas as situações legítimas e nestas não está incluído o concubinato. PENSÃO - SERVIDOR PÚBLICO - MULHER - CONCUBINA - DIREITO. A titularidade da pensão decorrente do falecimento de servidor público pressupõe vínculo agasalhado pelo ordenamento jurídico, mostrando-se impróprio o implemento de divisão a beneficiar, em detrimento da família, a concubina.
(RE 590779, Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO, Primeira Turma, julgado em 10/02/2009, DJe-059 DIVULG 26-03-2009 PUBLIC 27-03-2009 EMENT VOL-02354-05 PP-01058 RTJ VOL-00210-02 PP-00934 RB v. 21, n. 546, 2009, p. 21-23 LEXSTF v. 31, n. 363, 2009, p. 292-301 RJTJRS v. 46, n. 279, 2011, p. 33-38 RMP n. 42, 2011, p. 213-219)

Outrossim, a jurisprudência do TRF4 tem identificado situações em que, muito embora presente relacionamento afetivo com relativa publicidade, não se está diante de efetiva união estável. Neste sentido:

PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. UNIÃO ESTÁVEL. NÃO DEMONSTRAÇÃO. NAMORO OCASIONAL. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA DOS PAIS DEMOSTRADA EM RELAÇÃO AO FILHO. CONCESSÃO DA PENSÃO. TUTELA ESPECÍFICA. AJG. TUTELA ESPECÍFICA. 1. A jurisprudência desta Corte é pacífica no sentido de que o período de convivência não é o fator determinante no reconhecimento da união estável, mas sim a vida em comum, de forma pública e contínua, com intuito de constituição de família. 2. A prova testemunhal não confirma a união entre o casal como se casados fossem, mas sim, um mero namoro ocasional. Os documentos trazidos pela autora não demonstram a vida em comum, de forma pública e contínua, com intuito de constituição de família. 3. Deferido o benefício da assistência judiciária gratuita, este se estende para toda a fase de conhecimento enquanto perdurarem os motivos que ensejaram a concessão. 4. Determina-se o cumprimento imediato do acórdão naquilo que se refere à obrigação de implementar o benefício em favor da parte autora, por se tratar de decisão de eficácia mandamental que deverá ser efetivada mediante as atividades de cumprimento da sentença stricto sensu previstas no art. 497 do CPC/15, sem a necessidade de um processo executivo autônomo (sine intervallo). (TRF4, AC 5030709-32.2015.4.04.9999, SEXTA TURMA, Relator JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, juntado aos autos em 14/12/2018)

PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE DE COMPANHEIRO. RESIDÊNCIAS EM DISTINTOS ESTADOS DA FEDERAÇÃO. UNIÃO ESTÁVEL. NÃO COMPROVAÇÃO. 1. Para a obtenção do benefício de pensão por morte deve a parte interessada preencher os requisitos estabelecidos na legislação previdenciária vigente à data do óbito, consoante iterativa jurisprudência dos Tribunais Superiores e desta Corte. 2. Comprovada a união estável, presume-se a dependência econômica (artigo 16, § 4º, da Lei 8.213/91), impondo-se à Previdência Social demonstrar que esta não existia. 3. Não é condição indispensável para a comprovação pretendida que o casal resida em um mesmo endereço. Todavia, tratando-se de situação onde as residências localizam-se não apenas em cidades distintas como em diferentes Estados da Federação, há que se exigir um conjunto probatório mais robusto, pois o que se visa demonstrar não é apenas dependência econômica, que por si só não gera direito a pensão, mas de relação com intuitu familiae, isto é, aquela que apresenta convivência duradoura, pública, contínua e reconhecida como tal pela comunidade na qual convivem os companheiros, que é muito mais que um simples namoro, ainda que este possa ser duradouro. 4. Caso em que os documentos trazidos aos autos apresentam pouca relevância probatória e, ademais, sugerem uma relação de amizade ou, quanto muito, de namoro. Nesse contexto, a prova testemunhal, in casu extremamente frágil, não pode se sobrepor a uma prova documental que vai contra as afirmações da autora, razão pela qual esta não faz jus ao benefício de pensão por morte. (AC 50027936320104047100, CELSO KIPPER, TRF4 - SEXTA TURMA, D.E. 08/01/2013.)

Enfim, por todo o exposto, não restou caracterizada a união estável, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família.

Merece reforma a sentença.

Inicialmente, destaque-se que a possibilidade de reconhecimento de união estável baseada em prova exclusivamente testemunhal restou pacificada na 3ª Seção do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento da Ação Rescisória nº 3905/PE, em sessão realizada no dia 26-06-2013, de relatoria do Min. Campos Marques (Dês. Convocado do TJ/PR).

A questão restou inclusive sumulada (Súmula 104) por este Tribunal Regional conforme se vê:

SÚMULA 104

"A legislação previdenciária não faz qualquer restrição quanto à admissibilidade da prova testemunhal, para comprovação da união estável, com vista à obtenção de benefício previdenciário."

A atual exigência legal de início de prova material, contida no art. 16, §5º da Lei 8213/91, introduzida pela Lei 13.846/2019, de início de prova documental para tal demonstração não se aplica a pedidos formulados antes da respectiva vigência (MP 871/2019).

No caso dos autos, relativamente à apelante, além dos documentos citados em sentença, a prova testemunhal corroborou a versão da parte autora no sentido de que manteve relacionamento estável com o "de cujus" há cerca de quatro anos. Nesse sentido, os depoimentos de Lademir Cardoso e Airton Carlos da Silva colhidos em justificação administrativa em fev/18 (p. 5, ev. 61).

Em juízo, em 29/08/18 (ev. 120), as testemunhas prestaram os seguintes depoimentos:

Lademir Cardoso disse que conhece a autora há treze anos; que foi casada e separada e que, em torno de uns quatro ou cinco anos, tinha esse outro senhor; que passava praticamente todos os finais de semana e feriados lá; que durante a semana ele trabalhava fora, segundo comentários, em Passo Fundo; que não sabe com que ele trabalhava; que tinha eles como marido e mulher; que os via em lugares públicos, sempre juntos, final de semana, feriados e festas; que só parou de vê-lo após o falecimento; que não foi no velório; que soube por meio de outras pessoas sobre o óbito; que não sabia que ele tinha família em outra cidade.

Airton Carlos da Silva disse conhecer a autora há uns dez anos e o de cujus há uns 4 ou cinco anos; que tem empresa do lado da casa desde por volta de 2015, que não sabe se ela foi casada; que conheceu Vilmar, que era mecânico em Passo Fundo na Auto Agrícola; que não sabe se era casado e se tinha filhos; que almoçava com ele no restaurante União, aos sábados; que via sempre ele com a Francisca; que para ele, parecia ser casado com a Francisca; que os via sempre juntos nos finais de semana, que fez as tratativas de construção de um muro em terreno vizinho com ele; que morava com ela no sábado e domingo; que, durante a semana não sabe onde ele dormia.

Luiz Antonio Nunes disse conhecer Francisca do seu estabelecimento (mercado), que ela é cliente; que só a conheceu já com o Vilmar porque ele pagava os tickets dela no final de semana; que sabe que ele era casado com ela e trabalhava fora e só vinha finais de semana para Tunas, acha que em Passo Fundo; que o conhece desde 2013/2014, que os via como marido e mulher; que também os via no sábado, no restaurante que ele tem na cidade (Restaurante Central); que tem mercado no local há trinta anos, que abre também nos domingos e feriados até meio dia; que ela sempre foi sua cliente; que lembra só de comentários quando faleceu o Sr. Vilmar; que nunca soube se ele tinha família em outra cidade.

A prova testemunhal permite concluir que a união estável existia há pelo menos dois anos, contados retroativamente do óbito, o que, associado à idade da autora, atrai a incidência do art. 77, §2º, V, c-6, da Lei 8.213/91.

Por outro lado, também restou evidenciado que o "de cujus" manteve, por muitos anos, um relacionamento matrimonial, formalizado, não cessado juridicamente, com Iracilda Dallóglio da Silva, litisconsorte passiva no presente feito e atual beneficiária da pensão por morte.

A realidade narrada e comprovada nos autos caracteriza-se como hipótese de relações simultâneas, paralelas, e que não podem ficar ao desamparo da lei previdenciária.

Não desconheço que em julgamento de situação semelhante, o Supremo Tribunal Federal reafirmou tradicional distinção entre união estável e concubinato, assentando que o concubinato é situação não agasalhada pelo ordenamento jurídico, o que retiraria da parceira, neste caso, o direito à pensão por morte:

COMPANHEIRA E CONCUBINA - DISTINÇÃO. Sendo o Direito uma verdadeira ciência, impossível é confundir institutos, expressões e vocábulos, sob pena de prevalecer a babel. UNIÃO ESTÁVEL - PROTEÇÃO DO ESTADO. A proteção do Estado à união estável alcança apenas as situações legítimas e nestas não está incluído o concubinato. PENSÃO - SERVIDOR PÚBLICO - MULHER - CONCUBINA - DIREITO. A titularidade da pensão decorrente do falecimento de servidor público pressupõe vínculo agasalhado pelo ordenamento jurídico, mostrando-se impróprio o implemento de divisão a beneficiar, em detrimento da família, a concubina. (RE 590779, Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO, Primeira Turma, julgado em 10/02/2009).

A decisão em exame caracteriza como união estável aquela entre homem e mulher, que se encontram desimpedidos de contrair núpcias, reconhecendo a essa relação efeitos jurídicos semelhantes ao do casamento. Admite, também, a possibilidade de proteção jurídica da união união estável quando o casamento tenha deixado de existir, ainda que apenas de fato.

Já o concubinato, na esteira da mesma decisão, é relação que coexiste com outra, sem possibilidade de converter-se em casamento, a exemplo da situação em que o homem, casado civilmente, mantém dois lares, sendo um deles com a esposa. Para esse vínculo paralelo ao casamento, ainda que duradouro e do qual resultem filhos, o STF não reconheceu a proteção do Estado para fins de pensionamento.

Identifica-se da própria leitura de trecho da ementa que no entendimento da maioria dos Ministros que participaram do julgamento, seria impróprio o implemento de divisão a beneficiar, em detrimento da família, a concubina. Adotado o raciocínio, sequer se poderia falar em manutenção de duas famílias, já que a relação em regime de concubinato não poderia ser considerada vínculo familiar.

A decisão em referência, tomada por maioria de votos na Primeira Turma, encontrou no pronunciamento do então Ministro Carlos Britto, a divergência. Sua Excelência asseverou, na ocasião, que se há um núcleo doméstico estabilizado no tempo, é dever do Estado ampará-lo como se entidade familiar fosse, como real entidade familiar, até porque os filhos, que merecem absoluta proteção do Estado, não têm nada a ver com a natureza da relação entre os pais. Interessa é que o núcleo familiar em si mesmo merece toda a proteção.

Em que pese haver outros julgados do STF na linha antes ventilada, ouso divergir da ratio decidendi que neles, à época, alcançou maioria, o que faço excepcionalmente, com toda a vênia do entendimento assentado, e tendo por norte a perspectiva de eventual modificação da decisão frente ao reconhecimento de repercussão geral ao tema.

Os eminentes ministros do STF, agora sob outra composição, ao decidirem por reconhecer a repercussão geral e submeter novamente a julgamento a matéria, sinalizam com a possibilidade de revisão do entendimento, que foi adotado, até o momento, sem efeitos vinculantes. O RE 883168 aguarda julgamento de mérito e es tá afetado ao rito da repercussão geral. A perspectiva torna-se mais ainda verossímil frente à opção, do eminente relator, de não submeter o tema a mero procedimento de reafirmação da jurisprudência com vistas à produção de efeitos erga omnes, o que tem sido a técnica de julgamento adotada quando se trata de jurisprudência considerada efetivamente consolidada.

Dito isto, prossigo para afirmar que não identifico impedimento a que se reparta o benefício de pensão por morte entre esposa e concubina do segurado que, casado, mantinha contato com a esposa e com a companheira. A questão é de prova de que de fato houve esta relação em paralelo, que foi duradoura e com as características próprias de uma relação conjugal.

Uma vez que reste comprovada a concomitância dos dois vínculos, o casamento do segurado com a esposa e a convivência como se marido fosse com a autora, não há porque serem diferenciadas as situações de convívio para os fins de proteção do Estado. Se de fato existiram, o Direito não pode, porque as normas positivadas não concebiam a hipótese de fato, negar-lhes efeitos, fechando os olhos à realidade.

Trata-se de dar à lei e às normas constitucionais que dispõem sobre a proteção ao casamento ea união estável, interpretação que lhes assegure evolução histórica, como condição à sua máxima efetividade.

E hoje, o casamento não é mais o único vínculo capaz de dar origem à família. A própria Constituição, atenta à nova realidade fática, já acolhe novas formas de núcleo familiar, como as famílias monoparentais, além da união estável entre homem e mulher.

O conceito de família não é algo cristalizado no tempo, e o Direito deve evoluir para acompanhar as mudanças sociais. A sociedade não cabe na norma, esta é que deve ser retratar a sociedade, em constante modificação. A insistência em encaixar a vida na regra jurídica, sem a percepção de que as respectivas hipóteses de incidência, concebidas em momentos históricos específicos, devem evoluir para acompanhar as mudanças sociais, acaba por negar, por ficção jurídica, a existência de situações de fato que, por suas consequências, produzem efeitos jurídicos, ainda que na origem não fossem previstos ou mesmo desejados.

A entidade familiar, hoje, na lição de Carlos Ruzyk, é como um núcleo de coexistencialidade estável, público e fundado no afeto, cuja identificação não se apresenta em uma perspectiva que parta do direito positivado, mas, sim, da realidade social à qual o direito se destina (in Famílias simultâneas: da unidade codificada à pluralidade constitucional Rio de Janeiro: Renovar, 2005).

Letícia Ferrarini, em brilhante estudo sobre o tema, discorre sobre as famílias paralelas, asseverando que a despeito da resistência social à ideia, essa realidade existe e permanece sob os estigmas do preconceito, recebendo, por essa razão, tratamento marginalizado, como se, "fechando-se os olhos" fosse possível reduzir ou até exterminar a existência e continuidade de tais relações. Segundo a autora, no imaginário social ainda prepondera a ideia de que as relações paralelas ao casamento se caracterizam pelo triângulo amoroso formado pelo mito, no qual a esposa é santificada, o marido é vitimizado e, a "outra", por conseguinte, satanizada (in Famílias Simultâneas e seus efeitos jurídicos. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2010)

Ao interpretarem a parte final do § 3º do art. 226 da Constituição, que trata da proteção à união estável, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento, alguns juristas defendem que conteria uma regra de exclusão, dela extraindo que para se reconhecer efeitos jurídicos à união entre o homem e mulher, teria que ser possível a sua conversão em casamento. Em consequência, em sendo um dos parceiros já casado, e não tendo havido sequer separação de fato, a outra relação, ainda que também tivesse características de estabilidade, não receberia o reconhecimento do Estado para fins jurídicos.

O Direito não deve, porém, servir à exclusão social, e longe disso situam-se as disposições constitucionais que tratam da família, as quais, além de romperem com a presunção de que apenas o casamento dá origem à verdadeira família, assumem caráter eminentemente inclusivo. Pressupondo-se a validade, entre nós, do princípio da máxima efetividade das normas constitucionais, não se pode concluir que do § 3º do art. 226 da Constituição traga como condição para o seu reconhecimento, a possibilidade de conversão da união estável em casamento.

Sobre a parte final desse dispositivo, Paulo Lobo (apud FERRARINI, LETÍCIA, op. cit.) afirma que se trata apenas de uma norma de indução, que configura muito mais comando ao legislador infraconstitucional para que remova os obstáculos e dificuldades para os companheiros que desejem se casar, se quiserem, a exemplo da dispensa de solenidade de celebração.

Dessas considerações, extraio que a circunstância de haver duas relações conjugais paralelas e estáveis não se constitui em impeditivo ao reconhecimento da existência de ambas para efeitos jurídicos, e, para o que interessa, ao reconhecimento da existência de dois núcleos familiares.

Não me refiro às situações de relacionamentos extraconjugais instáveis, excepcionais e situados na clandestinidade, mas a situações, muito comuns, em que um dos cônjuges mantém dois vínculos conjugais simultâneos e estáveis, capazes de originar duas unidades familiares, com ou sem filhos.

Dito isso, de acordo com o exame das circunstâncias do caso concreto, conclui-se que na data do óbito a relação de união entre a autora e o segurado falecido se mantinha, bem como o matrimônio entre o de cujus e a corré.

Em se tratando de relação de fato, a presunção da dependência econômica somente ocorrerá, porém, se for possível a demonstração de que o vínculo permanecia existindo quando do falecimento do instituidor da pensão. Do contrário, a dependência terá que ser provada, adotando-se o mesmo entendimento que se acolhe quando se trata de pessoas casadas, em cuja separação não houve fixação de pensão alimentícia.

E nesse sentido, tem se inclinado a jurisprudência desta casa, cujos precedentes cito:

PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE DE ESPOSO E COMPANHEIRO. RESTABELECIMENTO. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA DEMONSTRADA. RATEIO DEVIDO ENTRE ESPOSA E COMPANHEIRA. TUTELA ESPECÍFICA. 1. A concessão do benefício de pensão por morte depende da ocorrência do evento morte, da demonstração da qualidade de segurado do de cujus e da condição de dependente de quem objetiva a pensão. 2. Embora o falecido mantivesse o vínculo jurídico formal com a esposa/autora até a data do óbito, também manteve união estável com a corré até seu falecimento, possuindo duas famílias de forma concomitante, não desistindo ou renunciando a qualquer desses relacionamentos, ambas fazendo jus a pensão por morte a ser dividida em partes iguais. 3. Determina-se o cumprimento imediato do acórdão naquilo que se refere à obrigação de implementar o benefício em favor da parte autora, por se tratar de decisão de eficácia mandamental que deverá ser efetivada mediante as atividades de cumprimento da sentença stricto sensu previstas no art. 497 do CPC/15, sem a necessidade de um processo executivo autônomo (sine intervallo). (TRF4, AC 5014655-53.2014.4.04.7112, SEXTA TURMA, Relator JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, juntado aos autos em 08/08/2019)

PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. EXISTÊNCIA DE UNIÃO ESTÁVEL PARALELA AO CASAMENTO. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA PRESUMIDA. BENEFÍCIO DEVIDO. 1. A relação de concubinato mantida em concomitância com uma relação matrimonial não afasta, por si só, o direito da concubina à percepção do benefício de pensão por morte, desde que demonstrada a união estável com o de cujus. In casu, restou comprovado que o de cujus manteve, durante mais de vinte anos, paralela e simultaneamente, o casamento com a autora Dyva e a união estável com a corré Regina, o que, ao que tudo indica, perdurou até a data do seu falecimento, em 2011. 3. O Supremo Tribunal Federal, em 09-03-2012, reconheceu a existência de repercussão geral em processo no qual se discute a possibilidade de o concubinato de longa duração gerar efeitos previdenciários (RE 669465). Porém, como a questão pende de decisão definitiva no Supremo Tribunal Federal e sobretudo porque o Judiciário não pode ignorar a realidade dos fatos comprovados nos autos, deve ser reconhecido que ambas - autora e corré - ostentam a condição de dependentes previdenciárias do falecido , fazendo jus a corré à pensão em virtude do falecimento deste. (TRF4, AC 5013568-26.2013.4.04.7200, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SC, Relator JORGE ANTONIO MAURIQUE, juntado aos autos em 17/07/2018)

PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. CONCUBINATO IMPURO. ESPOSA E COMPANHEIRA. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA PRESUMIDA. DIVISÃO DO BENEFÍCIO. POSSIBILIDADE. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. LEI 11.960/2009. CRITÉRIOS DE ATUALIZAÇÃO. DIFERIMENTO PARA A FASE PRÓPRIA (EXECUÇÃO). 1. Para a obtenção do benefício de pensão por morte deve a parte interessada preencher os requisitos estabelecidos na legislação previdenciária vigente à data do óbito, consoante iterativa jurisprudência dos Tribunais Superiores e desta Corte. 2. Nos termos do art. 16, §4º, da Lei nº 8.213/91, a dependência econômica, tanto da esposa quanto da companheira é presumida. 3. Se o casamento e a união estável foram mantidos concomitantemente pelo instituidor, deve ser dividido o benefício entre a esposa e a companheira 4. Deliberação sobre índices de correção monetária e taxas de juros diferida para a fase de cumprimento de sentença, a iniciar-se com a observância dos critérios da Lei nº 11.960/2009, de modo a racionalizar o andamento do processo, permitindo-se a expedição de precatório pelo valor incontroverso, enquanto pendente, no Supremo Tribunal Federal, decisão sobre o tema com caráter geral e vinculante. Precedentes do STJ e do TRF da 4ª Região. (TRF4, AC 5015433-65.2014.4.04.7001, SEXTA TURMA, Relator ARTUR CÉSAR DE SOUZA, juntado aos autos em 17/10/2017)

PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. RATEIO ENTRE ESPOSA E COMPANHEIRA. UNIÃO ESTÁVEL COMPROVADA. RELAÇÃO AFETIVA E DE DEPENDÊNCIA COM O SEGURADO. ART. 226, §3º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. ART. 1.723 DO CÓDIGO CIVIL. 1. A concessão do benefício de pensão por morte depende da ocorrência do evento morte, da demonstração da qualidade de segurado do de cujus e da condição de dependente de quem objetiva a pensão. 2. Nos termos do art. 226, § 3º, da Constituição Federal e do art. 1.723 do Código Civil, a união estável existe quando o casal mantém convivência pública, contínua, duradoura e estabelecida com o objetivo de constituir família. 3. Comprovada a existência de união estável, a dependência econômica da corré, nos termos do art. 16, § 4º, da Lei nº 8.213/91, é presumida. 4. Embora o de cujus mantivesse o vínculo jurídico formal com a esposa, a prova testemunhal confirma o relacionamento público e notório com a corré; a própria autarquia previdenciária reconheceu-a como dependente do de cujus, concedendo-lhe pensão em decorrência de sua morte. 5. Por mais que esteja em nosso ordenamento a prestigiada monogamia, não se pode fechar os olhos à realidade, deixando desamparada a corré, que, não obstante a inexistência de vínculo formal com o de cujus, estava em igualdade de condições com a esposa. Este entendimento não traz consignada a validação da duplicidade de relações maritais; pretende-se, apenas, por princípio de justiça, regular as consequências das circunstâncias fáticas, evitando-se deixar à margem da proteção jurídica a corré, que tinha vida em comum more uxorio com o segurado. (TRF4, APELREEX 5022258-78.2012.404.7200, Quinta Turma, Relator p/ Acórdão Luiz Carlos de Castro Lugon, juntado aos autos em 24/02/2015).

PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. BENEFÍCIO CONCEDIDO. ESPOSA E COMPANHEIRA. POSSIBILIDADE DE RECEBEREM PENSÃO POR MORTE EM CONJUNTO. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA NA DATA DO ÓBITO.1. A concessão do benefício de pensão por morte depende da ocorrência do evento morte, da demonstração da qualidade de segurado do de cujus e da condição de dependente de quem objetiva o benefício.2. A possibilidade ou não da divisão da pensão entre esposa e companheira ainda não é questão consolidada em definitivo na jurisprudência do STF que, sob nova composição, reconheceu recentemente a repercussão geral do tema. 3. Ainda que o segurado fosse casado enquanto manteve relação conjugal simultânea e estável, e houvesse impedimento à conversão da união estável em casamento, tem direito à quota-parte da pensão, por morte a parceira que com ele por muitos anos conviveu e manteve dependência econômica.4. O Direito não deve servir à exclusão social, e longe disso situam-se as disposições constitucionais que tratam da família, as quais, além de romperem com a presunção de que apenas o casamento daria origem à verdadeira família, assumem caráter eminentemente inclusivo.5. Pressupondo-se a validade, entre nós, do princípio da máxima efetividade das normas constitucionais, não se pode concluir que do § 3º do art. 226 da Constituição traga como condição para o seu reconhecimento, a possibilidade de conversão da união estável em casamento.6. Deliberação sobre índices de correção monetária e taxas de juros diferida para a fase de cumprimento de sentença, de modo a racionalizar o andamento do processo, e diante da pendência , nos tribunais superiores, de decisão sobre o tema com caráter geral e vinculante. Precedentes do STJ e do TRF da 4ª Região.o recurso da (TRF4 5069615-04.2014.404.7000, QUINTA TURMA, Relator (AUXÍLIO FAVRETO) TAÍS SCHILLING FERRAZ, juntado aos autos em 18/04/2017)

Comprovada a existência de relações conjugais simultâneas e estáveis, até a data do óbito, com a consequente presunção da dependência econômica, impõe-se a reforma da sentença, com a divisão da pensão pela morte do segurado em partes iguais entre a esposa e a companheira.

Dessa forma, presentes os requisitos, é devida a quota parte da pensão por morte à autora de forma vitalícia, nos termos do art. 77, § 2º, V, c-6, da Lei 8.213/91, com a redação dada pela Lei 13.146/15, a contar do óbito, tendo em vista que requerida a pensão no prazo do art. 74, I, da Lei 8.213/91.

- Correção monetária

A correção monetária das parcelas vencidas dos benefícios previdenciários será calculada conforme a variação dos seguintes índices:

- IGP-DI de 05/96 a 03/2006 (art. 10 da Lei n.º 9.711/98, combinado com o art. 20, §§5º e 6º, da Lei n.º 8.880/94);

- INPC a partir de 04/2006 (art. 41-A da lei 8.213/91, na redação da Lei n.º 11.430/06, precedida da MP n.º 316, de 11/08/2006, e art. 31 da Lei n.º 10.741/03, que determina a aplicação do índice de reajustamento dos benefícios do RGPS às parcelas pagas em atraso).

A utilização da TR como índice de correção monetária dos débitos judiciais da Fazenda Pública, que fora prevista na Lei 11.960/2009, que introduziu o art. 1º-F na Lei 9.494/97, foi afastada pelo STF no julgamento do tema 810, através do RE 870947, com repercussão geral, com trânsito em julgado em 03/03/2020.

No julgamento do tema 905, através do REsp 1.495146, e interpretando o julgamento do STF, transitado em julgado em 11/02/2020, o STJ definiu quais os índices que se aplicariam em substituição à TR, concluindo que aos benefícios assistenciais deveria ser utilizado IPCA-E, conforme decidiu a Suprema Corte, no recurso representativo da controvérsia e que, aos previdenciários, voltaria a ser aplicável o INPC, uma vez que a inconstitucionalidade reconhecida restabeleceu a validade e os efeitos da legislação anterior, que determinava a adoção deste último índice, nos termos acima indicados.

A conjugação dos precedentes dos tribunais superiores resulta, assim, na aplicação do INPC aos benefícios previdenciários, a partir de abril 2006, reservando-se a aplicação do IPCA-E aos benefícios de natureza assistencial.

Importante ter presente, para a adequada compreensão do eventual impacto sobre os créditos dos segurados, que os índices em referência - INPC e IPCA-E tiveram variação muito próxima no período de julho de 2009 (data em que começou a vigorar a TR) e até setembro de 2019, quando julgados os embargos de declaração no RE 870947 pelo STF (IPCA-E: 76,77%; INPC 75,11), de forma que a adoção de um ou outro índice nas decisões judiciais já proferidas não produzirá diferenças significativas sobre o valor da condenação.

Juros de mora

Os juros de mora devem incidir a partir da citação.

Até 29-06-2009, já tendo havido citação, deve-se adotar a taxa de 1% ao mês a título de juros de mora, conforme o art. 3º do Decreto-Lei n. 2.322/87, aplicável analogicamente aos benefícios pagos com atraso, tendo em vista o seu caráter eminentemente alimentar, consoante firme entendimento consagrado na jurisprudência do STJ e na Súmula 75 desta Corte.

A partir de então, deve haver incidência dos juros, uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo percentual aplicado à caderneta de poupança, nos termos estabelecidos no art. 1º-F, da Lei 9.494/97, na redação da Lei 11.960/2009, considerado, no ponto, constitucional pelo STF no RE 870947, decisão com repercussão geral.

Os juros de mora devem ser calculados sem capitalização, tendo em vista que o dispositivo legal em referência determina que os índices devem ser aplicados "uma única vez" e porque a capitalização, no direito brasileiro, pressupõe expressa autorização legal (STJ, AgRgno AgRg no Ag 1211604/SP).

Honorários

Tendo em vista que a sentença foi publicada sob a égide do novo CPC, é aplicável quanto à sucumbência aquele regramento.

Considerando a natureza previdenciária da causa, bem como a existência de parcelas vencidas, e tendo presente que o valor da condenação não excederá de 200 salários mínimos, os honorários de sucumbência devem ser fixados originariamente em 10% sobre as parcelas vencidas, nos termos do artigo 85, §3º, inciso I, do CPC. Conforme a Súmula n.º 111 do Superior Tribunal de Justiça, a verba honorária deve incidir sobre as prestações vencidas até a data da decisão de procedência (acórdão).

Custas

O INSS é isento de custas quando demandado perante a Justiça Estadual do RS (art. 5, I, Lei 14.634/14/RS).

Tutela específica - implantação do benefício

Considerando a eficácia mandamental dos provimentos fundados nos artigos 497 e 536 do NCPC, quando dirigidos à Administração Pública, e tendo em vista que a presente decisão não está sujeita, em princípio, a recurso com efeito suspensivo, determino o cumprimento do acórdão no tocante à implantação do benefício da parte autora, especialmente diante do seu caráter alimentar e da necessidade de efetivação imediata dos direitos sociais fundamentais.

Dados para cumprimento:

(X) Concessão ( ) Restabelecimento ( ) Revisão

NB: 172.764.545-1

Espécie: Pensão por morte na quota parte de 50%

DIB: 16/12/16

DIP: no primeiro dia do mês da implantação do benefício.

DCB: sem DCB

RMI: a apurar.

Requisite a Secretaria da 6ª Turma, à CEAB-DJ-INSS-SR3, o cumprimento da decisão e a comprovação nos presentes autos, no prazo de vinte (20) dias.

DISPOSITIVO

Ante o exposto, voto por dar provimento à apelação e determinar a implantação do benefício.



Documento eletrônico assinado por TAIS SCHILLING FERRAZ, Juíza Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002030666v56 e do código CRC c0f215f7.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): TAIS SCHILLING FERRAZ
Data e Hora: 19/11/2020, às 19:36:11


5000988-35.2017.4.04.7131
40002030666.V56


Conferência de autenticidade emitida em 30/11/2020 20:01:14.

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5000988-35.2017.4.04.7131/RS

RELATORA: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ

APELANTE: FRANCISCA ROZELAINE HIBNER (AUTOR)

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

APELADO: IRACILDA DALL OGLIO DA SULVA (RÉU)

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. BENEFÍCIO CONCEDIDO. ESPOSA E COMPANHEIRA. POSSIBILIDADE DE RECEBEREM PENSÃO POR MORTE EM CONJUNTO.

1. A concessão do benefício de pensão por morte depende da ocorrência do evento morte, da demonstração da qualidade de segurado do de cujus e da condição de dependente de quem objetiva o benefício.

2. A possibilidade da divisão da pensão por morte entre esposa e companheira, ainda não é questão consolidada em definitivo na jurisprudência do STF que, sob nova composição, reconheceu recentemente a repercussão geral do tema (RE 883168).

3. Ainda que o segurado fosse casado enquanto manteve relação conjugal simultânea e estável, e houvesse impedimento à conversão da união estável em casamento, tem direito à quota-parte da pensão por morte a companheira que com ele por muitos anos conviveu.

4. O Direito não deve servir à exclusão social, e longe disso situam-se as disposições constitucionais que tratam da família, as quais, além de romperem com a presunção de que apenas o casamento daria origem à família, assumem caráter eminentemente inclusivo.

5. Pressupondo-se a validade, entre nós, do princípio da máxima efetividade das normas constitucionais, não se pode concluir que do § 3º do art. 226 da Constituição traga como condição para o seu reconhecimento, a possibilidade de conversão da união estável em casamento.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar provimento à apelação e determinar a implantação do benefício, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 18 de novembro de 2020.



Documento eletrônico assinado por TAIS SCHILLING FERRAZ, Juíza Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002030667v7 e do código CRC 8a347290.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): TAIS SCHILLING FERRAZ
Data e Hora: 19/11/2020, às 19:36:11


5000988-35.2017.4.04.7131
40002030667 .V7


Conferência de autenticidade emitida em 30/11/2020 20:01:14.

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Telepresencial DE 16/09/2020

Apelação Cível Nº 5000988-35.2017.4.04.7131/RS

RELATORA: Juíza Federal TAIS SCHILLING FERRAZ

PRESIDENTE: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA

PROCURADOR(A): CAROLINA DA SILVEIRA MEDEIROS

SUSTENTAÇÃO ORAL PRESENCIAL: DOUGLAS DALL CORTIVO DOS SANTOS por FRANCISCA ROZELAINE HIBNER

APELANTE: FRANCISCA ROZELAINE HIBNER (AUTOR)

ADVOGADO: DOUGLAS DALL CORTIVO DOS SANTOS (OAB RS066427)

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

APELADO: IRACILDA DALL OGLIO DA SULVA (RÉU)

ADVOGADO: TATIANA CENDRON FORTES RABELLO (OAB RS049207)

ADVOGADO: BRUNA QUADROS TRAUTMANN (OAB RS094402)

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Telepresencial do dia 16/09/2020, na sequência 443, disponibilizada no DE de 03/09/2020.

Certifico que a 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

APÓS A SUSTENTAÇÃO ORAL, O JULGAMENTO FOI SUSPENSO.

PAULO ROBERTO DO AMARAL NUNES

Secretário



Conferência de autenticidade emitida em 30/11/2020 20:01:14.

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Telepresencial DE 18/11/2020

Apelação Cível Nº 5000988-35.2017.4.04.7131/RS

RELATORA: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ

PRESIDENTE: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ

PROCURADOR(A): JOÃO HELIOFAR DE JESUS VILLAR

APELANTE: FRANCISCA ROZELAINE HIBNER (AUTOR)

ADVOGADO: DOUGLAS DALL CORTIVO DOS SANTOS (OAB RS066427)

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

APELADO: IRACILDA DALL OGLIO DA SULVA (RÉU)

ADVOGADO: TATIANA CENDRON FORTES RABELLO (OAB RS049207)

ADVOGADO: BRUNA QUADROS TRAUTMANN (OAB RS094402)

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Telepresencial do dia 18/11/2020, na sequência 366, disponibilizada no DE de 09/11/2020.

Certifico que a 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 6ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO E DETERMINAR A IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO.

RELATORA DO ACÓRDÃO: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ

Votante: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ

Votante: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER

Votante: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA

PAULO ROBERTO DO AMARAL NUNES

Secretário



Conferência de autenticidade emitida em 30/11/2020 20:01:14.

O Prev já ajudou mais de 140 mil advogados em todo o Brasil.Faça cálculos ilimitados e utilize quantas petições quiser!

Teste grátis agora!