Apelação Cível Nº 5013146-64.2021.4.04.7202/SC
PROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 5013146-64.2021.4.04.7202/SC
RELATOR: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: ZEFERINO CAREGNATTO (AUTOR)
ADVOGADO: LUCIANA ZANCO (OAB SC057392A)
ADVOGADO: LUCIANA ZANCO (OAB PR093385)
RELATÓRIO
Trata-se de apelação interposta em face de sentença cujo dispositivo tem o seguinte teor:
Ante o exposto, declaro prescritas as parcelas anteriores a 10/10/2016, DEFIRO a tutela provisória e JULGO PROCEDENTE o pedido inicial, extinguindo o feito com resolução do mérito, com fulcro no art. 487, I, do CPC, para condenar o INSS a conceder à parte autora o benefício de pensão por morte n° 201.262.103-6 (DER 08/06/2021), com data de início do benefício em 28/01/1989, o qual deverá ser implantado no prazo de 20 dias, com RMI e RMA no valor de um salário mínimo.
Condeno o INSS ao pagamento das custas processuais, as quais, porém, ficam dispensadas, dada a isenção legal prevista na Lei nº 9.289/96 (art. 4º, inciso I).
Diante da procedência do pedido, condeno o INSS ao pagamento de honorários advocatícios sucumbenciais fixados a 10% sobre o valor da condenação e, no que exceder a 200 salários mínimos, em 8% (art.85, §§ 2 e 3° do CPC), tendo como base de cálculo apenas a soma das prestações vencidas até a data de publicação desta sentença (Súmula nº 76 do TRF da 4ª Região).
Trata-se de sentença ilíquida, o que, a teor da Súmula nº 490 do STJ, exigiria submetê-la à remessa necessária. Porém tal entendimento foi consolidado sob a vigência do CPC/73, quando estavam sujeitas ao duplo grau de jurisdição todas as condenações que excedessem 60 salários mínimos. O novo Código de Processo Civil elevou tal limite para 1.000 salários mínimos em relação à União e as respectivas autarquias e fundações de direito público (art. 496, §3º, I). Mesmo não se dispondo de elementos para determinar o exato montante da condenação é possível desde já afirmar que não excederá o montante fixado no referido dispositivo legal. Nesse contexto, e inclusive a fim de evitar eventual trabalho desnecessário e maior congestionamento do Tribunal, tenho como incabível no presente caso a remessa necessária.
Irresignado, o INSS interpôs apelação.
Destaca-se, em suas razões, o seguinte trecho:
A falecida esposa do recorrido não detinha a qualidade de segurada da Previdência Social com direito aos benefícios previdenciários e nem o recorrido era considerado dependente ao tempo do óbito ocorrido aos 28/01/1989, o qual determina a legislação a ser aplicada.
Àquele tempo, vigorava a Lei Complementar nº 11/71 e os Decretos nº 83.080/79 e 83.312/84.
A Lei Complementar nº 11/71 preconizava:
Art. 2º O Programa de Assistência ao Trabalhador Rural consistirá na prestação dos seguintes benefícios:
[...]
III - pensão;
[...]
Art. 3º São beneficiários do Programa de Assistência instituído nesta Lei Complementar o trabalhador rural e seus dependentes.
§ 1º Considera-se trabalhador rural, para os efeitos desta Lei Complementar:
a) a pessoa física que presta serviços de natureza rural a empregador, mediante remuneração de qualquer espécie.
b) o produtor, proprietário ou não, que sem empregado, trabalhe na atividade rural, individualmente ou em regime de economia familiar, assim entendido o trabalho dos membros da família indispensável à própria subsistência e exercido em condições de mutua dependência e colaboração.
§ 2º Considera-se dependente o definido como tal na Lei Orgânica da Previdência Social e legislação posterior em relação aos segurados do Sistema Geral de Previdência Social.
Por outro lado o Decreto 83.080/1979 definia quem eram os dependentes do trabalhador rural no art. 275, remetendo ao art. 12, verbis:
Art. 12 - São dependentes do segurado:
I - a esposa, o marido inválido, a campanheira mantida há mais de 5 (cinco) anos, os filhos de qualquer condição menores de 18 (dezoito) anos ou inválidos e as filhas solteiras de qualquer condição menores de 21 (vinte e um) anos ou inválidas;
[...]
Ainda, preceituava nos arts. 297 e 298, par. único, que a pensão por morte do trabalhador rural era devida aos dependentes do rurícola chefe ou arrimo da família:
Art. 297. A aposentadoria por velhice é devida, a contar da data da entrada do requerimento, ao trabalhador rural que completa 65 (sessenta e cinco) anos de idade e é o chefe ou arrimo de unidade familiar, em valor igual ao da aposentadoria por invalidez (art. 294).
(...).
§ 3º. Para efeito desse artigo considera-se:
I - unidade familiar, o conjunto das pessoas que vivem total ou parcialmente sob a dependência econômica de um trabalhador rural, na forma do item III do art. 275;
II - chefe da unidade familiar:
a) o cônjuge do sexo masculino, ainda que casado apenas segundo o rito religioso, sobre o qual recai a responsabilidade econômica pela unidade familiar;
b) o cônjuge do sexo feminino, nas mesmas condições da letra "a", quando dirige e administra os bens do casal nos termos do art. 251 do Código Civil, desde que o outro cônjuge não receba aposentadoria por velhice ou invalidez; (grifei)
Art. 298. A pensão por morte do trabalhador rural é devida aos seus dependentes, a contar da data do óbito, e consiste numa renda mensal de 50% (cinqüenta por cento) do maior salário-mínimo do País, arredondada a fração de cruzeiro para a unidade imediatamente superior.
Parágrafo único. Somente fazem jus a pensão os dependentes do trabalhador rural chefe ou arrimo da unidade familiar falecido depois de 31 de dezembro de 1971, ou, no caso de pescador, depois de 31 de dezembro de 1972.
Por isso, nos termos da legislação anterior à Lei nº 8.213/1991, apenas ao chefe ou arrimo da unidade familiar era devida aposentadoria, haja vista que somente ele era considerado segurado especial da Previdência Social. Os demais membros do grupo familiar ostentavam somente a condição de dependentes e, consequentemente, o direito à pensão.
Assim, conforme a legislação da época, a mulher casada apenas poderia ser considerada segurada na qualidade de trabalhadora rural se o cônjuge varão fosse inválido e não recebesse aposentadoria por velhice ou por invalidez, o que não foi verificado no presente caso.
Na verdade, como normalmente ocorre no meio rural até hoje, cuja realidade social difere, e muito, da vida no meio urbano, era o recorrido quem desempenhava a função de chefe ou arrimo da unidade familiar.
Dessa forma, não sendo a falecida chefe do seu grupo familiar, não era possível que ela recebesse aposentadoria como trabalhadora rural nos termos da legislação vigente quando do óbito e, por outro, lado, não era possível que o recorrido, ainda que fosse inválido, ser considerado daquela dependente.
Saliente-se que, no caso, não podem ser utilizadas as regras da Lei nº 8.213/91, pois para tanto a de cujus deveria ter falecido ao tempo da vigência dessa norma.
(...)
Acaso rejeitadas as argumentações supra, pugna no sentido de se considerar devido o benefício, apenas, a contar da DER em 08/06/2021.
Com as contrarrazões, vieram os autos.
É o relatório.
VOTO
O INSS sustenta, em síntese, que a autora não mantinha a condição de segurada, considerando-se que a trabalhadora rural não era chefe ou arrimo de família, considerando-se a legislação vigente à época do óbito.
A sentença não acolheu a tese da defesa, reconhecendo o direito do autor ao benefício postulado.
Confira-se, a propósito, sua fundamentação:
Do Mérito
O benefício previdenciário postulado está previsto no art. 74 da Lei nº 8.213/91, segundo o qual a pensão por morte é devida aos dependentes do segurado que vier a falecer. Dependentes, conforme o art. 16 da Lei de Benefícios, são: a) o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido; b) os pais; c) o irmão não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido.
Desde a Lei nº 8.213/91, inclusive depois da redação dada pela Lei 13.183/2015, não há mais imposição do período de carência para a concessão de pensão por morte ao dependente de segurado, sendo necessário, no entanto, a presença de dois requisitos: qualidade de segurado ou beneficiário do RGPS do finado na data do óbito e qualidade de dependente.
A parte autora colacionou ao processo administrativo certidão de casamento, registro de óbito da esposa (sendo ela qualificada como agricultora), registro de imóveis constando o casal como agricultores, sendo o benefício indeferido sob o argumento de que 'o óbito ocorreu antes de 05/04/1991, e de acordo com a Lei 8.213/1991, a partir de quando o cônjuge do sexo masculino passou a ser considerado beneficiário do Regime Geral de Previdência Social, na condição de dependnete. Fundamento contido no art. 129 da IN 77/2015' (fl.48 do PROCADM11, evento 01).
Assim, considerando que não houve impugnação aos documentos indicativos da atividade campesina e que em momento algum a autarquia previdenciária controverteu o exercício da atividade laborativa exercida pela esposa do autor até a data do falecimento, passo a análise dos fundamentos que ensejaram o indeferimento do benefício.
O Supremo Tribunal Federal reiteradamente vem decidindo que 'o óbito da segurada, em data anterior ao advento da Lei 8.213/91, ou mesmo antes da promulgação da Constituição Federal de 1988, não afasta o direito à concessão de pensão por mote ao cônjuge varão, por força do princípio da isonomia'. No RE 1120680 a corte acrescenta, em relação à pensão por morte rural ao cônjuge varão, que "A Lei complementar 11/71 só admitia queo viúvo recebesse a pensão na hipótese de ser também inválido. Não havia, contudo, exigência semelhante à viúva. Diante da ofensa ao princípio da isonomia, aindda que o óbito da segurada tenha ocorrido em data anterior à da promulgação da Constituição de 1988 - ou ao advento da Lei 8.213/91 -, é devida a prestação".
Tal entendimento é igualmente adotado pelo Egrégio Tribunal Regional Federal da 4ª Região.
CONSTITUCIONAL E PREVIDENCIÁRIO. DECADÊNCIA. REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. CONTEXTO PROBATÓRIO. CONCESSÃO DE PENSÃO POR MORTE AO CÔNJUGE VARÃO NÃO INVÁLIDO. ÓBITO POSTERIOR À CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 E ANTERIOR À LEI 8.213. POSSIBILIDADE. PRINCÍPIO DA ISONOMIA. HONORÁRIOS. TUTELA ESPECÍFICA. 1. Rejeitadas as preliminares de decadência e de ausência de prévio requerimento administrativo. 2. A concessão de pensão por morte, a par da comprovação documental do evento que pode lhe dar origem, exige também a demonstração da qualidade de segurado do de cujus e a condição de dependente de quem pretende obter o benefício. 3. O art. 201, inciso V, da Constituição Federal de 1988, que equiparou homens e mulheres para efeito de pensão por morte, tem aplicabilidade imediata e independe de fonte de custeio. Orientação do STF. 4. É possível a concessão, ao cônjuge varão não inválido, de pensão por morte de segurada, inclusive a trabalhadora rural, falecida no período entre a promulgação da Constituição Federal e a vigência da Lei 8.213. 5. Honorários advocatícios majorados para o fim de adequação ao que está disposto no art. 85, §11, do CPC. 6. Determinada a implantação imediata do benefício. (TRF4, AC 5000680-62.2018.4.04.7131, QUINTA TURMA, Relator OSNI CARDOSO FILHO, juntado aos autos em 31/12/2020)
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. ÓBITO ANTERIOR À CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 E À LEI 8.213/91. INCONSTITUCIONALIDADE DA EXIGÊNCIA DE INVALIDEZ DO CÔNJUGE VARÃO. PRINCÍPIO DA ISONOMIA. POSSIBILIDADE DE EXIGÊNCIA DE CONDIÇÃO DE CHEFE/ARRIMO DE FAMÍLIA. PRESCRIÇÃO QUINQUENAL. 1. A data do óbito determina a legislação a ser utilizada (Súmula 340 STJ). 2. Exigir invalidez do cônjuge varão impõe violação ao princípio da isonomia, já presente na Constituição de 1967. 3. Entendimento jurisprudencial que permite a exigência da condição de chefe ou arrimo de família para se enquadrar como segurado especial. 4. Termo inicial do benefício na data do falecimento, conforme legislação vigente à época. 5. Prescrição das parcelas vencidas antes do quinquênio anterior à propositura da ação. 6. Apelação parcialmente provida. (TRF4, AC 5002642-14.2017.4.04.7210, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SC, Relator JOÃO BATISTA LAZZARI, juntado aos autos em 08/06/2020)
Neste panorama, considerando a orientação da Suprema Corte, seguida pelo Egrégio Tribunal Regional da 4ª Região, e não restando conteste a condição de trabalhadora rural de Idalina Caregnatto na data do falecimento, acolho a pretensão autoral para deferir o benefĩcio de pensão por morte n° 201.262.103-6, com data de início do benefício na partir do óbito (nos termos da legislação vigente na data do óbito).
De fato, a lei aplicável é aquela vigente à data do óbito (Súmula 340 do STJ).
Considerando que a esposa do autor faleceu em 28/01/1989, são aplicáveis os Decretos nº 83.080/79 e 83.312/84, já que a Lei 8.213/91 ainda não havia sido promulgada.
O Decreto 83.080/79 assim previa quanto à condição de dependência para fins previdenciários:
Art. 12. São dependentes do segurado:
I - A esposa, o marido inválido, a companheira mantida há mais de 5 (cinco) anos, os filhos de qualquer condição menores de 18 (dezoito) anos ou inválidos e as filhas solteiras de qualquer condição menores de 21 (vinte e um) anos ou inválidas;
II - a pessoa designada que seja do sexo masculino, só pode ser menor de 18 (dezoito) anos ou maior de 60 (sessenta) anos ou inválida;
III - o pai inválido e a mãe;
IV - os irmãos de qualquer condição menores de 18 (dezoito) anos ou inválidos a as irmãs solteiras de qualquer condição menores de 21 (vinte a um) anos ou inválidas.
Parágrafo único. Equiparam-se aos filhos nas condições do item I mediante declaração escrita do segurados:
a) o enteado;
b) o menor que por determinação judicial, se acha sob a guarda do segurado;
c) o menor que se acha sob a tutela de segurado e não possui bens suficientes para o próprio sustento e educação.
Art. 15. A dependência econômica da esposa ou marido inválido, dos filhos e dos equiparados a eles na forma do parágrafo único do artigo 12 é presumida a dos demais dependentes deve ser comprovada.
Já o Decreto nº 89.312/84, quanto a este mesmo tema, tinha a seguinte redação (sem grifos no original):
Art. 10. Consideram-se dependentes do segurado:
I - a esposa, o marido inválido, a companheira mantida há mais de 5 (cinco) anos, o filho de qualquer condição menor de 18 (dezoito) anos ou inválido e a filha solteira de qualquer condição menor de 21 (vinte e um) anos ou inválida;
II - a pessoa designada, que, se do sexo masculino, só pode ser menor de 18 (dezoito) anos ou maior de 60 (sessenta) anos, ou inválida;
III - o pai inválido e a mãe;
IV - o irmão de qualquer condição menor de 18 (dezoito) anos ou inválido e a irmã solteira de qualquer condição menor de 21 (vinte e um) anos ou inválida.
Como se vê, o Decreto nº 89.312/84 considerava dependente a esposa, mas exigia do marido sua condição de invalidez.
A norma conferia, portanto, tratamento diferente ao homem e à mulher.
Tal discriminação entra em conflito direto com o princípio da isonomia, previsto na Constituição Federal de 1988, no artigo 5º, inciso I:
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
I - homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição;
Há incompatibilidade também com a disposição do artigo 201, V, da Carta Magna, que previu o direito à pensão por morte tanto ao cônjuge varão quanto ao cônjuge inválido, sem fazer distinções.
O dispositivo tinha, na data do óbito da instituidora, a seguinte redação:
Art. 201. Os planos de previdência social, mediante contribuição, atenderão, nos termos da lei, a:
(...)
V - pensão por morte de segurado, homem ou mulher, ao cônjuge ou companheiro e dependentes, obedecido o disposto no § 5º e no art. 202.
A orientação atual do Supremo Tribunal Federal é no sentido da possibilidade de o cônjuge varão não inválido ser considerado dependente, mesmo antes da vigência da Lei 8.213/91.
De acordo com Min. Luis Fux, (RE 607907 AgR, Primeira Turma, julgado em 21/06/2011, DJe 01-08-2011):
Os óbitos de segurados ocorridos entre o advento da Constituição de 1988 e a Lei 8.213/91 regem-se, direta e imediatamente, pelo disposto no artigo 201, inciso V, da Constituição Federal, que, sem recepcionar a parte discriminatória da legislação anterior, equiparou homens e mulheres para efeito de pensão por morte.
No mesmo sentido:
PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. PENSÃO POR MORTE AO CÔNJUGE VARÃO. ÓBITO DA SEGURADA EM DATA ANTERIOR AO ADVENTO DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988. PRINCÍPIO DA ISONOMIA (ART. 153, § 1º, DA CF/1967, NA REDAÇÃO DA EC 1/1969). PRECEDENTES. 1. Segundo a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, o óbito da segurada em data anterior ao advento da Constituição Federal de 1988 não afasta o direito à pensão por morte ao seu cônjuge varão. Nesse sentido: RE 439.484-AgR, Rel. Min. ROBERTO BARROSO, Primeira Turma, DJe de 5/5/2014; RE 535.156-AgR, Rel. Min. CÁRMEN LÚCIA, Primeira Turma, DJe de 11/4/2011. 2. Agravo regimental a que se nega provimento. (RE 880521 AgR, Relator(a): Min. TEORI ZAVASCKI, Segunda Turma, julgado em 08/03/2016).
Com base em tais precedentes, seja considerando-se os casos de óbito da esposa antes do advento da Constituição Federal de 1988, como aqueles que antecederam a Lei nº 8.213/91, este Tribunal passou a adotar o entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal.
Confiram-se, pois, as ementas de precedentes deste Tribunal:
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. LEGISLAÇÃO DE REGÊNCIA. TEMPUS REGIT ACTUM. FUNRURAL. LC 11/71. DECRETO 83.080/79. ÓBITO DO INSTITUIDOR POSTERIOR À CONSTITUIÇÃO DE 1988 E ANTERIOR À LEI Nº 8.213/91. ARTIGO 201, V, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. REQUISITOS. QUALIDADE DE SEGURADO ESPECIAL. CHEFE OU ARRIMO DE FAMÍLIA. DESNECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO. IGUALDADE DE GÊNERO. VÍNCULO DE DEPENDÊNCIA ECONÔMICA. QUALIDADE DE SEGURADO ESPECIAL. PROVA TESTEMUNHAL LASTREADA EM UM INÍCIO DE PROVA MATERIAL. OCORRÊNCIA. AMPARO PREVIDENCIÁRIO. CABIMENTO. CONSECTÁRIOS LEGAIS DA CONDENAÇÃO. PRECEDENTES DO STF (TEMA 810) E STJ (TEMA 905). IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO. 1. A concessão do benefício de pensão por morte depende da ocorrência do evento morte, da demonstração da qualidade de segurado do de cujus e da condição de dependente de quem objetiva a pensão. 2. A pensão por morte de trabalhador rural passou a ser prevista somente a partir da edição da Lei Complementar nº 11, de 25 de maio de 1971, regulamentada pelo Decreto nº 83.080/79, sob o regime do FUNRURAL, sendo essa a legislação vigente à época do óbito. Não obstante, quando o falecimento ocorre após a vigência da Constituição Federal de 1988, o pedido de pensão deve ser examinado de acordo com as recentes decisões do Supremo Tribunal Federal, que estendem o direito ao cônjuge varão não inválido, nos termos do art. 201, V, da Carta Magna, o qual estabelece a presunção de inter dependência mútua entre esposo e esposa. 3. Igualmente, desde o advento da Constituição de 1988 não existe mais justificativa para estabelecer distinção para fins previdenciários com base no conceito de arrimo de família. Homens e mulheres são iguais em direitos e deveres, de modo que demonstrada a condição de trabalhador rural, a ambos deve ser assegurado o acesso à previdência social. 4. Comprovado que o falecido era trabalhador rural, conforme oitiva testemunhal lastreada em um início de prova material, sua esposa/viúva faz jus ao benefício da pensão, na qualidade de dependente. 5. Critérios de correção monetária e juros de mora conforme decisão do STF no RE nº 870.947/SE (Tema 810) e do STJ no REsp nº 1.492.221/PR (Tema 905). 6. Conforme entendimento firmado pela 3ª Seção desta Corte, a tutela deverá ser antecipada independentemente de requerimento expresso da parte, devendo o INSS implantar o benefício concedido, sob pena de multa. (TRF4, AC 5030746-54.2018.4.04.9999, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, Relator FERNANDO QUADROS DA SILVA, juntado aos autos em 13/05/2021)
PREVIDENCIÁRIO. pensão por morte DE ESPOSA. ÓBITO ANTERIOR À CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988. RECONHECIMENTO DA QUALIDADE DE SEGURADA ESPECIAL DA DE CUJUS. POSSIBILIDADE. 1. Tendo o óbito da instituidora ocorrido em 22-03-1973, o pedido de pensão deve ser examinado à luz da LC n° 11/71 e da Lei n.º 3.807/1960 (Lei Orgânica da Previdência Social) que então vigiam e regulamentavam a matéria. 2. É devido o benefício de pensão por morte de segurada rural falecida anteriormente à Constituição Federal de 1988, mesmo quando ela não detinha a condição de chefe ou arrimo de família. Precedentes do STF e da Turma Regional Suplementar do Paraná (TRF 4a Região). 3. Comprovado o preenchimento de todos os requisitos legais, a parte autora faz jus ao benefício de pensão por morte a contar do requerimento administrativo, observada a prescrição quinquenal. (TRF4, AC 5000055-18.2014.4.04.7212, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SC, Relator CELSO KIPPER, juntado aos autos em 13/05/2020)
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. BENEFÍCIO CONCEDIDO AO CÔNJUGE VARÃO NÃO INVÁLIDO. ÓBITO DA SEGURADA TRABALHADORA RURAL ANTERIOR À LEI 8213/91. VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA ISONOMIA. ARTIGO 201, INCISO V, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. AUTOAPLICABILIDADE. JUROS E CORREÇÃO. 1. A concessão do benefício de pensão por morte depende da ocorrência do evento morte, da demonstração da qualidade de segurado do de cujus e da condição de dependente de quem objetiva o benefício. 2. Os óbitos de segurados ocorridos entre o advento da Constituição de 1988 e a Lei 8.213/91 regem-se, direta e imediatamente, pelo disposto no artigo 201, inciso V, da Constituição Federal, que, sem recepcionar a parte discriminatória da legislação anterior, equiparou homens e mulheres para efeito de pensão por morte. Inteligência da jurisprudência pacificada do STF. 3. Ao marido não inválido de trabalhadora rural deve ser reconhecido o direito à pensão por morte, estendendo-se à instituidora a condição de segurada especial quando o óbito ocorreu após a Constituição Federal de 1988 (precedentes desta Corte). 4. O Supremo Tribunal Federal reconheceu no RE 870947, com repercussão geral, a inconstitucionalidade do uso da TR. 5. O Superior Tribunal de Justiça, no REsp 1495146, em precedente também vinculante, e tendo presente a inconstitucionalidade da TR como fator de atualização monetária, distinguiu os créditos de natureza previdenciária, em relação aos quais, com base na legislação anterior, determinou a aplicação do INPC, daqueles de caráter administrativo, para os quais deverá ser utilizado o IPCA-E. 6. Estando pendentes embargos de declaração no STF para decisão sobre eventual modulação dos efeitos da inconstitucionalidade do uso da TR, impõe-se fixar desde logo os índices substitutivos, resguardando-se, porém, a possibilidade de terem seu termo inicial definido na origem, em fase de cumprimento de sentença. 7. Os juros de mora, a contar da citação, devem incidir à taxa de 1% ao mês, até 29-06-2009. A partir de então, incidem uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo o percentual aplicado à caderneta de poupança. (TRF4, AC 5038963-23.2017.4.04.9999, SEXTA TURMA, Relatora TAÍS SCHILLING FERRAZ, juntado aos autos em 04/11/2019)
Portanto, deve ser afastada a aplicação de legislação que resulte tratamento discriminatório entre homens e mulheres, sendo inexigível a comprovação de invalidez, estabelecendo-se a isonomia para a concessão de pensão por morte entre homens e mulheres.
Resta avaliar, contudo, se a de cujus tinha a condição de segurada especial.
Em seu registro de óbito, a falecida está qualificada como agricultora. Outrossim, nos documentos de registro do imóvel rural, a instituidora e seu cônjuge também estão qualificados como agricultores.
O apelante não refutou tal qualidade, não havendo dissentido da conclusão sentencial de que a esposa do autor, de fato, dedicava-se às lidas rurais conjuntamente com este.
Assim sendo, resta possível o reconhecimento da qualidade de segurado especial da instituidora, como trabalhadora rural.
Por fim, consigne-se que, tratando-se de marido e mulher, a dependência é presumida e foi, ademais, comprovada tanto pela certidão de casamento, como pela certidão de óbito, eis que em tais documentos resta clara a condição de casados (autor e instituidora).
Dessa forma, reconhece-se o direito do autor à pensão por morte.
Quanto ao marco inicial do benefício, tecem-se as considerações que se seguem.
Por regra, também a sua fixação observa as leis vigentes por ocasião do óbito do instituidor, de acordo com o princípio do tempus regis actum.
No caso dos autos, no entanto, tem-se a peculiaridade, qual seja a de que se está afastando a legislação vigente por ocasião do falecimento da esposa do autor, no ponto em que esta traz tratamento discriminatório entre homens e mulheres.
Todavia, quanto ao marco inicial, a referida legislação não trazia esse mesmo vício, motivo pelo qual é possível a concessão desde o óbito, observada a prescrição quinquenal já pronunciada pela sentença.
Além disso, veja-se que, antes da Lei nº 9.528/97, a legislação sempre previu que a pensão por morte seria devida a contar do falecimento, independente da data do requerimento, observada apenas à prescrição quinquenal.
Por conseguinte, embora por ocasião do requerimento administrativo (DER 08/06/2021) a legislação regente tenha tratado a quaestio de modo distinto, tem-se que deve ser prestigiada a legislação então vigente por ocasião do óbito da instituidora.
Neste cenário, a insurgência, também neste tocante, não merece prosperar.
Em face da sucumbência recursal do apelante, majoro, em 10% (dez por cento), o valor dos honorários advocatícios arbitrados na sentença (Código de Processo Civil, artigo 85, § 11).
Deixo de determinar a implantação do benefício, considerando-se que o INSS já a comprovou (evento 26 da origem).
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação.
Documento eletrônico assinado por SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003031571v10 e do código CRC 4c190010.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
Data e Hora: 15/2/2022, às 17:51:27
Conferência de autenticidade emitida em 23/02/2022 04:01:22.
Apelação Cível Nº 5013146-64.2021.4.04.7202/SC
PROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 5013146-64.2021.4.04.7202/SC
RELATOR: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: ZEFERINO CAREGNATTO (AUTOR)
ADVOGADO: LUCIANA ZANCO (OAB SC057392A)
ADVOGADO: LUCIANA ZANCO (OAB PR093385)
EMENTA
previdenciário. pensão por morte. ÓBITO POSTERIOR À CONSTITUIÇÃO DE 1988 E ANTERIOR À LEI 8.213/91. inconstitucionalidade da exigência de invalidez do cônjuge varão para sua qualificação como dependente previdenciário.
1. A data do óbito determina a legislação a ser utilizada (Súmula 340 do STJ).
2. Exigir invalidez do cônjuge varão impõe violação ao artigo 201, V, da Constituição Federal de 1988.
3. Comprovada a condição de segurada da instituidora e sendo presumida a relação de dependência entre ela e o autor, que era seu cônjuge, deve ser reconhecido o direito deste à pensão por morte.
4. Apelação improvida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar de Santa Catarina do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 14 de fevereiro de 2022.
Documento eletrônico assinado por SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003031572v3 e do código CRC 6b331032.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
Data e Hora: 15/2/2022, às 17:51:27
Conferência de autenticidade emitida em 23/02/2022 04:01:22.
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 07/02/2022 A 14/02/2022
Apelação Cível Nº 5013146-64.2021.4.04.7202/SC
RELATOR: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
PRESIDENTE: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
PROCURADOR(A): WALDIR ALVES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: ZEFERINO CAREGNATTO (AUTOR)
ADVOGADO: LUCIANA ZANCO (OAB SC057392A)
ADVOGADO: LUCIANA ZANCO (OAB PR093385)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 07/02/2022, às 00:00, a 14/02/2022, às 16:00, na sequência 1232, disponibilizada no DE de 26/01/2022.
Certifico que a Turma Regional suplementar de Santa Catarina, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SANTA CATARINA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
Votante: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
Votante: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
Votante: Desembargador Federal CELSO KIPPER
ANA CAROLINA GAMBA BERNARDES
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 23/02/2022 04:01:22.