Apelação Cível Nº 5012605-94.2017.4.04.7000/PR
RELATOR: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: GEOVANA FERNANDA DE ARAUJO (AUTOR)
APELADO: KENDRA KAUANE NOVINSKI DA SILVA SANTOS (RÉU)
APELADO: CRISTIAN RUAN NOVINSKI SANTOS (RÉU)
APELADO: OS MESMOS
RELATÓRIO
Trata-se de ação previdenciária ajuizada por Geovana Fernanda de Araujo, representada por sua genitora, visando a concessão do benefício de pensão por morte em razão do óbito de seu pai, Altivo da Silva Santos Junior, ocorrido em 08/11/2010, sob a alegação de restar demonstrada a sua qualidade de dependente através da sentença judicial de reconhecimento de paternidade do de cujus.
Foi deferida a tutela antecipada (ev. 26).
Citado, os litisconsortes, Cristian e Kendra, filhos do falecido, apresentaram contestação, não se opondo ao pedido de rateio da pensão uma vez que reconhecido o pedido da parte autora. Requerendo a declaração de impossibilidade de cobrança dos valores retroativos (ev. 68).
Sentenciando, em 29/11/2018, o Juízo a quo assim decidiu:
Pelo exposto, julgo procedente o pedido para condenar o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS a implantar o benefício de pensão por morte à parte autora NB 176.680.72-8 , na forma da fundamentação.
Sendo assim, o benefício deve ser concedido desde a data do óbito (08/11/2010), uma vez que contra ela não corria o prazo prescricional.
Ressalto que o benefício deverá ser dividido entre os demais titulares, não devendo o INSS efetuar a cobrança dos valores retroativos em desfavor dos corréus Cristian Ruan Novinski Santos e Kendra Kauane Novinski da Silva Santos, considerando o caráter alimentar do benefício e o fato de o terem recebido de boa-fé.
As prestações deverão ser corrigidas monetariamente desde o vencimento de cada parcela, aplicando-se os juros de mora, nos termos da fundamentação, por meio de requisição de pagamento, descontadas as parcelas já pagas em razão da antecipação dos efeitos da tutela.
Condeno o INSS ao pagamento integral dos honorários de sucumbência, fixados no percentual mínimo de cada faixa estipulada pelo artigo 85, § 3°, do Novo Código de Processo Civil, dependendo da apuração do montante em eventual cumprimento de sentença, sempre observando o § 5° do artigo 85 do CPC. Levo em conta, para tanto, o moderado grau de zelo do procurador do autor, bem como que a cidade da prestação de serviço é a mesma em que o i. causídico tem escritório, não importando deslocamentos, além da importância da causa e finalmente que a causa não demandou tempo extraordinário do i. causídico. A base de cálculo será o valor da condenação, limitado ao valor das parcelas vencidas até a sentença (Súmula 111, STJ; Súmula 76, TRF4).
Na hipótese de interposição de recursos voluntários tenham-se desde já por recebidos em seus legais efeitos, intime-se a parte contrária para apresentação de contra-razões, no devido prazo, e remetam-se os autos ao E. TRF da 4ª Região.
Em que pese ilíquida a sentença, o valor da condenação claramente é inferior a 1.000 (mil) salários-mínimos. Assim, dispensado o reexame necessário, nos termos do art. 496, § 3º, I, do CPC.
Apela o INSS alegando a falta de comprovação da condição de filiação em relação ao falecido, uma vez que não houve decisão transitada em julgado do pedido de investigação de paternidade da autora, devendo ser julgada improcedente a ação. Subsidiariamente, querer que a DIB seja fixada a contar da DER, em face da habilitação tardia de absolutamente incapaz, eis que já existe outros beneficiários. Requer o reconhecimento da dedução dos valores recebidos além de sua cota-parte, em relação aos codependentes, e que seja aplicada a Lei 11.960/09, no tocante os consectários.
Oportunizadas as contrarrazões, vieram os autos a este Tribunal.
O MPF opinou pelo parcial provimento da apelação e da remessa oficial (que deve ser considerada como interposta), para que a atualização monetária das parcelas vencidas seja feita pelo índice IPCA-E.
É o relatório.
VOTO
DA PENSÃO POR MORTE
A concessão do benefício de pensão por morte depende do preenchimento dos seguintes requisitos: a ocorrência do evento morte, a condição de dependente de quem objetiva a pensão e a demonstração da qualidade de segurado do de cujus por ocasião do óbito.
Além disso, conforme o disposto no art. 26, I, da Lei nº 8.213/1991, referido benefício independe de carência, regendo-se pela legislação vigente à época do falecimento.
Sobre a condição de dependência para fins previdenciários, dispõe o artigo 16 da Lei 8.213/91:
Art. 16. São beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condição de dependentes do segurado:
I - o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido; [redação alterada pela Lei nº 9.032/95]
II - os pais;
III - o irmão não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido; [redação alterada pela Lei nº 9.032/95]
IV - REVOGADO pela Lei nº 9.032/95.
§ 1º A existência de dependente de qualquer das classes deste artigo exclui do direito às prestações os das classes seguintes.
§ 2º O enteado e o menor tutelado equiparam-se a filho mediante declaração do segurado e desde que comprovada a dependência econômica na forma estabelecida no Regulamento. [redação alterada pela MP nº 1.523/96, reeditada até a conversão na Lei nº 9.528/97]
§ 3º Considera-se companheira ou companheiro a pessoa que, sem ser casada, mantém união estável com o segurado ou com a segurada, de acordo com o § 3º do art. 226 da Constituição Federal.
§ 4º A dependência econômica das pessoas indicadas no inciso I é presumida e a das demais deve ser comprovada.
O dependente, assim considerado na legislação previdenciária, pode valer-se de amplo espectro probatório de sua condição, seja para comprovar a relação de parentesco, seja para, nos casos em que não presumível por lei, demonstrar a dependência. Esta pode ser parcial, devendo, contudo, representar um auxílio substancial, permanente e necessário, cuja falta acarretaria desequilíbrio dos meios de subsistência do dependente (En. 13 do CRPS).
Do caso concreto
O óbito de Altivo da Silva Santos Junior ocorreu em 08/11/2010 (ev. 1.7).
A qualidade de segurado dos de cujus por ocasião do falecimento, não contestada nesta ação, restou comprovada, eis que já existe outros beneficiários da referida pensão.
A controvérsia diz respeita a qualidade de dependente da autora, cuja filiação foi comprovada através da procedência da ação de reconhecimento de paternidade do finado.
A fim de evitar tautologia, transcrevo parte da sentença (evento 95), proferida pela Juíza Federal Luciana Dias Bauer, que bem decidiu a questão, adotando os seus fundamentos como razões de decidir:
Resta comprovar a qualidade de dependente da requerente.
Verifico que a requerente ajuizou ação de investigação de paternidade, cumulada com pedido de alimentos em 20/05/2004 (evento 1, OUT9, fls. 01/05), Realizada perícia (evento 18), na qual foi realizado exame de DNA que concluiu que o Sr. Altivo da Silva Santos Junior é o pai biológico da requerente (evento 1, OUT9, fls. 29/33). O segurado falecido, naqueles autos, reconheceu em contestação a paternidade (fls. 49/53). Designada audiência para conciliação em relação ao valor dos alimentos, as partes não compareceram, razão pela qual o feito foi extinto sem resolução do mérito, em 29/10/2009 (evento 1, OUT9, fls. 99/100).
Em 25/08/2007, a requerente ajuizou Execução de Alimentos Provisórios em face do segurado, alegando que ele não estava pagando os alimentos provisórios fixados na ação de investigação de paternidade (evento 1, OUT8, fls. 01/08). O réu informou, em 01/06/2010, que estava pagando a pensão alimentícia (fl. 32), razão pela qual o feito foi extinto sem resolução do mérito (fl. 47).
O Ministério Público Federal, nestes autos, opinou pela procedência da ação.
Tendo em vista o exame de DNA, o reconhecimento da paternidade pelo segurado falecido nos autos da ação de investigação da paternidade e o pagamento de pensão alimentícia por parte dele, entendo que restou comprovada a qualidade de dependente da autora em relação ao Sr. Altivo da Silva Santos Junior, que era pai dela.
Presentes os requisitos para concessão da pensão por morte, é devido o benefício desde a DER, nos termos do art. 74, I e II, da Lei nº 8.213/91.
No entanto, nos termos do art. 198, I, do Código Civil, não corre a prescrição contra os absolutamente incapazes.
Observo que na data do requerimento administrativo (15/04/2016), a autora contava com 14 anos, pois nascida em 17/01/2002.
Sendo assim, o benefício deve ser concedido desde a data do óbito (08/11/2010), uma vez que contra ela não corria o prazo prescricional.
Ressalto que o benefício deverá ser dividido entre os demais titulares, não devendo o INSS efetuar a cobrança dos valores retroativos em desfavor dos corréus Cristian Ruan Novinski Santos e Kendra Kauane Novinski da Silva Santos, considerando o caráter alimentar do benefício e o fato de o terem recebido de boa-fé.
No mesmo sentido, o parecer ministerial (ev. 4):
Já quanto à qualidade de dependente da autora, diante daalegada falta de comprovação da condição de filho (objeto da apelação do INSS),devemos ter em conta que, apesar de efetivamente não constar a paternidade dode cujus na sua certidão de nascimento (evento 1, OUT9, pg. 08), a filiação restoudevidamente comprovada na Ação de Investigação de Paternidade nº 550/2004,especialmente por ter sido realizado exame de DNA, que apontou Altivo da SilvaSantos Junior como sendo o pai biológico de Geovana Fernanda de Araújo(evento 1, OUT9, pg. 32).
(...)
Assim, considerando que a filiação poderá ser provada porqualquer modo admissível em direito (art. 1.605, caput, do CC2), bem como que apaternidade está comprovada nos autos, temos que deve ser reconhecida aqualidade de filha da autora, sendo, em consequência, sua dependênciaeconômica presumida (§ 4º do art. 16 da Lei nº 8.213/1991), pois é menor de 21anos, já que nasceu no dia 17/01/2002, conforme comprova sua certidão denascimento (evento 1, OUT9, pg. 08).
Pelo mesmo motivo, entendemos que não é o caso de suspensãodo processo, com base no art. 313, V, do CPC, conforme requerido pelo INSS emsuas razões recursais (evento 110, APELAÇÃO1, pg. 07-09), pois já há provas suficiente da paternidade.
Desta forma, concluímos que restou comprovada a qualidade de segurado de Altivo da Silva Santos Júnior ao tempo do óbito e a condição de dependente da autora, motivo pelo qual faz jus ao recebimento do benefício depensão por morte, na forma como estabelecido na sentença.
Já quanto ao início do pagamento do benefício, considerando que a autora era absolutamente incapaz ao tempo do óbito de seu genitor, deve ser fixada a data de início do pagamento do benefício no dia do falecimento, ocorrido em 08/11/2010 (evento 1, CERTOBT7), já que contra o incapaz não corre o prazo previsto no art. 74, I, da Lei nº 8.213/91, por força do disposto no art. 198, I, doCódigo Civil, c/c os art. 79 e 103 da Lei nº 8.213/91, devendo ser mantida a sentença.
(...)
Quanto a eventual devolução dos valores já pagos pelo corréus(objeto do recurso do INSS), também não há motivos para se alterar a sentença,que abordou corretamente a questão, in verbis:
Ressalto que o benefício deverá ser dividido entre os demaistitulares, não devendo o INSS efetuar a cobrança dos valoresretroativos em desfavor dos corréus Cristian Ruan Novinski Santos eKendra Kauane Novinski da Silva Santos, considerando o caráteralimentar do benefício e o fato de o terem recebido de boa-fé. (evento95)
Ressalto, por oportuno, que não há confundir o direito com o seu exercício, ou seja, o fato de a autora não ter requerido o pensionamento por ocasião do falecimento de seu pai, já que estava buscando o reconhecimento da paternidade judicialmente, não o impede de postular benefício previdenciário já integrado ao seu patrimônio jurídico. Nesse sentido a AC nº 2005.72.01.001284-2, 5ª Turma, de minha relatoria, unânime, D.E. 15/05/2007 e AC Nº 2007.70.99.004484-9, 5ª Turma, Rel. Juiz Federal Alcides Vettorazzi, unânime, D.E. 29/07/2008.
A autora Geovana Fernanda de Araujo, nascida em 17/01/2002, tinha 8 anos de idade quando do óbito do pai, ocorrido em 08/11/2010. Diante de absolutamente incapaz, não há falar em prazo prescricional, a teor do disposto nos arts. 169, inciso I, e 5º, inciso I, ambos do Código Civil de 1916, e art. 198, inciso I, do Código Civil de 2002, c/c os artigos 79 e 103, parágrafo único, da Lei de Benefícios.
Esclareço, ainda, que os efeitos financeiros retroagem à data do óbito em razão de que a autora não se favoreceu da percepção da pensão por parte dos outros beneficiários, não podendo sofrer prejuízo pela demora a que não deu causa. Fosse a hipótese, por exemplo, de mãe e filha convivendo juntas, o recebimento do benefício por uma aproveitaria à outra, não ensejando diferenças pretéritas.
Em conclusão, atendidas as exigências previstas na legislação de regência, deve ser mantida a sentença que condenou o INSS ao pagamento da cota-parte do benefício de pensão por morte à autora, a contar do óbito do genitor, 08/11/2010, cujo benefício deve ser rateado entre todos os demais dependentes.
Logo, comprovada a qualidade de segurado do "de cujus" e a condição de dependente da autora através da procedência da ação de reconhecimento de paternidade, é de ser mantida a sentença de procedência da ação.
Do termo inicial do benefício
Mantido o termo inicial fixado pela sentença, ou seja, a contar do óbito do pai, em 08/11/2010, eis que a autora, nascida em 17/01/2002, possuia 14 anos de idade quando da DER (15/04/2016). Logo, não há falar em prazo prescricional.
O benefício de pensão por morte deve ser rateado com os demais dependentes do finado, filhos do "de cujus", Cristian Ruan Novinski Santos e Kendra Kauane Novinski da Silva Santos, como bem determinado pelo juízo a quo.
Da Irrepetibilidade dos valores recebidos de boa-fé
Embora o art. 115, inciso II, da Lei n. 8.213/91 preveja, de fato, a possibilidade de desconto de pagamento de benefício além do devido, há que se interpretar tal autorização restritivamente, dada a manifesta natureza alimentar do benefício previdenciário, a evidenciar que qualquer supressão de parcela deste comprometeria a subsistência do segurado e seus dependentes, em afronta ao princípio do respeito à dignidade humana (art. 1º, III, da CF/88). Assim, o INSS não pode cobrar do segurado os valores recebidos, de boa-fé, conforme iterativa jurisprudência que consagrou o princípio da irrepetibilidade dos valores de benefícios previdenciários sempre que verificada a boa-fé do beneficiário.
Nesse sentido, trago à colação os seguintes acórdãos:
AGRAVO. PREVIDENCIÁRIO. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. REQUISITOS. ACUMULAÇÃO INDEVIDA DE BENEFÍCIOS. PARCELAS RECEBIDAS DE BOA-FÉ. IRREPETIBILIDADE. 1. A Terceira Seção desta Corte sedimentou o entendimento de serem irrepetíveis as parcelas indevidas de benefícios previdenciários recebidas de boa-fé, em face do seu caráter eminentemente alimentar, razão pela qual se entende presente a verossimilhança das alegações, pois, em sede de cognição sumária, não se identificam indícios de má-fé do segurado. O risco de dano irreparável consubstancia-se no fato de que o benefício de aposentadoria por invalidez de trabalhador rural titulado pelo demandante, que atualmente conta 75 anos de idade, é de valor mínimo, sendo qualquer desconto prejudicial à manutenção de suas necessidades básicas. 2. Cabível, portanto, a antecipação dos efeitos da tutela, estando a parte autora dispensada da devolução dos valores percebidos em decorrência do benefício previdenciário suspenso. (TRF4, AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 5010815-02.2012.404.0000, 6a. Turma, Des. Federal CELSO KIPPER, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 27/09/2012)
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. DEVOLUÇÃO DE VALORES RECEBIDOS. IMPOSSIBILIDADE. BOA-FÉ DO SEGURADO. PRINCÍPIO DA IRREPETIBILIDADE DOS ALIMENTOS. Diante do caráter alimentar dos benefícios previdenciários e da boa-fé do segurado, cabível a aplicação do princípio da irrepetibilidade dos alimentos para afastar a necessidade de devolução de valores pagos ao segurado a título de aposentadoria por invalidez após o retorno ao trabalho. (TRF4, APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 5008121-13.2011.404.7108, 5a. Turma, Juiza Federal CLÁUDIA CRISTINA CRISTOFANI, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 02/08/2012)
MANDADO DE SEGURANÇA. PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. DESCONTO DOS VALORES PAGOS A MAIOR. EQUÍVOCO ADMINISTRATIVO. CARÁTER ALIMENTAR DAS PRESTAÇÕES PREVIDENCIÁRIAS. 1. Esta Corte vem se manifestando no sentido da impossibilidade de repetição dos valores recebidos de boa-fé pelo segurado, dado o caráter alimentar das prestações previdenciárias, sendo relativizadas as normas dos arts. 115, II, da Lei nº 8.213/91, e 154, § 3º, do Decreto nº 3.048/99. 2. Hipótese em que, diante do princípio da irrepetibilidade ou da não-devolução dos alimentos, deve ser afastada a cobrança dos valores determinada pela autarquia. (TRF4, APELREEX 2008.72.11.001599-4, Quinta Turma, Relator Ricardo Teixeira do Valle Pereira, D.E. 03/05/2010).
Com efeito, tendo em vista que, ao menos por ocasião de um exame inicial, não há indício de que os corréus tenham concorrido para o pagamento dos valores alegadamente indevidos ou, de qualquer outra forma, agido de má-fé, não considero viável a respectiva cobrança por se tratar de verba de caráter alimentar, recebida de boa-fé, não sujeitas à repetição.
Logo, diante do princípio da irrepetibilidade ou da não-devolução dos alimentos, tenho por indevida a cobrança dos valores recebidos de boa-fé pelos corréus Cristian Ruan Novinski Santos e Kendra Kauane Novinski da Silva Santos.
CONSECTÁRIOS LEGAIS
Os critérios de correção monetária e juros de mora vinham sendo fixados por esta Turma nos termos das decisões proferidas pelo STF, no RE nº 870.947, DJE de 20/11/2017 (Tema 810), e pelo STJ, no REsp nº 1.492.221/PR, DJe de 20/03/2018 (Tema 905).
Todavia, em 24/09/2018, o Relator do RE 870.947/SE, com base no artigo 1.026, §1º, do CPC/2015, c/c o artigo 21,V, do RISTF, excepcionalmente, conferiu efeito suspensivo aos Embargos de Declaração interpostos pelos entes federativos estaduais.
Ressalte-se, no entanto, que a questão da atualização monetária das quantias a que é condenada a Fazenda Pública, dado o caráter acessório de que se reveste, não deve ser impeditiva da regular marcha do processo no caminho da conclusão da fase de conhecimento.
Firmado em sentença, em apelação ou remessa necessária o cabimento dos juros e da correção monetária por eventual condenação imposta ao ente público e seus termos iniciais, a forma como serão apurados os percentuais correspondentes, sempre que se revelar fator impeditivo ao eventual trânsito em julgado da decisão condenatória, pode ser diferida para a fase de cumprimento, observando-se a norma legal e sua interpretação então em vigor. Isso porque é na fase de cumprimento do título judicial que deverá ser apresentado, e eventualmente questionado, o real valor a ser pago a título de condenação, em total observância à legislação de regência.
O art. 491 do CPC, ao prever, como regra geral, que os consectários já sejam definidos na fase de conhecimento, deve ter sua interpretação adequada às diversas situações concretas que reclamarão sua aplicação. Não por outra razão seu inciso I traz exceção à regra do caput, afastando a necessidade de predefinição quando não for possível determinar, de modo definitivo, o montante devido. A norma tem como objetivo favorecer a celeridade e a economia processuais.
E no caso, o enfrentamento da questão pertinente ao índice de correção monetária, a partir da vigência da Lei nº 11.960/09, nos débitos da Fazenda Pública, embora de caráter acessório, tem criado graves óbices à razoável duração do processo.
Tratando-se de débito, cujos consectários são totalmente definidos por lei, inclusive quanto ao termo inicial de incidência, nada obsta a que seja diferida a solução definitiva para a fase de cumprimento do julgado, em que, a propósito, poderão as partes, se assim desejarem, mais facilmente conciliar acerca do montante devido, de modo a finalizar definitivamente o processo.
Sobre essa possibilidade, já existe julgado da Terceira Seção do STJ, em que assentado que "diante a declaração de inconstitucionalidade parcial do artigo 5º da Lei n. 11.960/09 (ADI 4357/DF), cuja modulação dos efeitos ainda não foi concluída pelo Supremo Tribunal Federal, e por transbordar o objeto do mandado de segurança a fixação de parâmetros para o pagamento do valor constante da portaria de anistia, por não se tratar de ação de cobrança, as teses referentes aos juros de mora e à correção monetária devem ser diferidas para a fase de execução. 4. Embargos de declaração rejeitados". (EDcl no MS 14.741/DF, Rel. Ministro JORGE MUSSI, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 08/10/2014, DJe 15/10/2014).
Portanto, em face da incerteza quanto ao índice de atualização monetária, e considerando que a discussão envolve apenas questão acessória no contexto da lide, à luz do que preconizam os art. 4º, 6º e 8º do Código de Processo Civil, mostra-se adequado e racional diferir-se para a fase de execução a solução em definitivo acerca dos critérios de correção, ocasião em que, provavelmente, a questão já terá sido dirimida pelo tribunal superior, o que conduzirá à observância, pelos julgadores, ao fim e ao cabo, da solução uniformizadora.
A fim de evitar novos recursos, inclusive na fase de cumprimento de sentença, e anteriormente à solução definitiva pelo STF sobre o tema, a alternativa é que o cumprimento do julgado se inicie, adotando-se os índices da Lei nº 11.960/09, inclusive para fins de expedição de precatório ou RPV pelo valor incontroverso, diferindo-se para momento posterior ao julgamento pelo STF a decisão do juízo sobre a existência de diferenças remanescentes, a serem requisitadas, acaso outro índice venha a ter sua aplicação legitimada.
Os juros de mora, incidentes desde a citação, como acessórios que são, também deverão ter sua incidência garantida na fase de cumprimento de sentença, observadas as disposições legais vigentes conforme os períodos pelos quais perdurar a mora da Fazenda Pública.
Evita-se, assim, que o presente feito fique paralisado, submetido a infindáveis recursos, sobrestamentos, juízos de retratação, e até ações rescisórias, com comprometimento da efetividade da prestação jurisdicional, apenas para solução de questão acessória.
Diante disso, difere-se para a fase de cumprimento de sentença a forma de cálculo dos consectários legais, adotando-se inicialmente o índice da Lei nº 11.960/09.
ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA
Confirmado o direito ao benefício de pensão por morte, resta mantida a antecipação dos efeitos da tutela, concedida pelo juízo de origem.
CONCLUSÃO
Apelação do INSS provida, em parte, tão-somente, para que seja diferida para a fase de cumprimento de sentença a forma de cálculo dos consectários legais, adotando-se inicialmente o índice da Lei nº 11.960/09.
Confirmada a tutela antecipada deferida na sentença.
PREQUESTIONAMENTO
Restam prequestionados, para fins de acesso às instâncias recursais superiores, os dispositivos legais e constitucionais elencados pelas partes.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento à apelação, e confirmar a tutela antecipada deferida na sentença.
Documento eletrônico assinado por LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001232365v55 e do código CRC 4c3571a5.Informações adicionais da assinatura:
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Apelação Cível Nº 5012605-94.2017.4.04.7000/PR
RELATOR: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: GEOVANA FERNANDA DE ARAUJO (AUTOR)
APELADO: KENDRA KAUANE NOVINSKI DA SILVA SANTOS (RÉU)
APELADO: CRISTIAN RUAN NOVINSKI SANTOS (RÉU)
APELADO: OS MESMOS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. CONCESSÃO. QUALIDADE DE DEPENDENTE. RECONHECIMENTO DE PATERNIDADE. FILHO MENOR. PAGAMENTO DE COTA-PARTE COM EFEITOS FINANCEIROS DESDE O ÓBITO DO SEGURADO. IRREPETIBILIDADE DOS VALORES RECEBIDOS. AUSÊNCIA DE MÁ-FÉ. consectarios.
1. A concessão do benefício de pensão por morte depende da ocorrência do evento morte, da demonstração da qualidade de segurado do de cujus e da condição de dependente de quem objetiva a pensão.
2. Diante de absolutamente incapaz, não há falar em prazo prescricional, a teor do disposto nos arts. 169, inciso I, e 5º, inciso I, ambos do Código Civil de 1916, e art. 198, inciso I, do Código Civil de 2002, c/c os artigos 79 e 103, parágrafo único, da Lei de Benefícios.
3. Consoante entendimento predominante nesta Corte, o absolutamente incapaz não pode ser prejudicado pela inércia de seu representante legal, até porque não se cogita de prescrição em se tratando de direitos de incapazes.
4. Hipótese em que é devido à autora - filha do de cujus, menor de 16 anos ao tempo do falecimento - o pagamento de sua cota da pensão desde o óbito do segurado até a data em que ela completar 21 anos de idade.
5. Hipótese em que, diante do princípio da irrepetibilidade ou da não-devolução dos alimentos, deve ser afastada a cobrança dos valores determinada pela autarquia. Precedentes desta Corte e Supremo Tribunal Federal.
6. Deliberação sobre índices de correção monetária e taxas de juros diferida para a fase de cumprimento de sentença, a iniciar-se com a observância dos critérios da Lei nº 11.960/2009, de modo a racionalizar o andamento do processo, permitindo-se a expedição de precatório pelo valor incontroverso, enquanto pendente, no Supremo Tribunal Federal, decisão sobre o tema com caráter geral e vinculante. Precedentes do STJ e do TRF da 4ª Região.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar do Paraná do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação, e confirmar a tutela antecipada deferida na sentença, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Curitiba, 20 de agosto de 2019.
Documento eletrônico assinado por LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001232366v9 e do código CRC 104a8ea4.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Ordinária DE 20/08/2019
Apelação Cível Nº 5012605-94.2017.4.04.7000/PR
RELATOR: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
PRESIDENTE: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: GEOVANA FERNANDA DE ARAUJO (AUTOR)
ADVOGADO: GARDENIA FERNANDES OLIVEIRA (OAB PR046466)
APELADO: KENDRA KAUANE NOVINSKI DA SILVA SANTOS (RÉU)
ADVOGADO: CARLOS EDUARDO REGILIO LIMA (DPU)
APELADO: CRISTIAN RUAN NOVINSKI SANTOS (RÉU)
ADVOGADO: CARLOS EDUARDO REGILIO LIMA (DPU)
APELADO: OS MESMOS
MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (MPF)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Ordinária do dia 20/08/2019, na sequência 141, disponibilizada no DE de 05/08/2019.
Certifico que a Turma Regional suplementar do Paraná, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PARANÁ DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO, E CONFIRMAR A TUTELA ANTECIPADA DEFERIDA NA SENTENÇA.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
Votante: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
Votante: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
Votante: Juiz Federal MARCELO MALUCELLI
Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 05:33:12.