APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5040916-22.2017.4.04.9999/PR
RELATOR | : | LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | ANA CLARA RODRIGUES DE LIMA |
ADVOGADO | : | ALEXANDRE TEIXEIRA |
MPF | : | MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. CONCESSÃO. QUALIDADE DE SEGURADO DO "DE CUJUS". TRABALHO RURAL. BOIA-FRIA. COMPROVAÇÃO. TERMO INICIAL. FILHO MENOR IMPÚBERE. CONSECTÁRIOS LEGAIS.
1. A concessão do benefício de pensão por morte depende da ocorrência do evento morte, da demonstração da qualidade de segurado do de cujus e da condição de dependente de quem objetiva a pensão.
2. Não será concedida a pensão aos dependentes do instituidor que falecer após a perda da qualidade de segurado, salvo se preenchidos, à época do falecimento, os requisitos para obtenção da aposentadoria segundo as normas então em vigor.
3. Pela análise do conjunto probatório presente nos autos, há como ser reconhecida a qualidade de segurado especial da de cujus, pois comprovado o exercício de atividade rural como boia-fria antes do óbito do instituidor.
4. O termo inicial do benefício deve ser fixado de acordo com as leis vigentes por ocasião do óbito. Na atual redação do art. 74 da LBPS, conferida pela Lei n.° 9.528/97, o termo inicial do benefício deve ser fixado na DER, quando decorridos mais de 30 dias entre o óbito e a apresentação do requerimento administrativo.
5. Há exceção no caso de pensionista absolutamente incapaz na ocasião do óbito, hipótese em que o dependente terá direito à percepção do benefício desde o falecimento, situação em que se enquadra o filho do de cujus.
6. Verba honorária majorada em razão do comando inserto no § 11 do art. 85 do CPC/2015.
7. Consectários legais fixados, de ofício, nos termos do decidido pelo STF, no julgamento do RE 870.947, em sede de repercussão geral (Tema 810).
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Turma Regional suplementar do Paraná do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, não conhecer da remessa necessária, negar provimento à apelação do INSS, dar provimento ao recurso adesivo da parte autora e confirmar a tutela antecipada deferida na sentença, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Curitiba, 27 de março de 2018.
Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
Relator
| Documento eletrônico assinado por Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9273845v13 e, se solicitado, do código CRC BEA7A489. | |
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| Signatário (a): | Luiz Fernando Wowk Penteado |
| Data e Hora: | 03/04/2018 18:08 |
APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5040916-22.2017.4.04.9999/PR
RELATOR | : | LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | ANA CLARA RODRIGUES DE LIMA |
ADVOGADO | : | ALEXANDRE TEIXEIRA |
MPF | : | MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL |
RELATÓRIO
Trata-se de ação proposta por Ana Clara Rodrigues de Lima, menor impúbere, representada por sua guardiã, contra o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, postulando a concessão de pensão por morte em razão do óbito de sua mãe Joziani Rodrigues de Lima, ocorrido em 10/04/2014, sob o fundamento de que ela exerceu trabalho rural até a data do falecimento.
Foi determinada a inclusão na lide do filho menor Mateus Luis de Santana Sobrinho (ev.1.14 e ev. 17).
Sentenciando em 02/08/2016, o juízo a quo julgou procedentes os pedidos, nos seguintes termos:
Diante do exposto, com espeque no art. 487, inciso I, do novo Código de Processo Civil, JULGO PROCEDENTES os pedidos formulados na inicial para condenar o INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS a conceder o benefício de pensão por morte aos autores ANA CLARA RODRIGUES DE LIMA e MATEUS LUIS DE SANTANA SOBRINHO, na forma acima exposta, cujo valor deverá ser calculado em observância ao artigo 75 da Lei n° 8.213/91, com início em 26/11/2014 (data do requerimento administrativo), acrescido de juros legais desde a citação e correção monetária a partir do vencimento de cada prestação (Súmulas nºs 43 e 148 do STJ).
Quanto à correção monetária, o Supremo Tribunal Federal, quando do julgamento das ADIs 4.357 e 4.425, declarou a inconstitucionalidade por arrastamento do art. 1º-F da Lei 9.494/97, com a redação dada pelo art. 5º da Lei 11.960/2009, afastando a utilização da TR como fator de correção monetária dos débitos judiciais da Fazenda Pública, relativamente ao período entre a respectiva inscrição em precatório e o efetivo pagamento.
(...)
Portanto, deve ser aplicada a TR na atualização monetária a ser executado, salvo após inscrição em precatório.
No pertinente aos juros, até 30.06.2009, apurados a contar da data da citação, devem ser fixados à taxa de 1% ao mês, com base no art. 3º do Decreto-Lei nº 2.322/87, aplicável analogicamente aos benefícios pagos com atraso, tendo em vista o seu caráter eminentemente alimentar, consoante firme entendimento consagrado na jurisprudência do STJ e na Súmula 75 desta Corte.
Condeno ainda, o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS ao pagamento dos honorários advocatícios em favor do procurador da autora, arbitrados em 10% sobre o valor da condenação, na forma do artigo 20, § 3º. do CPC, além das custas e despesas processuais.
Declaro, outrossim, prescritas as parcelas que se venceram anteriormente ao quinquênio que antecedeu o ajuizamento da presente ação.
Concedo à parte autora a ANTECIPAÇÃO DE TUTELA, a fim de determinar que o INSS implante imediatamente o benefício, levando em apreço existente fundado receio de dano irreparável, diante do caráter alimentar do benefício, nos termos do art. 273 do Código de Processo Civil, bem como no entendimento sedimentado pelo Superior Tribunal de Justiça (AgRg no Ag 940.317/SC, Rel. Min. Nancy Andrighi).
A presente decisão deverá ser submetida ao reexame necessário.
Apela o INSS requerendo inicialmente a suspensão da tutela antecipada deferida na sentença. No mérito, aduz falta de prova material quanto à comprovação da condição de segurado especial da instituidora. Na eventualidade, requer que a verba honorária seja fixada no mínimo legal, nos termos da Súmula 111 do STJ.
A parte autora apresentou recurso adesivo (ev. 91), tão somente, para que o termo inicial seja fixado a contar do óbito da instituidora.
Oportunizadas as contrarrazões, subiram os autos.
O MPF opinou pelo desprovimento do apelo do INSS e pelo provimento do apelo dos requerentes.
É o relatório.
VOTO
REMESSA NECESSÁRIA
A Corte Especial do STJ dirimiu a controvérsia e firmou o entendimento, no julgamento do Recurso Especial Repetitivo nº 1.101.727/PR, no sentido de que é obrigatório o reexame de sentença ilíquida proferida contra a União, os Estados, o Distrito Federal, os Municípios e as respectivas autarquias e fundações de direito público.
Contudo, o §3º, I, do art. 496 do CPC dispensa a submissão da sentença ao duplo grau de jurisdição quando a condenação ou o proveito econômico obtido na causa for de valor certo e líquido inferior a 1.000 (mil) salários-mínimos para a União e suas respectivas Autarquias e fundações de direito público.
Assim, é pouco provável que a condenação nas lides previdenciárias, na quase totalidade dos feitos, ultrapassem o valor limite de mil salários mínimos. E isso fica evidente especialmente nas hipóteses em que possível mensurar o proveito econômico por mero cálculo aritmético.
Nessa linha, e com base no §3º, I, do art. 496, do CPC, deixo de conhecer da remessa necessária.
Da controvérsia dos autos
No caso em apreço, a controvérsia recursal envolve a comprovação da qualidade de segurada da falecida, na condição de boia-fria.
Da Pensão por Morte
A concessão do benefício de pensão por morte depende do preenchimento dos seguintes requisitos: a ocorrência do evento morte, a condição de dependente de quem objetiva a pensão e a demonstração da qualidade de segurado do de cujus por ocasião do óbito.
Para exame da implementação de tais pressupostos, devem ser aplicadas as leis vigentes à época do óbito do de cujus.
Conforme o disposto no art. 26, I, da Lei nº 8.213/1991, referido benefício independe de carência.
Sobre a condição de dependência para fins previdenciários, dispõe o art. 16 da Lei 8.213/91:
Art. 16. São beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condição de dependentes do segurado:
I - o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental que o torne absoluta ou relativamente incapaz, assim declarado judicialmente;
II - os pais;
III - o irmão não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental que o torne absoluta ou relativamente incapaz, assim declarado judicialmente;
§ 1º. A existência de dependente de qualquer das classes deste artigo exclui do direito às prestações os das classes seguintes.
§ 2º. O enteado e o menor tutelado equiparam-se a filho mediante declaração do segurado e desde que comprovada a dependência econômica na forma estabelecida no Regulamento.
§ 3º. Considera-se companheira ou companheiro a pessoa que, sem ser casada, mantém união estável com o segurado ou com a segurada, de acordo com o § 3º do art. 226 da Constituição Federal.
§ 4º. A dependência econômica das pessoas indicadas no inciso I é presumida e a das demais deve ser comprovada.
A manutenção da qualidade de segurado tem previsão no artigo 15 da Lei nº 8.213/91, in verbis:
"Art. 15. Mantém a qualidade de segurado, independentemente de contribuições:
I - sem limite de prazo, quem está em gozo de benefício;
II - até 12 (doze) meses após a cessação das contribuições, o segurado que deixar de exercer atividade remunerada abrangida pela Previdência Social ou estiver suspenso ou licenciado sem remuneração;
(...)
§ 1º O prazo do inciso II será prorrogado para até 24 (vinte e quatro) meses se o segurado já tiver pago mais de 120 (cento e vinte) contribuições mensais sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado.
§ 2º Os prazos do inciso II ou do § 1º serão acrescidos de 12 (doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
§ 3º Durante os prazos deste artigo, o segurado conserva todos os seus direitos perante a Previdência Social.
§ 4º A perda da qualidade de segurado ocorrerá no dia seguinte ao do término do prazo fixado no Plano de Custeio da Seguridade Social para recolhimento da contribuição referente ao mês imediatamente posterior ao do final dos prazos fixados neste artigo e seus parágrafos."
Assim, o período de graça de 12/24 meses, estabelecido no artigo 15, II e § 1º, da Lei nº 8.213/91, consoante as disposições do § 2º, pode ser ampliado em mais doze meses, na eventualidade de o segurado estar desempregado, desde que comprovada essa condição.
Saliente-se que não será concedida a pensão aos dependentes do instituidor que falecer após a perda da qualidade de segurado, salvo se preenchidos os requisitos para obtenção da aposentadoria segundo as normas em vigor à época do falecimento.
O segurado especial, condição prevista no art. 11, VII, da Lei n° 8.213/91, inclui-se entre os segurados obrigatórios da Previdência Social, sendo-lhe dispensado o recolhimento das contribuições para fazer jus ao benefício previdenciário.
O exercício de atividade rural ou de pescador artesanal deve ser comprovado mediante a produção de prova material suficiente, ainda que inicial, complementada por prova testemunhal idônea, não sendo esta admitida exclusivamente, a teor do art. 55, § 3º, da Lei n. 8.213/91 e da Súmula 149 do Eg. STJ. Embora o art. 106 da Lei de Benefícios relacione os documentos aptos a essa comprovação, tal rol não é exaustivo, sendo certa a possibilidade de alternância das provas ali referidas. Não se exige prova plena da atividade rural ou pesqueira de toda a vida do de cujus, mas um início de documentação que, juntamente com a prova oral, possibilite um juízo de valor seguro de que o labor fosse exercido contemporaneamente à época do óbito ou que essa atividade tenha cessado em decorrência do acometimento de alguma enfermidade.
Caso Concreto
O óbito de Joziani Rodrigues de Lima ocorreu em 10/04/2014 (ev. 1.6).
A condição de dependente dos autores Ana Clara Rodrigues de Lima, nascida em 15/03/2010 (ev.1.5) e Mateus Luis de Santana Sobrinho, nascido em 20/11/2012, é incontroversa, eis que filhos da finada, conforme comprova as certidões de nascimento acostadas aos autos. (ev. 1.8 e 17.2).
A controvérsia diz respeito a qualidade de segurado da "de cujus".
No presente feito, entendo existir início de prova material assim como testemunhal no sentido de demonstrar o exercício do labor rural pela finada, nas condições alegadas.
A parte autora juntou os seguintes documentos:
- certidão de óbito, onde consta que a finada residia na Chácara Recanto das Águas, Zona Rural, em Assai-PR (ev. 1.6);
- ficha do departamento de saúde, onde a finada foi qualificada como trabalhadora rural, em 2010, 2011, 2012 e 2013 (ev. 1.7 e 1.10);
- certidão eleitoral, onde consta que a finada residia no Sítio Seção Cebolão (ev. 1.10);
- matrícula escolar da autora Ana Clara, onde consta que o endereço no Sítio Central em 2014 (ev. 1.10);
- cnis da finada contendo vínculo rural em 2008 (ev. 1.10).
Reconhecendo-se a dificuldade dos trabalhadores rurais quanto à comprovação da lide rural, pacificou-se que as anotações em certidão de óbito ou de casamento de registro civil são suficientes em preencher o requisito da prova material que exige a lei.
Isto inclusive foi objeto de súmula pela Turma Nacional de Uniformização de Jurisprudência dos Juizados Especiais Federais:
Súmula 06. A certidão de casamento ou outro documento idôneo que evidencie a condição de trabalhador rural do cônjuge constitui indício razoável de prova material da atividade rurícola.
Além do mais, a prova testemunhal foi unânime confirmando o trabalho exercido pela de cujus, como boia-fria antes do óbito.
Nesse sentido a prova testemunhal, que transcrevo da sentença (ev. 78):
Com efeito, a representante legal da autora Ana Clara, a Sra. Rozalha Cristie de Lima asseverou que:
"Que a falecida trabalhava no sítio de sua sobrinha de nome Maria Aparecida e o sítio fica próximo a Jumbo Pesada, que Joziani trabalhou para Zé Maria, na seção cebolão e plantava mandioca, que a declarante trabalhava junto com sua filha e ela trabalhava desde os 14 anos de idade; que Joziani trabalhou para seu Baiano, carpindo algodão, milho, feijão. Que Joziani morou com a declarante enquanto solteira e depois foi morar com seu companheiro; Que quando estava casada trabalhou com Pedro e plantava soja, trigo e Joziani carpia beira de estrada, quando estava casada Joziani trabalhava no parreiral de chuchu e morava do sítio do Roberto Eno. Joziani recebia por dia."
O representante do autor Mateus, o Sr. Luiz Rufino declarou:
"Que vivia em união estável com Joziani e quando foram morar juntos Joziani era diarista no sítio, quando estavam juntos Joziani trabalhou para Maria Aparecida e antes no sítio onde moravam na seção guarucaia, plantava laranja, carpia e trabalhava por temporada; que deve ter trabalhada para Maria aparecida por mais de 30 vezes e recebia R$ 25,00 de diária; que moravam no sítio do Roberto Eno e ela também trabalhava lá na barreira de chuchu e ela recebia diária."
No mesmo sentido, a testemunha Maria Aparecida Batista, afirmou:
"Que conhecia os pais de Joziani há longa data do trabalho rural; que Joziani trabalhou para a declarante e inclusive morou em sua propriedade, que Joziani fazia pomar, entrada de carreador eram feitos por Joziani, que ela trabalhava uns dois dias e depois voltava; que acredita que uma semana antes de morrer a joziani tenha feito serviços para a declarante. E os autores há mais de 3 anos. Que chegou a conhecer José Benedito e faz 4 anos que ele faleceu."
Por fim, a testemunha Edinaldo Henrique Rocha, afirmou:
"Que conhecia a falecida; que a falecida trabalhava como boia-fria; que depois que a falecida foi morar com o Luiz manteve contato coma mesma; que a falecida trabalhava para várias pessoas; que a falecida trabalhou para o Zé Baiano, José Maria, por último o Roberto; que a falecida também trabalhou para a dona Maria, pouco antes de falecer."
Considerando-se que a demandante objetiva comprovar labor rural na condição de boia-fria, é assente que a prova testemunhal não pode ser desprezada. Saliente-se que no caso dos trabalhadores rurais conhecidos como boias-frias, diaristas ou volantes especificamente, considerando a informalidade com que é exercida a profissão no meio rural, que dificulta a comprovação documental da atividade, o entendimento pacífico desta Corte é no sentido de que a exigência de início de prova material deve ser abrandada.
Por outro lado, registro recente julgado do Superior Tribunal de Justiça, em regime de recurso especial repetitivo, em que restou definido que a prova exclusivamente testemunhal é insuficiente para comprovação da atividade laborativa do trabalhador rural, sendo indispensável que ela venha corroborada por razoável início de prova material, inclusive para os trabalhadores do tipo boia-fria:
RECURSO ESPECIAL. MATÉRIA REPETITIVA. ART. 543-C DO CPC E RESOLUÇÃO STJ 8/2008. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. SEGURADO ESPECIAL. TRABALHO RURAL. INFORMALIDADE. BOIAS-FRIAS. PROVA EXCLUSIVAMENTE TESTEMUNHAL. ART. 55, § 3º, DA LEI 8.213/1991. SÚMULA 149/STJ. IMPOSSIBILIDADE. PROVA MATERIAL QUE NÃO ABRANGE TODO O PERÍODO PRETENDIDO. IDÔNEA E ROBUSTA PROVA TESTEMUNHAL. EXTENSÃO DA EFICÁCIA PROBATÓRIA. NÃO VIOLAÇÃO DA PRECITADA SÚMULA.
1. Trata-se de Recurso Especial do INSS com o escopo de combater o abrandamento da exigência de produção de prova material, adotado pelo acórdão recorrido, para os denominados trabalhadores rurais boias-frias.
2. A solução integral da controvérsia, com fundamento suficiente, não caracteriza ofensa ao art. 535 do CPC.
3. Aplica-se a Súmula 149/STJ ("A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeitos da obtenção de benefício previdenciário") aos trabalhadores rurais denominados "boias-frias", sendo imprescindível a apresentação de início de prova material.
4. Por outro lado, considerando a inerente dificuldade probatória da condição de trabalhador campesino, o STJ sedimentou o entendimento de que a apresentação de prova material somente sobre parte do lapso temporal pretendido não implica violação da Súmula 149/STJ, cuja aplicação é mitigada se a reduzida prova material for complementada por idônea e robusta prova testemunhal.
5. No caso concreto, o Tribunal a quo, não obstante tenha pressuposto o afastamento da Súmula 149/STJ para os "boias-frias", apontou diminuta prova material e assentou a produção de robusta prova testemunhal para configurar a recorrida como segurada especial, o que está em consonância com os parâmetros aqui fixados.
6. Recurso Especial do INSS não provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução 8/2008 do STJ.
(Superior Tribunal de Justiça. REsp 1321493/PR, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 10/10/2012, DJe 19/12/2012)
Em suma, os documentos juntados aos autos constituem início razoável de prova material. A prova testemunhal, por sua vez, é precisa e convincente quanto ao labor rural da falecida antes do óbito.
Ora, preenchidos todos os requisitos legais, conclui-se que a parte autora faz jus ao recebimento do benefício de pensão por morte, devendo ser mantida a sentença de procedência da ação.
TERMO INICIAL DO BENEFÍCIO
Quanto ao termo inicial do benefício, deve ser fixado de acordo com as leis vigentes por ocasião do óbito. Antes da Lei 9.528/97, de 10/12/1997, o benefício era devido a contar do falecimento, independentemente da data do requerimento. A contar dessa data, o art. 74 da Lei 8.213/91 passou a ter a seguinte redação:
Art. 74. A pensão por morte será devida ao conjunto dos dependentes do segurado que falecer, aposentado ou não, a contar da data:
I - do óbito, quando requerida até trinta dias depois deste;
II - do requerimento, quando requerida após o prazo previsto no inciso anterior;
III - da decisão judicial, no caso de morte presumida.
Entretanto, a regra não é aplicável no caso de pensionista menor de 16 anos na data do óbito.
Com efeito, a formalização tardia da inscrição de dependente absolutamente incapaz não impede a percepção dos valores devidos desde a data do óbito, uma vez que ele não pode ser prejudicado pela inércia de seu representante legal. Observe-se, a propósito, que contra o absolutamente incapaz não corre a prescrição, a teor do art. 198, I, do Código Civil c/c os arts. 79 e 103, parágrafo único, da Lei 8.213/91.
Acrescente-se que, mesmo que o requerimento administrativo da pensão venha a ser apresentado mais de trinta dias após o pensionista completar 16 anos de idade, não se altera o termo inicial do benefício, que será sempre a data do óbito no caso de menor de 16 anos ao tempo deste. Se contra o absolutamente incapaz não corre o prazo prescricional e, na mesma linha, não se aplica o prazo previsto no artigo 74, II, da Lei 8.213/91, não se pode pretender fulminar o direito do menor ao recebimento das parcelas vencidas assim que passados trinta dias da data em que ele completa 16 anos de idade, inclusive com efeitos retroativos. Admitir essa possibilidade implicaria, por via oblíqua, reconhecer a prescrição em detrimento de absolutamente incapaz.
No caso concreto, portanto, considerando que os filhos Ana Clara, nascida em 15/03/2010 e Mateus, nascido em 20/11/2012 tinham menos de 16 anos ao tempo do óbito, o termo inicial do benefício deve ser fixado nessa data, ou seja, em 10/04/2014, razão pela qual merece provimento o recurso adesivo da parte autora.
PRESCRIÇÃO
Questão diversa da fixação do termo inicial do benefício é a eventual prescrição de parcelas vencidas.
Nesse sentido, em regra, a prescrição atinge o direito à percepção dos créditos anteriores a cinco anos contados do ajuizamento da ação, a teor do artigo 103, parágrafo único, da Lei 8.213/91. No entanto, em caso de pensionista menor absolutamente incapaz, o prazo somente passa a fluir a partir da data em que ele completa 16 anos de idade, por força do art. 198, I, do Código Civil c/c os arts. 79 e 103, parágrafo único da Lei 8.213/91.
Dito de outro modo, se postulado o benefício antes de o pensionista completar 21 anos de idade, não haverá parcelas prescritas; se postulada a pensão após os 21 anos de idade, haverá prescrição das parcelas anteriores a cinco anos contados do ajuizamento da ação.
No caso, decorridos menos de cinco anos entre a data em que os autores completarão 16 anos de idade e a propositura da demanda, não há parcelas prescritas.
CONSECTÁRIOS LEGAIS
O Plenário do Supremo Tribunal Federal ao julgar o RE 870.947, em sede de repercussão geral, na sessão do dia 20/09/2017, fixou as seguintes teses, nos termos do voto do Relator:
1) O art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, na parte em que disciplina os juros moratórios aplicáveis a condenações da Fazenda Pública, é inconstitucional ao incidir sobre débitos oriundos de relação jurídico-tributária, aos quais devem ser aplicados os mesmos juros de mora pelos quais a Fazenda Pública remunera seu crédito tributário, em respeito ao princípio constitucional da isonomia (CRFB, art. 5º, caput); quanto às condenações oriundas de relação jurídica não-tributária, a fixação dos juros moratórios segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança é constitucional, permanecendo hígido, nesta extensão, o disposto no art. 1º-F da Lei nº 9.494/97 com a redação dada pela Lei nº 11.960/09; e
2) O art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, na parte em que disciplina a atualização monetária das condenações impostas à Fazenda Pública segundo a remuneração oficial da caderneta de poupança, revela-se inconstitucional ao impor restrição desproporcional ao direito de propriedade (CRFB, art. 5º, XXII), uma vez que não se qualifica como medida adequada a capturar a variação de preços da economia, sendo inidônea a promover os fins a que se destina.
Como se pode observar, o STF não efetuou qualquer modulação dos efeitos da declaração de inconstitucionalidade do art. 1ºF- da Lei nº 9.494/97, com a redação da Lei nº 11.960/09, em relação à correção monetária.
Assim, considerando que a publicação do acórdão não é condição indispensável para a produção dos efeitos vinculantes do precedente formado no julgamento de recurso extraordinário repetitivo, e que a respectiva Ata de julgamento (Tema 810) foi publicada no DJe n. 216, de 22-09-2017, deve-se aplicar, desde logo, o entendimento firmado pela Corte Suprema, fixando-se os consectários legais nos termos abaixo delineados.
CORREÇÃO MONETÁRIA
A correção monetária incidirá a contar do vencimento de cada prestação e será calculada pelos índices oficiais e aceitos na jurisprudência, quais sejam:
- INPC (de 04/2006 a 29/06/2009, conforme o art. 31 da Lei n.º 10.741/03, combinado com a Lei n.º 11.430/06, precedida da MP n.º 316, de 11/08/2006, que acrescentou o art. 41-A à Lei n.º 8.213/91).
- IPCA-E (a partir de 30-06-2009, conforme RE 870.947, j. 20/09/2017).
JUROS DE MORA
Os juros de mora de 1% (um por cento) ao mês, a contar da citação (Súmula 204 do STJ) , até 29/06/2009.
A partir de 30/06/2009, segundo os índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança, conforme art. 5º da Lei 11.960/09, que deu nova redação ao art. 1º-F da Lei nº 9.494/97.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS
Incide, no caso, a sistemática de fixação de honorários advocatícios prevista no art. 85 do NCPC, porquanto a sentença foi proferida após 18/03/2016 (data da vigência do NCPC definida pelo Pleno do STJ em 02/04/2016).
Aplica-se, portanto, em razão da atuação do advogado da parte em sede de apelação, o comando do §11 do referido artigo, que determina a majoração dos honorários fixados anteriormente, pelo trabalho adicional realizado em grau recursal, observando, conforme o caso, o disposto nos §§ 2º a 6º e os limites estabelecidos nos §§ 2º e 3º do art. 85.
Confirmada a sentença no mérito, majoro a verba honorária, elevando-a de 10% para 15% (quinze por cento) sobre as parcelas vencidas até sentença (Súmula 76 do TRF4), considerando as variáveis dos incisos I a IV do § 2º do artigo 85 do NCPC.
ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA
Confirmado o direito ao benefício de pensão por morte, resta mantida a antecipação dos efeitos da tutela, concedida pelo juízo de origem.
CONCLUSÃO
Remessa oficial não conhecida.
Apelação do INSS não provida.
Recurso adesivo da parte autora provido, para que o termo inicial seja fixado a contar do óbito da instituidora.
De ofício, aplicada, quanto aos consectários legais, a decisão proferida pelo STF no Tema 810.
Confirmar a tutela antecipada deferida na sentença, e majorar os honorários advocatícios.
PREQUESTIONAMENTO
Restam prequestionados, para fins de acesso às instâncias recursais superiores, os dispositivos legais e constitucionais elencados pelas partes.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto por não conhecer da remessa necessária, negar provimento à apelação do INSS, dar provimento ao recurso adesivo da parte autora e confirmar a tutela antecipada deferida na sentença.
Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
Relator
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 27/03/2018
APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5040916-22.2017.4.04.9999/PR
ORIGEM: PR 00023662520158160047
RELATOR | : | Des. Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO |
PRESIDENTE | : | Luiz Fernando Wowk Penteado |
PROCURADOR | : | Dr. João Heliofar Villar |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | ANA CLARA RODRIGUES DE LIMA |
ADVOGADO | : | ALEXANDRE TEIXEIRA |
MPF | : | MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 27/03/2018, na seqüência 114, disponibilizada no DE de 12/03/2018, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) Turma Regional suplementar do Paraná, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NÃO CONHECER DA REMESSA NECESSÁRIA, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS, DAR PROVIMENTO AO RECURSO ADESIVO DA PARTE AUTORA E CONFIRMAR A TUTELA ANTECIPADA DEFERIDA NA SENTENÇA.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO |
: | Juiz Federal LUIZ ANTONIO BONAT | |
: | Des. Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA |
Suzana Roessing
Secretária de Turma
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