| D.E. Publicado em 21/03/2017 |
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0008982-05.2015.4.04.9999/PR
RELATORA | : | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | FLAVIA DA SILVA SANTOS e outros |
ADVOGADO | : | Sueli Casteluzzi Vechiatto e outro |
REMETENTE | : | JUIZO DE DIREITO DA 1A VARA DA COMARCA DE CENTENARIO DO SUL/PR |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE DE COMPANHEIRA E GENITORA. QUALIDADE DE SEGURADO DA FALECIDA COMPROVADA. CONJUNTO PROBATÓRIO SUFICIENTE. COMPROVAÇÃO DA UNIÃO ESTÁVEL. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA PRESUMIDA. BENEFÍCIO DEVIDO. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA. FASE DE CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. DIFERIMENTO.
1. Para a obtenção do benefício de pensão por morte deve a parte interessada preencher os requisitos estabelecidos na legislação previdenciária vigente à data do óbito, consoante iterativa jurisprudência dos Tribunais Superiores e Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF 4).
2. Demonstrada a qualidade de segurada da falecida ao tempo do óbito, tem os autores, na condição de companheiro e filhos, o direito ao recebimento do benefício de pensão por morte.
3. Comprovada a união estável, presume-se a dependência econômica (artigo 16, § 4º, da Lei 8.213/91), impondo-se à Previdência Social demonstrar que esta não existia.
4. Deliberação sobre índices de correção monetária e taxas de juros diferida para a fase de cumprimento de sentença, a iniciar-se com a observância dos critérios da Lei 11.960/2009, de modo a racionalizar o andamento do processo, permitindo-se a expedição de precatório pelo valor incontroverso, enquanto pendente, no Supremo Tribunal Federal, decisão sobre o tema com caráter geral e vinculante. Precedentes do STJ e do TRF da 4ª Região.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, não conhecer da remessa oficial, negar provimento à apelação da ré e determinar o cumprimento imediato do acórdão, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre/RS, 07 de fevereiro de 2017.
Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE
Relatora
| Documento eletrônico assinado por Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8821359v23 e, se solicitado, do código CRC 16C9B07C. | |
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| Signatário (a): | Salise Monteiro Sanchotene |
| Data e Hora: | 09/03/2017 15:29 |
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0008982-05.2015.4.04.9999/PR
RELATORA | : | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | FLAVIA DA SILVA SANTOS e outros |
ADVOGADO | : | Sueli Casteluzzi Vechiatto e outro |
REMETENTE | : | JUIZO DE DIREITO DA 1A VARA DA COMARCA DE CENTENARIO DO SUL/PR |
RELATÓRIO
FLAVIA DA SILVA SANTOS, nascida em 16-04-1997 e representada por Ivonice da Silva Lima, e LUIZ FERNANDO DOS SANTOS, nascido em 25-06-1998 e representado por José Menezes do Espírito Santo e Nilza Maria da Silva do Espírito Santo, ajuizaram ação ordinária contra o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), objetivando a concessão de pensão por morte da mãe, NILMA APARECIDA DA SILVA, cujo óbito ocorreu em 03-07-1998.
Regularizado o pólo ativo da demanda para incluir LUIZ CARLOS DOS SANTOS, genitor dos autores e alegado companheiro da falecida (fls.94).
Sobreveio sentença (20-08-2014) que julgou procedente o pedido inicial condenando a autarquia previdenciária a conceder o benefício previdenciário aos autores, no valor de 01 salário mínimo, contados a partir do requerimento administrativo em 24-08-2011. Fixou honorários advocatícios em 10% sobre as parcelas vencidas até a data da prolação da sentença. Submeteu o feito ao reexame necessário.
Em suas razões recursais, o INSS requereu a reforma da sentença alegando que não há comprovação da condição de segurado especial da de cujus.
Sustentou que não foi comprovada a condição de companheiro do autor Luiz Carlos dos Santos.
Apresentadas as contrarrazões, vieram os autos para julgamento.
O Ministério Público Federal opinou pelo não provimento do recurso.
VOTO
Nos termos do artigo 1.046 do Código de Processo Civil (CPC), em vigor desde 18 de março de 2016, com a redação que lhe deu a Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015, suas disposições aplicar-se-ão, desde logo, aos processos pendentes, ficando revogada a Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973.
Com as ressalvas feitas nas disposições seguintes a este artigo 1.046 do CPC, compreende-se que não terá aplicação a nova legislação para retroativamente atingir atos processuais já praticados nos processos em curso e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada, conforme expressamente estabelece seu artigo 14.
Remessa Oficial
Nos termos do artigo 14 do novo Código de Processo Civil - CPC, "a norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada".
O intuito do legislador foi salvaguardar os atos já praticados, perfeitos e acabados, aplicando-se a nova lei processual com efeitos prospectivos.
Nesse sentido, as sentenças sob a égide do CPC de 1973, sujeitavam-se a reexame obrigatório se houvesse condenação da Fazenda Pública ou fosse assegurado ao autor direito equivalente (proveito econômico) no valor de até sessenta salários mínimos.
O novo CPC de 2015 no art. 496, § 3º elencou novos parâmetros, aumentando o limite para reexame obrigatório da sentença. Assim é possível a indagação quanto à lei aplicável às sentenças publicadas anteriormente e ainda não reexaminadas.
Uma das interpretações possíveis seria a de que, em tendo havido fato superveniente à remessa - novo CPC, a suprimir o interesse da Fazenda Pública em ver reexaminadas sentenças que a houvessem condenado ou garantido proveito econômico à outra parte em valores correspondentes a até mil salários mínimos, não seria caso de se julgar a remessa. Inexistindo o interesse, por força da sobrevinda dos novos parâmetros, não haveria condição (interesse) para o seu conhecimento.
No entanto, o Superior Tribunal de Justiça, firmou entendimento de que a lei vigente à época da prolação da decisão recorrida é a que rege o cabimento da remessa oficial (REsp 642.838/SP, Rel. Min. Teori Zavascki).
Nesses termos, em atenção ao precedente citado, impõe-se que a possibilidade de conhecimento da remessa necessária das sentenças anteriores à mudança processual observe os parâmetros do CPC de 1973, aplicando-se o novo CPC às sentenças posteriores.
Registre-se que no caso dos autos, não se pode invocar o preceito da Súmula 490 do STJ, segundo a qual, a dispensa de reexame necessário quando o valor da condenação ou do direito controvertido for inferior a sessenta salários mínimos, não se aplica a sentenças ilíquidas.
No caso concreto, o valor do proveito econômico outorgado em sentença à parte autora da demanda é mensurável por simples cálculo aritmético.
Desse modo, para aferir a aplicabilidade ou não do disposto no § 2º do art. 475 do CPC/73 em comento, é irrelevante o valor que tenha sido atribuído pela parte sua peça inicial, servindo como parâmetro o valor econômico expresso na sentença condenatória que julga a causa.
Nesse sentido:
PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. REEXAME NECESSÁRIO. INTELIGÊNCIA DO § 2º DO ART. 475 DO CPC, COM A REDAÇÃO DA LEI 10.352/01. 1. Nos termos do art. 475, § 2º, do CPC, a sentença não está sujeita a reexame necessário quando "a condenação, ou o direito o direito controvertido, for de valor certo não excedente a 60 (sessenta) salários mínimos". Considera-se "valor certo", para esse efeito, o que decorre de uma sentença líquida, tal como prevê o art. 459 e seu parágrafo, combinado com o art. 286 do CPC. 2. Os pressupostos normativos para a dispensa do reexame têm natureza estritamente econômica e são aferidos, não pelos elementos da demanda (petição inicial ou valor da causa), e sim pelos que decorrem da sentença que a julga. (...) 5. Embargos de divergência providos. (EREsp 600.596/RS, Rel. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, CORTE ESPECIAL, julgado em 04/11/2009, DJe 23/11/2009)
A sentença de 20-08-2014 condenou o INSS ao pagamento de pensão por morte no valor de um salário mínimo desde o requerimento administrativo em 24-08-2011.
De acordo com a Planilha de Cálculos da Justiça Federal (Programa JUSPREV II), de agosto de 2011 a agosto de 2014, a Autarquia Previdenciária não pagou à parte autora o valor de R$ 27.692,51 (vinte e sete mil, seiscentos e noventa e dois reais e cinquenta e um centavos), atualizados monetariamente, quantia equivalente a 38 salários mínimos, resultando, portanto, na condenação em montante manifestamente inferior a 60 (sessenta) salários-mínimos.
Trata-se, como visto, de valor facilmente estimável, o que atribui liquidez ao julgado.
Cabe salientar que se a sentença sujeita a reexame necessário é a que condena a Fazenda Pública em valor não excedente a sessenta salários mínimos, impõe-se aferir o montante da condenação na data em que proferida. Valores sujeitos a vencimento futuro não podem ser considerados para este efeito, pois não é possível estimar por quanto tempo o benefício será mantido.
Não por outra razão é que se toma o valor das parcelas vencidas até a data da decisão de procedência, para fins de aferição do montante da condenação sobre o qual incidirão os honorários advocatícios, nos termos da Súmula 111 do STJ. Não se aplicam à hipótese, as regras de estimativa do valor da causa. Trata-se, no momento, de condenação.
A propósito, vale colacionar as palavras do Ministro Humberto Martins no Resp 1577902 (decisão de 16-02-2016) que bem espelha a hipótese dos autos:
(...)
aplica-se o entendimento de que "É líquida a sentença que contém em si todos os elementos que permitem definir a quantidade de bens a serem prestados, dependendo apenas de cálculos aritméticos apurados mediante critérios constantes do próprio título ou de fontes oficiais públicas e objetivamente conhecidas." (REsp 937.082/MG, Rei. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONA QUARTA TURMA, julgado em 18/09/2008, DJe 13/10/2008).
(...) Dessa forma, tratando-se de titulo judicial líquido, cujo valor da condenação não supera 60 (sessenta) salários mínimos, a aplicação do disposto no art. 475, §2º, do CPC é medida que se impõe.
Ademais, apesar de o discurso da autarquia previdenciária normalmente girar em torno do argumento de que defende o interesse público, fato é que sua atuação é restrita à defesa do próprio INSS, e não do interesse público ou da sociedade."
(...)
Logo, sendo a condenação do INSS fixada, nada data da sentença, em valor inferior a sessenta salários mínimos, a sentença não está sujeita ao reexame obrigatório, de forma que a remessa não deve ser conhecida nesta Corte.
Assim, não conheço da remessa oficial.
Pensão por Morte
Os autores sustentaram que a sua mãe era agricultora até seu falecimento, em 03-07-1998. Alegaram que, em 24-08-2011, ingressaram com o requerimento administrativo de pensão por morte, que foi negado sob fundamento da perda da qualidade de segurado, visto que a última contribuição deu-se em maio de 1982 (fl.37).
Para a obtenção do benefício de pensão por morte, deve a parte interessada preencher os requisitos previstos na legislação previdenciária vigente na data do óbito, conforme dispõe a Súmula 340, do Superior Tribunal de Justiça (STJ).
À época, quando do falecimento de NILMA APARECIDA DA SILVA, ocorrido em 03-07-1998, a legislação aplicável à espécie - Lei 8.213, de 24 de julho de 1991 (Plano de Benefícios da Previdência Social) - apresentava a seguinte redação:
Art. 74 - A pensão por morte será devida ao conjunto dos dependentes do segurado que falecer, aposentado ou não, a contar da data:
I - do óbito, quando requerida até 30 dias depois deste;
II - do requerimento, quando requerida após o prazo previsto no inciso anterior;
III - da decisão judicial, no caso de morte presumida.
São, portanto, três os requisitos para a concessão do benefício de pensão por morte previdenciária:
a) o óbito (ou morte presumida);
b) a qualidade de segurada da pessoa falecida;
c) a existência de dependentes, na forma prevista no artigo 16, da Lei n. 8.213/1991.
O evento morte está comprovado pela certidão de óbito (fl.27).
Não há discussão quanto à qualidade de dependente dos requerentes, Flavia Da Silva Santos e Luiz Fernando Dos Santos, porquanto são filhos da falecide e, à época do óbito, eram menores de idade (datas de nascimento 16-04-1997 e 25-06-1998, respectivamente, conforme as certidões das fls. 12-20).
A dependência econômica dos autores filhos é presumida por força de lei (art. 16, inc. I, § 4º, da Lei 8.213/1991):
Art. 16. São beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condição de dependentes do segurado:
I - o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental que o torne absoluta ou relativamente incapaz", assim declarado judicialmente;
[...]
§ 4o A dependência econômica das pessoas indicadas no inciso I é presumida e a das demais deve ser comprovada .
A controvérsia gira em torno da qualidade de segurada da falecida e da união estável havida entre ela e o requerente LUIZ CARLOS DOS SANTOS.
No caso concreto, foram acostados os seguintes documentos:
a) Certidão de nascimento de Flávia da Silva Santos, ocorrido em 16-04-1997, filha do autor Luiz Carlos dos Santos e da falecida Nilma Aparecida da Silva, na qual o genitor está qualificado como lavrador (fl.12);
b) Certidão de nascimento de Luiz Fernando dos Santos, ocorrido em 25-06-1998, filho do autor Luiz Carlos dos Santos e da falecida Nilma Aparecida da Silva, sem qualificação dos genitores (fl.20);
c) Termo de acordo sobre guarda, expedido pelo Ministério Público do Paraná, no qual Luiz Carlos dos Santos, qualificado como trabalhador rural, viúvo passa a guarda do filho Luiz Fernando dos Santos aos seus tios, firmado em 30-06-2011 (fl.21);
d) Cópia da CTPS da falecida com registro no período de 10-12-1979 a 03-05-1982 como trabalhadora rural, na Fazenda Quem Sabe (fl.32);
e) Cópia da CTPS do autor Luiz Carlos dos Santos com registros como trabalhador rural no período de 1992 a 2012, em várias Fazendas (fls.80/93).
Realizada audiência de instrução e julgamento em 11-04-2013, na qual foi colhido o depoimento pessoal do autor e ouvidas duas testemunhas.
No seu depoimento pessoal, Luiz Carlos dos Santos declarou:
Que foi companheiro da Nilma por 11 anos; que conheceu ela em 1993; que não lembra bem, faz muito tempo; que o primeiro filho chama-se Fábio, vai fazer 18 anos de idade; que ele nasceu em 1995; que a segunda filha chama-se Flávia, vai fazer 15 anos de idade; que tiveram mais um filho o Luis Fernando; que não lembra o ano que ele nasceu; que quando Nilma faleceu o Luis Fernando era novinho; que ela nem saiu do hospital depois que deu a luz ao Luis Fernando; que ela trabalhou grávida na lavoura; que naquela época não registrava o trabalho na lavoura; que o único registro foi na Fazenda Quem Sabe; que quando conheceu Nilma ela trabalhava na diária e continuou trabalhando; que ela trabalhou nas Fazendas Palmeira, na Quem Sabe, Guanabara, sempre com os gatos; que o depoente trabalha na lavoura também; que na época em que Nilma faleceu viviam como marido e mulher, moravam juntos. Nada mais.
Quando do depoimento pessoal por parte de Ivonice da Silva Lima, tia da autora Flávia, foram informados os seguintes fatos:
Que é guardiã da Flavia; que é tia da Flávia e irmã da Nilma; que ela vivia com o Luiz Carlos; que eles moraram juntos uns oito anos; que eles tiveram quatro filhos; que a Flávia é gêmea, o outro nasceu e morreu; que eles viviam como marido e mulher; que na época em que Nilma faleceu, ela morava com o Luiz Carlos; que todos entendiam eles como casados; que ela trabalhou toda a vida na diária, colhendo algodão, colhendo café; que ela trabalhou muito na gravidez; que trabalhava de dia para comer de noite, era bem fraquinha; que mesmo durante a gravidez ela trabalhava assim; que ela não tinha registro; que em 1997 e 1998 ela sempre ia trabalhar; que ela faleceu em complicação do parto; que depois que nasceu a Flávia e morreu o gêmeo, foi dito para ela não engravidar novamente, aí ela ficou grávida do Flávio, esforçou muito e entrou em coma e não voltou mais; que a depoente está com a guarda da Flávia e a outra irmã está com o Fernando e o outro filho com o pai dele; que pegou ela com um ano e dois meses; que ela vai fazer 16 anos. Nada mais.
A testemunha Nair Reinaldo Ranpaso, por sua vez, relatou:
Que conheceu Nilma e Luiz Carlos; que eles viviam juntos até a última criança que eles tiveram; que aí ele ficou viúvo da Nilma era como casado;que a cidade via eles como marido e mulher; que eles tiveram três filhos; que neste tempo todo eles moraram juntos, saíam, trabalhavam; quando ela faleceu ela morava com o Luiz Carlos; que ela faleceu do parto do último filho; que nestes últimos anos ela trabalhava na lavoura; que a depoente trabalhou com ela; que a depoente é trabalhadora rural também; que trabalhou com a Nilma muitos anos; que pouco antes dela falecer trabalhavam juntas como o João Pescoço, na diária, colhendo laranja, algodão com o seu Martinho, sem registro na carteira de trabalho; que o único trabalho dela foi o rural, com certeza. Nada mais.
Por fim, a testemunha Ana Lima de Macedo referiu:
Que conhece o Luiz Carlos e conheceu a Nilma; que eles moravam juntos; que ele era o marido dela, para todo mundo eles eram marido e mulher; que tiveram quatro filhos; que na época em que ela faleceu morava com o Luiz Carlos; que ela trabalhava nas diárias, no algodão, carpindo; que a depoente trabalhou com ela; que a vida toda ela foi trabalhadora rural; que mesmo na época em que esteve grávida ela continuou trabalhando; que trabalhavam como bóia-fria, nunca tinha um lugar certo; que trabalharam nas Fazendas Guanabara, Umuarama, Quem Sabe, Palmeira. Nada mais.
O tempo de serviço rural pode ser comprovado mediante a produção de prova material suficiente, ainda que inicial, complementada por prova testemunhal idônea - quando necessária ao preenchimento de eventuais lacunas - não sendo esta admitida exclusivamente, a teor do art. 55, § 3º, da Lei n. 8.213/1991, e Súmula 149 do Superior Tribunal de Justiça - STJ.
Embora o art. 106 da Lei de Benefícios relacione os documentos aptos a essa comprovação, tal rol não é exaustivo, sendo certa a possibilidade de alternância das provas ali referidas.
Não se exige prova plena da atividade rural de todo o período correspondente à carência, de forma a inviabilizar a pretensão, mas um início de documentação que, juntamente com a prova oral, possibilite um juízo de valor seguro acerca dos fatos que se pretende comprovar.
Na hipótese, a certidão de nascimento na qual o companheiro da falecida, Luiz Carlos dos Santos está qualificado como lavrador, torna-se hábil a configurar início de prova material acerca da atividade rural desenvolvida pela pessoa falecida até a data do óbito.
A propósito, precedente do Superior Tribunal de Justiça (STJ):
"PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. CERTIDÃO DE CASAMENTO NA QUAL CONSTA A QUALIFICAÇÃO DO CÔNJUGE COMO AGRICULTOR OU RURAL. EXTENSÃO À ESPOSA, DESDE QUE VENHA ACOMPANHADO DE PROVA TESTEMUNHAL IDÔNEA. FALECIMENTO DO MARIDO, SEPARAÇÃO JUDICIAL OU DE FATO NÃO CONDUZEM À EXTEMPORANEIDADE DO DOCUMENTO PÚBLICO.
1. A certidão de casamento na qual consta a qualificação do marido como agricultor ou rural é documento público hábil a comprovar o início de prova material do trabalho da esposa no meio agrícola, entretanto deve vir acompanhado de idônea prova testemunhal como observado pelo acórdão a quo. 2. A ocorrência do falecimento do marido, a separação judicial ou de fato do casal, em momento até mesmo anterior ao implemento da idade para o gozo do benefício, não são eventos aptos a gerar a extemporaneidade ou a desnaturar a validade e a eficácia da certidão de casamento, desde que a prova testemunhal produzida ateste a continuidade do labor da mulher nas lides rurais. Nesse sentido: "Ainda que a certidão pública nas condições acima seja a única prova material e não haja prova documental do labor rural após o óbito do cônjuge qualificado como trabalhador rural, está caracterizada a qualidade de segurado especial se a continuidade do labor agrícola for atestada por robusta prova testemunhal (AgRg no AREsp 100.566/MG, Rel. Min. Herman Benjamin, Segunda Turma, Dje 24/04/2012)". A propósito, confiram-se: AgRg no AREsp 105.451/MG, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, Primeira Turma, DJe 20/03/2014; e AgRg no Ag 1.424.675/MT, Rel. Min. Og Fernandes, Sexta Turma, Dje 04/10/2012. 3. Agravo regimental não provido.
(AgRg no AREsp 119028 / MT, Re. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, DJe 15/04/2014)
No mesmo sentido, julgado do Tribunal Regional Federal da 4ª Região:
PREVIDENCIÁRIO. SALÁRIO-MATERNIDADE. TRABALHADORA RURAL BÓIA-FRIA. CERTIDÃO DE NASCIMENTO. DOCUMENTO COMPROBATÓRIO HÁBIL. REQUISITOS LEGAIS DEMONSTRADOS. HONORÁRIOS ADVOCATÍCOS. MAJORAÇÃO. 1. As certidões da vida civil são hábeis a constituir início probatório da atividade rural, nos termos na jurisprudência pacífica do Egrégio STJ. 2. Demonstrada a maternidade e a qualidade de trabalhadora rural bóia-fria, mediante início razoável de prova documental, corroborada pela prova testemunhal, durante período equivalente ao da carência, é devido o salário-maternidade. 3. Em ações de salário-maternidade, o valor da condenação de apenas quatro salários mínimos exige ponderação para montante maior que o usual 10%, sob pena de aviltamento do trabalho técnico do patrono da parte autora. (TRF4, APELAÇÃO CÍVEL Nº 0007858-84.2015.404.9999, 6ª TURMA, Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA, POR UNANIMIDADE, D.E. 29/07/2015, PUBLICAÇÃO EM 30/07/2015)
Destarte, no que se refere a eventuais lacunas e contradições por parte do autor, quando do depoimento, apontadas pelo juízo de origem, devem ser mitigadas, pois visível que o requerente apresentou problemas de inteligência dos questionamentos.
Ademais, os depoimentos prestados pelas testemunhas foram robustos e convergiram no mesmo sentido, de que a falecida sempre trabalhou na lavoura, como bóia-fria colhendo e carpindo algodão, tendo sido referido que trabalhou mesmo grávida e nunca exerceu outra atividade.
Assim, diante do acervo probatório, tenho que restou comprovada a qualidade de segurada da de cujus, equiparada a segurado especial pela sua condição de boia-fria..
Passo a analisar a união estável entre a Nilma e Luiz Carlos para fins de qualificação da parte autora como dependente.
A Constituição Federal de 1988, para efeito da proteção do Estado, reconheceu a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, remetendo à lei a tarefa de facilitar sua conversão em casamento (artigo 226, §3º).
A regulamentação desse dispositivo constitucional veio com a Lei nº 9.278, de 10 de maio de 1996, que assim estabeleceu em seu artigo 1º:
Art. 1º É reconhecida como entidade familiar a convivência duradoura, pública e contínua, de um homem e uma mulher, estabelecida como objetivo de constituição da família.
Por seu turno, o artigo 16, §3º, da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991, em sua redação original, ao dispor sobre os beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condição de dependentes, definiu como companheiro ou companheira a pessoa que, sem ser casada, mantém união estável com o segurado ou com a segurada, de acordo com o§ 3º do artigo 226 da Constituição Federal.
Posteriormente, o Regulamento da Previdência Social (Decreto nº 3.048, de 06 de maio de 1999), ao especificar a união estável para fins previdenciários, observou o tratamento conferido ao tema pelo artigo 1.723, do Código Civil de 2002, que reconhece como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família.
Esta disposição legal deve ser interpretada conforme a Constituição Federal de 1988, de modo a dela se excluir qualquer significado que impeça o reconhecimento da união contínua, pública e duradoura entre pessoas do mesmo sexo como família, consoante decidiu o Supremo Tribunal Federal na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 132 (Relator: Ministro Ayres Britto, Tribunal Pleno, julgado em 05 de maio de 2011, DJe-198 DIVULG 13-10-2011 PUBLIC 14-10-2011).
De toda maneira, para o reconhecimento da união estável, essencial que haja o propósito atual de constituir família, na linha de recente julgado do Superior Tribunal de Justiça, cujo trecho da ementa assim refere:
[...]
2.1 O propósito de constituir família, alçado pela lei de regência como requisito essencial à constituição da união estável - a distinguir, inclusive, esta entidade familiar do denominado "namoro qualificado" -, não consubstancia mera proclamação, para o futuro, da intenção de constituir uma família. É mais abrangente. Esta deve se afigurar presente durante toda a convivência, a partir do efetivo compartilhamento de vidas, com irrestrito apoio moral e material entre os companheiros. É dizer: a família deve, de fato, restar constituída.
2.2. Tampouco a coabitação, por si, evidencia a constituição de uma união estável (ainda que possa vir a constituir, no mais das vezes, um relevante indício)[...].
(REsp 1454643/RJ, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA, julgado em 03/03/2015, DJe 10/03/2015).
Dessa forma, comprovada a relação intuitu familiae, ou seja, que apresenta convivência duradoura e por tempo indeterminável, contínua e reconhecida publicamente na comunidade em que convivem os companheiros, a dependência econômica é presumida, cabendo ao Instituto Nacional do Seguro Social demonstrar o contrário. Nesse sentido:
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE DE COMPANHEIRO E GENITOR. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA COMPROVADA E PRESUMIDA. QUALIDADE DE SEGURADO ESPECIAL DEMONSTRADA. TUTELA ESPECÍFICA. 1. Na vigência da Lei nº 8.213/91, dois são os requisitos para a concessão de benefício de pensão por morte, quais sejam: a qualidade de segurado do instituidor e a dependência dos beneficiários que, se preenchidos, ensejam o seu deferimento. 2. Presumida a dependência econômica em relação aos filhos e, também, em relação á companheira, pois demonstrada a existência de união estável entre o casal, correta a sentença que concedeu ao autor o benefício de pensão por morte a contar do óbito em relação aos filhos menores, absolutamente incapazes, e a contar do ajuizamento da ação em relação à companheira. 3. Determina-se o cumprimento imediato do acórdão naquilo que se refere à obrigação de implementar o benefício, por se tratar de decisão de eficácia mandamental que deverá ser efetivada mediante as atividades de cumprimento da sentença stricto sensu previstas no art. 461 do CPC, sem a necessidade de um processo executivo autônomo (sine intervallo). (TRF4, APELREEX 0022784-41.2013.404.9999, Sexta Turma, Relator João Batista Pinto Silveira, D.E. 27/07/2015).
Demais, a união estável pode ser demonstrada por testemunhos idôneos e coerentes, informando a existência da relação 'more uxório', uma vez que a Lei nº 8.213/91 apenas exige início de prova material para a comprovação de tempo de serviço. (TRF4, AC 0001256-77.2015.404.9999, Sexta Turma, Relatora Vânia Hack de Almeida, D.E. 29/06/2015).
No caso concreto, foram ouvidas duas testemunhas na audiência realizada em 11-04-2013, que demonstraram bem conhecer a vida em comum havida entre Nilma e Luiz Carlos. Como se vê, os elementos instrutórios do feito dão conta de que o autor e a falecida segurada, além de manterem uma relação de confiança recíproca, conviviam publicamente, com laços afetivos contínuos e duradouros, estabelecidos com o objetivo de constituição familiar, em condições que configuram o reconhecimento da união estável, nos termos do art. 1.723 do CC.
Dessarte, comprovada a qualidade de segurada da de cujus, equiparada à segurado especial pela sua condição de bóia-fria, bem como a dependência econômica dos requerentes, o que é suficiente para considerar cumpridos os requisitos legais à concessão do benefício, deve ser mantida a sentença que concedeu a pensão por morte aos autores.
Honorários advocatícios
Os honorários advocatícios devem ser fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor das parcelas vencidas até a data da sentença, a teor das Súmulas 111, do STJ, e 76, do TRF da 4ª Região.
Custas
O INSS é isento do pagamento das custas no Foro Federal (art. 4, I, da Lei nº 9.289/96) e na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul, devendo, contudo, pagar eventuais despesas processuais, como as relacionadas a correio, publicação de editais e condução de oficiais de justiça (artigo 11 da Lei Estadual nº 8.121/85, com a redação da Lei Estadual nº 13.471/2010, já considerada a inconstitucionalidade formal reconhecida na ADInº 70038755864, julgada pelo Órgão Especial do TJ/RS); para os feitos ajuizados a partir de 2015 é isento o INSS da taxa única de serviços judiciais, na forma do estabelecido na lei estadual nº 14.634/2014 (artigo 5º). Tais isenções não se aplicam quando demandado na Justiça Estadual do Paraná (Súmula 20 do TRF4), devendo ser ressalvado, ainda, que no Estado de Santa Catarina (art. 33, parágrafo único, da Lei Complementar Estadual nº 156/97), a autarquia responde pela metade do valor.
Tutela específica
Considerando a eficácia mandamental dos provimentos fundados no art. 497, caput, do Código de Processo Civil, e tendo em vista que a presente decisão não está sujeita, em princípio, a recurso com efeito suspensivo (TRF4, 3ª Seção, Questão de Ordem na AC n. 2002.71.00.050349-7/RS, Relator para o acórdão Desembargador Federal Celso Kipper, julgado em 09 de agosto de 2007), determino o cumprimento imediato do acórdão no tocante à implantação do benefício aos autores, a ser efetivada em 45 dias.
Conclusão
Não conhecida a remessa oficial e negado provimento à apelação da ré, determinando o cumprimento imediato do acórdão.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por não conhecer da remessa oficial, negar provimento à apelação da ré e determinar o cumprimento imediato do acórdão.
Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE
Relatora
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 08/03/2017
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0008982-05.2015.4.04.9999/PR
ORIGEM: PR 00000221920128160066
RELATOR | : | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
PRESIDENTE | : | Desembargadora Federal Vânia Hack de Almeida |
PROCURADOR | : | Procurador Regional da República Fábio Venzon |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | FLAVIA DA SILVA SANTOS e outros |
ADVOGADO | : | Sueli Casteluzzi Vechiatto e outro |
REMETENTE | : | JUIZO DE DIREITO DA 1A VARA DA COMARCA DE CENTENARIO DO SUL/PR |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 08/03/2017, na seqüência 218, disponibilizada no DE de 20/02/2017, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NÃO CONHECER DA REMESSA OFICIAL, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA RÉ E DETERMINAR O CUMPRIMENTO IMEDIATO DO ACÓRDÃO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
: | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA | |
: | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
Gilberto Flores do Nascimento
Diretor de Secretaria
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