Apelação Cível Nº 5022455-94.2020.4.04.9999/RS
RELATOR: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER
APELANTE: LORVANE MARIA COELHO CAVALHEIRO (Sucessor)
ADVOGADO: ARLEI VITÓRIO STEIGER (OAB RS055786)
APELANTE: FRIEDA ELVIRA COELHO (Sucessão)
ADVOGADO: ARLEI VITÓRIO STEIGER (OAB RS055786)
APELANTE: EVANIR TEREZINHA COELHO ROSA (Sucessor)
ADVOGADO: ARLEI VITÓRIO STEIGER (OAB RS055786)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATÓRIO
Trata-se de recurso da parte autora em face de sentença proferida em 16-7-2019, na vigência do NCPC, cujo dispositivo tem o seguinte teor:
Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTE o pedido constante na inicial, extinguindo o feito com resolução do mérito (art. 487, I, do CPC/15).
Condeno a autora ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios em favor do procurador da parte contrária, fixados em 10% do valor da causa, nos termos do art. 85, §3º, I, do CPC/15. Ressalve-se, porém, que a exigibilidade dessas verbas resta suspensa, nos termos do art. 98, §3º, do CPC/15, ante o prévio deferimento do benefício da assistência judiciária gratuita à autora.
Sentença não sujeita ao reexame necessário.
Sustentou, em apertada síntese, que restou comprovado, através das certidões acostadas aos autos que o segurado falecido foi agricultor ao longo da vida, hipótese estribada em consistente depoimento das testemunhas. Requereu a reforma da sentença para conceder a pensão por morte desde a DER em 21-11-2011 a datada do óbito da autora em 19-6-2013.
Oportunizada as contrarrazões, vieram os autos para julgamento.
É o relatório.
VOTO
Juízo de admissibilidade
A apelação preenche os requisitos legais de admissibilidade.
Objeto da ação
A presente ação se limita a concessão do benefício de pensão por morte em decorrência do falecimento de Silvio Ferreira Coelho, ocorrido em 17-4-1999. Para fins de clareza, transcrevo excerto do relatório da sentença (evento 3, SENT26, p. 10):
Trata-se de ação previdenciária de concessão do benefício de pensão por morte proposta por Frieda Elvira Coelho, já qualificada nos autos, em face do Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, também já qualificado nos autos, alegando, em resumo, que: a) seu esposo Silvio Ferreira Coelho faleceu em 17/04/1999, e era segurado especial do INSS, pois laborava como agricultor em regime de economia familiar; b) em 21/11/2011, requereu administrativamente a concessão do benefício de pensão por morte, que foi indeferido sob o argumento de falta de período mínimo de carência até a data do óbito; c) a documentação se perdeu quase toda com o incêndio ocorrido na residência da família em 2004, havendo indício de prova nas certidões de casamento e óbito; d) desnecessária a prova da dependência econômica. Em razão disso, postulou a condenação da ré ao pagamento do benefício de pensão por morte a partir da data do óbito. Ao final, postulou a concessão da tutela antecipada para compelir ao réu a implementar o benefício de pensão por morte (fls. 02/06). O benefício da gratuidade judiciária foi concedido à autora e indeferida a tutela antecipada (fl. 20), tendo a autora interposto agravo de instrumento (fls. 22/29), ao qual foi negado provimento (fls. 33 e 44/59).
Citado, o réu ofereceu contestação às fls. 62/65, alegando, em resumo, que: a) não restou comprovada a qualidade de segurado do falecido; b) os documentos apresentados não comprovam o exercício de trabalho em regime de economia familiar e não formam um início de prova material razoável; c) não há prova de que a família da autora efetivamente residia no local do incêndio, sendo que o óbito de seu marido ocorreu quase 05 anos antes do sinistro; d) tudo indica que o falecido esposo da autora era empregado rural; e) em caso de procedência do pedido a data de início do benefício deve ser a data em que encerrada a instrução processual...
Em audiência, foram inquiridas as testemunhas arroladas e encerrada a instrução (fls. 113/116). Apenas a parte ré apresentou memoriais (fls. 119/120). É o relatório. Passo a fundamentar e decidir.
Pensão por Morte
Para a obtenção do benefício de pensão por morte deve a parte interessada preencher os requisitos estabelecidos na legislação previdenciária vigente à data do óbito, consoante iterativa jurisprudência dos Tribunais Superiores e desta Corte.
À época, quando do falecimento de SILVIO FERREIRA COELHO, ocorrido em 17-4-1999, a legislação aplicável à espécie - Lei 8.213, de 24 de julho de 1991 (Plano de Benefícios da Previdência Social) - apresentava a seguinte redação:
Art. 74 - A pensão por morte será devida ao conjunto dos dependentes do segurado que falecer, aposentado ou não, a contar da data:
I - do óbito, quando requerida até 30 dias depois deste;
II - do requerimento, quando requerida após o prazo previsto no inciso anterior;
III - da decisão judicial, no caso de morte presumida.
São, portanto, três os requisitos para a concessão do benefício de pensão por morte previdenciária:
a) o óbito (ou morte presumida);
b) a qualidade de segurada da pessoa falecida;
c) a existência de dependentes, na forma prevista no artigo 16, da Lei n. 8.213/1991.
O evento morte está comprovado pela certidão de óbito (evento 3, ANEXOSPET4, p. 3).
Não há discussão quanto à qualidade de dependente da requerente Teresa da Silva porquanto esposa. Ademais acostada certidão de casamento (evento 3, ANEXOSPET4, p. 4).
A dependência econômica da autora é presumida por força de lei (art. 16, inc. I, § 4º, da Lei 8.213/1991):
Art. 16. São beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condição de dependentes do segurado:
I - o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental que o torne absoluta ou relativamente incapaz", assim declarado judicialmente;
[...]
§ 4º A dependência econômica das pessoas indicadas no inciso I é presumida e a das demais deve ser comprovada
No presente caso, a controvérsia restringe-se à comprovação da qualidade de segurado do falecido, alegado trabalhador rurícola em economia familiar.
Para comprovar a atividade rurícola do falecido, foram acostados os seguintes documentos:
a) Certidão de óbito de Silvio Ferreira Coelho ocorrido em 17-4-1999, qualificado como “agricultor” (evento 3, ANEXOSPET4, p.3);
b) Certidão de casamento de Silvio ocorrido em 10-6-1958 na qual o instituidor do benefício está qualificado como “agricultor” (evento 3, ANEXOSPET4, p. 4)
Foi realizada audiência de instrução e julgamento em 28-7-2016, na qual foram ouvidas duas testemunhas (evento 3, AUDIÊNCI22, p.1):
Depoimento da testemunha Atillo Décio Grelmann, agricultor, casado, residente na localidade de Linha Boêmia, Agudo/RS que relatou:
J: ADVERTIDO E COMPROMISSADO. De onde o senhor conhecia a dona Frieda?
T: A gente se conhecia assim de passagem
J: Mas em qual localidade vocês moravam? Próximos? Como é?
T: Dá 7 km para cima
J: O senhor lembra mais ou menos em que época era que o senhor morava a essa distância da dona Frieda?
T: Desde 1998
J: O senhor continua morando nesse mesmo local?
T: Sim
J: A dona Frieda até falecer morava ali?
T: Sim
J: Ela morava em terras próprias?
T: Não
J: De quem eram as terras?
T: Do Avelino Cavalheiro
J: Qual é a localidade?
T: Linha Boêmia
J: E ela trabalhava para esse senhor? Ele deixava ela ficar ali? A que título ele deixava ela morar ali?
T: Eles plantavam ali
J: A dona Frieda?
T: Sim
J: Ela plantava para ela própria ou para o seu Cavalheiro?
T: Para os dois
J: Eles faziam parceria?
T: Sim
J: Qual é o tamanho da área?
T: Isso não posso lhe dizer
J: Mas era grande? Média?
T: Era mais ou menos grande
J: E quem cultivava no dia a dia?
T: Os dois
J: A dona Frieda e o seu Cavalheiro?
T: Sim
J: Era só os dois ou tinha mais alguém?
T: Não. Geralmente, se eles plantam juntos o patrão também ajuda
J: O patrão ajudava? Tinha outros empregados ou não?
T: Não
J: E o que eles plantavam lá?
T: Fumo e outras coisas para o sustento
J: A dona Frieda era casada?
T: Sim
J: O marido dela ainda é vivo?
T: Não
J: Ele faleceu antes ou depois dela?
T: Antes
J: E mesmo depois do falecimento dele, ela continuou morando nesse local?
T: Sim
J: O senhor lembra o nome do falecido esposo da dona Frieda?
T: Não lembro, faz tanto tempo
J: A dona Frieda ou o falecido esposo dela tinham outra atividade que não a plantação?
T: Não
J: E os filhos moravam com eles ou já tinham saído?
T: Moravam com eles. A filha mora lá no mesmo lugar
J: E essa filha fazia o que quando a dona Frieda era viva?
T: Ajudava
J: Na roça?
T: Sim
J: Pela Autora
AA: Na residência da dona Frieda e do esposo dela teve um incêndio que queimou quase toda casa? (grifo meu)
T: Sim
AA: O senhor lembra mais ou menos que ano foi isso?
T: O ano não recordo
AA: Mas não salvaram nada? Nem os documentos?
T: Não, nada
AA: Nada mais
J: Nada mais
Depoimento da testemunha Olimpio Neu, aposentado, casado, residente na localidade de Linha Boêmia, Agudo/RS, que prestou depoimento com o seguinte teor:
J: ADVERTIDO E COMPROMISSADO. De onde o senhor conhecia a dona Frieda?
T: Ela sempre morou lá no Alvino Cavalheiro, de sócio
J: O senhor mora próximo?
T: Não, isso dá 2km a 3 km
J: O senhor ainda mora nesse local?
T: Não, agora estou morando na cidade
J: Quanto tempo faz que o senhor saiu de lá?
T: 11 anos por aí
J: E o senhor costumava ir na localidade depois que o senhor veio morar na cidade?
T: Sim, o filho mora lá em cima
J: O senhor visitava ele?
T: Sim
J: E o senhor sabe o que a dona Frieda trabalhava?
T: Na agricultura
J: Em terra própria?
T: Não, arrendada
J: De quem ela arrendava?
T: Do Alvino Cavalheiro
J: Qual era a quantidade de terras que ela arrendava?
T: Não sei exatamente. Eles plantavam fumo, 1 hectare, 2 hectare, não sei bem certo
J: Tinham empregados?
T: Não
J: A dona Frieda era casada?
T: Sim
J: E o marido dela ainda é vivo?
T: Não
J: Faleceu antes ou depois dela?
T: Antes
J: O senhor lembra o nome dele?
T: Era o Coelho, mas o primeiro nome eu não me lembro mais
J: E depois que a dona Frieda ficou viúva ela continuou morando lá no interior?
T: Sim, até quando ela faleceu
J: E os filhos moravam com eles? Já tinham saído?
T: Só a Lovani
J: E ela trabalhava no que enquanto a dona Frieda era viva?
T: Na agricultura, todos trabalhavam
J: Teve um incêndio na casa da dona Frieda?
T: Sim. Queimou tudo aquela vez, os móveis tudo (Grifos meus)
J: O senhor lembra mais ou menos que época foi?
T: Não recordo, faz tanto tempo
J: Não sobrou nada?
T: Não sobrou nada, a gente foi até olhar
J: Pela Autora
AA: Nada
J: Nada mais
Destarte, para a comprovação da qualidade de segurado especial, embora o art. 106 da Lei de Benefícios relacione os documentos aptos a essa comprovação, tal rol não é exaustivo, sendo certa a possibilidade de alternância das provas ali referidas.
Não se exige prova plena da atividade rural de todo o período correspondente à carência, de forma a inviabilizar a pretensão, mas um início de documentação que, juntamente com aprova oral, possibilite um juízo de valor seguro acerca dos fatos que se pretende comprovar.
Na hipótese, as certidões de casamento e de óbito, nas quais o instituidor do benefício está qualificado como "agricultor", tornam-se hábeis a configurar início de prova material acerca da atividade rural por ele desenvolvida até a data do óbito.
A propósito, precedente do Superior Tribunal de Justiça (STJ):
PREVIDENCIÁRIO.APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. CERTIDÃO DE CASAMENTO NA QUAL CONSTA A QUALIFICAÇÃO DO CÔNJUGE COMO AGRICULTOR OU RURAL. EXTENSÃO À ESPOSA, DESDE QUE VENHA ACOMPANHADO DE PROVA TESTEMUNHAL IDÔNEA. FALECIMENTO DO MARIDO, SEPARAÇÃO JUDICIAL OU DE FATO NÃO CONDUZEM À EXTEMPORANEIDADE DO DOCUMENTO PÚBLICO.
1. A certidão de casamento na qual consta a qualificação do marido como agricultor ou rural é documento público hábil a comprovar o início de prova material do trabalho da esposa nomeio agrícola, entretanto deve vir acompanhado de idônea prova testemunhal como observado pelo acórdão a quo. 2. A ocorrência do falecimento do marido, a separação judicial ou de fato do casal, em momento até mesmo anterior ao implemento da idade para o gozo do benefício, não são eventos aptos a gerar a extemporaneidade ou a desnaturar a validade e a eficácia da certidão de casamento, desde que a prova testemunhal produzida ateste a continuidade do labor da mulher nas lides rurais. Nesse sentido: "Ainda que a certidão pública nas condições acima seja a única prova material e não haja prova documental do labor rural após o óbito do cônjuge qualificado como trabalhador rural, está caracterizada a qualidade de segurado especial se a continuidade do labor agrícola for atestada por robusta prova testemunhal (AgRg no AREsp100.566/MG, Rel. Min. Herman Benjamin, Segunda Turma, Dje 24/04/2012)". A propósito, confiram-se: AgRg no AREsp 105.451/MG, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, Primeira Turma, DJe 20/03/2014; e AgRg no Ag 1.424.675/MT, Rel. Min. Og Fernandes, Sexta Turma, Dje 04/10/2012. 3. Agravo regimental não provido.
(AgRg no AREsp 119028 / MT,Re. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, DJe 15/04/2014)
E da jurisprudência do Tribunal Regional Federal da 4ª Região:
PREVIDENCIÁRIO. SALÁRIO-MATERNIDADE. TRABALHO RURAL. CONJUNTO PROBATÓRIO SUFICIENTE. PERÍODO DE CARÊNCIA COMPROVADO. CERTIDÃO DE NASCIMENTO.ABONO ANUAL. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. LEI 11.960/09. CRITÉRIOS DE ATUALIZAÇÃO. DIFERIMENTO PARA A FASE PRÓPRIA (EXECUÇÃO). 1. Comprovado o trabalho rural durante o período de carência exigido em lei, é devida a concessão do salário-maternidade. 2. A certidão de nascimento do filho em virtude do qual se postula o salário-maternidade é documento apto à constituição de início de prova material, até porque, segundo o entendimento do Superior Tribunal de Justiça - STJ, os dados constantes das certidões da vida civil são hábeis à comprovação da condição de rurícola para efeitos previdenciários. Precedente da Terceira Seção TRF4. 3. É devido o abono anual à segurada gestante, correspondente ao período de duração do salário-maternidade, nos termos do art. 120 do Decreto nº 3.048/1999, com a redação dada pelo Decreto nº 4.032/2001. Precedente do Tribunal Regional Federal da 4ª Região. 4. As teses relativas ao percentual de juros e o índice de correção monetária devem ser diferidas para a fase de execução, de modo a racionalizar o andamento do presente processo de conhecimento. (TRF4, APELAÇÃO CÍVEL Nº 0008694-23.2016.404.9999, 6ª TURMA, Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE, POR UNANIMIDADE, D.E. 02/09/2016, PUBLICAÇÃO EM 05/09/2016
PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO DE PENSÃO POR MORTE DE CÔNJUGE E GENITOR. COMPROVAÇÃO DA QUALIDADE DE SEGURADO DO DE CUJUS. CERTIDÃO DE CASAMENTO NA QUAL CONSTA A QUALIFICAÇÃO DO CÔNJUGE COMO LAVRADOR OU RURAL. CONSECTÁRIOS. 1. Para a obtenção do benefício de pensão por morte deve a parte interessada preencher os requisitos estabelecidos na legislação previdenciária vigente à data do óbito, consoante iterativa jurisprudência dos Tribunais Superiores e desta Corte. 2. As certidões da vida civil são hábeis a constituir início probatório da atividade rural, nos termos na jurisprudência pacífica do Egrégio STJ. Precedente da Terceira Seção TRF4. 3.Da análise do conjunto probatório produzido, tenho por comprovado o exercício de atividades rural pelo de cujus, restando cumprido, assim, o requisito da qualidade de segurado da instituidor da pensão à época do óbito. 4. O Supremo Tribunal Federal reconheceu no RE 870947, com repercussão geral, a inconstitucionalidade do uso da TR, determinando, no recurso paradigma, a adoção do IPCA-E para o cálculo da correção monetária. 5. Considerando que o recurso que originou o precedente do STF tratava de condenação da Fazenda Pública ao pagamento de débito de natureza administrativa, o Superior Tribunal de Justiça, no REsp 1495146, em precedente também vinculante, e tendo presente a inconstitucionalidade da TR como fator de atualização monetária, distinguiu os créditos de natureza previdenciária, em relação aos quais, com base na legislação anterior, determinou a aplicação do INPC. 6. Os juros de mora, a contar da citação, devem incidir à taxa de 1% ao mês, até 29-06-2009. A partir de então, incidem uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo o índice oficial de remuneração básica aplicado à caderneta de poupança. (TRF4, AC 5013196-46.2018.4.04.9999, SEXTA TURMA, Relator ARTUR CÉSAR DE SOUZA, juntado aos autos em 05/09/2018)
Ademais, as testemunhas convergem no mesmo sentido, que o falecido sempre trabalhou na agricultura com a esposa em terras arrendadas.
Conquanto franciscanos os documentos apresentados, justificando-se pelo incêndio que queimou a casa e documentos do casal, não pairam dúvidas de que o falecido era trabalhador rural, corroborado ainda pelo fato da esposa autora agora falecida ter se aposentada por idade como agricultora, ramos de atividade rural, forma de filiação segurado especial (evento 3, ANEXOSPET4, p.17).
Dessa forma, da análise do conjunto probatório produzido, possível concluir que restou perfeitamente evidenciada a qualidade de segurado especial do instituidor do benefício, mediante produção de prova documental e testemunhal; preenchidos, então, os requisitos legais à concessão do postulado, devendo ser reformada a sentença para conceder à autora o benefício de Pensão por Morte.
Termo inicial e final
A situação fática estava sob a regência normativa do artigo 74, II, Lei 8.213/91 - do requerimento, quando requerida após o prazo previsto no inciso anterior;. Tendo em vista que transcorrera mais de 30 dias entre o óbito em 17-4-1999 e o requerimento administrativo em 21-11-2011 (evento 3, ANEXOSPET4, p. 1).
Assim, o termo inicial do benefício é a data do requerimento administrativo em 21-11-2011 e final em 19-6-2013 (evento 3, PROCAUTO13, p. 2) considerando que a autora veio a óbito nesta data.
Observo que não há que se falar em prescrição de parcelas considerando que o feito foi distribuído em 17-1-2012 (evento 3, CAPA1, p 1).
Como a parte autora logrou êxito na integralidade do pedido, invertem-se os ônus da sucumbência, nos termos do art. 86, parágrafo único, do novo Código de Processo Civil (CPC), para condenar a requerida ao pagamento de custas e honorários advocatícios.
Correção monetária e juros de mora
A correção monetária incide a contar do vencimento de cada prestação e é calculada pelos seguintes índices oficiais: [a] IGP-DI de 5-1996 a 3-2006, de acordo com o artigo 10 da Lei n. 9.711/1998 combinado com os §§ 5º e 6º do artigo 20 da Lei n. 8.880/1994; e, [b] INPC a partir de 4-2006, de acordo com a Lei n. 11.430/2006, que foi precedida pela MP n. 316/2006, que acrescentou o artigo 41-A à Lei n. 8.213/1991 (o artigo 31 da Lei n. 10.741/2003 determina a aplicação do índice de reajustamento do RGPS às parcelas pagas em atraso).
A incidência da TR como índice de correção monetária dos débitos judiciais da Fazenda Pública foi afastada pelo Supremo naquele julgamento. No recurso paradigma foi determinada a utilização do IPCA-E, como já o havia sido para o período subsequente à inscrição do precatório (ADI n. 4.357 e ADI n. 4.425).
O Superior Tribunal de Justiça (REsp 149146) - a partir da decisão do STF e levando em conta que o recurso paradigma que originou o precedente tratava de condenação da Fazenda Pública ao pagamento de débito de natureza não previdenciária (benefício assistencial) - distinguiu os créditos de natureza previdenciária para estabelecer que, tendo sido reconhecida a inconstitucionalidade da TR como fator de atualização, deveria voltar a incidir, em relação a eles, o INPC, que era o índice que os reajustava à edição da Lei n. 11.960/2009.
É importante registrar que os índices em questão (INPC e IPCA-E) tiveram variação praticamente idêntica no período transcorrido desde 7-2009 até 9-2017 (mês do julgamento do RE n. 870.947): 64,23% contra 63,63%. Assim, a adoção de um ou outro índice nas decisões judiciais já proferidas não produzirá diferenças significativas sobre o valor da condenação.
A conjugação dos precedentes acima resulta na aplicação, a partir de 4-2006, do INPC aos benefícios previdenciários e o IPCA-E aos de natureza assistencial.
Os juros de mora devem incidir a partir da citação. Até 29-6-2009 à taxa de 1% ao mês (artigo 3º do Decreto-Lei n. 2.322/1987), aplicável analogicamente aos benefícios pagos com atraso, tendo em vista o seu caráter eminentemente alimentar (Súmula n. 75 do Tribunal).
A partir de então, deve haver incidência dos juros até o efetivo pagamento do débito, segundo o índice oficial de remuneração básica aplicado à caderneta de poupança, de acordo com o artigo 1º-F, da Lei n. 9.494/1997, com a redação que lhe foi conferida pela Lei n. 11.960/2009. Eles devem ser calculados sem capitalização, tendo em vista que o dispositivo determina que os índices devem ser aplicados "uma única vez".
Honorários advocatícios e periciais
Incide, no caso, a sistemática de fixação de honorários advocatícios prevista no art. 85 do NCPC, porquanto a sentença foi proferida após 18/03/2016 (data da vigência do NCPC definida pelo Pleno do STJ em 02/04/2016).
Invertidos os ônus sucumbenciais, estabeleço a verba honorária em 10% (dez por cento) sobre as parcelas vencidas até a data do presente julgado, considerando as variáveis dos incisos I a IV do § 2º do artigo 85 do NCPC, devendo restituir os honorários periciais.
Custas e despesas processuais
O INSS é isento do pagamento das custas processuais quando demandado na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul, devendo, contudo, pagar eventuais despesas processuais, como as relacionadas a correio, publicação de editais e condução de oficiais de justiça (artigo 11 da Lei Estadual nº 8.121/85, com a redação da Lei Estadual nº 13.471/2010, já considerada a inconstitucionalidade formal reconhecida na ADI nº 70038755864 julgada pelo Órgão Especial do TJ/RS).
Conclusão
Dado provimento à apelação.
Fixada a verba honorária em 10% (dez por cento) sobre as parcelas vencidas até a data do presente julgado, considerando as variáveis dos incisos I a IV do § 2º do artigo 85 do NCPC, adequando consectários à orientação do STF no RE 870947.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar provimento à apelação da parte autora.
Documento eletrônico assinado por JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002297171v5 e do código CRC 48ba0290.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER
Data e Hora: 12/2/2021, às 10:13:53
Conferência de autenticidade emitida em 20/02/2021 04:01:09.
Apelação Cível Nº 5022455-94.2020.4.04.9999/RS
RELATOR: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER
APELANTE: LORVANE MARIA COELHO CAVALHEIRO (Sucessor)
ADVOGADO: ARLEI VITÓRIO STEIGER (OAB RS055786)
APELANTE: FRIEDA ELVIRA COELHO (Sucessão)
ADVOGADO: ARLEI VITÓRIO STEIGER (OAB RS055786)
APELANTE: EVANIR TEREZINHA COELHO ROSA (Sucessor)
ADVOGADO: ARLEI VITÓRIO STEIGER (OAB RS055786)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE DE CÔNJUGE. CONCESSÃO. QUALIDADE DE SEGURADO. CERTIDÃO DE ÓBITO NA QUAL CONSTA A QUALIFICAÇÃO DO FALECIDO COMO AGRICULTOR. CONSECTÁRIOS.
1. Demonstrada a união estável por prova meramente testemunhal, que é perfeitamente viável conforme jurisprudência dominante deste Regional, não há se perquirir sobre a dependência econômica, uma vez que presumida, de acordo com o artigo 16, I e §4º da Lei 8.213/91.
2. As certidões da vida civil são hábeis a constituir início probatório da atividade rural, nos termos na jurisprudência pacífica do Egrégio STJ. Precedente da Terceira Seção TRF4.
3.Da análise do conjunto probatório produzido, tenho por comprovado o exercício de atividades rural pelo(a) de cujus, restando cumprido, assim, o requisito da qualidade de segurado da instituidor da pensão à época do óbito.
4.A utilização da TR como índice de correção monetária dos débitos judiciais da Fazenda Pública, prevista na Lei 11.960/2009, foi afastada pelo STF no julgamento do Tema 810, através do RE 870947, com repercussão geral, o que restou confirmado, no julgamento de embargos de declaração por aquela Corte, sem qualquer modulação de efeitos.
5. O Superior Tribunal de Justiça, no REsp 1495146, em precedente também vinculante, e tendo presente a inconstitucionalidade da TR como fator de atualização monetária, distinguiu os créditos de natureza previdenciária, em relação aos quais, com base na legislação anterior, determinou a aplicação do INPC, daqueles de caráter administrativo, para os quais deverá ser utilizado o IPCA-E.
6. Os juros de mora, a contar da citação, devem incidir à taxa de 1% ao mês, até 29-06-2009. A partir de então, incidem uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo o percentual aplicado à caderneta de poupança.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 10 de fevereiro de 2021.
Documento eletrônico assinado por JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002297172v2 e do código CRC 01d5ac88.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER
Data e Hora: 12/2/2021, às 10:13:53
Conferência de autenticidade emitida em 20/02/2021 04:01:09.
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Telepresencial DE 10/02/2021
Apelação Cível Nº 5022455-94.2020.4.04.9999/RS
RELATOR: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER
PRESIDENTE: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
PROCURADOR(A): EDUARDO KURTZ LORENZONI
APELANTE: LORVANE MARIA COELHO CAVALHEIRO (Sucessor)
ADVOGADO: ARLEI VITÓRIO STEIGER (OAB RS055786)
APELANTE: FRIEDA ELVIRA COELHO (Sucessão)
ADVOGADO: ARLEI VITÓRIO STEIGER (OAB RS055786)
APELANTE: EVANIR TEREZINHA COELHO ROSA (Sucessor)
ADVOGADO: ARLEI VITÓRIO STEIGER (OAB RS055786)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Telepresencial do dia 10/02/2021, na sequência 673, disponibilizada no DE de 29/01/2021.
Certifico que a 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 6ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER
Votante: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER
Votante: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
Votante: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
PAULO ROBERTO DO AMARAL NUNES
Secretário
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