| D.E. Publicado em 30/05/2017 |
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0017451-40.2015.4.04.9999/RS
RELATORA | : | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
APELANTE | : | VANDERLEI TRESSINO |
ADVOGADO | : | Tiago Augusto Rossi |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | (Os mesmos) |
REMETENTE | : | JUIZO DE DIREITO DA 1A VARA DA COMARCA DE VERANÓPOLIS/RS |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE DOS GENITORES. FILHO MAIOR INVÁLIDO. PRESCRIÇÃO. CUMULAÇÃO DE BENEFÍCIOS. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA. FASE DE CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. DIFERIMENTO.
1. Para a obtenção do benefício de pensão por morte deve a parte interessada preencher os requisitos estabelecidos na legislação previdenciária vigente à data do óbito, consoante iterativa jurisprudência dos Tribunais Superiores e desta Corte.
2. A pensão por morte a filho maior incapaz é devida nos casos de se reconhecer a existência de incapacidade e dependência em data anterior ao óbito do instituidor, o que restou demonstrado nos autos.
3. Estabelecida por perícia a dependência econômica, e tratando-se de beneficiário maior incapaz, o termo inicial do benefício é a data do óbito, inocorrendo prescrição.
4. Não há óbice à acumulação de benefício de pensão por morte em razão do falecimento de genitor e genitora, ou ainda, ao recebimento simultâneo de pensões por morte e aposentadoria por invalidez, porquanto inexistente vedação expressa nesse sentido.
5. Deliberação sobre índices de correção monetária e taxas de juros diferida para a fase de cumprimento de sentença, a iniciar-se com a observância dos critérios da Lei 11.960/2009, de modo a racionalizar o andamento do processo, permitindo-se a expedição de precatório pelo valor incontroverso, enquanto pendente, no Supremo Tribunal Federal, decisão sobre o tema com caráter geral e vinculante. Precedentes do STJ e do TRF da 4ª Região.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação da parte autora, negar provimento à apelação do INSS e à remessa oficial, mantida a antecipação de tutela, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre/RS, 17 de maio de 2017.
Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE
Relatora
| Documento eletrônico assinado por Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8939160v35 e, se solicitado, do código CRC 1E79E5A5. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Salise Monteiro Sanchotene |
| Data e Hora: | 18/05/2017 14:04 |
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0017451-40.2015.4.04.9999/RS
RELATORA | : | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
APELANTE | : | VANDERLEI TRESSINO |
ADVOGADO | : | Tiago Augusto Rossi |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | (Os mesmos) |
REMETENTE | : | JUIZO DE DIREITO DA 1A VARA DA COMARCA DE VERANÓPOLIS/RS |
RELATÓRIO
VANDERLEI TRESSINO, representado por seu curador, Valdes Tressino, ajuizou, em 02-02-2011, ação ordinária contra o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), objetivando a concessão de pensão por morte de seus genitores ENRICO TRESSINO e HOLMA TESTA TRESSINO, cujos óbitos ocorreram em 23-11-2001 e 12-01-2000, respectivamente.
Sobreveio sentença (25-05-2015) que julgou procedentes os pedidos iniciais para condenar o INSS a implantar, em favor da parte autora, os benefícios de pensão por morte decorrente dos falecimentos dos genitores, desde a data do requerimento administrativo (03-08-2009). Fixou os honorários advocatícios de 10% (dez por cento) do valor atualizado das parcelas vencidas até a publicação desta sentença (Súmula 111 do STJ e Súmula 76 do TRF 4ª Região). Deferiu a antecipação de tutela.
O autor se insurgiu alegando, em síntese, que a sentença merece reforma no ponto que deferiu os benefícios desde a data do requerimento administrativo, sustentando que contra absolutamente incapaz não corre prescrição, por conseguinte, a data de início do benefício é do óbito do genitor Enrico Tressino em 23-11-2001.
Apresentada as contrarrazões, vieram os autos para julgamento, inclusive para remessa oficial.
VOTO
Nos termos do artigo 1.046 do Código de Processo Civil (CPC), em vigor desde 18 de março de 2016, com a redação que lhe deu a nº Lei 13.105, de 16 de março de 2015, suas disposições aplicar-se-ão, desde logo, aos processos pendentes, ficando revogada a Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973.
Com as ressalvas feitas nas disposições seguintes a este artigo 1.046 do CPC, compreende-se que não terá aplicação a nova legislação para retroativamente atingir atos processuais já praticados nos processos em curso e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada, conforme expressamente estabelece seu artigo 14.
Remessa Oficial
Conheço da remessa oficial tendo em vista que o valor da condenação ultrapassa sessenta salários mínimos, uma vez que reconhecido o direito aos dois benefícios de pensão por morte, por período superior a cinco anos.
Pensão por Morte
Para a obtenção do benefício de pensão por morte, deve a parte interessada preencher os requisitos previstos na legislação previdenciária vigente à data do óbito, conforme dispõe a Súmula 340, do Superior Tribunal de Justiça (STJ).
À época, quando dos falecimentos de ENRICO TRESSINO, ocorrido em 23-11-2001, e de HOLMA TESTA TRESSINO, ocorrido em 12-01-2000, a legislação aplicável à espécie - Lei 8.213, de 24 de julho de 1991 (Plano de Benefícios da Previdência Social) apresentava a seguinte redação:
Art. 74 - A pensão por morte será devida ao conjunto dos dependentes do segurado que falecer, aposentado ou não, a contar da data:
I - do óbito, quando requerida até 30 dias depois deste;
II - do requerimento, quando requerida após o prazo previsto no inciso anterior;
III - da decisão judicial, no caso de morte presumida.
São, portanto, três os requisitos para a concessão do benefício de pensão por morte previdenciária:
a) o óbito (ou morte presumida);
b) a qualidade de segurada da pessoa falecida;
c) a existência de dependentes, na forma prevista no artigo 16, da Lei n. 8.213/1991.
Os eventos morte estão comprovados pelas certidões de óbito (fls. 33/34).
No que se refere à filiação do autor em relação aos genitores, restou comprovada através das certidões (fls. 33/34) e documento da autarquia (fl.53).
Não há controvérsia em relação à qualidade de segurado dos instituidores do benefício, sendo que a mãe do autor recebia a aposentadoria por invalidez previdenciária NB 111.253.723-3 (fl. 69) e o pai a aposentadoria por tempo de contribuição NB 041.139.707-9 (fl.61).
A controvérsia cinge-se à qualidade de dependente do requerente em relação aos falecidos genitores.
No que se refere à invalidez superveniente à maioridade civil, necessário enfatizar que não há qualquer exigência legal no sentido de que a invalidez do requerente deva ocorrer antes da maioridade, mas somente que a invalidez deva existir na época do óbito.
Assim já decidiu a Sexta Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4):
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. FILHO MAIOR inválido. DIREITO AO BENEFÍCIO. CUMPRIMENTO IMEDIATO DO ACÓRDÃO. 1. O fato de o início da incapacidade ter sido fixado após o advento dos 21 anos de idade não é empecilho à concessão da pensão, uma vez que a lei apenas exige que a invalidez seja preexistente ao óbito do instituidor, o que restou demonstrado nos autos. 2. Determinado o cumprimento imediato do acórdão no tocante à implantação do benefício, a ser efetivada em 45 dias, nos termos do art. 461 do CPC. (TRF4 5035682-02.2012.404.7100, Sexta Turma, Relator p/ Acórdão Paulo Paim da Silva, juntado aos autos em 19/12/2013)
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. CONCESSÃO. COMPROVAÇÃO DA QUALIDADE DE DEPENDENTE. FILHO INVÁLIDO. AMPARO SOCIAL. IMPOSSIBILIDADE DE ACUMULAÇÃO. OPÇÃO PELO BENEFÍCIO MAIS VANTAJOSO. DIB. ABSOLUTAMENTE INCAPAZ. CONSECTÁRIOS.
(...)3. O filho inválido preenche a qualidade de dependente para fins previdenciários, ainda que a invalidez seja posterior ao implemento dos 21 anos de idade, mas desde que preexistente ao óbito do instituidor. 4. (...) (TRF4, APELREEX 5005767-79.2010.404.7001, Quinta Turma, Relator p/ Acórdão Rogério Favreto, D.E. 09/03/2012)
PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO DE PENSÃO POR MORTE. FILHO INVÁLIDO. INVALIDEZ POSTERIOR À MAIORIDADE. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA. (...)2. Comprovado que a invalidez da parte autora remonta a período anterior ao óbito de seu pai, não sendo exigida prova de que exista desde o nascimento ou tenha sido adquirida até aos 21 anos para que o filho possa ser considerado beneficiário, mantém-se a sentença que condenou o INSS a conceder a pensão por morte. (...) (TRF4, APELREEX 0014898-59.2011.404.9999, Sexta Turma, Relator João Batista Pinto Silveira, D.E. 24/02/2012)
Destaco que a posição desta Corte, no que se refere à dependência de filho maior inválido em relação a seus genitores, está condicionada à verificação da invalidez do requerente à época do óbito do instituidor. Nesse caso, a dependência econômica deverá ser comprovada, pois a presunção estabelecida no artigo 16, § 4º, da Lei 8213/91, não é absoluta, admitindo prova em sentido contrário, especialmente quando o filho maior inválido já recebe outro amparo previdenciário, na linha dos inúmeros precedentes do Superior Tribunal de Justiça.
Nesse sentido, transcrevo as ementas dos julgados do STJ:
PREVIDENCIÁRIO - PENSÃO POR MORTE - FILHO MAIOR INVÁLIDO - PRESUNÇÃO DE DEPENDÊNCIA ECONÔMICA RELATIVA - SUPRIDA POR PROVA EM SENTIDO CONTRÁRIO - REEXAME FÁTICO-PROBATÓRIO - SÚMULA 7/STJ - PRECEDENTES.
1. O § 4º do art. 16 da Lei n. 8.213/91 prescreve uma presunção relativa de dependência econômica das pessoas indicadas no inciso I do mesmo dispositivo, e, como tal, pode ser suprimida por provas em sentido contrário. Precedentes.
2. É inadmissível o recurso especial se a análise da pretensão da recorrente demanda o reexame de provas.
3. Agravo regimental não provido.
(AgRg nos EDcl no AREsp 396.299/SP, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 17/12/2013, DJe 07/02/2014)
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO. FILHO MAIOR INVÁLIDO. ART. 16, I, § 4º DA LEI N. 8.213/91. PRESUNÇÃO DE DEPENDÊNCIA ECONÔMICA RELATIVA. ELIDÍVEL POR PROVA EM SENTIDO CONTRÁRIO. REVISÃO DE FATOS. SÚMULA 7/STJ.
1. O § 4º do art. 16 da Lei n. 8.213/91 estabelece uma presunção relativa de dependência econômica das pessoas indicadas no inciso I do mesmo dispositivo, e, como tal, pode ser elidida por provas em sentido contrário. Precedente: (AgRg no REsp 1241558/PR, Rel. Min. Haroldo Rodrigues (Desembargador convocado DO TJ/CE), Sexta Turma, julgado em 1/04/2011, DJe 6/6/2011).
2. O Tribunal de origem negou provimento à pretensão, por entender que (I) o recorrente não possuía relação de dependência com a mãe, pois já recebia a pensão pela morte do pai, o que lhe garantia o sustento e, (II) que o montante recebido foi aplicado pela representante legal também em favor do demandante, que com ela convivia. Assim, a despeito da fixação da DIB na data do óbito, o demandante somente pode receber os valores referentes à pensão decorrente do óbito do pai, a contar da data do óbito da mãe.3. Não há como infirmar os fundamentos do Tribunal de origem, pois tal medida demandaria o revolvimento de matéria fático-probatória, esbarrando na Súmula 7/STJ.
Agravo regimental improvido.
(AgRg nos EDcl no REsp 1250619/RS, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 06/12/2012, DJe 17/12/2012)
AGRAVO REGIMENTAL. PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. FILHO MAIOR INVÁLIDO. TITULAR DE APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA. COMPROVAÇÃO. REEXAME DE PROVAS. SÚMULA Nº 7/STJ.
1. Nas hipóteses em que o filho inválido é titular de benefício de aposentadoria por invalidez, sendo o marco inicial anterior ao óbito da instituidora da pensão, a dependência econômica deve ser comprovada, porque a presunção desta, acaba sendo afastada diante da percepção de renda própria.
2. A irresignação que busca desconstituir os pressupostos fáticos adotados pelo acórdão recorrido encontra óbice no enunciado nº 7 da Súmula desta Corte.
3. Agravo regimental a que se nega provimento.
(AgRg no REsp 1241558/PR, Rel. Ministro HAROLDO RODRIGUES (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/CE), SEXTA TURMA, julgado em 14/04/2011, DJe 06/06/2011)
Assevero que a prova da dependência econômica prescinde de prova documental bastando, para tanto, prova testemunhal.
Entendo que as questões controvertidas foram devidamente analisadas na sentença, cujos fundamentos acolho e adoto como razão de decidir, merecendo transcrição, in verbis:
(...)
É certo que a aludida presunção de dependência econômica é relativa e pode ser afastada por prova em sentido contrário.
Entretanto, das circunstâncias aferidas pelo conjunto probatório carreado aos autos, conclui-se que havia, de fato, dependência econômica da parte autora em relação aos seus pais.
A invalidez está demonstrada através da prova pericial. Segundo o laudo pericial das fls. 122/128, a parte autora sofre de "retardo mental leve - CID F70". Em função disso, o requerente "não tem o necessário discernimento de sua condição, é acometido de patologia em que não houve o correto desenvolvimento da mente (irrecuperável) caracterizada por comprometimento das habilidades que contribuem para o nível global de inteligência isto é, as aptidões cognitivas, de linguagem, motoras e sociais".
Trata-se de incapacidade permanente e total.
Assevera a perita que a "patologia que acomete o autor é caracterizada por um desenvolvimento interrompido ou incompleto da mente", e já existia à época do falecimento do pai e da mãe, pois os sintomas psiquiátricos advém desde a infância.
Com efeito, não procede o argumento defensivo do INSS no sentido da inviabilidade da concessão do benefício em razão da incapacidade da parte autora ter iniciado após a maioridade. E ainda que assim não fosse, tal argumento seria afastado com base no seguinte precedente do E. TRF-4, in verbis:
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. FILHO MAIOR INVÁLIDO. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA. COMPROVAÇÃO. CONCESSÃO. O filho maior e inválido, sem fonte de renda, tem direito à pensão pela morte de seu pai, mesmo que a incapacidade haja iniciado depois de alcançada a maioridade. (TRF4, AC 5043481-96.2012.404.7100, Sexta Turma, Relatora p/ Acórdão Luciane Merlin Clève Kravetz, D.E. 20/12/2013)
A prova testemunhal colhida na fase de justificação corrobora o quanto disposto no laudo pericial, confirmando que o autor é incapaz, sempre dependeu economicamente da família e nunca conseguir desempenhar atividades profissionais sem supervisão de terceiros (fls. 165/167). Grifo meu
Os argumentos acima expostos, somados à presunção legal de dependência estabelecido pelo art. 16 da lei 8.213/91, levam à conclusão pelo adimplemento dos requisitos para a concessão do benefício de pensão por morte, daí porque mister o julgamento pela procedência dos pedidos.
(...)
Em face dos fundamentos acima declinados, deverá a Autarquia Previdenciária conceder ao autor os benefícios de pensão por morte de ENRICO TRESSINO e HOLMA TESTA TRESSINO, cumulativamente, desde a data do requerimento administrativo (03.08.2009).
(...)
Muito embora a perícia técnica realizada nos autos não tenha sido capaz de estabelecer a data do início da incapacidade, concluiu ser esta total e definitiva para os atos da vida civil, por ser o autor portador de "retardo mental leve - CID F70", não apresentando discernimento de sua condição, sendo acometido de patologia em que não houve o correto desenvolvimento da mente (irrecuperável) caracterizada por comprometimento das habilidades que contribuem para o nível global de inteligência isto é, as aptidões cognitivas, de linguagem, motoras e sociais. Prosseguiu a expert que a patologia que acomete o autor é caracterizada por um desenvolvimento interrompido ou incompleto da mente", e já existia à época do falecimento do pai e da mãe, pois os sintomas psiquiátricos advém desde a infância.
Ora, da detida análise dos documentos juntados com a inicial, bem como dos depoimentos colhidos na justificação administrativa, crível a hipótese que a incapacidade do autor remonta à infância, conferindo reforço às declarações de que o autor sempre foi sustentado e tutelado pelos pais, não conseguindo se integrar à sociedade e viver uma vida independente, a não ser com a supervisão de terceiros (fls. 165/167).
Preenchidos, então, os requisitos legais à concessão dos benefícios postulados, deve ser mantida a sentença que concedeu as pensões por morte à parte autora VANDERLEI TRESSINO.
Termo inicial
A parte autora se insurgiu contra o dispositivo sentencial que fixou o início dos benefícios a partir da data do requerimento administrativo; sustentou que contra absolutamente incapaz não corre prescrição e, por conseguinte, a data de início do benefício é do óbito do genitor Enrico Tressino em 23-11-2001.
Assiste razão ao autor. Senão, vejamos.
Deveras, o art. 103, parágrafo único, da Lei n.º 8.213/91 dispõe que a prescrição quinquenal atinge a pretensão ao recebimento dos créditos anteriores a cinco anos do ajuizamento da ação, ressalvando o direito de menores, incapazes e ausentes.
No presente caso, restou demonstrado nos autos que o autor é absolutamente incapaz, conforme termo de curador provisório, firmado pelo irmão Valdes Tressino em 20-07-2012 (fl.143) e de acordo com o laudo pericial realizado em juízo (fls.122/128).
À época do óbito, do requerimento administrativo e do ajuizamento da ação, vigia a seguinte redação do artigo 3º do Código Civil, com a inclusão das pessoas com enfermidade e com deficiência dentre as absolutamente incapazes, sendo, portanto, amparadas pelo disposto no artigo 198, inciso I, do Código Civil:
Art. 3º. São absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil:
I - os menores de dezesseis anos;
II - os que, por enfermidade ou deficiência mental, não tiverem o necessário discernimento para a prática desses atos;
III - os que, mesmo por causa transitória, não puderem exprimir sua vontade.
A Lei nº 13.146/2015, denominada Estatuto da Pessoa com Deficiência, alterou a redação do artigo 3º do Código Civil, mantendo como absolutamente incapazes apenas os menores de dezesseis anos.
Tais modificações operadas pela Lei nº 13.146/2015 e dos seus efeitos sobre os direitos das pessoas com deficiência e das pessoas que não tem discernimento para a prática de atos da vida civil são objeto de discussão na doutrina e nos julgamentos.
Em recente julgado do Tribunal Regional Federal da 4ª Região - TRF4, a Sexta Turma assim decidiu em relação ao ponto, conforme trecho que segue transcrito:
(...)
Entretanto, embora a redação do art. 3º do Código Civil tenha sido alterada pela Lei 13.146/2015 ("Estatuto da Pessoa com Deficiência"), para definir como absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil apenas os menores de 16 anos - situação essa na qual não se encontra o demandante -, e o inciso I do art. 198 do Código Civil disponha que a prescrição não corre contra os incapazes de que trata o art. 3º, entendo que a vulnerabilidade do indivíduo - inquestionável no caso do autor - não pode jamais ser desconsiderada pelo ordenamento jurídico, ou seja, o Direito não pode fechar os olhos à falta de determinação de alguns indivíduos e tratá-los como se tivessem plena capacidade de interagir em sociedade em condições de igualdade.
Veja-se que, no próprio parecer do projeto de lei que deu origem ao estatuto da pessoa com deficiência apresentado no Senado Federal, foi referido que:
"Para facilitar a compreensão, optamos por fazer uma análise conjunta dos dispositivos constantes dos arts. 6º e 84, além de algumas das alterações contidas no art. 114, uma vez que dispõem sobre a capacidade civil das pessoas com deficiência. Seu cerne é o reconhecimento de que condição de pessoa com deficiência, isoladamente, não é elemento relevante para limitar a capacidade civil. Assim, a deficiência não é, a priori, causadora de limitações à capacidade civil. Os elementos que importam, realmente, para eventual limitação dessa capacidade, são o discernimento para tomar decisões e a aptidão para manifestar vontade. Uma pessoa pode ter deficiência e pleno discernimento, ou pode não ter deficiência alguma e não conseguir manifestar sua vontade."
A Lei 13.146/2015, embora editada com o propósito de promover uma ampla inclusão das pessoas portadoras de deficiência, ao contrário, acabou por aniquilar a proteção dos incapazes, rompendo com a própria lógica dos direitos humanos.
(TRF4, APELAÇÃO CÍVEL Nº 5001195-60.2014.404.7124, 6ª TURMA, Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 31/03/2017)
De qualquer forma, na hipótese, deve ser aplicado o princípio da irretroatividade, o qual aduz que a lei nova não será aplicada às situações constituídas sob a vigência da lei revogada ou modificada. Tal princípio baseia-se no disposto nos art. 5º, inciso XXXVI, da CF/88 e art. 6º, da LINDB.
No caso dos autos, é evidente, pelas conclusões do perito judicial (fls.122/128), que o demandante não possui discernimento para a prática dos atos da vida civil e, em razão disso, deve ser rigorosamente protegido pelo ordenamento jurídico, não podendo ser prejudicado pela fluência do prazo prescricional.
Assim, considerando que a presente ação foi ajuizada em 02-02-2011, o requerimento administrativo foi realizado em 03-08-2009 e os óbitos ocorridos em 23-11-2001 e 12-01-2000 (fls.33/34), que a incapacidade civil da parte autora se deu em momento anterior ao advento da Lei nº 13.146/2015, afasta-se a aplicação da referida norma ao caso em tela, não havendo falar em prescrição.
Logo, afasta-se a prescrição no caso em tela.
Por conseguinte, merece reparos a sentença no que se refere ao termo inicial dos benefícios que devem ser fixados nas datas dos óbitos de ENRICO TRESSINO em 23-11-2001 e de HOLMA TESTA TRESSINO em 12-01-2000. No entanto, os efeitos financeiros dos dois benefícios decorrem do óbito de Enrico em 23-11-2001, pois este já detinha a disponibilidade do valor total da pensão por morte de Holma Testa Tressino (fl.62) e era gestor dos rendimentos auferidos pelo grupo familiar, no qual estava inserido o requerente.
Dou provimento à apelação da parte autora.
Acrescento, no que se refere à percepção de ambas as pensões, que a única vedação feita à acumulação de benefícios previdenciários está inserta no art. 124 em seu parágrafo único Lei 8.213/91, in verbis:
Art. 124. Salvo nos casos de direito adquirido, não é permitido o recebimento conjunto dos seguintes benefícios da Previdência Social:
I - aposentadoria e auxílio-doença;
II - mais de uma aposentadoria;
III- aposentadoria e abono de permanência em serviço;
IV- salário-maternidade e auxílio-doença;
V- mais de um auxílio-acidente;
VI - mais de uma pensão deixada por cônjuge ou companheiro, ressalvado o direito de opção pela mais vantajosa.
Parágrafo único. É vedado o recebimento conjunto do seguro desemprego com qualquer benefício de prestação continuada da Previdência Social, exceto pensão por morte ou auxílio-acidente.
Depreende-se, portanto, que o recebimento cumulado das pensões decorrentes do falecimento dos genitores é permitido, pois o que é vedado é a cumulação de mais de uma pensão deixada por cônjuge ou companheiro.
Nesse sentido, colaciono os seguintes precedentes:
PREVIDENCIÁRIO. pensão POR morte. CUMULAÇÃO. Não há vedação à acumulação de pensões por morte decorrentes do falecimento de filho e do falecimento de cônjuge. O art. 124, VI da Lei 8.213/91, veda somente a cumulação de pensões por morte em decorrência do falecimento de cônjuge e/ou companheiro. (TRF4, APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0012458-22.2013.404.9999, 5ª TURMA, Des. Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA, por UNANIMIDADE, D.E. 24/09/2013, PUBLICAÇÃO EM 25/09/2013).
PREVIDENCIÁRIO. pensão POR morte DE MÃE. MENOR IMPÚBERE. CONCESSÃO. QUALIDADE DE SEGURADA ESPECIAL. COMPROVAÇÃO. RECEBIMENTO CONJUNTO DE DUAS PENSÕES. POSSIBILIDADE. TERMO INICIAL. 1. Na vigência da Lei nº 8.213/91, dois são os requisitos para a concessão de benefício de pensão por morte, quais sejam: a qualidade de segurado do instituidor e a dependência dos beneficiários que, se preenchidos, ensejam o seu deferimento. 2. Comprovada a qualidade de segurado especial e presumida a dependência econômica, porque reconhecida a união estável, é de ser mantida a sentença que concedeu o benefício de pensão por morte a contar do óbito. 3. Não havendo vedação legal quanto à acumulação de pensões pelas mortes dos pais, têm direito à parte autora, também, à pensão pela morte do pai, a qual já vem recebendo desde o óbito deste. 4. Marco inicial fixado nas datas dos óbitos, pois contra incapazes não corre prescrição, não se aplicando os prazos prescricionais previstos no art. 74 da Lei 8.213/91. (TRF4, APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0017128-69.2014.404.9999, 6ª TURMA, Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA, por UNANIMIDADE, D.E. 09/12/2014, PUBLICAÇÃO EM 10/12/2014) Grifo meu.
Honorários advocatícios
Os honorários advocatícios devem ser mantidos em 10% (dez por cento) sobre o valor das parcelas vencidas até a data da presente decisão, a teor das Súmulas 111, do STJ, e 76, do TRF da 4ª Região.
Custas
O INSS é isento do pagamento das custas no Foro Federal (art. 4, I, da Lei nº 9.289/96) e na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul, devendo, contudo, pagar eventuais despesas processuais, como as relacionadas a correio, publicação de editais e condução de oficiais de justiça (artigo 11 da Lei Estadual nº 8.121/85, com a redação da Lei Estadual nº 13.471/2010, já considerada a inconstitucionalidade formal reconhecida na ADInº 70038755864, julgada pelo Órgão Especial do TJ/RS); para os feitos ajuizados a partir de 2015 é isento o INSS da taxa única de serviços judiciais, na forma do estabelecido na lei estadual nº 14.634/2014 (artigo 5º). Tais isenções não se aplicam quando demandado na Justiça Estadual do Paraná (Súmula 20 do TRF4), devendo ser ressalvado, ainda, que no Estado de Santa Catarina (art. 33, parágrafo único, da Lei Complementar Estadual nº 156/97), a autarquia responde pela metade do valor.
Da antecipação da tutela
Uma vez confirmado o direito ao benefício, resta mantida a antecipação dos efeitos da tutela, concedida no juízo de origem.
Verifico através de petitório do INSS (fls. 189/191) a implementação dos benefícios NB 168.285.784-8 e NB 168.285.785-6.
Conclusão
Restou provida a apelação da parte autora para fixar os benefícios de pensão por morte a partir da data dos respectivos óbitos, sendo os efeitos financeiros dos dois benefícios decorrentes do óbito de Enrico Tressino em 23-11-2001 (detinha a disponibilidade do valor total da pensão por morte de Holma Testa Tressino).
Restaram improvidas à apelação da ré e à remessa oficial. Difere-se para a fase de execução a forma de cálculo dos consectários legais.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar provimento à apelação da parte autora, negar provimento à apelação do INSS e à remessa oficial, mantida a antecipação de tutela.
Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE
Relatora
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 17/05/2017
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0017451-40.2015.4.04.9999/RS
ORIGEM: RS 00003778620118210078
RELATOR | : | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
PRESIDENTE | : | Desembargadora Federal Vânia Hack de Almeida |
PROCURADOR | : | Procurador Regional da Republica Paulo Gilberto Cogo Leivas |
APELANTE | : | VANDERLEI TRESSINO |
ADVOGADO | : | Tiago Augusto Rossi |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | (Os mesmos) |
REMETENTE | : | JUIZO DE DIREITO DA 1A VARA DA COMARCA DE VERANÓPOLIS/RS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 17/05/2017, na seqüência 1237, disponibilizada no DE de 02/05/2017, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS E À REMESSA OFICIAL, MANTIDA A ANTECIPAÇÃO DE TUTELA.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
: | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA | |
: | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
Gilberto Flores do Nascimento
Diretor de Secretaria
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