APELAÇÃO CÍVEL Nº 5008867-45.2010.4.04.7000/PR
RELATOR | : | VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
APELANTE | : | MARIA DE LOURDES JAKOBOWITZ |
ADVOGADO | : | JONAS BORGES |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE E PENSÃO ESTATUTÁRIA. AGRAVO RETIDO. CERCEAMENTO DE DEFESA. DECADÊNCIA. INOCORRÊNCIA. CONTAGEM DE TEMPO DE SERVIÇO CONCOMITANTE. POSSIBILIDADE DE PERCEPÇÃO DE DUAS PENSÕES EM REGIMES DIVERSOS. SENTENÇA IMPROCEDENTE REFORMADA. INVERTIDA SUCUMBÊNCIA. TUTELA ESPECÍFICA.
1. Agravo Retido cuja apreciação foi requerida nas preliminares do apelo, deve ser conhecido. Inexiste cerceamento de defesa no indeferimento de modalidade probatória diversa da perseguida pela parte se a prova do fato foi realizada por outra forma.
2. A Administração, em atenção ao princípio da legalidade, tem o poder-dever de anular seus próprios atos quando eivados de vícios que os tornem ilegais (Súmulas 346 e 473 do STF).
3. Na hipótese de sucessão de leis, o entendimento doutrinário é no sentido de que se aplica, em caso de lei mais nova estabelecendo prazo decadencial maior que a antiga, o novo prazo, contando-se, porém, para integrá-lo, o tempo transcorrido na vigência da lei antiga.
4. Para os benefícios concedidos desde o início da vigência da Lei n. 9.784/99, o prazo decadencial a incidir é o de dez anos (MP n. 138, de 2003), contados da data em que foi praticado o ato administrativo (ou da percepção do primeiro pagamento, conforme o caso), salvo comprovada má-fé. Entendimento pacificado pelo STJ.
5. O prazo decadencial de dez anos também deve ser aplicado quando o ato administrativo foi praticado anteriormente à vigência da Lei 9.784/99 (e depois da revogação da Lei 6.309/75), desde que não se perfaça violação ao princípio da segurança jurídica. Nessa hipótese, conta-se o prazo a partir da entrada em vigor da Lei 9.784/99, ante a impossibilidade de sua retroação, conforme entendimento do STJ. No caso, não incidente a decadência por não ter decorrido o prazo de dez anos.
6. Desde que efetuada a contagem de tempo de serviço concomitante em paralelo, possível a percepção de pensão estatutária concomitantemente com a previdenciária.
7. Reconhecida a contagem de tempo independente, deve ser restabelecido o benefício de pensão por morte, com o pagamento das parcelas atrasadas, desde a indevida cessação, corrigidas monetariamente e acrescidas de juros moratórios. Reformada da sentença.
8. Invertida a sucumbência para o fim de condenar o INSS ao pagamento dos honorários advocatícios.
9. Determina-se o cumprimento imediato do acórdão naquilo que se refere à obrigação de implementar o benefício, por se tratar de decisão de eficácia mandamental que deverá ser efetivada mediante as atividades de cumprimento da sentença stricto sensu previstas no art. 461 do CPC, sem a necessidade de um processo executivo autônomo (sine intervallo).
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6a. Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, conhecer dos agravos retidos e no mérito, negar-lhes provimento, bem como dar provimento à apelação da parte autora para julgar procedente o pedido, condenando o INSS a restabelecer o benefício de pensão por morte, desde a cessação administrativa e, de ofício, determinar o cumprimento do acórdão no tocante à implantação do benefício, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 27 de janeiro de 2016.
Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
Relatora
| Documento eletrônico assinado por Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8037920v11 e, se solicitado, do código CRC CE3BA117. | |
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 5008867-45.2010.4.04.7000/PR
RELATOR | : | VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
APELANTE | : | MARIA DE LOURDES JAKOBOWITZ |
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RELATÓRIO
Trata-se de ação ordinária movida por Maria de Lourdes Jakobowitz em que a autora busca o restabelecimento do benefício de pensão pela morte de Pedro Simão Jacobowitz, cessado em 09/08/2008, alegadamente sem oportunização de contraditório à autora.
Foram interpostos dois agravos retidos no presente feito. Um no corpo da petição do evento 31, insurgindo-se a parte acerca do encerramento da instrução sem a produção de provas. Em petição imediatamente posterior (evento 34), requereu o autor prova pericial para a prova do tempo de serviço utilizado para a concessão da aposentadoria previdenciária. Lançada decisão indeferitória, foi interposto agravo retido (evento 39), tendo sido mantida a decisão (evento 45).
A sentença do evento 66 julgou improcedente o pedido, por considerar que o cancelamento do pedido foi motivado pela concessão judicial de benefício de pensão por morte estatutária, em demanda por ela movida.
Foram opostos embargos declaratórios em face da sentença (evento 71), alegando ter havido omissão da sentença no que toca à segurança jurídica, à prescrição administrativa e quanto ao recolhimento das contribuições suficientes para a concessão de benefício perante o RGPS. Tais embargos foram rejeitados (evento 74).
Em seu apelo a parte autora levantou as seguintes preliminares: negativa de prestação jurisdicional pela rejeição de embargos declaratórios, cerceamento de defesa, reiterando a apreciação dos agravos retidos. No mérito, sustentou a apelante que a autora tem direito à percepção da pensão por morte pelo RGPS em razão de ter o de cujus efetuado recolhimento de contribuições previdenciárias na condição de contribuinte individual até a data de seu óbito, que não foram utilizados para a contagem de tempo de serviço. Observou, ademais, que teria havido prescrição administrativa do direito de revisão administrativa. Pediu a reforma da sentença para a concessão do benefício.
Oportunizadas contrarrazões, vieram os autos a este Tribunal.
É o breve relatório.
VOTO
Agravos Retidos
Os agravos retidos interpostos pela parte autora, tendo em vista que reiterados nas preliminares de seu apelo, são conhecidos.
Em seu mérito, os agravos se aproximam dos embargos declaratórios opostos girando em torno do cerceamento de defesa da parte autora, em razão do indeferimento da prova pericial e da ausência de enfrentamento da questão relativa à "prescrição administrativa" e o princípio da segurança jurídica.
No que toca ao cerceamento de defesa, observo que, com efeito, à apreciação da causa de pedir do autor era necessária a elucidação da contagem de tempo para a concessão dos benefícios perseguidos. Entretanto, verifica-se que o juízo indeferiu a prova pericial por inadequada (evento 35, item 2), substituindo-a pela prova documental, a ser produzida pelo INSS (item 3), o que redundou nos documentos do evento 40, impugnados pelo autor de forma genérica (evento 43).
A matéria voltou a ser levantada nos embargos declaratórios, ora sob a forma de omissão acerca do recolhimento de contribuições suficientes para o RGPS, entretanto, o ponto foi decidido em sentença, em sentido contrário ao requerido pelo autor.
Ou seja, não houve cerceamento de defesa, mas decisão contrária ao posicionamento considerado melhor pela autora, motivo pelo qual afasto a preliminar.
Ademais, no caso, considero que a prova do fato compraz-se com a produção da prova documental como decidido pelo Juízo ad quo.
Quanto à ausência de referência à prescrição administrativa, observa-se que a matéria foi tratada ao se apreciar a decadência do direito de revisão dos atos administrativos pela administração, tendo havido expressa referência à aplicação da Lei nº 9.784/99.
A ausência de referência ao princípio da segurança jurídica, reclamado pela autora, não se constitui em omissão, uma vez que a sentença apresentou os argumentos necessários ao tratamento da questão.
In totum, irretocável a decisão que rejeitou os embargos declaratórios (evento 74), motivo pelo qual nego provimento aos agravos retidos.
Decadência
No exercício do princípio da autotutela, o INSS pode rever os atos administrativos praticados quando constatado erro ou equívoco por parte da Administração, desde que não se tenha verificado a decadência ou que a revisão no âmbito administrativo não viole a segurança jurídica (a ser avaliada no caso concreto, já que os administrados não podem permanecer indefinidamente sujeitos a alterações originadas da autotutela).
É sabido que a Administração Pública pode declarar a nulidade dos seus próprios atos quando eivados de vícios (Súmula 473 do STF).
Segundo Odete Medauar, em virtude do princípio da autotutela administrativa, "a Administração deve zelar pela legalidade de seus atos e condutas e pela adequação dos mesmos ao interesse público. Se a Administração verificar que atos e medidas contêm ilegalidades, poderá anulá-los por si própria; se concluir no sentido da inoportunidade e inconveniência, poderá revogá-los" (Medauar, Odete. Direito Administrativo Moderno. 12ª Edição: São Paulo.2008, p. 130).
Cuida-se de verdadeira ilegalidade que impõe ao ente público o dever de zelar pela regularidade de sua atuação, mesmo que não provocada.
No caso em tela, plenamente vigente a regra da decadência que, de acordo com entendimento pacificado pelo Superior Tribunal de Justiça por ocasião do julgamento do Recurso Especial Repetitivo nº 1.114.938/AL (Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, 3ª Seção, Unânime, julgado em 14.04.2010), os benefícios previdenciários concedidos antes do advento da Lei n.º 9.784/99, têm, como termo inicial do prazo decadencial, a data de vigência da norma que o estabeleceu, ou seja, 01.02.1999. Já para os benefícios concedidos sob a égide da referida legislação, o termo inicial do prazo decadencial a ser considerado é a data do respectivo ato.
Considerando-se, ademais, que o elastecimento do prazo de cinco anos (art. 54 da Lei nº 9.784/99) para dez anos (MP nº 138, de 19 de novembro de 2003) se deu antes do decurso de cinco anos da vigência da primeira norma, em qualquer hipótese, tanto para benefícios concedidos antes quanto para os concedidos após o advento da Lei nº 9.784/99, o prazo decadencial aplicável é de dez anos.
Cabe referir, por fim, que não se vislumbra qualquer fraude ou má-fé no comportamento da parte autora, uma vez que à época do pedido administrativo o INSS entendeu que a autora possuía todos os requisitos para concessão do benefício de pensão por morte.
A considerar a data do ato concessório do benefício (14/11/1990, evento 19, PROCADM2, fl. 22) é anterior a 01/02/1999 e que a ciência da autora acerca do cancelamento do benefício se pode fixar em 16/03/2006, uma vez que nesta data requereu administrativamente o restabelecimento de seu benefício (PROCADM7, fl. 81), não incidente o prazo decadencial supra indicado.
Do restabelecimento da pensão por morte
Controvertem as partes acerca da contagem recíproca de tempo de serviço do regime geral de previdência para o regime próprio, no caso estatutário, alegando o INSS que a pensão por morte estatutária concedida à autora não pode ser cumulada com a pensão percebida pelo regime geral de previdência, uma vez que houve contagem de tempo de serviço, vedada pelo art. 96, inc. III, do RGPS.
Redarguiu a parte autora que a referida contagem não se efetivou.
No tocante à contagem recíproca do tempo de serviço, assim dispõem os artigos 94 e 96 da Lei n. 8.213/91:
Art. 94 - Para efeito dos benefícios previstos no Regime Geral de Previdência Social ou no serviço público é assegurada a contagem recíproca do tempo de contribuição na atividade privada, rural e urbana, e do tempo de contribuição ou de serviço na administração pública, hipótese em que os diferentes sistemas de previdência social se compensarão financeiramente.
§ 1º - A compensação financeira será feita ao sistema a que o interessado estiver vinculado ao requerer o benefício pelos demais sistemas, em relação aos respectivos tempos de contribuição ou de serviço, conforme dispuser o Regulamento.
(...)
Art. 96. O tempo de contribuição ou de serviço de que trata esta Seção será contado de acordo com a legislação pertinente, observadas as normas seguintes:
I - não será admitida a contagem em dobro ou em outras condições especiais;
II - é vedada a contagem de tempo de serviço público com o de atividade privada, quando concomitantes;
III - não será contado por um sistema o tempo de serviço utilizado para concessão de aposentadoria pelo outro;
Interpretando os incisos II e III acima, chego à conclusão de que não proíbem toda e qualquer contagem de tempos de serviço concomitantes, prestados um como celetista e outro como estatutário; ao contrário, vedam unicamente a utilização de um destes períodos, por meio da contagem recíproca, para acréscimo de tempo de serviço e percepção de benefício no regime do outro, ou seja, proíbem que os dois períodos laborados de forma concomitante sejam considerados em um mesmo regime de previdência com a finalidade de aumentar o tempo de serviço para uma única aposentadoria.
Observando-se a prova documental produzida, verifica-se que houve recolhimento em paralelo, no mesmo período, o que foi administrativamente reconhecido (evento 40, INFBEN2):
Na concessão do benefício de pensão, foram utilizados os períodos de 01/02/61 a 10/03/64, 01/10/72 a 25/03/75 e de 26/03/75 a 03/07/90, num total de 20 anos 10 meses e 13 dias até 03/07/90 (Data do Óbito).
5. Assim sendo, os recolhimentos na condição de contribuinte individual são paralelos ao período já utilizado para a concessão da pensão.
Já é de longa data o posicionamento desta Corte acerca da possibilidade de percepção de duas aposentadorias por regimes distintos, desde que o tempo de serviço seja contado independentemente.
Sobre a matéria já se manifestou o Superior Tribunal de Justiça, ao afirmar que "a concessão de aposentadoria pelo Regime Geral da Previdência Social a segurado aposentado em regime próprio não ofende o disposto nos arts. 96 e 98 da Lei n. 8.213/1991, se o autor permaneceu vinculado ao RGPS e cumpriu os requisitos para a cumulação dos benefícios por regimes distintos, vertendo a respectiva contribuição para cada um deles" (AgRg no REsp 1433178/RN, Segunda Turma, Relator Ministro Humberto Martins, DJe 26/05/14).
No mesmo sentido:
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. CONTAGEM RECÍPROCA. APROVEITAMENTO DE TEMPO EXCEDENTE. ART. 98 DA LEI Nº 8.213/91. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO.
1. A norma previdenciária não cria óbice a percepção de duas aposentadorias em regimes distintos, quando os tempos de serviços realizados em atividades concomitantes sejam computados em cada sistema de previdência, havendo a respectiva contribuição para cada um deles.
2. Agravo regimental a que se nega provimento.
(AgRg no REsp 1335066/RN, Segunda Turma, Relator Ministro Mauro Campbell Marques, DJe 23/10/12).
Utilizando-se do mesmo raciocínio, julgamento da 3ª Seção deste Tribunal:
ATIVIDADES CONCOMITANTES PRESTADAS SOB O RGPS. CONTAGEM PARA OBTENÇÃO DE APOSENTADORIA EM REGIMES DIVERSOS. POSSIBILIDADE.
1. Transformados os empregos públicos em cargos públicos, o tempo anterior celetista foi automaticamente incorporado ao vínculo estatutário, mediante compensação entre os sistemas. Houve modificação da natureza jurídica do vínculo, mas não ocorreu solução de continuidade, tendo inclusive o Supremo Tribunal Federal reconhecido, como sabido, o direito dos servidores federais ao aproveitamento, no regime estatutário, sem restrições, do tempo anterior celetista.
2. Com a convolação do emprego público para cargo público, e a previsão para compensação financeira, nada impede o aproveitamento das contribuições como servidor público pelo demandante para fins de obtenção de aposentadoria no regime próprio. A situação em apreço não é a de dupla consideração da mesma atividade e das mesmas contribuições, e sim, de concomitância de atividade de como autônomo e professor, com recolhimentos distintos, cabendo salientar que é inclusive permitida a acumulação de cargos públicos (art. 97, CF/67, art. 37, XVI, CF/88).
3. Hipótese em que não há se falar, pois, em rigor, de contagem de tempo de serviço em duplicidade ou sequer de contagem recíproca, mas, tão-somente, de possibilidade de aproveitamento, em Regime próprio, de tempo de serviço público celetista referente a emprego público que foi convolado em cargo público, com a previsão de compensação financeira, não se subsumindo o presente caso à hipótese prevista no art. 96, II, da Lei 8.213/91. (grifei)
(EINF 2007.70.09.001928-0, Relator p/ Acórdão Des. Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, D.E. 28/01/2013)
Do mesmo modo, e respeitando esta linha jurisprudencial, inexiste vedação à percepção de pensão em duplicidade do benefício de pensão que decorre da constatação da duplicidade de vínculos laborais em regime diverso do de cujus, vedação esta somente existente entre benefícios percebidos perante a Previdência Social, nos termos do art. 124, inc. II, da Lei nº 8.213/91, com a redação da Lei nº 9.032/95.
Nestes termos, e a considerar que a administração admite o cômputo de tempo de serviço em paralelo, com contribuições para ambos os vínculos (evento 40, INFBEN2), considero que deve ser reformada a sentença para restabelecer o benefício previdenciário cessado administrativamente, desde a data de sua cessação.
Provido, portanto, o recurso da parte autora, para julgar procedente o pedido, condenando o INSS a restabelecer o benefício de pensão por morte, desde a cessação administrativa.
Consectários
Correção Monetária e Juros de Mora
De início, esclareço que a correção monetária e os juros de mora, sendo consectários da condenação principal, possuem natureza de ordem pública e podem ser analisados até mesmo de ofício. Assim, sequer há que se falar em reformatio in pejus.
A correção monetária, segundo o entendimento consolidado na 3ª Seção deste TRF4, incidirá a contar do vencimento de cada prestação e será calculada pelos índices oficiais e aceitos na jurisprudência, quais sejam:
- ORTN (10/64 a 02/86, Lei nº 4.257/64);
- OTN (03/86 a 01/89, Decreto-Lei nº 2.284/86);
- BTN (02/89 a 02/91, Lei nº 7.777/89);
- INPC (03/91 a 12/92, Lei nº 8.213/91);
- IRSM (01/93 a 02/94, Lei nº 8.542/92);
- URV (03 a 06/94, Lei nº 8.880/94);
- IPC-r (07/94 a 06/95, Lei nº 8.880/94);
- INPC (07/95 a 04/96, MP nº 1.053/95);
- IGP-DI (05/96 a 03/2006, art. 10 da Lei n.º 9.711/98, combinado com o art. 20, §§5º e 6.º, da Lei n.º 8.880/94);
- INPC (de 04/2006 a 29/06/2009, conforme o art. 31 da Lei n.º 10.741/03, combinado com a Lei n.º 11.430/06, precedida da MP n.º 316, de 11/08/2006, que acrescentou o art. 41-A à Lei n.º 8.213/91);
- TR (a partir de 30/06/2009, conforme art. 1º-F da Lei 9.494/97, com a redação dada pelo art. 5º da Lei 11.960/2009).
O Supremo Tribunal Federal, quando do julgamento das ADIs 4.357 e 4.425, declarou a inconstitucionalidade por arrastamento do art. 1º-F da Lei 9.494/97, com a redação dada pelo art. 5º da Lei 11.960/2009, afastando a utilização da TR como fator de correção monetária dos débitos judiciais da Fazenda Pública, relativamente ao período entre a respectiva inscrição em precatório e o efetivo pagamento.
Em consequência dessa decisão, e tendo presente a sua ratio, a 3ª Seção desta Corte vinha adotando, para fins de atualização dos débitos judiciais da Fazenda Pública, a sistemática anterior à Lei nº 11.960/2009, o que significava, nos termos da legislação então vigente, apurar-se a correção monetária segundo a variação do INPC, salvo no período subsequente à inscrição em precatório, quando se determinava a utilização do IPCA-E.
Entretanto, a questão da constitucionalidade do uso da TR como índice de atualização das condenações judiciais da Fazenda Pública, no período antes da inscrição do débito em precatório, teve sua repercussão geral reconhecida no RE 870.947, e aguarda pronunciamento de mérito do STF. A relevância e a transcendência da matéria foram reconhecidas especialmente em razão das interpretações que vinham ocorrendo nas demais instâncias quanto à abrangência do julgamento nas ADIs 4.357 e 4.425.
Recentemente, em sucessivas reclamações, a Suprema Corte vem afirmando que no julgamento das ADIs em referência a questão constitucional decidida restringiu-se à inaplicabilidade da TR ao período de tramitação dos precatórios, de forma que a decisão de inconstitucionalidade por arrastamento foi limitada à pertinência lógica entre o art. 100, § 12, da CRFB e o artigo 1º-F da Lei 9.494/97, na redação dada pelo art. 5º da Lei 11.960/2009. Em consequência, as reclamações vêm sendo acolhidas, assegurando-se que, ao menos até que sobrevenha decisão específica do STF, seja aplicada a legislação em referência na atualização das condenações impostas à Fazenda Pública, salvo após inscrição em precatório. Os pronunciamentos sinalizam, inclusive, para eventual modulação de efeitos, acaso sobrevenha decisão mais ampla quanto à inconstitucionalidade do uso da TR para correção dos débitos judiciais da Fazenda Pública (Rcl 19.050, Rel. Min. Roberto Barroso; Rcl 21.147, Rel. Min. Cármen Lúcia; Rcl 19.095, Rel. Min. Gilmar Mendes).
Em tais condições, com o objetivo de guardar coerência com os mais recentes posicionamentos do STF sobre o tema, e para prevenir a necessidade de futuro sobrestamento dos feitos apenas em razão dos consectários, a melhor solução a ser adotada, por ora, é orientar para aplicação do critério de atualização estabelecido no art. 1º-F da Lei 9.494/97, na redação da lei 11.960/2009.
Este entendimento não obsta a que o juízo de execução observe, quando da liquidação e atualização das condenações impostas ao INSS, o que vier a ser decidido pelo STF em regime de repercussão geral, bem como eventual regramento de transição que sobrevenha em sede de modulação de efeitos.
Quanto aos juros de mora, até 29-06-2009, apurados a contar da data da citação, devem ser fixados à taxa de 1% ao mês, com base no art. 3º do Decreto-Lei n. 2.322/87, aplicável analogicamente aos benefícios pagos com atraso, tendo em vista o seu caráter eminentemente alimentar, consoante firme entendimento consagrado na jurisprudência do STJ e na Súmula 75 desta Corte.
A partir de então, deve haver incidência dos juros, uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo o índice oficial de remuneração básica aplicado à caderneta de poupança, nos termos estabelecidos no art. 1º-F, da lei 9.494/97, na redação da Lei 11.960/2009. Os juros devem ser calculados sem capitalização, tendo em vista que o dispositivo determina que os índices devem ser aplicados "uma única vez" e porque a capitalização, no direito brasileiro, pressupõe expressa autorização legal (STJ, 5ª Turma, AgRg no AgRg no Ag 1211604/SP, Rel. Min. Laurita Vaz).
Quanto ao ponto, esta Corte já vinha entendendo que no julgamento das ADIs 4.357 e 4.425 não houvera pronunciamento de inconstitucionalidade sobre o critério de incidência dos juros de mora previsto na legislação em referência.
Esta interpretação foi, agora, chancelada, pois no exame do recurso extraordinário 870.947, o STF reconheceu repercussão geral não apenas à questão constitucional pertinente ao regime de atualização monetária das condenações judiciais da Fazenda Pública, mas também à controvérsia pertinente aos juros de mora incidentes.
Em tendo havido a citação já sob a vigência das novas normas, inaplicáveis as disposições do Decreto-lei 2.322/87, incidindo apenas os juros da caderneta de poupança, sem capitalização.
Honorários Advocatícios
Invertida a sucumbência. Os honorários advocatícios são devidos pelo INSS no percentual de 10% sobre as parcelas vencidas até a decisão judicial concessória do benefício previdenciário pleiteado, conforme definidos nas Súmulas nº 76 do TRF4 e nº 111 do STJ.
Custas Processuais
O INSS é isento do pagamento das custas no Foro Federal (art. 4, I, da Lei nº 9.289/96) e na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul, devendo, contudo, pagar eventuais despesas processuais, como as relacionadas a correio, publicação de editais e condução de oficiais de justiça (artigo 11 da Lei Estadual nº 8.121/85, com a redação da Lei Estadual nº 13.471/2010, já considerada a inconstitucionalidade formal reconhecida na ADI nº 70038755864 julgada pelo Órgão Especial do TJ/RS), isenções estas que não se aplicam quando demandado na Justiça Estadual do Paraná (Súmula 20 do TRF4), devendo ser ressalvado, ainda, que no Estado de Santa Catarina (art. 33, p.único, da Lei Complementar Estadual nº156/97), a autarquia responde pela metade do valor.
Tutela Específica
Considerando os termos do art. 461 do CPC e o fato de que, em princípio, a presente decisão não está sujeita a recurso com efeito suspensivo (Questão de Ordem na AC nº 2002.71.00.050349-7/RS - Rel. p/ acórdão Desemb. Federal Celso Kipper, julgado em 09/08/2007 - 3ª Seção), o presente julgado deverá ser cumprido de imediato quanto à implantação do benefício postulado. Prazo: 45 dias.
Faculta-se ao beneficiário manifestar eventual desinteresse quanto ao cumprimento desta determinação.
Prequestionamento
Quanto ao prequestionamento, não há necessidade de o julgador mencionar os dispositivos legais e constitucionais em que fundamentam sua decisão, tampouco os citados pelas partes, pois o enfrentamento da matéria através do julgamento feito pelo Tribunal justifica o conhecimento de eventual recurso pelos Tribunais Superiores (STJ, EREsp nº 155.621-SP, Corte Especial, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJ de 13-09-99).
Dispositivo
Em face do exposto, voto por conhecer dos agravos retidos e no mérito, negar-lhes provimento, bem como dar provimento à apelação da parte autora para julgar procedente o pedido, condenando o INSS a restabelecer o benefício de pensão por morte, desde a cessação administrativa e, de ofício, determinar o cumprimento do acórdão no tocante à implantação do benefício.
Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
Relatora
| Documento eletrônico assinado por Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8037919v12 e, se solicitado, do código CRC 8F9A093F. | |
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 27/01/2016
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5008867-45.2010.4.04.7000/PR
ORIGEM: PR 50088674520104047000
RELATOR | : | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
PRESIDENTE | : | Desembargadora Federal Vânia Hack de Almeida |
PROCURADOR | : | Procurador Regional da República Cláudio Dutra Fontella |
APELANTE | : | MARIA DE LOURDES JAKOBOWITZ |
ADVOGADO | : | JONAS BORGES |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 27/01/2016, na seqüência 813, disponibilizada no DE de 15/01/2016, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU CONHECER DOS AGRAVOS RETIDOS E NO MÉRITO, NEGAR-LHES PROVIMENTO, BEM COMO DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA PARA JULGAR PROCEDENTE O PEDIDO, CONDENANDO O INSS A RESTABELECER O BENEFÍCIO DE PENSÃO POR MORTE, DESDE A CESSAÇÃO ADMINISTRATIVA E, DE OFÍCIO, DETERMINAR O CUMPRIMENTO DO ACÓRDÃO NO TOCANTE À IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
: | Juiz Federal OSNI CARDOSO FILHO | |
: | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
Gilberto Flores do Nascimento
Diretor de Secretaria
| Documento eletrônico assinado por Gilberto Flores do Nascimento, Diretor de Secretaria, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8099914v1 e, se solicitado, do código CRC 1368016E. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Gilberto Flores do Nascimento |
| Data e Hora: | 28/01/2016 12:27 |
