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PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. FILIAÇÃO SÓCIO-AFETIVA. COMPROVAÇÃO. FILHO MAIOR INVÁLIDO. INVALIDEZ PRÉ-EXISTENTE AO ÓBITO COMPROVADA. DIREITO AO BENEF...

Data da publicação: 14/06/2021, 11:01:07

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. FILIAÇÃO SÓCIO-AFETIVA. COMPROVAÇÃO. FILHO MAIOR INVÁLIDO. INVALIDEZ PRÉ-EXISTENTE AO ÓBITO COMPROVADA. DIREITO AO BENEFÍCIO. 1. A concessão do benefício de pensão por morte depende da ocorrência do evento morte, da demonstração da qualidade de segurado do de cujus e da condição de dependente de quem objetiva o benefício. 2. O filho maior inválido faz jus à percepção de pensão em decorrência tanto do óbito do pai, como da mãe, acaso comprovado que, na data do óbito, já era considerado inválido, no que a dependência econômica é presumida. 3. Não há qualquer exigência legal no sentido de que a invalidez do(a) requerente deva ocorrer antes de atingir a maioridade, mas somente que a invalidez deva existir na época do óbito. 4. Comprovada a filiação sócio-afetiva e a dependência anterior ao óbito, é devida a pensão pensão por morte. (TRF4, AC 5002746-39.2021.4.04.9999, SEXTA TURMA, Relatora TAÍS SCHILLING FERRAZ, juntado aos autos em 07/06/2021)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5002746-39.2021.4.04.9999/RS

RELATORA: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ

APELANTE: MARIA IRACIDINA CARDOSO

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

RELATÓRIO

Trata-se de apelação interposta contra sentença que julgou improcedente pedido de pensão por morte por não comprovada a dependência ao tempo do óbito e por não haver documento que comprove a filiação.

A parte autora apelou sustentando estar demonstrada a filiação sócio-afetiva por declaração da Sra. Aura de 1981 e por testemunhos colhidos em justificação administrativa. Alegou que a incapacidade anterior ao óbito também restou comprovada por laudo em interdição judicial e pelo próprio INSS ao deferir-lhe Renda Mensal Vitalícia por Incapacidade desde 24/04/85.

Com contrarrazões, subiram os autos ao Tribunal para julgamento.

O MPF opinou pelo provimento da apelação.

É o relatório.

VOTO

Juízo de admissibilidade

O apelo preenche os requisitos de admissibilidade

DA PENSÃO POR MORTE

A concessão do benefício de pensão por morte depende do preenchimento dos seguintes requisitos: (1) ocorrência do evento morte, (2) condição de dependente de quem objetiva a pensão e (3) demonstração da qualidade de segurado do de cujus por ocasião do óbito.

Conforme o disposto no art. 26, I, da Lei nº 8.213/1991, referido benefício independe de carência.

Além disso, não será concedida a pensão aos dependentes daquele que falecer após a perda da qualidade de segurado, salvo se preenchidos os requisitos para obtenção da aposentadoria segundo as normas em vigor à época do falecimento.

Do caso concreto

No caso em apreço, a parte autora, nascida em 17/01/36, representada por sua curadora, ajuizou ação em 22/06/15, postulando a concessão do benefício previdenciário de pensão por morte na qualidade de dependente (filha de criação) de Aura Narciso, falecida em 21/12/88, desde o óbito (p.19, inic1, ev. 11).

O evento morte está comprovado pela certidão de óbito anexada ao feito. A falecida era aposentada por velhice - trab. rural, benefício 091684214-2. O pedido administrativo de 28/10/13 (NB 1611593490) foi indeferido por não comprovadas invalidez e filiação (p. 13, inic2, ev. 11).

Assim, a controvérsia diz respeito à qualidade de dependente da autora.

Inicialmente, consigno que a presunção da dependência econômica do filho(a) maior inválido(a) quanto aos pais é matéria que encontra abrigo no meio jurídico.

Inclusive, a 3ª Seção deste Tribunal Regional assim decidiu quando do julgamento dos Embargos Infringentes nº 5006733-65.2012.404.71100, julgado em 30/10/2015, de relatoria do Desembargador Federal João Batista Pinto Silveira, cujo acórdão restou assim ementado:

PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS INFRINGENTES. PENSÃO POR MORTE. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA. FILHO INVÁLIDO. BENEFICIÁRIO DE APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. CUMULAÇÃO DE BENEFÍCIOS. 1. A concessão do benefício de pensão por morte depende da ocorrência do evento morte, da demonstração da qualidade de segurado do de cujus e da condição de dependente de quem objetiva a pensão. 2. Ainda que o filho inválido tenha rendimentos, como no caso dos autos, em que o autor é beneficiário de aposentadoria por invalidez, esta circunstância não exclui automaticamente o direito à pensão, uma vez que o art. 124 da Lei nº 8213-91 não veda a percepção simultânea de pensão e aposentadoria por invalidez. 3. Além disso, a dependência comporta conceito amplo, muito além daquele vinculado ao critério meramente econômico. 4. Embargos infringentes aos quais se nega provimento.

A dependência comporta conceito amplo, muito além daquele vinculado ao critério meramente econômico. Nesse sentido, ainda que o filho(a) inválido(a) aufira rendimentos, tal circunstância não exclui o direito ao benefício de pensão, especialmente considerando-se que não existe vedação à percepção simultância de pensão e aposentadoria por invalidez (art. 124 da Lei 8.213/91).

Destaque-se, ainda, que não há qualquer exigência legal no sentido de que a invalidez do(a) requerente deva ocorrer antes de atingir a maioridade, mas somente que a invalidez deva existir na época do óbito.

A filiação sócio-afetiva da autora restou comprovada nos autos. Conforme declaração emitida pela falecida em 11/12/81 (p. 7, inic2, ev. 11), "MARIA IRACIDINA CARDOSO é minha dependente desde fevereiro de 1939 até apresente data". Da ficha do Sindicato Rural da falecida constou como dependentes a filha Maria Leoni e a autora "criada" (p. 18, réplica5, ev. 11).

Em 1989, o Ministério Público Estadual ajuizou ação de interdição acostado em Laudo Médico lavrado em 14 de março de 1989 que diagnosticou a recorrente como “surda muda, com deficiência mental acentuada, não conseguindo subsistir sem auxílio de terceiro” e que, em 1990, foi proferida sentença que decretou a incapacidade civil da recorrente (p.28, réplica4, ev. 8).

Evidente que tal incapacidade total e absoluta não surgiu em 1990, sendo bem anterior ao óbito em 1988, tanto que o próprio INSS deferiu-lhe em renda mensal vitalícia por incapacidade desde 23/01/85 - NB 0781267714 (p. 14, réplica5, ev. 11).

Ademais, em justificação administrativa realizada em 29/10/19 (p.15, replica6) foram ouvidas três testemunhas que deram conta de ter a autora chegado na família de Maria Leoni quando criança, que são irmãs de criação e que a mesma tem problemas desde que nasceu, nunca tendo trabalhado e sendo cuidada pela irmã.

Registre-se que a filiação sócio-afetiva deve receber a mesma proteção legal dispensada aos filhos biológicos, sob pena de criar-se distinção que afronta os direitos fundamentais da pessoa humana.

Nesse sentido:

PREVIDENCIÁRIO. ADMINISTRATIVO. INTERPRETAÇÃO COMPATIBILIZADA COM OS MACROPROPÓSITOS PROTECIONISTAS JUSPREVIDENCIARISTAS. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. MILITAR ESTADUAL. PENSÃO POR MORTE DO INSTITUIDOR. FILHA AFETIVA OU DE CRIAÇÃO. RESP. 1.274.240/SC, REL. MIN. NANCY ANDRIGHI, DJE 15.10.2013 E RESP. 1.328.380/MS, REL. MIN. MARCO AURÉLIO BELLIZZE, DJE 3.11.2014. COMPREENSÃO DO ART. 7o. DA LEI 3.765/60. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA QUE SE TEM POR PRESUMIDA. DESNECESSIDADE DE SUA COMPROVAÇÃO. AGRG NO RESP 1.190.384/RJ, REL. MIN. HAMILTON CARVALHIDO, DJE 2.9.2010; AGRG NO RESP 1.154.667/RS, REL. MIN. LAURITA VAZ, DJE 27.4.2012; RESP 370.067/RS, REL. MIN. LAURITA VAZ, DJE 5.9.2005; AGRG NO RESP 601.721/PE, REL. MIN. CELSO LIMONGI DJE 1O.2.2010. AGRAVO REGIMENTAL DA UNIÃO DESPROVIDO. 1. A interpretação jurídica e judicial das normas de Direito Previdenciário deve assegurar a máxima efetividade de seus institutos garantísticos, por isso não pode ficar restrita aos vocábulos que os expressam, sob pena de comprometer os seus objetivos e transformar o jusprevidenciarismo em mera técnica positivista, estranha ou refratária aos valores do humanismo e da fundamentalidade contemporânea dos direitos das pessoas. 2. O art. 7º., II da Lei 3.765/60 garante aos filhos de qualquer condição, excluindo os maiores do sexo masculino que não sejam interditos ou inválidos, o recebimento da pensão militar, independentemente da relação de dependência com o seu instituidor. 3. A filha afetiva ou de criação posiciona-se na mesma situação da enteada ou da filha adotiva; é entendimento antigo, mas atualizado do STJ, que equipara-se à condição de filha a enteada criada e mantida pelo Militar, instituidor da pensão, o qual, a despeito da ausência de laços sanguíneos, dispensou-lhe o mesmo tratamento que se dá a filho biológico (artigo 7º., inciso II, da Lei n. 3.765/60 combinado com o artigo 50, § 2º., Lei n. 6.880/80) (AgRg no REsp. 1.190.384/RJ, Rel. Min. HAMILTON CARVALHIDO, DJe 2.9.2010); a postura que tende a criar distinções ou classes de filiação, além de avessa aos postulados humanísticos e às premissas dos direitos fundamentais da pessoa humana, afronta também a realidade dos sentimentos dos pais e a larguesa de sua afeição pelos filhos. 4. No caso em comento, comprovado que o Militar dispensava à ora Agravada tratamento idêntico ao que as famílias devotam à filha biológica, deve serlhe assegurado o direito pensional decorrente do óbito do seu pai afetivo ou por adoção, sendo desimportante, nesta hipótese para a sua definição, a ausência de previsão legal expressa; em situação assim, a jurisprudência elaborou o entendimento de que, do mesmo modo que se reconhece à filha consanguínea a presunção de dependência econômica, também se deve reconhecer em favor da filha afetiva ou de criação a mesma condição pressuposta. 5. A 2ª. Seção do STJ tem orientação firme e construtiva no sentido de reconhecer em casos como este, segundo afirmado pela douta Ministra FÁTIMA NANCY, a maternidade/paternidade socioafetiva tem seu reconhecimento jurídico decorrente da relação jurídica de afeto, marcadamente nos casos em que, sem nenhum vínculo biológico, os pais criam uma criança por escolha própria, destinando-lhe todo o amor, ternura e cuidados inerentes à relação pai-filho (REsp. 1.274.240/SC, DJe 15.10.2013). 6. Também o eminente Ministro MARCO AURÉLIO BELIZZE, em atenção às novas estruturas familiares, baseadas no princípio da afetividade jurídica (a permitir, em última análise, a realização do indivíduo como consectário da dignidade da pessoa humana), a coexistência de relações filiais ou a denominada multiplicidade parental, compreendida como expressão da realidade social, não pode passar despercebida pelo direito (REsp. 1.328.380/MS, DJe 3.11.2014). 7. Agravo Regimental da UNIÃO desprovido. (STJ - AgRg no AREsp: 71290 MG 2011/0246081-8, Relator: Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, Data de Julgamento: 02/08/2016, T1 - PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 23/08/2016)

PENSÃO POR MORTE. FILIAÇÃO SÓCIO-AFETIVA. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA COMPROVADA. CONCESSÃO. 1. A concessão do benefício de pensão por morte depende da ocorrência do evento morte, da demonstração da qualidade de segurado do de cujus e da condição de dependente de quem objetiva a pensão. 2. É devida a pensão por morte a filho sócio-afetivo ou de criação, assim considerado aquele que foi criado desde tenra idade pelo segurado como se fora seu filho. 3. Presentes todos os requisitos, é de ser deferida a pensão desde a data do falecimento da mãe dos autores, a qual recebia cota integral de pensão instituída pelo padrasto dos autores. (TRF4, AC 0015564-55.2014.4.04.9999, QUINTA TURMA, Relator RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA, D.E. 12/12/2014)

Portanto, comprovadas tanto a filiação sócio-afetiva quanto a dependência da autora da falecida desde antes do óbito, impõe-se o reconhecimento do direito à pensão, o qual não se desnatura pelo fato de perceber benefício previdenciário, tendo em vista que sua condição pressupõe gastos e despesas que não são supridos pela renda mensal mínima.

Entretanto, a parte autora recebe renda mensal vitalícia desde 23/01/85 (p. 8, out3, ev. 11), benefício instituído pela Lei 6.179, de 11/12/74 e que foi substituído pelo benefício assistencial de que trata o art. 203, V, da CF/88. Tal benefício é inacumulável com qualquer outro no âmbito da seguridade social, nos termos do §4º do art. 139 da Lei 8.213/91.

Nesse sentido:

PREVIDENCIÁRIO. concessão de PENSÃO POR MORTE DE GENITOR a FILHO INVÁLIDO, titular de renda mensal vitalícia. impossibilidade de acumulação. direito de opção ao benefício mais vantajoso. 1. Em virtude de expressa disposição de lei, a renda mensal vitalícia não podia ser acumulada com qualquer tipo de benefício concedido pela Previdência Social, ressalvada a opção pelo benefício mais vantajoso, o que igualmente se aplica ao atual benefício assistencial, regrado pela Lei 8.742/93. 2. In casu, ao dispor acerca do direito de opção do autor ao benefício mais vantajoso diante da impossibilidade de acumulação da renda mensal vitalícia com qualquer outro benefício previdenciário e, ainda, ao autorizar o desconto dos valores recebidos a título de RMV no período em que o demandante faria jus à pensão por morte, o julgador a quo nada mais fez do que reproduzir as disposições legais, não havendo que se cogitar de sentença ultra ou extra petita. (TRF4 5053906-45.2017.4.04.9999, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SC, Relator PAULO AFONSO BRUM VAZ, juntado aos autos em 07/05/2018)

PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE DOS PAIS. FILHO MAIOR INVÁLIDO. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA PRESUMIDA. CUMULAÇÃO COM RENDA MENSAL VITALÍCIA. IMPOSSIBILIDADE. PRESCRIÇÃO. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS.TEMA 810/STF. 1. Para a obtenção do benefício de pensão por morte deve a parte interessada preencher os requisitos estabelecidos na legislação previdenciária vigente à data do óbito, consoante iterativa jurisprudência dos Tribunais Superiores e desta Corte. 2. A concessão de pensão por morte a filho inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental ou deficiência grave encontra suporte no art. 16, inciso I, da Lei 8.213/91, que o elenca como dependente previdenciário. Aplica-se ao filho inválido, por conseguinte, o disposto no § 4º daquele artigo, considerando-se presumida a dependência econômica em relação aos genitores. 3. No caso concreto, a incapacidade da parte autora foi comprovada por meio das conclusões da perícia judicial, razão pela qual são devidos os benfícios de pensão por morte postulados na inicial. 4. O benefício de renda mensal vitalícia não pode ser acumulado com qualquer espécie de benefício do Regime Geral de Previdência Social, ou da antiga Previdência Social Urbana ou Rural, ou de outro regime, razão pela qual seu pagamento deve ser cancelado, a partir da DIB da pensão mais antiga, descontando-se os valores já recebidos do montante total dos atrasados a serem pagos nos autos. 5. Sendo o autor pessoal absolutamente incapaz para os atos da vida civil, desde a data do óbito de seus genitores, estando, inclusive, interditado atualmente, o prazo prescricional não transcorreu em seu desfavor. 6. No tocante aos consectários legais, deve esta Corte adequar seus julgados ao que foi decidido pelo STF no RE n. 870.947, em face dos princípios da economia processual, da duração razoável do processo e da eficiência. Desse modo, a atualização monetária, a contar do vencimento de cada prestação, deve-se dar pelos índices oficiais e jurisprudencialmente aceitos, quais sejam, IGP-DI (05/96 a 03/2006), INPC(04/2006 a 06/2009) e IPCA-E (a partir de 30-06-2009). Quanto aos juros de mora, até 29-06-2009, devem ser fixados à taxa de 1% ao mês, a contar da citação. A partir de 30-06-2009, por força da Lei n. 11.960, de 29-06-2009, que alterou o art. 1.º-F da Lei n. 9.494/97, haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice oficial aplicado à caderneta de poupança. (TRF4 5044604-89.2017.4.04.9999, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SC, Relatora para Acórdão GABRIELA PIETSCH SERAFIN, juntado aos autos em 27/04/2018)

Dessa forma, a parte autora tem direito de optar pelo benefício mais vantajoso e, caso opte pela pensão por morte, deverão ser descontados, do montante devido, todos os valores recebidos a título de RMV no período concomitante.

Termo inicial

A Lei de Benefícios remete ao Código Civil o critério de fluência da prescrição, no caso de direito de menores, incapazes e ausentes.

Por sua vez, o Código Civil de 2002, em seus artigos 3º, II, e 198, I, impedia a fruição do prazo prescricional contra os absolutamente incapazes, reconhecendo como tais aqueles que, por enfermidade ou deficiência mental, não tivessem o necessário discernimento para a prática dos atos da vida civil.

Esta norma resultou alterada com a superveniência da Lei 13.146/2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência), que revogou o inciso II do art. 3º do Código Civil, mantendo como absolutamente incapazes apenas os menores de 16 anos.

No entanto, a vulnerabilidade do indivíduo - inquestionável no caso, pois restou devidamente comprovado nos autos que a autora não possui discernimento para os atos da vida civil - não pode jamais ser desconsiderada pelo ordenamento jurídico, ou seja, o Direito não pode fechar os olhos à falta de determinação de alguns indivíduos e tratá-los como se tivessem plena capacidade de interagir em sociedade em condições de igualdade.

Veja-se que, no próprio parecer do projeto de lei que deu origem ao Estatuto da Pessoa com Deficiência apresentado no Senado Federal, foi referido que:

"Para facilitar a compreensão, optamos por fazer uma análise conjunta dos dispositivos constantes dos arts. 6º e 84, além de algumas das alterações contidas no art. 114, uma vez que dispõem sobre a capacidade civil das pessoas com deficiência. Seu cerne é o reconhecimento de que condição de pessoa com deficiência, isoladamente, não é elemento relevante para limitar a capacidade civil. Assim, a deficiência não é, a priori, causadora de limitações à capacidade civil. Os elementos que importam, realmente, para eventual limitação dessa capacidade, são o discernimento para tomar decisões e a aptidão para manifestar vontade. Uma pessoa pode ter deficiência e pleno discernimento, ou pode não ter deficiência alguma e não conseguir manifestar sua vontade." (grifei)

A Lei 13.146/2015, embora editada com o propósito de promover uma ampla inclusão das pessoas portadoras de deficiência, no caso da prescrição, acabou por prejudicar aqueles que busca proteger, rompendo com a própria lógica.

Ao deixar de reconhecer como absolutamente incapazes as pessoas portadoras de deficiência psíquica ou intelectual, o Estatuto pretendeu incluí-las na sociedade e não lhes restringir direitos.

A possibilidade de fluência da prescrição pressupõe discernimento para a tomada de iniciativa para exercer os próprios direitos, de forma que a melhor alternativa para solucionar a antinomia criada pela alteração legislativa é assegurar-se, por analogia, em situações como a presente, a regra reservada aos absolutamente incapazes, pelo art. 198, I, do Código Civil, ou seja: contra eles não corre a prescrição.

Contra o absolutamente incapaz também não correm os prazos decadenciais, bem como não se lhe aplica o disposto nos artigos 74 e 103 da Lei 8.213/91, conforme preceitua o art. 79 da mesma Lei "Não se aplica o disposto no art. 103 desta Lei ao pensionista menor, incapaz ou ausente, na forma da lei".

Portanto, no caso, comprovada incapacidade total desde a infância, é devido benefício de pensão desde o óbito em 21/12/88.

Consectários e provimento finais

- Correção monetária

A correção monetária das parcelas vencidas dos benefícios previdenciários será calculada conforme a variação dos seguintes índices:

- IGP-DI de 05/96 a 03/2006 (art. 10 da Lei n.º 9.711/98, combinado com o art. 20, §§5º e 6º, da Lei n.º 8.880/94);

- INPC a partir de 04/2006 (art. 41-A da lei 8.213/91, na redação da Lei n.º 11.430/06, precedida da MP n.º 316, de 11/08/2006, e art. 31 da Lei n.º 10.741/03, que determina a aplicação do índice de reajustamento dos benefícios do RGPS às parcelas pagas em atraso).

A utilização da TR como índice de correção monetária dos débitos judiciais da Fazenda Pública, que fora prevista na Lei 11.960/2009, que introduziu o art. 1º-F na Lei 9.494/97, foi afastada pelo STF no julgamento do tema 810, através do RE 870947, com repercussão geral, com trânsito em julgado em 03/03/2020.

No julgamento do tema 905, através do REsp 1.495146, e interpretando o julgamento do STF, transitado em julgado em 11/02/2020, o STJ definiu quais os índices que se aplicariam em substituição à TR, concluindo que aos benefícios assistenciais deveria ser utilizado IPCA-E, conforme decidiu a Suprema Corte, no recurso representativo da controvérsia e que, aos previdenciários, voltaria a ser aplicável o INPC, uma vez que a inconstitucionalidade reconhecida restabeleceu a validade e os efeitos da legislação anterior, que determinava a adoção deste último índice, nos termos acima indicados.

A conjugação dos precedentes dos tribunais superiores resulta, assim, na aplicação do INPC aos benefícios previdenciários, a partir de abril 2006, reservando-se a aplicação do IPCA-E aos benefícios de natureza assistencial.

Juros de mora

Os juros de mora devem incidir a partir da citação.

Até 29-06-2009, já tendo havido citação, deve-se adotar a taxa de 1% ao mês a título de juros de mora, conforme o art. 3º do Decreto-Lei n. 2.322/87, aplicável analogicamente aos benefícios pagos com atraso, tendo em vista o seu caráter eminentemente alimentar, consoante firme entendimento consagrado na jurisprudência do STJ e na Súmula 75 desta Corte.

A partir de então, deve haver incidência dos juros, uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo percentual aplicado à caderneta de poupança, nos termos estabelecidos no art. 1º-F, da Lei 9.494/97, na redação da Lei 11.960/2009, considerado, no ponto, constitucional pelo STF no RE 870947, decisão com repercussão geral.

Os juros de mora devem ser calculados sem capitalização, tendo em vista que o dispositivo legal em referência determina que os índices devem ser aplicados "uma única vez" e porque a capitalização, no direito brasileiro, pressupõe expressa autorização legal (STJ, AgRgno AgRg no Ag 1211604/SP).

Honorários Advocatícios

Tendo em vista que a sentença foi publicada sob a égide do novo CPC, é aplicável quanto à sucumbência aquele regramento.

Considerando a natureza previdenciária da causa, bem como a existência de parcelas vencidas, e tendo presente que o valor da condenação não excederá de 200 salários mínimos, os honorários de sucumbência devem ser fixados originariamente em 10% sobre as parcelas vencidas, nos termos do artigo 85, §3º, inciso I, do CPC. Conforme a Súmula n.º 111 do Superior Tribunal de Justiça, a verba honorária deve incidir sobre as prestações vencidas até a data da decisão de procedência (acórdão).

Custas processuais

O INSS é isento do pagamento das custas na Justiça do Estado do Rio Grande do Sul (art. 5º, inciso I, da Lei Estadual/RS nº 14.634/2014, que instituiu a Taxa Única de Serviços Judiciais).

Tutela específica - implantação do benefício

Considerando a eficácia mandamental dos provimentos fundados nos artigos 497 e 536 do NCPC, quando dirigidos à Administração Pública, e tendo em vista que a presente decisão não está sujeita, em princípio, a recurso com efeito suspensivo, determino o cumprimento do acórdão no tocante à implantação do benefício da parte autora, especialmente diante do seu caráter alimentar e da necessidade de efetivação imediata dos direitos sociais fundamentais.

Dados para cumprimento: (X) Concessão ( ) Restabelecimento ( ) Revisão

NB

1611593490

Espécie

pensão por morte previdenciária

DIB

desde o óbito em 21/12/88 por se tratar de absolutamente incapaz

DIP

No primeiro dia do mês da implantação do benefício

DCB

RMI

a apurar

Observações

Em face da inacumulabilidade, devem ser descontados, em caso de opção pela pensão por morte, do montante devido, aqueles recebidos a título de RMV em período concomitante

Requisite a Secretaria da 6ª Turma, à CEAB-DJ-INSS-SR3, o cumprimento da decisão e a comprovação nos presentes autos, no prazo de 20 (vinte) dias.

DISPOSITIVO

Ante o exposto, voto por dar provimento à apelação e determinar a implantação do benefício, via CEAB.



Documento eletrônico assinado por TAIS SCHILLING FERRAZ, Desembargadora Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002557956v21 e do código CRC 5eca2ff6.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): TAIS SCHILLING FERRAZ
Data e Hora: 7/6/2021, às 19:38:19


5002746-39.2021.4.04.9999
40002557956.V21


Conferência de autenticidade emitida em 14/06/2021 08:01:07.

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5002746-39.2021.4.04.9999/RS

RELATORA: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ

APELANTE: MARIA IRACIDINA CARDOSO

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. FILIAÇÃO SÓCIO-AFETIVA. COMPROVAÇÃO. FILHO MAIOR INVÁLIDO. INVALIDEZ PRÉ-EXISTENTE AO ÓBITO COMPROVADA. DIREITO AO BENEFÍCIO.

1. A concessão do benefício de pensão por morte depende da ocorrência do evento morte, da demonstração da qualidade de segurado do de cujus e da condição de dependente de quem objetiva o benefício.

2. O filho maior inválido faz jus à percepção de pensão em decorrência tanto do óbito do pai, como da mãe, acaso comprovado que, na data do óbito, já era considerado inválido, no que a dependência econômica é presumida.

3. Não há qualquer exigência legal no sentido de que a invalidez do(a) requerente deva ocorrer antes de atingir a maioridade, mas somente que a invalidez deva existir na época do óbito.

4. Comprovada a filiação sócio-afetiva e a dependência anterior ao óbito, é devida a pensão pensão por morte.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar provimento à apelação e determinar a implantação do benefício, via CEAB, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 02 de junho de 2021.



Documento eletrônico assinado por TAIS SCHILLING FERRAZ, Desembargadora Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002557957v3 e do código CRC f8e95594.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): TAIS SCHILLING FERRAZ
Data e Hora: 7/6/2021, às 19:38:19


5002746-39.2021.4.04.9999
40002557957 .V3


Conferência de autenticidade emitida em 14/06/2021 08:01:07.

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Telepresencial DE 02/06/2021

Apelação Cível Nº 5002746-39.2021.4.04.9999/RS

RELATORA: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ

PRESIDENTE: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ

PROCURADOR(A): CAROLINA DA SILVEIRA MEDEIROS

APELANTE: MARIA IRACIDINA CARDOSO

ADVOGADO: CAMILA MORAES DAL MOLIN (OAB RS116035)

ADVOGADO: FELIPE HENRIQUE GIARETTA (OAB RS084897)

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Telepresencial do dia 02/06/2021, na sequência 730, disponibilizada no DE de 24/05/2021.

Certifico que a 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 6ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO E DETERMINAR A IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO, VIA CEAB.

RELATORA DO ACÓRDÃO: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ

Votante: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ

Votante: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER

Votante: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA

PAULO ROBERTO DO AMARAL NUNES

Secretário



Conferência de autenticidade emitida em 14/06/2021 08:01:07.

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