Apelação Cível Nº 5000776-33.2023.4.04.9999/PR
RELATOR: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
APELANTE: VERONICE RAMOS DIAS
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATÓRIO
A parte autora ajuizou ação contra o INSS, pleiteando a concessão de pensão por morte em razão do óbito de Valdir Delgado de Souza, desde a data do óbito em 01.08.2019.
Processado o feito, sobreveio sentença, publicada em 25.10.2022, por meio da qual o Juízo a quo julgou o pedido nos seguintes termos (ev. 56):
3.Ante o exposto, julgo procedente o pedido inicial, resolvendo o mérito (artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil), para o fim de condenar o INSS à concessão do benefício de pensão por morte às autoras Andreia Delgado de Souza e Veronice Ramos Dias da data do requerimento administrativo – 02/12/2019 (seq. 1.11, pág. 38) e aos autores Gabriel Delgado de Souza, Daniel Delgado de Souza, Eduarda Delgado de Souzadesde a data do óbito em 01/08/2019 (seq. 1.11, pág. 46).
3.1. Não há verbas prescritas no presente caso.
3.2. Os critérios de correção monetária e de juros moratórios encontram-se estabelecidos na fundamentação.
3.3. Ante a sucumbência mínima da parte autora (art. 86, parágrafo único, do CPC), condeno a parte ré, ainda, ao pagamento das custas judiciais e de honorários advocatícios, estes arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o valor das parcelas vencidas (Súmula n. 111 do Superior Tribunal de Justiça e Súmula n. 76 do Tribunal Regional Federal da 4ª Região), na forma do art. 85 e ss do Código de Processo Civil.
3.4. Por vislumbrar que a autarquia ré não goza da isenção legal sobre as custas processuais quando demandada perante a Justiça Estadual (Súmulas 178 do STJ e 20 do TRF4), condeno-a em custas integrais.
3.5. Sentença não sujeita à remessa necessária (art. 496, §3º, inciso I, do Código de Processo Civil), tendo em vista que, embora ilíquida, o valor da condenação não atinge o equivalente a 1.000 salários mínimos.
Em suas razões recursais (ev. 59), o INSS requer a reforma da sentença, sustentando que o termo inicial do benefício para todos os autores deve ser a contar da DER, porquanto todos eles requereram o benefício 90 dias após o óbito do segurado. Ainda defende a necessidade de se consignar que a pensão em relação à viúva é devida por 15 anos.
Com contrarrazões (ev. 63), vieram os autos a esta Corte.
O Ministério Público Federal apresentou parecer, opinando pelo desprovimento do recurso (ev. 70).
É o relatório.
Peço dia para julgamento.
VOTO
Pensão por Morte
A Lei 8.213/1991, que dispõe sobre os benefícios da Previdência Social, preceitua em seu art. 74 ser devida pensão por morte aos dependentes do segurado falecido, não sendo exigido o cumprimento de carência (art. 26, I).
Assim, a concessão do benefício de pensão por morte depende do preenchimento dos seguintes requisitos: a) a ocorrência do evento morte; b) a condição de dependente de quem objetiva a pensão; c) a demonstração da qualidade de segurado do de cujus por ocasião do óbito.
Além disso, rege-se o benefício pela legislação vigente à época do falecimento.
Sobre a condição de dependência para fins previdenciários, dispõe o artigo 16 da Lei 8.213/91:
Art. 16. São beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condição de dependentes do segurado:
I - o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido; [redação alterada pela Lei nº 9.032/95]
II - os pais;
III - o irmão não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido; [redação alterada pela Lei nº 9.032/95]
IV - REVOGADO pela Lei nº 9.032/95.
§ 1º A existência de dependente de qualquer das classes deste artigo exclui do direito às prestações os das classes seguintes.
§ 2º O enteado e o menor tutelado equiparam-se a filho mediante declaração do segurado e desde que comprovada a dependência econômica na forma estabelecida no Regulamento. [redação alterada pela MP nº 1.523/96, reeditada até a conversão na Lei nº 9.528/97]
§ 3º Considera-se companheira ou companheiro a pessoa que, sem ser casada, mantém união estável com o segurado ou com a segurada, de acordo com o § 3º do art. 226 da Constituição Federal.
§ 4º A dependência econômica das pessoas indicadas no inciso I é presumida e a das demais deve ser comprovada.
O dependente, assim considerado na legislação previdenciária, pode valer-se de amplo espectro probatório de sua condição, seja para comprovar a relação de parentesco, seja para comprovar a dependência econômica. Esta pode ser parcial, devendo, contudo, representar um auxílio substancial, permanente e necessário, cuja falta acarretaria desequilíbrio dos meios de subsistência do dependente (Enunciado. 13 do Conselho de Recursos da Previdência Social - CRPS).
Caso Concreto
O óbito de Valdir Delgado de Souza, alegado companheiro de Veronice Ramos Dias e pai de Andreia Delgado de Souza, Gabriel Delgado de Souza, Daniel Delgado de Souza, Eduarda Delgado de Souza, ocorreu em 01.08.2019 (ev. 1 - OUT7).
A sentença, da lavra do MM. Juiz de Direito, Dr. Paulo Henrique Dias Drummond, examinou e decidiu com precisão todos os pontos relevantes da lide, devolvidos à apreciação do Tribunal, assim como o respectivo conjunto probatório produzido nos autos. As questões suscitadas no recurso não têm o condão de ilidir os fundamentos da decisão recorrida. Evidenciando-se a desnecessidade da construção de nova fundamentação jurídica, destinada à confirmação da bem lançada sentença, transcrevo e adoto como razões de decidir os seus fundamentos, in verbis:
(...)
2. O pedido formulado pela parte autora há de ser julgado procedente. O benefício de pensão por morte está disciplinado no art. 74 e seguintes da Lei nº 8.213/1991, in verbis:
Art. 74. A pensão por morte será devida ao conjunto dos dependentes do segurado que falecer, aposentado ou não, a contar da data: (Redação dada pela Lei nº 9.528, de 1997) (Vide Medida Provisória nº 871, de 2019)
I - do óbito, quando requerida em até 180 (cento e oitenta) dias após o óbito, para os filhos menores de 16 (dezesseis) anos, ou em até 90 (noventa) dias após o óbito, para os demais dependentes; (Redação dada pela Lei nº 13.846, de 2019)
II - do requerimento, quando requerida após o prazo previsto no inciso anterior; (Incluído pela Lei nº 9.528, de 1997)
III - da decisão judicial, no caso de morte presumida. (Incluído pela Lei nº 9.528, de 1997)
Da análise do artigo 74 da Lei n.º 8.213/91 conclui-se que são requisitos para a concessão de pensão por morte: a) a ocorrência do óbito; b) a qualidade de segurado do falecido e c) a condição de dependente do de cujus da parte autora da demanda.
Passo à análise dos requisitos supramencionados.
a) Da ocorrência do óbito
A comprovação do falecimento do(a) instituidor(a) do benefício se deu com a juntada aos autos da certidão de óbito, a qual atesta que a morte ocorreu em 01/08/2018 (seq. 1.11, página 46).
Ainda, em sede de contestação, não houve impugnação específica quanto a este requisito por parte do INSS, razão pela qual o reputo incontroverso, conquanto comprovado.
Resta preenchido, portanto, o requisito relacionado ao óbito do(a) instituidor(a) para a obtenção do benefício previdenciário.
b) Da condição de dependente do de cujus da parte autora da demanda
A parte autora Veronice Ramos Dias é convivente do(a) instituidor(a) do benefício, conforme se verifica da certidão de nascimento e batizado dos filhos e das notas fiscais que acompanham a inicial. Da mesma forma resta comprovada a filiação de Eduarda Delgado de Souza (seq. 1.11, pág. 49), Daniel Delgado de Souza (seq. 1.11, pág. 50), Gabriel Delgado de Souza (seq. 1.11, pág. 51), Andreia Delgado de Souza (seq. 1.11, pág. 52), Adrieli Delgado de Souza (seq. 1.11, pág. 53), Adriano Delgado de Souza (seq. 1.11, pág. 54). Destarte, se enquadram na condição de dependente nos termos do inciso I do art. 16 da Lei n° 8213/91.
Este requisito não foi impugnado especificamente pelo INSS em sede de contestação, que sustentou que não houve a juntada do documento, mas, conforme acima, a certidão de casamento está juntada aos autos.
Desse modo, encontra-se igualmente preenchido o requisito afeto à condição de dependente do de cujus da parte autora da demanda.
c) Da qualidade de segurado do(a) falecido(a)
Cinge-se a controvérsia do presente caso em saber se o instituidor do benefício, Valdir Delgado de Souza, era segurado da Previdência Social. Alegam os autores que o instituidor do benefício era trabalhadora rural, e, portanto, segurada especial. O INSS, por outro lado, aduz que não restou comprovada tal condição, pois ausente início de prova material.
Sabe-se que a lei não exige período de carência para a concessão da pensão por morte. O que se precisa é a comprovação da qualidade de segurado do instituidor da pensão na data do óbito. Assim, não há que se analisar com igual exigência as provas para a concessão de uma pensão, como se faz para a concessão da aposentadoria rural por idade; não há necessidade de que a prova tenha abrangência sobre todo o período, ano a ano, a fim de comprovar o exercício do trabalho rural, bastando um início de prova material, podendo ser complementada por prova testemunhal, conforme reiterados precedentes de todos os Tribunais Federais e do Superior Tribunal de Justiça.
A comprovação documental da qualidade de segurado especial da Previdência Social do(a) instituidor(a) se deu com a juntada do seguinte documento:
1. Nota de compra de material de construção, em nome de Veronice Ramos Dias, qualificada como agricultora (seq. 1.7, pág. 24);
2. Ficha de cadastro do material de construção Rio Iguaçu de Veronice Ramos Dias, em 06/05/2013, com endereço no assentamento Ireno Alves (seq. 1.7, pág. 25 /26);
3. Nota fiscal de compra na Gilmar Kruger e Cia Ltda, em nome de Valdir Delgado de Souza, com endereço no Assentamento Ireno, emitida em 20/03/2015 (seq. 1.7, pág. 27);
4. Nota fiscal de compra na Stillo Móveis, em nome de Valdir Delgado de Souza, emitida em 04/12/2014, 04/04/2014 (seq. 1.7, pág. 28/29);
5. Fatura da copel em nome de Valdir Delgado de Souza, com endereço no Assentamento Ireno Alves, de agosto/2019 (seq. 1.11, pág. 45);
6. Certidão de óbito de Valdir Delgado de Souza, qualificado com a profissão “diarista”, em 01/08/2019 (seq. 1.11, pág. 46);
7. Certidão de nascimento de Eduarda Delgado de Souza, em 15/04 /2019, em que os genitores Valdir Delgado de Souza e Veronice Ramos Dias são qualificados como agricultores (seq. 1.11, pág. 49);
8. Certidão de nascimento de Daniel Delgado de Souza, em 10/12/2010, em que os genitores Valdir Delgado de Souza e Veronice Ramos Dias, em que o genitor é qualificado como agricultor (seq. 1.11, pág. 50);
9. Certidão de nascimento de Gabriel Delgado de Souza, em 20/06/2007, em que os genitores Valdir Delgado de Souza e Veronice Ramos Dias são qualificados como agricultores (seq. 1.11, pág. 51);
10. Certidão de nascimento de Andreia Delgado de Souza, em 04/03 /2000, que indica como domícilio o Assentamento Rosela Nunes Randron III (seq. 1.11, pág. 52);
11. Certidão de nascimento de Adriele Delgado de Souza, em 15/07/1995, em que os genitores Valdir Delgado de Souza e Veronice Ramos Dias são qualificados como agricultores (seq. 1.11, pág. 53);
12. Certidão de nascimento de Adriano Delgado de Souza, em 04/09 /1991, em que os genitores Valdir Delgado de Souza e Veronice Ramos Dias são qualificados como agricultores (seq. 1.11, pág. 54);
13. Declaração de matrícula e frequência escolar de Daniel Delgado de Souza, com endereço no Assentamento Marcos Freire (seq. 1.12, pág. 57);
14. Ficha escolar de Andreia Delgado de Souza, de 01/02/2011 a 22/12 /2011, com endereço no Assentamento Ireno Alves (seq. 1.12, pág. 59/60);
15. Ficha escolar de Adrieli Delgado de Souza, de 08/02/2011 a 19/12 /2012, com endereço no Assentamento Ireno Alves (seq. 1.12, pág. 61);
16. Declaração de matrícula e frequência escolar de Gabriel Delgado de Souza, com endereço no Assentamento Marcos Freire (seq. 1.12, pág. 62);
17. Histórico escolar da Escola Rural Municipal Severino da Silva, do aluno Adriano Delgado de Souza, do ano de 2002/2006 (seq. 1.12, pág. 65);
18. Parecer descritivo da Escola Rural Municipal Severino da Silva, do aluno Adriano Delgado de Souza (seq. 1.12, pág. 66);
19. Histórico escolar da Escola Rural Municipal Chico Mendes, do aluno Adriano Delgado de Souza, do ano de 2004/2009 (seq. 1.12, pág. 67);
20. Nota fiscal de venda de milho, em nome de Airton Mariano Dias e Maria Alves Dias, emitida em 20/04/2001, 18/06/2003, 11/05/2004, 25/03/2004, 23/11 /2004, 25/04/2005, 17/10/2005 (seq. 1.12, pág. 68/76).
Podemos chegar à conclusão de que o instituidor exercia efetivamente o labor rural, porque segundo inúmeros precedentes do Superior Tribunal de Justiça, o início de prova material da atividade rurícola pode ser dada através de documentos públicos:
PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA POR IDADE. RURÍCOLA. GUIA DE RECOLHIMENTO DO MINISTÉRIO DO TRABALHO. QUALIFICAÇÃO DE AGRICULTORA. FÉ PÚBLICA. COMPROVANTE DE PAGAMENTO DE ITR EM NOME DO EMPREGADOR DA AUTORA. DECLARAÇÕES DO EMPREGADOR E DO SINDICATO DOS TRABALHADORES RURAIS. INÍCIO DE PROVA MATERIAL CONFIGURADO. 1. A comprovação da atividade laborativa do rurícola deve-se dar com o início de prova material, que pode ser constituído por dados de registro civil, documentos públicos e declarações de sindicatos de trabalhadores rurais ou de ex-patrões, corroborados por provas testemunhais. [...]. 3. O comprovante de pagamento de ITR em nome do dono da propriedade onde a Autora exerceu a atividade rural constitui início razoável de prova material e, corroborado pelas Declarações do Empregador e do Sindicato dos Trabalhadores Rurais, comprovam a atividade da Autora como rurícola, para fins previdenciários, pelo período legalmente exigido. Precedentes do STJ. (REsp 616.226/CE, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em 17/06/2004, DJ 02/08/2004, p. 549). (grifei).
A jurisprudência supra amolda-se ao caso em tela.
Ademais, a qualidade de trabalhador rural, atribuída a outros membros do grupo familiar, especialmente em documentos públicos, pode ser extensível ao trabalhador, segundo diversos precedentes do STJ. Confira-se:
ADMISSIBILIDADE. APOSENTADORIA POR IDADE. REQUISITOS. PREENCHIMENTO. ATIVIDADE RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. QUALIFICAÇÃO DO MARIDO. EXTENSÃO À ESPOSA. 1. Ainda que o documento apresentado seja anterior à ação originária, esta Corte, nos casos de trabalhadores rurais, tem adotado solução pro misero para admitir sua análise, como novo, na rescisória. 2. O conjunto probatório da ação originária demonstrou o preenchimento dos requisitos necessários ao recebimento do benefício. 3. Os documentos apresentados constituem início de prova material apto para, juntamente com os testemunhos colhidos no processo originário, comprovar o exercício da atividade rural. 4. A qualificação do marido, na certidão de casamento, como lavrador estende-se à esposa, conforme precedentes desta Corte a respeito da matéria. 5. Ação rescisória procedente. (AR 2.338/SP, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 24/04/2013, DJe 08/05/2013). (grifei).
Outrossim, não se pode exigir farta documentação na hipótese sob litígio, sob o risco de se afastar o único benefício com que estes trabalhadores podem contar, após anos de esforço físico intenso próprio da atividade rurícola, que muitas vezes leva o cidadão a lesões permanentes e a invalidez.
Mesmo porque seria demais exigir que trabalhadores campesinos, carentes de condições econômicas e de informação jurídica (muitos são analfabetos), documentassem todas as suas atividades profissionais prevendo futura necessidade.
Sobreleva esclarecer que a prova documental foi devidamente corroborada pela prova oral produzida. Nesse sentido, destaco os depoimentos colhidos no curso da instrução processual:
A autora Veronice Ramos Dias declarou que era convivente do falecido, conviveram 27 anos e tiveram 7 filhos. Ele era agricultor, trabalhava na propriedade própria, com 1,5 alqueire, no assentamento. Plantavam milho, arroz, feijão para o consumo. Ele trabalhava de bóia-fria para os vizinhos, para o Adriano, o Wilson. Ele carpia, roçava. Sempre trabalhei na agricultura também. Não tivemos trabalhos urbano. No dia que faleceu ele trabalhou para o Matias, ele estava roçando, se acidentou e faleceu. Nunca se separaram. Eram vistos na comunidade como marido e mulher.
A testemunha Tereza Lurdes Pinheiro disse que o falecido era marido da autora, eles viviam juntos. Os conhecia do assentamento Ireno Alves, morava próximo. Eles viviam da lavoura, em terreno próprio, 1 alqueire, eles carpiam, plantavam feijão. Era produção para consumo. A Veronice sempre o ajudou. Não tinham maquinários, nem empregados. Eles eram vistos como marido e mulher na comunidade. Não tinham outro emprego, só agricultura. Ele trabalhava para fora, para outras famílias, para o Matias, o Nilson, de bóia-fria, plantava feijão. Eles são da comunidade também. Não tinha trabalho urbano. Eles tiveram filhos.
Zeni Aparecida Barbosa Pelisson informou que conhecia o Valdir Delgado de Souza, esposo da Veronice, ele trabalhava na roça, na terra dele de 1 alqueire e meio e de bóia-fria para os vizinhos. A terra é no assentamento Ireno Alves. Eles plantavam mandioca, arroz, feijão, milho. Não tinham maquinários, nem empregados. Os filhos trabalhavam com eles. Ele trabalhava de bóia-fria para o Matias, Adriano e Hilton. Ele era agricultor. Eles viviam normalmente na época do falecimento. Tiveram 7 filhos.
Assim, à vista do teor dos depoimentos colhidos em juízo, que corroboram o início de prova material anexado à exordial, resta devidamente comprovada a qualidade da autora de trabalhadora rural.
d) Data de início do benefício
Ante o exposto acima, resta verificar a partir de que momento o benefício é devido à parte autora.
Com fundamento no julgamento dos Recursos Extraordinários nºs 415454 e 416827, o Supremo Tribunal Federal firmou o entendimento de que, em obediência ao princípio do tempus regit actum, são inaplicáveis aos benefícios previdenciários as leis previdenciárias mais benéficas editadas posteriormente.
Assim, apesar de a lei previdenciária acerca do início do pagamento da pensão por morte ter sido alterada por sucessivas vezes, deve ser a aplicada a lei vigente à época do óbito.
In casu, considerando que a morte do(a) instituidor(a) ocorreu em 01/08 /2019 (seq. 1.11), aplica-se a redação do art. 74 da Lei n° 8.213/91 com a redação da Lei nº 13.846/2019 – que dispunha, apenas, ser a pensão por morte devida aos dependentes do segurado que falecer, requerida até 180 dias para os filhos menores de 16 anos e 90 dias após o óbito para os demais.
No que tange ao termo inicial para fins de pagamento de pensão por morte, em especial quando o dependente é pessoa absolutamente incapaz, se tem entendido, que o benefício previdenciário deve ser pago, desde a data do óbito, uma vez que não corre prazo prescricional para absolutamente incapazes, nos termos do art. 198, I, do CC. Sobre o assunto:
PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. ENUNCIADO ADMINISTRATIVO 3/STJ. PENSÃO POR MORTE. HABILITAÇÃO TARDIA. DEPENDENTE ABSOLUTAMENTE INCAPAZ. TERMO INICIAL DO BENEFÍCIO. DATA DO ÓBITO. PRECEDENTES. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. (...) A jurisprudência do STJ é no sentido de que comprovada a absoluta incapacidade do requerente à pensão por morte, faz ele jus ao pagamento das parcelas vencidas desde a data do óbito do instituidor da pensão, ainda que não postulado administrativamente no prazo de trinta dias, uma vez que não se sujeita aos prazos prescricionais. Colacionam-se os seguintes precedentes: PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. PENSÃO POR MORTE. ABSOLUTAMENTE INCAPAZ. INTERDITADO. SUSPENSÃO DO PRAZO PRESCRICIONAL. TERMO INICIAL DO BENEFÍCIO: DATA DO ÓBITO DO INSTITUIDOR DA PENSÃO. SENTENÇA DE INTERDIÇÃO: EFEITOS DECLARATÓRIOS. RECURSO ESPECIAL DO INSS A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1. A pessoa absolutamente incapaz para os atos da vida civil, submetida à curatela, tem direito o benefício de pensão por morte desde o óbito do Segurado, ainda que não postulado administrativamente no prazo de trinta dias, uma vez que não se sujeita aos prazos prescricionais. 2. É firme o entendimento desta Corte de que a suspensão do prazo de prescrição para tais indivíduos ocorre no momento em que se manifesta a sua incapacidade, sendo a sentença de interdição, para esse fim específico, meramente declaratória. 3. Recurso Especial do INSS a que se nega provimento. (Resp 1.429.309/SC, Primeira Turma, Relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, DJe 8/8/2018) PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE DEVIDA. NÃO INCIDÊNCIA DE PRESCRIÇÃO CONTRA MENOR DE IDADE. PARCELAS PRETÉRITAS RETROATIVAS À DATA DO ÓBITO. (...) (STJ - REsp: XXXXX PB 2018/0250641-1, Relator: Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, Data de Publicação: DJ 29/10 /2018).
Os autores Gabriel Delgado de Souza, Daniel Delgado de Souza, Eduarda Delgado de Souza, nasceram respectivamente em 20/06/2007 (seq. 1.11, pág. 51), 10/12/2010 (seq. 1.11, pág. 50) , 15/07/2019 (seq. 1.11, pág. 49), eram absolutamente incapazes tanto na data do óbito, quanto na data do requerimento administrativo, devendo a pensão ser fixada à eles desde a data do óbito em 01/08/2019 (seq. 1.11, pág. 46).
Já com relação as autoras Andreia Delgado de Souza e Veronice Ramos Dias o pagamento deve ser efetuado desde a data do requerimento administrativo, qual seja, 02/12 /2019 (seq. 1.11).
A qualidade de segurado do falecido por ocasião do óbito e a condição de dependente dos autores não são contestadas nesta ação, restando incontroversa.
A controvérsia, portanto, no caso está limitada ao termo inicial dos efeitos financeiros da pensão.
Termo Inicial
O termo inicial deve ser fixado de acordo com as leis vigentes por ocasião do óbito do instituidor, de acordo com o princípio do tempus regis actum.
Antes da Lei nº 9.528/97, de 10.12.1997, o benefício era devido a contar do falecimento, independente da data do requerimento. Apenas com o advento dessa Lei, o art. 74 da Lei nº 8.213/91 passou a vigorar com nova redação, prevendo prazo de 30 dias para o pedido, sob pena de prevalecer a data do requerimento.
Posteriormente, com a Lei nº 13.183/15, vigente a partir de 5.11.2015, a redação do referido art. 74, I, passou a vigorar com a redação atual, prevendo prazo de 90 dias para o requerimento, para fins de concessão a partir da data do óbito, sendo que, ultrapassado esse prazo, o benefício será deferido a partir da data do requerimento.
No caso em tela, o óbito ocorreu em 01.08.2019 e o requerimento administrativo foi protocolizado em 02.12.2019, mais de 30 dias após o falecimento, de modo que o benefício é devido a contar da Data de Entrada do Requerimento - DER em relação às autoras Andreia Delgado de Souza, filha maior de 16 anos e menor de 21, e Veronice Ramos Dias, companheira.
Habilitação Tardia e Reversão
A formalização tardia da inscrição de dependente absolutamente incapaz não impede a percepção dos valores que lhe são devidos desde a data do óbito, não obstante os termos do inciso II do artigo 74 da Lei nº 8.213/91, instituído pela Lei nº 9.528/97, pois não pode ser prejudicado pela inércia de seu representante legal, até porque contra ele não corre prescrição, a teor do art. 198, I, do Código Civil c/c os artigos 79 e 103, parágrafo único da Lei de Benefícios.
Nesse caso, excepciona-se a hipótese em que já houver dependente anteriormente habilitado recebendo a pensão, situação em que os efeitos surtirão a contar da habilitação tardia, como decidiu o Superior Tribunal de Justiça:
PREVIDENCIÁRIO. REGIME GERAL DE PREVIDÊNCIA SOCIAL. PENSÃO POR MORTE. HABILITAÇÃO TARDIA DE DEPENDENTE. MENOR. EXISTÊNCIA DE BENEFICIÁRIOS PREVIAMENTE HABILITADOS. ART. 76 DA LEI 8.213/1991. EFEITOS FINANCEIROS. DATA DO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. 1. Cinge-se a controvérsia à possibilidade de o recorrido, menor de idade, receber as diferenças da pensão por morte, compreendidas entre a data do óbito e a data da implantação administrativa, considerando que requereu o benefício após o prazo de trinta dias previsto no artigo 74, I, da Lei 8.213/1991 e que havia prévia habilitação de outro dependente. 2. Com efeito, o STJ orienta-se que, como regra geral, comprovada a absoluta incapacidade do requerente da pensão por morte, faz ele jus ao pagamento das parcelas vencidas desde a data do óbito do instituidor do benefício, ainda que não postulado administrativamente no prazo de trinta dias. 3. Contudo, o STJ excepciona esse entendimento, de forma que o dependente incapaz não tem direito ao recebimento do referido benefício a partir da data do falecimento do instituidor se outros dependentes já recebiam o benefício. Evita-se, assim, que a Autarquia previdenciária seja condenada duplamente a pagar o valor da pensão. Precedentes: AgInt no REsp 1.590.218/SP, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 8.6.2016, e AgRg no REsp 1.523.326/SC, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 18/12/2015; REsp 1.371.006/MG, Rel. Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, DJe 17.2.2017; REsp 1.377.720/SC, Rel. Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, DJe 5.8.2013; e REsp 1.479.948/RS, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 17.10.2016. 4. De acordo com o art. 76 da Lei 8.213/1991, a habilitação posterior do dependente somente deverá produzir efeitos a contar desse episódio, de modo que não há falar em efeitos financeiros para momento anterior à inclusão do dependente. 5. A concessão do benefício para momento anterior à habilitação, na forma estipulada pelo acórdão recorrido, acarretaria, além da inobservância dos arts. 74 e 76 da Lei 8.213/91, inevitável prejuízo à autarquia previdenciária, que seria condenada a pagar duplamente o valor da pensão, devendo ser preservado o orçamento da Seguridade Social para garantir o cumprimento das coberturas previdenciárias legais a toda a base de segurados do sistema. 6. Recurso Especial provido. (REsp 1655424/RJ, Rel. Ministro Herman Benjamin, 2ª T., j. 21.11.2017)
Destaca-se que, em julgamento recente, o Superior Tribunal de Justiça reafirmou a tese no sentido que havendo dependentes previamente habilitados - pertencentes ou não ao mesmo grupo familiar - , o pagamento do benefício ao dependente que se habilita tardiamente, seja capaz ou incapaz, surtirá efeito somente a partir da data do respectivo requerimento, e não à data do óbito do instituidor. Considerou o Superior Tribunal de Justiça que, assim, dá-se cumprimento ao art. 76 da Lei n. 8.213/1991, preservando a Previdência Social do indevido pagamento em duplicidade:
PREVIDENCIÁRIO. REGIME GERAL DE PREVIDÊNCIA SOCIAL. PENSÃO POR MORTE. HABILITAÇÃO TARDIA DE DEPENDENTE. FILHO MENOR DE 16 ANOS. ART. 76 DA LEI 8.213/1991. OUTROS BENEFICIÁRIOS. EFEITOS FINANCEIROS. HISTÓRICO DA DEMANDA 1. Trata-se, na origem, de Ação Ordinária proposta por dependente de segurado falecido que requer o pagamento de cota de pensão por morte não percebida desde o óbito do instituidor (genitor da autora da ação) em virtude de ter-se habilitado tardiamente para o recebimento da prestação previdenciária. Alega que na data do óbito (10.11.1998) ainda não contava com 16 (dezesseis) anos, razão pela qual teria direito subjetivo ao recebimento das prestações mensais relacionadas ao período de 10.11.1998 a 14.6.2012, quando passou a receber cota de pensão por morte e procedeu ao requerimento administrativo perante o INSS, benefício de pensão por morte dividido com outros três dependentes do falecido. Os demais pensionistas foram citados e fizeram parte da relação processual. 2. O ínclito Min. Og Fernandes apresentou voto-vogal, divergindo do Min. Herman Benjamin, para negar provimento ao Recurso Especial do INSS. Sendo mister destacar: "Entretanto, outra é a situação em que os dependentes compõem núcleos familiares distintos, caso dos autos, contexto em que não haveria compartilhamento do benefício. Nessa hipótese, vota o e. Relator pela não retroação do benefício à data de óbito do instituidor da pensão, mas, apenas, à data do requerimento administrativo, sob o fundamento de que, assim, estar-se-ia dando cumprimento ao art. 76 da Lei n. 8.213/1991 e preservando a autarquia previdenciária do indevido pagamento em dobro. (...) O fato de o INSS ter concedido o benefício de pensão a outro dependente, de forma integral, a meu ver, não afasta o direito do incapaz à sua cota parte, pois não se pode imputar a ele a concessão indevida de sua cota a outro dependente". 3. O catedrático Ministro Mauro Campbell Marques, em seu primoroso voto-vista, deu parcial provimento ao Recurso Especial do INSS, a fim de reconhecer o direito à cota-parte da pensão a partir do requerimento administrativo. Acompanhou, assim, o Ministro Relator. Transcrevem-se trechos do retromencionado voto: "Ainda que a autora possa em tese ter se prejudicado com a inércia de sua representante legal, por outro lado, não é razoável imputar à Autarquia previdenciária o pagamento em duplicidade. Menos razoável, ainda, no meu modo de sentir, é imputar o pagamento ao outros cotistas da pensão, pois legitimados ao benefício, requereram na data legal e de boa-fé. Comprovada a absoluta incapacidade do requerente da pensão por morte, faz ele jus ao pagamento das parcelas vencidas desde a data do óbito do instituidor da pensão, ainda que não postulada administrativamente no prazo de 30 dias, uma vez que não se sujeita aos prazos prescricionais, salvo se o benefício já tenha sido pago a outro dependente previamente habilitado, como no caso. Penso deva ser vedado o pagamento em duplicidade, mesmo que a habilitação tardia seja de um menor absolutamente incapaz, considerando a existência de outro(s) prévio(s) dependente(s) habilitado(s). Entendo como melhor caminho para o caso, o proposto pelo Ministro Relator, reconhecendo o direito à pensão por morte, apenas a partir do requerimento administrativo. (...) Ante o exposto, conheço do recurso especial do INSS e lhe dou parcial provimento, a fim de reconhecer o direito à cota-parte da pensão a partir do requerimento administrativo e julgar o pedido inicial improcedente, invertendo o ônus da sucumbência. Acompanho nesses termos o Ministro Relator, pedindo respeitosa vênia ao Ministro Og Fernandes". TERMO INICIAL DO PAGAMENTO DA PENSÃO POR MORTE 4. A Lei 8.213/1991 dispõe que a pensão por morte será devida ao conjunto dos dependentes do segurado falecido, desde a data do óbito, se tiver havido habilitação perante o INSS até noventa dias, prazo esse que era de trinta dias até a edição da Lei 13.183/2015; ou a partir da data do requerimento administrativo, quando não exercido o direito no referido prazo (art. 74). 5. É que, consoante afirmado pelo art. 76 da Lei 8.213/1991, "A concessão da pensão por morte não será protelada pela falta de habilitação de outro possível dependente, e qualquer inscrição ou habilitação posterior que importe em exclusão ou inclusão de dependente só produzirá efeito a contar da data da inscrição ou habilitação". 6. Ocorre que a própria "lei de benefícios" do RGPS afasta a prescrição quinquenal do art. 103 para os casos em que o pensionista for menor, incapaz ou ausente (art. 79). Assim, haveria que se empreender interpretação sistemática da legislação previdenciária, de modo a assegurar o direito subjetivo dos segurados descritos no art. 79, mas também evitar que a Previdência Social seja obrigada a pagar em duplicidade valores que compõem a dimensão econômica de um único benefício previdenciário de pensão por morte. PENSÃO POR MORTE JÁ PAGA A OUTROS DEPENDENTES 7. Não se desconhece a jurisprudência do STJ no sentido de que, comprovada a absoluta incapacidade do requerente da pensão por morte, faz ele jus ao pagamento das parcelas vencidas desde a data do óbito do instituidor do benefício, ainda que não postulado administrativamente no prazo fixado pela legislação.Vejamos: REsp 1.405.909/AL, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Rel. p/ Acórdão Ministro Ari Pargendler, Primeira Turma, DJe 9/9/2014; AgRg no AREsp 269.887/PE, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, DJe 21/3/2014; REsp 1.354.689/PB, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 11/3/2014. 8. Contudo, a questão ora controvertida está relacionada à habilitação tardia de dependente incapaz para receber pensão por morte que já estava sendo paga regularmente a outros dependentes. AVANÇO DA JURISPRUDÊNCIA DO STJ 9. O STJ iniciou realinhamento de sua jurisprudência na direção de que o dependente incapaz que não pleiteia a pensão por morte no prazo de trinta dias a contar da data do óbito do segurado não tem direito ao recebimento do referido benefício a partir da data do falecimento do instituidor, considerando que outros dependentes, integrantes do mesmo núcleo familiar, já recebiam o benefício. Evita-se, assim, que a Autarquia previdenciária seja condenada duplamente a pagar o valor da pensão. 10. De acordo com o art. 76 da Lei 8.213/1991, a habilitação posterior do dependente somente deverá produzir efeitos a contar do requerimento administrativo, de modo que não há falar em efeitos financeiros para momento anterior à inclusão do dependente. 11. A concessão do benefício para momento anterior à habilitação do autor, na forma estipulada pelo acórdão recorrido, acarreta, além da inobservância dos arts. 74 e 76 da Lei 8.213/1991, prejuízo à autarquia previdenciária, que seria condenada a pagar duplicadamente o valor da pensão. A propósito: REsp 1.655.424/RJ, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 19/12/2017; REsp 1.655.067/RJ, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 19/12/2017; AgInt no REsp 1.590.218/SP, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 8/6/2016; AgRg no REsp 1.523.326/SC, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 18/12/2015; REsp 1.479.948/RS, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 17/10/2016. CONCLUSÃO 12. Permissa venia ao paráclito Ministro Og Fernandes, para não acatar seu Voto-vogal. Nesse sentido, ratifica-se o entendimento original do relator, corroborado pelo pensamento do emérito Ministro Mauro Campbell Marques. 13. Recurso Especial do INSS parcialmente provido para considerar como devidos os valores pretéritos do benefício a partir do requerimento administrativo. (REsp 1664036/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 23/05/2019, DJe 06/11/2019)
Na hipótese de habilitação/requerimento concomitante de beneficiários capazes e incapazes, a quota-parte do incapaz é devida a contar da data do óbito, conforme o entendimento firmado pela 3ª Seção deste Tribunal:
PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS INFRINGENTES. PENSÃO POR MORTE DE PAI. REQUERIMENTO APÓS 30 DIAS DO ÓBITO. ABSOLUTAMENTE INCAPAZ. PRESCRIÇÃO QÜINQÜENAL. INOCORRÊNCIA. Contra o menor absolutamente incapaz não corre a prescrição qüinqüenal. A quota-parte da pensão referente ao incapaz é devida desde o óbito do instituidor do benefício, pois o menor não pode ser prejudicado pela inércia de seu representante legal. Precedentes. (TRF4, EINF 2006.71.00.017623-6, 3ª S. Rel. Juiz Federal Loraci Flores de Lima, D.E. 19.02.2010)
Quando se tratar de pensão anteriormente recebida por dependente incapaz, que deixa de receber porque alcançou a maioridade, e é hipótese de reversão para dependente capaz, esta só surtirá efeito a partir do momento em que cessou a percepção do benefício pelo outro dependente, sem efeito retroativo:
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE.COMPANHEIRA DO DE CUJUS. INDEFERIMENTO ADMINISTRATIVO. CONCESSÃO ÀS FILHAS MENORES. REVERSÃO EM FAVOR DA COMPANHEIRA A PARTIR DA MAIORIDADE DA ÚLTIMA BENEFICIÁRIA. RETROAÇÃO. DESCABIMENTO. 1. O Plenário do STJ decidiu que "aos recursos interpostos com fundamento no CPC/1973 (relativos a decisões publicadas até 17 de março de 2016) devem ser exigidos os requisitos de admissibilidade na forma nele prevista, com as interpretações dadas até então pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça" (Enunciado Administrativo n. 2). 2. Caso em que a parte autora requereu a pensão em 20/01/1988, ocasião em que lhe foi indeferido o benefício pela falta de prova da união estável, mas concedido, integralmente, às três filhas menores do casal, tendo o benefício encerrado em 02/10/2000, em razão da maioridade da última beneficiária, não se tratando, portanto, de habilitação tardia. 3. A solução da controvérsia requer um exame cum granu salis, tendo em vista o interesse público, evitando-se o pagamento em duplicidade, uma vez que a Lei de Benefícios determina o rateio da pensão em parcelas iguais (art. 77, caput). 4. A pretensão da autarquia merece acolhimento a fim de que seja reconhecido o direito ao pagamento da pensão por morte à companheira do de cujus somente a contar do dia seguinte à data de cessação da pensão pelo alcance da maioridade da última filha. 5. Recurso especial provido. (REsp 1371006/MG, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, 1ª T., DJe 17/02/2017)
Tendo o autor Gabriel Delgado de Souza, Daniel Delgado de Souza e Eduarda Delgado de Souza nasceram respectivamente em 20.06.2007 (ev. 1 - OUT11, pág. 51), 10.12.2010 (ev. 1 - OUT11, pág. 50) e 15.07.2019 (ev. 1 - OUT11, pág. 49), vê-se que eram menores de 16 anos por ocasião do requerimento administrativo, protocolado tão-somente em 02.12.2019 (ev. 1 - OUT1, p. 1).
Deste modo, o benefício lhe é devido desde o óbito do instituidor, ou seja, a contar de 01.08.2019.
Assim, não merece provimento o apelo do INSS no tópico.
Duração da Pensão
No que diz respeito ao período de manutenção do benefício de pensão, observa-se que a sentença foi omissa.
Para os óbitos ocorridos após o advento da Medida Provisória nº 664, de 30 de dezembro de 2014, convertida na Lei nº 13.135, de 17.06.2015, são aplicáveis as respectivas disposições legais, que alteraram os arts. 16, I, III; 74, §§ 1º e 2º; 77, § 2º, incisos e parágrafos, da Lei nº 8.213/91:
Art. 76. (...)
§ 2º - O cônjuge divorciado ou separado judicialmente ou de fato que recebia pensão de alimentos concorrerá em igualdade de condições com os dependentes referidos no inc. I do art. 16 desta Lei.
Art. 77. A pensão por morte, havendo mais de um pensionista será rateada entre todos em partes iguais.
§1º Reverterá em favor dos demais a parte daquele cujo direito à pensão cessar.
§2º O direito à percepção de cada cota individual cessará:
I - pela morte do pensionista;
II - para filho, pessoa a ele equiparada ou o irmão, de ambos os sexos, ao completar 21 (vinte e um) anos de idade, salvo se for inválido ou com deficiência intelectual ou mental grave;
III - para filho ou irmão inválido, pela cessação da invalidez;
IV - para filho ou irmão que tenha deficiência intelectual ou mental ou deficiência grave, pelo afastamento da deficiência, nos termos do regulamento; (Vigência)
V - para cônjuge ou companheiro:
a) se inválido ou com deficiência, pela cessação da invalidez ou pelo afastamento da deficiência, respeitados os períodos mínimos decorrentes da aplicação das alíneas "b" e "c";
b) em 4 (quatro) meses, se o óbito ocorrer sem que o segurado tenha vertido 18 (dezoito) contribuições mensais ou se o casamento ou a união estável tiverem sido iniciados em menos de 2 (dois) anos antes do óbito do segurado; (grifei)
c) transcorridos os seguintes períodos, estabelecidos de acordo com a idade do beneficiário na data de óbito do segurado, se o óbito ocorrer depois de vertidas 18 (dezoito) contribuições mensais e pelo menos 2 (dois) anos após o início do casamento ou da união estável:
1) 3 (três) anos, com menos de 21 (vinte e um) anos de idade;
2) 6 (seis) anos, entre 21 (vinte e um) e 26 (vinte e seis) anos de idade;
3) 10 (dez) anos, entre 27 (vinte e sete) e 29 (vinte e nove) anos de idade;
4) 15 (quinze) anos, entre 30 (trinta) e 40 (quarenta) anos de idade;
5) 20 (vinte) anos, entre 41 (quarenta e um) e 43 (quarenta e três) anos de idade;
6) vitalícia, com 44 (quarenta e quatro) ou mais anos de idade.
§ 2º-A. Serão aplicados, conforme o caso, a regra contida na alínea "a" ou os prazos previstos na alínea "c", ambas do inciso V do § 2o, se o óbito do segurado decorrer de acidente de qualquer natureza ou de doença profissional ou do trabalho, independentemente do recolhimento de 18 (dezoito) contribuições mensais ou da comprovação de 2 (dois) anos de casamento ou de união estável.
§ 2º-B. Após o transcurso de pelo menos 3 (três) anos e desde que nesse período se verifique o incremento mínimo de um ano inteiro na média nacional única, para ambos os sexos, correspondente à expectativa de sobrevida da população brasileira ao nascer, poderão ser fixadas, em números inteiros, novas idades para os fins previstos na alínea "c" do inciso V do § 2o, em ato do Ministro de Estado da Previdência Social, limitado o acréscimo na comparação com as idades anteriores ao referido incremento.
§3º Com a extinção da parte do último pensionista a pensão extinguir-se-á.
§ 4º revogado.
§ 5º O tempo de contribuição a Regime Próprio de Previdência Social (RPPS) será considerado na contagem das 18 (dezoito) contribuições mensais de que tratam as alíneas "b" e "c" do inciso V do § 2o." (NR)
§ 6º - O exercício de atividade remunerada, inclusive na condição de microempreendedor individual, não impede a concessão ou manutenção da parte individual da pensão do dependente com deficiência intelectual ou mental ou com deficiência grave.
Nesse sentido:
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE DE COMPANHEIRO. UNIÃO ESTÁVEL. COMPROVAÇÃO. ART. 77 DA LEI N° 8.213/91. MP N° 664/2014. LEI N° 13.135/2015. (...) 6. Tendo o instituidor do benefício falecido durante a vigência da Medida Provisória n° 664, de 30 de dezembro de 2014, aplica-se o disposto na tabela do §5°, inciso IV, do art. 77 da Lei 8.213/91, com redação dada pela MP n° 664/2014. (...) (TRF4 5004069-50.2019.4.04.9999, TRS/PR, Rel. Des. Federal Luiz Fernando Wowk Penteado, 15.08.2019)
Considerando que o óbito do instituidor ocorreu em 01.08.2019 e a autora Veronice possuía 41 anos naquela data (nascida em 01.01.1979), faz-se necessária a correção da sentença, no sentido de conceder o benefício à referida autora no período de 20 (vinte) anos, a contar do óbito do segurado, a teor do art. 77, inciso V, letra "c", item 5 da Lei 8.213/91.
Diante disso, merece provimento o recurso para fixar a duração da pensão concedida à referida autora pelo prazo de 20 anos, conforme fundamentação supra.
Honorários Advocatícios
Em grau recursal, consoante entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça, a majoração é cabível quando se trata de "recurso não conhecido integralmente ou desprovido, monocraticamente ou pelo órgão colegiado competente" (STJ, AgInt. nos EREsp. 1539725/DF, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, 2ª S., DJe 19.10.2017).
Parcialmente provido o recurso, não cabe majoração da verba honorária na instância recursal.
Custas
O INSS é isento do pagamento das custas processuais no Foro Federal (artigo 4.º, I, da Lei n.º 9.289/96), mas não quando demandado na Justiça Estadual do Paraná (Súmula 20 do TRF/4ª Região).
Tutela Específica
Nas causas previdenciárias, deve-se determinar a imediata implementação do benefício, valendo-se da tutela específica da obrigação de fazer prevista no artigo 461 do Código de Processo Civil de 1973, bem como nos artigos 497, 536 e parágrafos e 537, do Código de Processo Civil de 2015, independentemente de requerimento expresso por parte do segurado ou beneficiário (TRF4, Questão de Ordem na AC 2002.71.00.050349-7, Rel. para Acórdão, Des. Federal Celso Kipper, 3ª S., j. 09.08.2007).
Assim sendo, o INSS deverá implantar o benefício concedido no prazo de 45 (quarenta e cinco) dias. Havendo reconhecimento de direito ao benefício em mais de uma hipótese, o prazo será contado da intimação do INSS sobre a manifestação de opção da parte segurada.
Na hipótese de a parte autora já estar em gozo de benefício previdenciário, o INSS deverá implantar o benefício deferido judicialmente apenas se o valor de sua renda mensal atual for superior ao daquele.
Faculta-se à parte beneficiária manifestar eventual desinteresse quanto ao cumprimento desta determinação.
Prequestionamento
Objetivando possibilitar o acesso das partes às Instâncias Superiores, considero prequestionadas as matérias constitucionais e/ou legais suscitadas nos autos, conquanto não referidos expressamente os respectivos artigos na fundamentação do voto, nos termos do art. 1.025 do Código de Processo Civil.
Conclusão
- apelação: provida em parte para para conceder a pensão à autora pelo prazo de 20 anos, nos termos do art. 77, V, c, 5), da Lei 8.213/1991;
- de ofício, é determinada a implantação do benefício, no prazo de 45 dias.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento à apelação e, de ofício, determinar a implantação do benefício.
Documento eletrônico assinado por MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA, Desembargador Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003727195v12 e do código CRC 026666a0.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA
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Apelação Cível Nº 5000776-33.2023.4.04.9999/PR
RELATOR: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
APELANTE: VERONICE RAMOS DIAS
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. HABILITAÇÃO TARDIA. EFEITOS FINANCEIROS. DEPENDENTE ABSOLUTAMENTE INCAPAZ. DURAÇÃO ´para a companheira.
1. A concessão do benefício de pensão por morte depende do preenchimento dos seguintes requisitos: a) a ocorrência do evento morte; b) a condição de dependente de quem objetiva a pensão; c) a demonstração da qualidade de segurado do de cujus por ocasião do óbito. O benefício independe de carência e é regido pela legislação vigente à época do óbito
2. A formalização tardia da inscrição de dependente absolutamente incapaz não impede a percepção dos valores que lhe são devidos desde a data do óbito, não obstante os termos do inciso II do artigo 74 da Lei nº 8.213/91, instituído pela Lei nº 9.528/97, pois não pode ser prejudicado pela inércia de seu representante legal, até porque contra ele não corre prescrição, a teor do art. 198, I, do Código Civil c/c os artigos 79 e 103, parágrafo único, da Lei de Benefícios.
3. Ocorrido o óbito do segurado após a vigência da Medida Provisória nº 664, de 30.12.2014, convertida na Lei nº 13.135, de 17.06.2015, são aplicáveis as respectivas disposições legais, que alteraram os arts. 16, I, III, 74, §§ 1º e 2º; 77, § 2º, incisos e parágrafos, da Lei nº 8.213/91, estabelecendo prazos de duração do benefício de pensão por morte.
4. Considerando que o falecimento do instituidor ocorreu quando a companheria tinha 41 anos de idade, ela faz jus à pensão por morte pelo período de 20 (vinte) anos, a contar do óbito do ex-segurado, a teor do art. 77, inciso V, letra "c", item 5, da Lei 8.213/91.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 10ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação e, de ofício, determinar a implantação do benefício, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Curitiba, 28 de fevereiro de 2023.
Documento eletrônico assinado por MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA, Desembargador Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003727196v4 e do código CRC b9969d71.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 17/02/2023 A 28/02/2023
Apelação Cível Nº 5000776-33.2023.4.04.9999/PR
RELATOR: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
PRESIDENTE: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI
PROCURADOR(A): MAURICIO GOTARDO GERUM
APELANTE: VERONICE RAMOS DIAS
ADVOGADO(A): GISELE APARECIDA SPANCERSKI (OAB PR048364)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 17/02/2023, às 00:00, a 28/02/2023, às 16:00, na sequência 1456, disponibilizada no DE de 08/02/2023.
Certifico que a 10ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 10ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO E, DE OFÍCIO, DETERMINAR A IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
Votante: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
Votante: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
Votante: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI
SUZANA ROESSING
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 09/03/2023 04:33:55.