Apelação Cível Nº 5003978-92.2018.4.04.7121/RS
RELATORA: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
APELANTE: MARLI DE OLIVEIRA BREHM (AUTOR)
APELANTE: HELENA GIROLETI KRECHE (RÉU)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: OS MESMOS
RELATÓRIO
Trata-se de apelações interpostas contra sentença (
), que assim dispôs:Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE EM PARTE o pedido inicial, encerrando a fase de conhecimento com resolução de mérito (art. 487, I, CPC), para:
a) CONDENAR o INSS a excluir Helena Giroleti Kreche como dependente do segurado Sérgio Amauri Kreche e cancelar o benefício de pensão por morte concedido a ela;
b) e INDEFERIR o pedido de restituição dos valores recebidos pela pensionista.
Condeno a parte ré Helena Giroleti Kreche ao pagamento das custas, despesas processuais e dos honorários advocatícios. Nos termos do artigo 85, § 3º, do CPC, observando-se ainda o grau de zelo, a natureza e a importância da causa, a curta duração do processo e a ausência de dilação probatória, fixo-os em 10% sobre o valor atualizado da causa. Os juros e correção sobre esses honorários obedecerão ao Manual de Cálculos, e os juros serão devidos apenas a partir do trânsito em julgado dessa decisão (§ 16 do art. 85 do CPC).
De acordo com o art. 98, § 2º, do CPC/2015, "a concessão de gratuidade não afasta a responsabilidade do beneficiário pelas despesas processuais e pelos honorários advocatícios decorrentes de sua sucumbência". A exigibilidade fica sob condição suspensiva pelo prazo de 5 anos, durante o qual o credor pode promover a execução, caso demonstre a suficiência de recursos do devedor (art. 98, § 3º, do CPC).
A autora Marli de Oliveira Brehm apela sustentando que tem direito à restituição das cotas que foram indevidamente pagas à corré Helena Giroleti Kreche, pelo menos desde a DER revisional em 07/08/18. Defende seja o INSS condenado em honorários na instância inicial.
A corré Helena Giroleti Kreche recorre adesivamente sustentando fazer jus à cota parte da pensão por morte, pois era legalmente cônjuge do falecido e, mesmo após mudar-se para SC, mantiveram relacionamento e sempre obteve sua ajuda, caracterizada a dependência.
Com contrarrazões, subiram os autos ao Tribunal para julgamento.
É o relatório.
VOTO
Juízo de admissibilidade
Os apelos preenchem os requisitos de admissibilidade.
DA PENSÃO POR MORTE
A concessão do benefício de pensão por morte depende do preenchimento dos seguintes requisitos: (1) ocorrência do evento morte, (2) condição de dependente de quem objetiva a pensão e (3) demonstração da qualidade de segurado do de cujus por ocasião do óbito.
Conforme o disposto no art. 26, I, da Lei nº 8.213/1991, referido benefício independe de carência.
Sobre a condição de dependência para fins previdenciários, dispõe o art. 16 da Lei 8.213/91:
Art. 16. São beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condição de dependentes do segurado:
I - o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental que o torne absoluta ou relativamente incapaz, assim declarado judicialmente;
II - os pais;
III - o irmão não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental que o torne absoluta ou relativamente incapaz, assim declarado judicialmente;
§ 1º. A existência de dependente de qualquer das classes deste artigo exclui do direito às prestações os das classes seguintes.
§ 2º. O enteado e o menor tutelado equiparam-se a filho mediante declaração do segurado e desde que comprovada a dependência econômica na forma estabelecida no Regulamento.
§ 3º. Considera-se companheira ou companheiro a pessoa que, sem ser casada, mantém união estável com o segurado ou com a segurada, de acordo com o § 3º do art. 226 da Constituição Federal.
§ 4º. A dependência econômica das pessoas indicadas no inciso I é presumida e a das demais deve ser comprovada.
No que toca à qualidade de segurado, os arts. 11 e 13 da Lei nº 8.213/91 elencam os segurados do Regime Geral de Previdência Social.
E, acerca da manutenção da qualidade de segurado, assim prevê o art. 15 da mesma lei:
Art. 15. Mantém a qualidade de segurado, independentemente de contribuições:
I - sem limite de prazo, quem está em gozo de benefício;
II - até 12 (doze) meses após a cessação das contribuições, o segurado que deixar de exercer atividade remunerada abrangida pela Previdência Social ou estiver suspenso ou licenciado sem remuneração;
III - até 12 (doze) meses após cessar a segregação, o segurado acometido de doença de segregação compulsória;
IV - até 12 (doze) meses após o livramento, o segurado retido ou recluso;
V - até 3 (três) meses após o licenciamento, o segurado incorporado às Forças Armadas para prestar serviço militar;
VI - até 6 (seis) meses após a cessação das contribuições, o segurado facultativo.
§ 1º O prazo do inciso II será prorrogado para até 24 (vinte e quatro) meses se o segurado já tiver pago mais de 120 (cento e vinte) contribuições mensais sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado.
§ 2º Os prazos do inciso II ou do § 1º serão acrescidos de 12 (doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
§ 3º Durante os prazos deste artigo, o segurado conserva todos os seus direitos perante a Previdência Social.
§ 4º A perda da qualidade de segurado ocorrerá no dia seguinte ao do término do prazo fixado no Plano de Custeio da Seguridade Social para recolhimento da contribuição referente ao mês imediatamente posterior ao do final dos prazos fixados neste artigo e seus parágrafos.
Além disso, não será concedida a pensão aos dependentes daquele que falecer após a perda da qualidade de segurado, salvo se preenchidos os requisitos para obtenção da aposentadoria segundo as normas em vigor à época do falecimento.
Do caso concreto
No caso em apreço, a parte autora postula a revisão do benefício de pensão por morte de Sergio Amauri Kreche, ocorrida em 09/02/10, do qual é titular, sendo que, até 02/03/12, em rateio com o filho menor do segundo casamento do falecido, bem como com a corré Helena, habilitada desde 27/04/10. Pretende a exclusão dessa última do rol de dependentes, alegando que é separada de fato do falecido desde 1987, tendo, inclusive, constituído nova família.
Assim, a controvérsia diz respeito à qualidade de dependente da corré Helena.
Reproduzo como razões de decidir, os fundamentos declinados em sentença, em que a prova contida nos autos foi ampla e escorreitamente analisada in verbis:
...
No caso em análise, a parte autora pretende a exclusão da beneficiária Helena Giroleti Kreche, com o recebimento integral da pensão por morte.
A controvérsia diz respeito à existência de união estável e de dependência econômica com o segurado Sérgio Amauri Kreche, falecido em
A autora e a corré alegam que mantinham união estável com o segurado, a segunda alega que a união ocorreu mesmo após o divórcio do casal.
Como prova do alegado, a parte autora apresentou (ev. 1 e 67):
- Comprovante de residência na Rua Parque da Lagoa, 441, em Osório, em nome da autora (2018);
- Sentença na ação de divórcio do segurado e Helena Giroleti Kreche (2004);
- Petição inicial e termo de depoimento de testemunha na ação de divórcio.
No processo administrativo, juntou-se (ev. 15):
- Cópia integral da ação de divórcio do segurado e Helena Giroleti Kreche (2004);
- Certidão de óbito do segurado, constando que residia na Rua Santo Antônio, 185, em Santo Antônio da Patrulha, e que era casado com Helena Giroleti Kreche (2010);
- Certidão de casamento do segurado e Helena Giroleti Kreche, sem averbação de divórcio (1980);
Por sua vez, a corréu anexou aos autos (ev. 56 e 76):
- Declarações particulares (2020);
- Sentença de concessão de pensão por morte (2013).
Em audiência, a autora afirmou que viveu com o Sergio durante 14 anos e 6 meses, até ele falecer; que ele morava na Rua Farrapos, em Osório; que a autora conheceu só um filho dele, o Guilherme, filho do segundo casamento; que a autora não conheceu a Helena, só a viu no dia do enterro do Sérgio; que a Helena morava em Armazém, em Santa Catarina; que o Sérgio morou sempre em Osório; que o Sérgio não pagava pensão ou prestava auxílio à Helena, apenas ao Guilherme; que o Sergio não teve contato com a Helena nesses 14 anos em que a autora viveu com ele, ele nem ia para Santa Catarina.
As provas apresentadas pelas partes demonstram que foi a própria corré Helena Giroleti Kreche que propôs a ação de divórcio direto contra o segurado falecido em 2003, sob a alegação de separação de fato desde 1987 (ev. 67).
Uma das testemunhas ouvidas na ação de divórcio, Maria Teresinha Francisco Philippi, declarou que quando conheceu Helena ela já estava separada de fato e que nem chegou a conhecer o Sérgio. Afirmou ainda que Helena trabalhava na época como secretária dos pais da testemunha (ev. 67).
Portanto, há provas de que a demandada não convivia com o segurado falecido e não dependia economicamente dele desde 1987.
Desse modo, procede o pedido inicial, com a exclusão de Helena Giroleti Kreche como dependente do segurado Sérgio Amauri Kreche e o cancelamento do benefício de pensão por morte concedido a ela.
Contudo, tendo em vista o requerimento tardio formulado pela parte autora, é indevida a restituição de valores recebidos pela demandada, com o pagamento integral da pensão por morte à parte autora apenas a partir do trânsito em julgado.
...
Não merece reparos a sentença.
Como visto dos autos, a autora Marli teve comprovada judicialmente a união estável com o falecido por quatorze anos até o óbito, sendo reconhecido judicialmente o direito à pensão desde o óbito (
).Por outro lado, ficou comprovada a separação de fato entre a corré e o falecido. A própria corré moveu ação de divórcio, na qual afirmou que se separaram de fato em 1987 e não mais se reconciliaram, tendo inclusive tido novo companheiro e filha desse relacionamento, conforme peças juntadas em contrarrazões (ev.129 ). Na oportunidade do pedido de divórcio, houve fixação de pensão de 50% do salário mínimo somente em favor da filha Caroline, que já contava com 17 anos (
).Na audiência de instrução realizada nesses autos, somente a autora compareceu e foi ouvida. A corré não logrou comprovar a manutenção do relacionamento ou da alegada dependência econômica. Ao contrário, a prova dos autos é contrária à sua pretensão.
Assim, correta a exclusão da corré do rol de dependentes habilitados à pensão por morte, tendo em vista que comprovada a separação de fato, inclusive por ação de divórcio, (embora não tenha sido averbado no registro de casamento), sem estabelecimento de pensão alimentícia em favor da mesma, na condição de ex-esposa ou, por qualquer outra forma, demonstrada dependência econômica.
Por outro lado, não é devida, à autora, a restituição da cota-parte que foi paga à pensionista Helena, tendo em vista que o foi em razão de regular concessão administrativa do benefício de pensão por morte, mediante a apresentação da certidão de casamento sem anotação de qualquer separação ou divórcio. Logo, o INSS não pode, visto que terceiro, ser prejudicado se não houve a publicização nos termos da lei com o efetivo registro público.
Ademais, a parte autora recebeu o benefício em rateio desde 2013, vindo a se insurgir quanto ao fato somente em 2018, não podendo a exclusão operar efeitos retroativos ao pedido de revisão.
No caso, assim que tomou ciência da decisão, o INSS fez cessar o pagamento da cota parte da corré (ev. 117 ).
Apenas quanto aos honorários resta provida a apelação da parte autora, tendo em vista que o INSS se insurgiu quanto ao pedido que, ao final, foi julgado procedente.
Dessa forma, os honorários impostos em sentença, devem ser rateados em 50% entre o INSS e a corré.
Honorários advocatícios - majoração
Negado provimento ao recurso da corré, deve ser observada, em cumprimento de sentença, a majoração de 50% da verba honorária fixada na origem, pela incidência do §11 do artigo 85 do CPC, suspensa a exigibilidade em virtude da gratuidade da justiça.
Não se cogita de majoração da verba imposta ao INSS, porque somente foi arbitrada nessa instância e o INSS não apelou.
Tutela específica
Prejudicado o pedido de antecipação de tutela, tendo em vista que o INSS informou a suspensão do pagamento da cota à corré e o cumprimento da sentença ( ev. 117).
Conclusão
Negado provimento à apelação da corré Helena. Provida a apelação da autora Marli apenas quanto à distribuição da sucumbência. Nos demais pontos, mantida a sentença.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento à apelação da autora e negar provimento à apelação da corré.
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Apelação Cível Nº 5003978-92.2018.4.04.7121/RS
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APELANTE: MARLI DE OLIVEIRA BREHM (AUTOR)
APELANTE: HELENA GIROLETI KRECHE (RÉU)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: OS MESMOS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. PEDIDO DE REVISÃO. EXCLUSÃO DE BENEFICIÁRIO. DIFERENÇAS RETROATIVAS. RESTITUIÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. HONORÁRIOS.
1. A concessão do benefício de pensão por morte depende da ocorrência do evento morte, da demonstração da qualidade de segurado do de cujus e da condição de dependente de quem objetiva o benefício.
2. Restando comprovada a separação de fato da corré, inclusive pelo ajuizamento de ação de divórcio, e não tendo sido estabelecida pensão alimentícia em seu favor, na condição de ex-esposa ou, por qualquer outra forma, demonstrada dependência econômica, é devida a respectiva exclusão dentre os beneficiárias da pensão por morte, cuja cota deve reverter em favor da companheira.
3. Tratando-se de exclusão tardia de dependente previdenciário, não pode o INSS ser prejudicado quando não praticou qualquer ilegalidade ao conceder a pensão. Não pode, portanto, ser condenado a pagar, retroativamente, as diferenças correspondentes.
4. Considerando que o INSS se insurgiu quanto ao pedido de exclusão de beneficiário que, ao final, foi julgado procedente, é sucumbente, e os honorários devem ser rateados entre a autarquia e a corré.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação da autora e negar provimento à apelação da corré, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 27 de julho de 2022.
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 20/07/2022 A 27/07/2022
Apelação Cível Nº 5003978-92.2018.4.04.7121/RS
RELATORA: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
PRESIDENTE: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
PROCURADOR(A): PAULO GILBERTO COGO LEIVAS
APELANTE: MARLI DE OLIVEIRA BREHM (AUTOR)
ADVOGADO: RENATA SANTOS DA SILVA (OAB RS094201)
APELANTE: HELENA GIROLETI KRECHE (RÉU)
ADVOGADO: TAIANA DA SILVA BITENCOURT (OAB SC052359)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: OS MESMOS
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 20/07/2022, às 00:00, a 27/07/2022, às 14:00, na sequência 999, disponibilizada no DE de 11/07/2022.
Certifico que a 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 6ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DA AUTORA E NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA CORRÉ.
RELATORA DO ACÓRDÃO: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
Votante: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
Votante: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER
Votante: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
LIDICE PEÑA THOMAZ
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 13/10/2022 13:44:05.