APELAÇÃO CÍVEL Nº 5001032-97.2015.4.04.7107/RS
RELATORA | : | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
APELANTE | : | IRACI MARTINS |
ADVOGADO | : | MARCOS ROBERTO NARCISO |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. QUALIDADE DE DEPENDENTE. UNIÃO ESTÁVEL COMPROVADA. BENEFÍCIO DEVIDO. JUROS MORATÓRIOS E CORREÇÃO MONETÁRIA. DIFERIDOS. TUTELA ESPECÍFICA.
1. Para a obtenção do benefício de pensão por morte, deve a parte interessada preencher os requisitos estabelecidos na legislação previdenciária vigente à data do óbito, consoante iterativa jurisprudência dos Tribunais Superiores e desta Corte.
2. É presumida a dependência econômica da companheira que vivia em união estável com o de cujus.
3. A união estável pode ser demonstrada por testemunhos idôneos e coerentes, informando a existência da relação more uxório. A Lei nº 8.213/91 apenas exige início de prova material para a comprovação de tempo de serviço.
4. Comprovada a união estável e, por conseguinte, a dependência econômica da autora em relação ao de cujus, além dos demais requisitos, deve ser reformada a sentença para determinar ao INSS que conceda a pensão por morte à requerente.
5. Deliberação sobre índices de correção monetária e taxas de juros diferida para a fase de cumprimento de sentença, a iniciar-se com a observância dos critérios da Lei 11.960/2009, de modo a racionalizar o andamento do processo, permitindo-se a expedição de precatório pelo valor incontroverso, enquanto pendente, no Supremo Tribunal Federal, decisão sobre o tema com caráter geral e vinculante. Precedentes do STJ e do TRF da 4ª Região.
6. Determina-se o cumprimento imediato do acórdão naquilo que se refere à obrigação de implementar o benefício, por se tratar de decisão de eficácia mandamental que deverá ser efetivada mediante as atividades de cumprimento da sentença stricto sensu previstas no art. 497 do CPC/2015, sem a necessidade de um processo executivo autônomo (sine intervallo).
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6a. Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar provimento ao recurso da parte autora para julgar procedente o pedido e conceder o benefício de pensão por morte à autora desde a DER (02/10/2014) e, de ofício, determinar o cumprimento do acórdão no tocante à implantação do benefício e diferir para a fase de execução a forma de cálculo dos consectários legais, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 14 de dezembro de 2016.
Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
Relatora
| Documento eletrônico assinado por Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8671918v8 e, se solicitado, do código CRC 81374CF3. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Vânia Hack de Almeida |
| Data e Hora: | 15/12/2016 16:34 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5001032-97.2015.4.04.7107/RS
RELATORA | : | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
APELANTE | : | IRACI MARTINS |
ADVOGADO | : | MARCOS ROBERTO NARCISO |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
RELATÓRIO
Trata-se de ação ordinária movida por Iraci Martins em face do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS buscando a concessão do benefício de pensão previdenciária em razão do óbito de Getúlio José Rodrigues da Fonseca, desde o falecimento (22/09/2014). Requereu a parte autora, ao final, o pagamento das parcelas atrasadas.
A sentença do evento 72 julgou improcedente o pedido, condenando a parte autora ao pagamento de honorários advocatícios em favor do INSS no montante de 10% do valor da causa e das custas processuais, suspensa a exigibilidade da condenação em face da gratuidade de justiça.
Apelou a parte autora requerendo a reforma da sentença diante da existência de prova suficiente da união estável, a conferir qualidade de dependente à autora.
Oportunizadas as contrarrazões, subiram os autos.
É o relatório.
VOTO
Do Direito Intertemporal
Considerando que o presente processo está sendo apreciado por esta Turma após o início da vigência da Lei n.º 13.105/15, novo Código de Processo Civil, necessário se faz a fixação, à luz do direito intertemporal, dos critérios de aplicação dos dispositivos processuais concernentes ao caso em apreço, a fim de evitar eventual conflito aparente de normas.
Para tanto, cabe inicialmente ressaltar que o CPC/2015 procurou estabelecer, em seu CAPÍTULO I, art. 1º que 'o processo civil será ordenado, disciplinado e interpretado conforme os valores e as normas fundamentais estabelecidos na Constituição da República Federativa do Brasil, observando-se as disposições deste Código'; em seu CAPÍTULO II, art. 14, que 'a norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada'; bem como, em suas DISPOSIÇÕES FINAIS E TRANSITÓRIAS, art. 1.046, caput, que 'ao entrar em vigor este Código, suas disposições se aplicarão desde logo aos processos pendentes, ficando revogada a Lei no 5.869, de 11 de janeiro de 1973' (grifo nosso).
Neste contexto, percebe-se claramente ter o legislador pátrio adotado o princípio da irretroatividade da norma processual, em consonância com o art. 5º, inc. XXXVI da Constituição Federal, o qual estabelece que 'a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada'.
Desta forma, a fim de dar plena efetividade às referidas disposições normativas, e tendo em vista ser o processo constituído por um conjunto de atos, dirigidos à consecução de uma finalidade, qual seja, a composição do litígio, adoto, como critério de solução de eventual conflito aparente de normas, a Teoria dos Atos Processuais Isolados, segundo a qual cada ato deve ser considerado separadamente dos demais para o fim de se determinar a lei que o rege, a qual será, segundo o princípio tempus regit actum, aquela que estava em vigor no momento em que o ato foi praticado.
Por consequência, para deslinde da antinomia aparente supracitada, deve ser aplicada no julgamento a lei vigente:
(a) Na data do ajuizamento da ação, para a verificação dos pressupostos processuais e das condições da ação;
(b) Na data da citação (em razão do surgimento do ônus de defesa), para a determinação do procedimento adequado à resposta do réu, inclusive quanto a seus efeitos;
(c) Na data do despacho que admitir ou determinar a produção probatória, para o procedimento a ser adotado, inclusive no que diz respeito à existência de cerceamento de defesa;
(d) Na data da publicação da sentença (entendida esta como o momento em que é entregue em cartório ou em que é tornado público o resultado do julgamento), para fins de verificação dos requisitos de admissibilidade dos recursos, de seus efeitos, da sujeição da decisão à remessa necessária, da aplicabilidade das disposições relativas aos honorários advocatícios, bem como de sua majoração em grau recursal.
Prescrição Quinquenal
Tendo o requerimento administrativo sido protocolado em 02/10/2014 (evento 1, INDEFERIMENTO5), e a ação sido ajuizada em 28/01/2015, não há parcelas atingidas pela prescrição, restando afastada a preliminar arguida.
Da pensão por morte
Como é sabido, a pensão por morte independe de carência e rege-se pela legislação vigente quando da sua causa legal. No caso, tendo o óbito ocorrido em 22/09/2014 (evento 2, CERTOBT2), são aplicáveis as disposições da Lei 8.213/91, com a redação dada pela Lei 9.528/97, que estatui:
Art. 74. A pensão por morte será devida ao conjunto dos dependentes do segurado que falecer, aposentado ou não, a contar da data:
I - do óbito, quando requerida até 30 (trinta) dias depois deste;
II - do requerimento, quando requerida após o prazo previsto no inciso anterior;
III - da decisão judicial, no caso de morte presumida.
Art. 76. (...)
§ 2º - O cônjuge divorciado ou separado judicialmente ou de fato que recebia pensão de alimentos concorrerá em igualdade de condições com os dependentes referidos no inc. I do art. 16 desta Lei.
Art. 77. A pensão por morte, havendo mais de um pensionista será rateada entre todos em partes iguais.
§1º Reverterá em favor dos demais a parte daquele cujo direito à pensão cessar.
§2º A parte individual da pensão extingue-se:
I - pela morte do pensionista;
II - para o filho, a pessoa a ele equiparada ou o irmão, de ambos os sexos, pela emancipação ou ao completar 21 (vinte e um) anos de idade, salvo se for inválido ou com deficiência intelectual ou mental que o torne absoluta ou relativamente incapaz, assim declarado judicialmente;
III - para o pensionista inválido pela cessação da invalidez e para o pensionista com deficiência intelectual ou mental, pelo levantamento da interdição.
§3º Com a extinção da parte do último pensionista a pensão extinguir-se-á.
§ 4º A parte individual da pensão do dependente com deficiência intelectual ou mental que o torne absoluta ou relativamente incapaz, assim declarado judicialmente, que exerça atividade remunerada, será reduzida em 30% (trinta por cento), devendo ser integralmente restabelecida em face da extinção da relação de trabalho ou da atividade empreendedora.
Art. 26. Independe de carência a concessão das seguintes prestações:
I - pensão por morte, auxílio-reclusão, salário-família, salário-maternidade e auxílio-acidente;
(...)
III - os benefícios concedidos na forma do inciso I do artigo 39, aos segurados especiais referidos no inciso VII do art. 11 desta Lei.
Art. 16. São beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condição de dependentes do segurado:
I - o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental que o torne absoluta ou relativamente incapaz, assim declarado judicialmente;
II - os pais;
III - o irmão não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental que o torne absoluta ou relativamente incapaz, assim declarado judicialmente;
§1º A existência de dependente de qualquer das classes deste artigo exclui do direito às prestações os das classes seguintes.
§2º O enteado e o menor tutelado equiparam-se a filho mediante declaração do segurado e desde que comprovada a dependência econômica na forma estabelecida no Regulamento.
§3º Considera-se companheira ou companheiro a pessoa que, sem ser casada, mantém união estável com o segurado ou com a segurada, de acordo com o §3º do art. 226 da Constituição Federal.
§4º A dependência econômica das pessoas indicadas no inciso I é presumida e a das demais deve ser comprovada.
Isto é, para fazer jus à pensão por morte, o requerente deve comprovar a qualidade de segurado do de cujus quando do óbito e a dependência econômica, nos casos em que esta não é presumida.
Da qualidade de segurado
Não há controvérsia quanto à qualidade de segurado do falecido, pois se encontrava aposentado na data do óbito (evento 7, PROCADM3, p. 08).
Da condição de dependente
A união estável pode ser demonstrada por testemunhos idôneos e coerentes, informando a existência da relação more uxório. A Lei nº 8.213/91 apenas exige início de prova material para a comprovação de tempo de serviço, não repetindo semelhante imposição para fins de união estável.
Neste sentido, há verbete sumulado nesta Corte, de nº 104, que ora se reproduz:
"A legislação previdenciária não faz qualquer restrição quanto à admissibilidade da prova testemunhal, para comprovação da união estável, com vista à obtenção de benefício previdenciário."
No que se refere à prova testemunhal (evento 46, RESJUSTADMIN1), os depoentes corroboraram a existência da união estável e consequente dependência econômica da requerente.
Transcrevo, por oportuno, o depoimento pessoal da autora, bem como os testemunhos prestados.
Depoimento pessoal da autora:
Afirma ter sido companheira de Getúlio desde o ano de 2010, até o falecimento de Getúlio, ocorrido em 2014, que se conheceram em Nova Petrópolis.
Afirma que moravam juntos, na Rua Sete de Setembro, Edifício Dom Pedro, nº 240, apto afirma que acha que era 401 ou 403, que não se lembra mais.
Afirma que Getúlio era de profissão aposentado, e que a requerente diarista.
Afirmou que o falecido não tinha filhos.
De acordo com a requerente a pessoa que foi declarante na Certidão de óbito é irmão de Getúlio,
Declara que o falecido tinha problema de coração, que fez um procedimento no coração antes de ir para a UTI, onde esteve internado antes de falecer , em Caxias, no Hospital do Círculo, sendo que afirma que Getúlio teria ficado 18 dias internado. Afirma que o acompanhou no procedimento durante o período de internação.
Afirma que as despesas da casa eram divididas entre os dois, mas que ele arcava com maior parte, sendo que a requerente colaborava de acordo com a necessidade de ambos para a manutenção da casa.
Perguntada sobre o apartamento em que moravam, afirma que era alugado quando se conheceram ele já residia no local.
Testemunho de Iria Kich:
Afirma que conhece Iraci há cerca de dez anos, que a conhecia e que ela passou a trabalhar como diarista em sua casa em torno de sete a oito anos, e que Getúlio conheceu faz uns cinco anos, que foi através de Iraci que o conheceu. Afirma que durante o período de cinco anos Getúlio foi companheiro de Iraci. Perguntada sobre onde residiam, afirmou que era no Edifício Dom Pedro II, na Rua Sete de Setembro, no centro de Nova Petrópolis. Afirma que encontrava o casal em restaurantes, mercado, e que Getúlio costumava levar Iraci até sua casa quando ela ia fazer o trabalho de diarista. Afirma que Getúlio faleceu por problemas cardíacos, estando durante vários dias, entre idas e vindas, internado em Caxias, no Hospital Medianeira, Conhecido como Hospital do Círculo; e que teria se operado no mesmo dia em que Getúlio faleceu, tendo encontrado Iraci no hospital, cuidando de Getúlio. Não sabe dizer a respeito de Getúlio ter filhos ou não. Afirma que Getúlio era aposentado.
Testemunho de Walmi Schumann Lenz:
(...) afirma que conheceu Getúlio através de Iraci, que o conheceu quando este passou a morar com ela. Afirma que viveram em união estável durante mais ou menos quatro anos, que não sabe bem ao certo quanto tempo. Perguntada sobre onde residiam, afirmou que era no Edifício São Pedro, na Rua Sete de Setembro, nº 240 no centro de Nova Petrópolis. Que o apartamento ficava a uma quadra de sua casa. Afirma que visitar a casa deles não chegou a visitar, mas que Getúlio ia até a sua casa acompanhando Iraci, e que chegaram a veranear juntos na casa de praia que é de sua propriedade. Afirma que Getúlio faleceu por problemas cardíacos, que passou mal durante o período da manhã, foi atendido em pronto socorro em Nova Petrópolis, tendo sido transferido para Caxias, para o hospital Medianeira, onde veio a falecer. Afirma que Iraci acompanhou neste período, tendo faltado nos dias de faxina para acompanhar Getúlio no Hospital. Não sabe dizer a respeito de Getúlio ter filhos, nem ouviu dizer que fosse casado. Afirma que Getúlio era aposentado, acha que era de profissão viajante.
Testemunho de Meri Mari Sost:
(..) afirma que conheceu Iraci depois do ano de 2000, que ela e Getúlio eram clientes do mercado que é da sua propriedade. Que o mercado está situado na Avenida XV de Novembro, 1227, no Centro de Nova Petrópolis. Afirma desde que abriu o mercado passou a ver Iraci e Getúlio juntos, que faziam compras lá. Perguntada sobre onde residiam, afirmou que era no Edifício Dom Pedro, na Rua Sete de Setembro, nº 240, no centro de Nova Petrópolis, que mandava entregar as compras lá. Afirma que não tinham ficha no crediário, que o pagamento era feito em dinheiro. Que o apartamento em que residiam fica na rua de trás do mercado. Afirma que não tinha relação de amizade, nem se visitavam. Afirma que Getúlio faleceu por problemas cardíacos, afirma que ficou internado no hospital, afirma que a internação foi feita em Caxias. Afirma que não tem conhecimento sobre a profissão de Getúlio, que os conhecia do mercado.
Observa-se que a prova é uníssona acerca da manutenção de união estável com o de cujus por vários anos e de que viviam juntos quando ele faleceu.
No caso dos autos, além da prova testemunhal, houve apresentação de documentos que passo a relacionar:
a) escritura pública de declaração união estável, firmada por duas testemunhas em 30/09/2014, de que a autora e o falecido viveram em união estável desde novembro de 2010 até 22/09/2014 (evento 1, ESCRITURA9 e ESCRITURA10);
b) fatura de serviços de energia elétrica datados de 22/08/2014, em nome do falecido, no endereço da Rua Sete de Setembro, nº 240, ap. 403, Nova Petrópolis (evento 1, FATURA11);
c) fatura de cartão de crédito em nome da autora Iraci, datada de 10/11/2012, no endereço da Rua Sete de Setembro, nº 240, ap. 403, Nova Petrópolis (evento 1, FATURA12);
d) nota fiscal de compra em supermercado, datada de 18/07/2014, do cartão de fidelidade em nome do falecido (evento 1, NFISCAL13).
No que toca à escritura pública da alínea "a", observo que seu valor probatório é reduzido, uma vez que posterior aos eventos narrados. Os comprovantes das alíneas "b" e "c" indicam convivência no mesmo endereço, mas não são contundentes para, isoladamente, constituírem prova da efetiva união estável, uma vez que tal elemento não é essencial para a sua configuração. Quanto ao documento da alínea "d", observa-se que ele não guarda qualquer elemento de conexão com a autora, servindo apenas para indicar as despesas do falecido.
A sentença, ao concluir pela inexistência de união estável valeu-se de elementos trazidos da demanda nº 5009653-88.2012.4.04.7107 da seguinte forma:
Ademais, na data de 06-07-2012 a demandante ajuizou o processo nº 5009653-88.2012.4.04.7107, o qual tramitou perante a 4ª Vara Federal desta Subseção Judiciária, no qual postulou a concessão de pensão por morte, alegando ter mantido união estável com Romeu Bauer, falecido em 25-02-2011, situação que perdurou até a data do óbito. A referida demanda foi julgada improcedente, diante da não comprovação de existência de união estável à época do óbito.
Naqueles autos a autora afirmou residir à Rua Guilherme Schumann, nº 226, Nova Petrópolis - RS, juntando documentos comprobatórios. Tal endereço, inclusive, constou na petição inicial, no instrumento de mandato, no contrato de honorários e na declaração de insuficiência econômica, ambos datados de abril de 2012.
Outrossim, na justificação administrativa realizada no âmbito do citado processo, datada de 14-09-2012, a demandante afirmou que ela e Romeu continuaram morando na mesma casa até a data do óbito dele, local em que ela ainda permanecia residindo (fl. 6 do PROCADM27, evento 1 daqueles autos).
Getúlio José também foi ouvido na justificação administrativa realizada naqueles autos, na condição de testemunha da autora, oportunidade que declarou que conheceu a demandante através de seu irmão, afirmando que nunca frequentou a sua casa e do falecido Romeu, bem como que nunca os encontrava, apenas tendo conhecimento dos fatos por meio de seu irmão (fl. 4 do PROCADM27, evento 1 daquele processo). Saliente-se que tais declarações foram prestadas na data de 14-09-2012, sendo que a autora alega nestes autos que convivia em união estável com Getúlio desde setembro de 2010.
Nesse contexto, não se tem por verossímil a alegação da demandante, no sentido de que manteve união estável com Getúlio José Rodrigues da Fonseca pelo período de 2010 até a data em que ele faleceu (setembro de 2014), tornando-se despicienda, inclusive, a valoração dos testemunhos produzidos no âmbito destes autos.
Assim, não demonstrada a qualidade de dependente da autora, impõe-se a improcedência do pedido formulado no âmbito destes autos.
Há, com efeito, contradição entre a versão apresentada pela parte autora nestes autos e as declarações prestadas da demanda referenciada supra. Entretanto, atentamente sopesando os testemunhos apresentados nesta demanda, observa-se que os testemunhos não referem a data do início da relação afetiva tratada, sendo plausível que, após 14/09/2012, data do testemunho do falecido naqueles autos, se tenha firmado a referida relação, que posteriormente se intensificou a ponto de constituir união estável.
Entretanto, alega a autora em seu apelo que a união remonta a novembro de 2011 quando se separou judicialmente de seu antigo e falecido esposo, o que motivou a improcedência da demanda nº 5009653-88.2012.4.04.7107. Isto é o que, com efeito, foi relatado na sentença dos autos referenciados, que a seguir transcrevo, no que importa:
Na espécie, a autora exibe documentos comprovando que manteve domicílio comum com Romeu Bauer, na Rua Guilherme Schumann, nº 226, em Nova Petrópolis/RS, além de ter com ele tido um filho, nascido em 29.01.1989, e de haver Romeu figurado como responsável por internação dela ocorrida em fevereiro de 2007, todos integrantes dos autos do processo administrativo reproduzidos no evento nº 13 (PROCAMD1-2). Comprova, ainda, que arcou com as despesas do funeral de Romeu Bauer (PROCADM2, p. 19-22).
Entretanto, também constam dos autos do processo administrativo mandado de afastamento expedido em ação de separação de corpos movida pela autora contra Romeu Bauer, datado de 22.07.2009, determinando o afastamento temporário dele da morada do casal, bem como termo de audiência realizada em 11.08.2010, na qual os dois resolveram separar-se consensualmente e ajustaram sobre a divisão do patrimônio comum, tendo sido homologado o acordo pelo juiz e declarada extinta a sociedade de fato havida entre eles (evento nº 13, PROCADM2, p. 7-8).
Do referido termo, não consta qualquer estipulação acerca da prestação de alimentos, além de estar consignado que a casa em que a autora e Romeu moravam seria vendida, porém a autora poderia permanecer residindo nela por um ano, sem qualquer ônus.
Desta forma, o fato de possuir a demandante comprovantes de que se manteve residindo no endereço antes mencionado posteriormente a agosto de 2010 não se presta para comprovar domicílio comum com Romeu Bauer no período imediatamente anterior ao óbito dele, ocorrido em fevereiro de 2011.
Ademais, por ocasião do pagamento das despesas do funeral, a autora declarou residir em outro endereço (evento nº 13, PROCADM2, p. 19), o que denota que efetivamente deixou o antigo domicílio comum.
De resto, em declaração apresentada quando da interposição de recurso administrativo, a demandante admitiu que deixou de morar na casa em que havia residido com Romeu Bauer em novembro de 2010 (evento nº 13, PROCADM2, p. 28). Embora se depreenda, do relato formulado pela autora em tal declaração, que Romeu se encontraria então residindo com ela na mesma casa, não há evidências documentais de que efetivamente tenha ocorrido o reatamento da união após a separação homologada judicialmente, em agosto de 2010.
Além disso, os depoimentos produzidos na justificação administrativa realizada por determinação do juízo (evento nº 27) não se mostram elucidativos a esse respeito.
Com efeito, a testemunha Elizabeth, apesar de ter afirmado que a autora e Romeu brigavam muito, porém voltavam a conviver após as brigas, disse expressamente que não poderia afirmar se, nos últimos meses, o falecido estaria ou não convivendo maritalmente com a autora, tendo dito que, na época do óbito, ela própria (a depoente) se encontrava viajando para outro Estado (evento nº 27, PROCADM1, p. 2). A seu turno, a testemunha Iria Kich disse apenas supor que a autora e Romeu estivessem juntos quando este ficou doente e foi hospitalizado, por ter sido aquela quem providenciou todos os trâmites do funeral (p. 3). Já a testemunha Getúlio José nada declarou acerca da persistência ou não da relação entre a autora e Romeu no período próximo ao óbito dele, tendo mencionado, ainda, que nunca freqüentou a casa em que moravam, tendo sabido dos fatos por meio de um irmão, que era amigo do casal (p. 4).
Observa-se que, com efeito, a autora já estava separada judicialmente, podendo ter constituído nova união no período posterior. Entretanto, se isto é verdade, também não se pode ultrapassar o óbice da declaração do próprio de cujus de que apenas sabia dos fatos através de um irmão, ou seja, naquela época não mantinha contato com a autora.
Desta forma, de modo a superar a contradição enunciada, somente se pode reconhecer configurada a união estável posterior a 14/09/2012, interpretando os testemunhos apresentados como referentes àquele período, uma vez que existem elementos de prova documental da convivência em comum neste período que, somados à prova testemunhal permitem tal conclusão.
Portanto, comprovada a união estável e, por conseguinte, a dependência econômica da autora em relação ao de cujus, além dos demais requisitos, deve ser reformada a sentença que concedeu a pensão por morte à requerente.
Do termo inicial do benefício
Tendo em vista que transcorreram mais de 30 dias entre o falecimento e o requerimento administrativo, o marco inicial do benefício deve ser fixado na data do protocolo administrativo (02/10/2014), nos termos do art. 74, II, da Lei 8.213/91.
Conclusão
Neste contexto, merece provimento o recurso da parte autora para julgar procedente o pedido e conceder o benefício de pensão por morte à autora desde 02/10/2014.
Consectários
Juros Moratórios e Correção Monetária.
De início, esclareço que a correção monetária e os juros de mora, sendo consectários da condenação principal, possuem natureza de ordem pública e podem ser analisados até mesmo de ofício. Assim, sua alteração não implica falar em reformatio in pejus.
A questão da atualização monetária das quantias a que é condenada a Fazenda Pública, dado o caráter acessório de que se reveste, não deve ser impeditiva da regular marcha do processo no caminho da conclusão da fase de conhecimento.
Firmado em sentença, em apelação ou remessa oficial o cabimento dos juros e da correção monetária por eventual condenação imposta ao ente público e seus termos iniciais, a forma como serão apurados os percentuais correspondentes, sempre que se revelar fator impeditivo ao eventual trânsito em julgado da decisão condenatória, pode ser diferida para a fase de cumprimento, observando-se a norma legal e sua interpretação então em vigor. Isso porque é na fase de cumprimento do título judicial que deverá ser apresentado, e eventualmente questionado, o real valor a ser pago a título de condenação, em total observância à legislação de regência.
O recente art. 491 do NCPC, ao prever, como regra geral, que os consectários já sejam definidos na fase de conhecimento, deve ter sua interpretação adequada às diversas situações concretas que reclamarão sua aplicação. Não por outra razão seu inciso I traz exceção à regra do caput, afastando a necessidade de predefinição quando não for possível determinar, de modo definitivo, o montante devido. A norma vem com o objetivo de favorecer a celeridade e a economia processuais, nunca para frear o processo.
E no caso, o enfrentamento da questão pertinente ao índice de correção monetária, a partir da vigência da Lei 11.960/09, nos débitos da Fazenda Pública, embora de caráter acessório, tem criado graves óbices à razoável duração do processo, especialmente se considerado que pende de julgamento no STF a definição, em regime de repercussão geral, quanto à constitucionalidade da utilização do índice da poupança na fase que antecede a expedição do precatório (RE 870.947, Tema 810).
Tratando-se de débito, cujos consectários são totalmente definidos por lei, inclusive quanto ao termo inicial de incidência, nada obsta a que seja diferida a solução definitiva para a fase de cumprimento do julgado, em que, a propósito, poderão as partes, se assim desejarem, mais facilmente conciliar acerca do montante devido, de modo a finalizar definitivamente o processo.
Sobre esta possibilidade, já existe julgado da Terceira Seção do STJ, em que assentado que "diante a declaração de inconstitucionalidade parcial do artigo 5º da Lei n. 11.960/09 (ADI 4357/DF), cuja modulação dos efeitos ainda não foi concluída pelo Supremo Tribunal Federal, e por transbordar o objeto do mandado de segurança a fixação de parâmetros para o pagamento do valor constante da portaria de anistia, por não se tratar de ação de cobrança, as teses referentes aos juros de mora e à correção monetária devem ser diferidas para a fase de execução. 4. Embargos de declaração rejeitados". (EDcl no MS 14.741/DF, Rel. Ministro JORGE MUSSI, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 08/10/2014, DJe 15/10/2014).
Na mesma linha vêm decidindo as duas turmas de Direito Administrativo desta Corte (2ª Seção), à unanimidade, (Ad exemplum: os processos 5005406-14.2014.404.7101, 3ª Turma, julgado em 01-06-2016 e 5052050-61.2013.404.7000, 4ª Turma, julgado em 25/05/2016)
Portanto, em face da incerteza quanto ao índice de atualização monetária, e considerando que a discussão envolve apenas questão acessória no contexto da lide, à luz do que preconizam os art. 4º, 6º e 8º do novo Código de Processo Civil, mostra-se adequado e racional diferir-se para a fase de execução a solução em definitivo acerca dos critérios de correção, ocasião em que, provavelmente, a questão já terá sido dirimida pelo tribunal superior, o que conduzirá à observância, pelos julgadores, ao fim e ao cabo, da solução uniformizadora.
A fim de evitar novos recursos, inclusive na fase de cumprimento de sentença, e anteriormente à solução definitiva pelo STF sobre o tema, a alternativa é que o cumprimento do julgado se inicie, adotando-se os índices da Lei 11.960/2009, inclusive para fins de expedição de precatório ou RPV pelo valor incontroverso, diferindo-se para momento posterior ao julgamento pelo STF a decisão do juízo sobre a existência de diferenças remanescentes, a serem requisitadas, acaso outro índice venha a ter sua aplicação legitimada.
Os juros de mora, incidentes desde a citação, como acessórios que são, também deverão ter sua incidência garantida na fase de cumprimento de sentença, observadas as disposições legais vigentes conforme os períodos pelos quais perdurar a mora da Fazenda Pública.
Evita-se, assim, que o presente feito fique paralisado, submetido a infindáveis recursos, sobrestamentos, juízos de retratação, e até ações rescisórias, com comprometimento da efetividade da prestação jurisdicional, apenas para solução de questão acessória.
Diante disso, difere-se para a fase de cumprimento de sentença a forma de cálculo dos consectários legais, adotando-se inicialmente o índice da Lei 11.960/2009.
Honorários Advocatícios
Tratando-se de sentença publicada já na vigência do novo Código de Processo Civil, aplicável o disposto em seu art. 85 quanto à fixação da verba honorária.
Considerando a natureza da causa e tendo presente que o valor da condenação provavelmente não excederá a 200 salários mínimos, fixo os honorários advocatícios em 10% sobre as parcelas vencidas até a decisão concessória do benefício postulado (Súmulas 76/TRF4 e 111/STJ), nos termos do art. 85, §3º, I, do CPC/2015.
Consoante determina o §5º do referido artigo, na eventualidade de a condenação superar o limite de 200 salários mínimos, a verba honorária deverá observar os percentuais mínimos previstos nos incisos II a V do §3º, conforme a graduação do proveito econômico obtido.
Por fim, levando em conta o trabalho adicional do procurador na fase recursal, a verba honorária fica majorada em 2%, forte no §11 do art. 85 do CPC/2015.
Custas Processuais
O INSS é isento do pagamento das custas no Foro Federal (art. 4, I, da Lei nº 9.289/96) e na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul, devendo, contudo, pagar eventuais despesas processuais, como as relacionadas a correio, publicação de editais e condução de oficiais de justiça (artigo 11 da Lei Estadual nº 8.121/85, com a redação da Lei Estadual nº 13.471/2010, já considerada a inconstitucionalidade formal reconhecida na ADI nº 70038755864 julgada pelo Órgão Especial do TJ/RS), isenções estas que não se aplicam quando demandado na Justiça Estadual do Paraná (Súmula 20 do TRF4), devendo ser ressalvado, ainda, que no Estado de Santa Catarina (art. 33, p. único, da Lei Complementar Estadual nº156/97), a autarquia responde pela metade do valor.
Tutela Específica
Considerando os termos do art. 497 do CPC/2015, que repete dispositivo constante do art. 461 do Código de Processo Civil/1973, e o fato de que, em princípio, a presente decisão não está sujeita a recurso com efeito suspensivo (Questão de Ordem na AC nº 2002.71.00.050349-7/RS - Rel. p/ acórdão Desemb. Federal Celso Kipper, julgado em 09/08/2007 - 3ª Seção), o presente julgado deverá ser cumprido de imediato quanto à implantação do benefício postulado. Prazo: 45 dias.
Faculta-se ao beneficiário manifestar eventual desinteresse quanto ao cumprimento desta determinação.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar provimento ao recurso da parte autora para julgar procedente o pedido e conceder o benefício de pensão por morte à autora desde a DER (02/10/2014) e, de ofício, determinar o cumprimento do acórdão no tocante à implantação do benefício e diferir para a fase de execução a forma de cálculo dos consectários legais.
Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
Relatora
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 14/12/2016
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5001032-97.2015.4.04.7107/RS
ORIGEM: RS 50010329720154047107
RELATOR | : | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
PRESIDENTE | : | Desembargadora Federal Vânia Hack de Almeida |
PROCURADOR | : | Procurador Regional da República Eduardo Kurtz Lorenzoni |
APELANTE | : | IRACI MARTINS |
ADVOGADO | : | MARCOS ROBERTO NARCISO |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 14/12/2016, na seqüência 1144, disponibilizada no DE de 29/11/2016, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PROVIMENTO AO RECURSO DA PARTE AUTORA PARA JULGAR PROCEDENTE O PEDIDO E CONCEDER O BENEFÍCIO DE PENSÃO POR MORTE À AUTORA DESDE A DER (02/10/2014) E, DE OFÍCIO, DETERMINAR O CUMPRIMENTO DO ACÓRDÃO NO TOCANTE À IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO E DIFERIR PARA A FASE DE EXECUÇÃO A FORMA DE CÁLCULO DOS CONSECTÁRIOS LEGAIS.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
: | Juíza Federal MARINA VASQUES DUARTE DE BARROS FALCÃO | |
: | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
Gilberto Flores do Nascimento
Diretor de Secretaria
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