| D.E. Publicado em 08/03/2017 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0012292-82.2016.4.04.9999/RS
RELATOR | : | Juíza Federal GABRIELA PIETSCH SERAFIN |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELANTE | : | MAICON GENEROSO DOMENEGHINI |
ADVOGADO | : | Julieta Tomedi |
APELADO | : | (Os mesmos) |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. QUALIDADE DE SEGURADO. ECONOMIA FAMILIAR. BENEFÍCIO DEVIDO. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA. FASE DE CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. DIFERIMENTO.
1. Para a obtenção do benefício de pensão por morte, deve a parte interessada preencher os requisitos estabelecidos na legislação previdenciária vigente à data do óbito, consoante iterativa jurisprudência dos Tribunais Superiores e desta Corte.
2. A comprovação do exercício de atividade rural pode ser efetuada mediante início de prova material, complementada por prova testemunhal idônea.
3. Deliberação sobre índices de correção monetária e taxas de juros diferida para a fase de cumprimento de sentença, a iniciar-se com a observância dos critérios da Lei 11.960/2009, de modo a racionalizar o andamento do processo, permitindo-se a expedição de precatório pelo valor incontroverso, enquanto pendente, no Supremo Tribunal Federal, decisão sobre o tema com caráter geral e vinculante. Precedentes do STJ e do TRF da 4ª Região.
4. O termo inicial da contagem dos juros moratórios é a data da citação da Autarquia Previdenciária.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento ao recurso do INSS e à remessa oficial para reduzir a verba honorária para 10% do valor da condenação, excluídas as parcelas vincendas, dar parcial provimento ao recurso da parte autora para fixar o termo inicial dos juros moratórios na data da citação e, de ofício, diferir para a fase de cumprimento de sentença a forma de cálculo dos consectários legais, adotando-se inicialmente o índice da Lei 11.960/2009, restando prejudicada a remessa necessária no ponto, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 22 de fevereiro de 2017.
Juíza Federal GABRIELA PIETSCH SERAFIN
Relatora
| Documento eletrônico assinado por Juíza Federal GABRIELA PIETSCH SERAFIN, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8765787v10 e, se solicitado, do código CRC 9F858EE. | |
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| Signatário (a): | Gabriela Pietsch Serafin |
| Data e Hora: | 23/02/2017 13:31 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0012292-82.2016.4.04.9999/RS
RELATOR | : | Juíza Federal GABRIELA PIETSCH SERAFIN |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELANTE | : | MAICON GENEROSO DOMENEGHINI |
ADVOGADO | : | Julieta Tomedi |
APELADO | : | (Os mesmos) |
RELATÓRIO
Trata-se de ação ordinária movida por Maicon Generoso Domeneghini em face do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS buscando a concessão do benefício de pensão previdenciária em razão do óbito de Ironi Generoso, desde a data do falecimento (16/04/2007). Requereu a parte autora a antecipação dos efeitos da tutela e, ao final, o pagamento das parcelas atrasadas.
O pedido antecipatório foi deferido (fl. 45).
A sentença confirmou a antecipação de tutela e julgou procedente o pedido, condenando o INSS a conceder o benefício de pensão por morte ao autor, desde a data do cumprimento da decisão liminar, observado o rateio da pensão, corrigidas as parcelas vencidas e com incidência de juros de mora. Ainda, condenou a Autarquia ao pagamento das custas e dos honorários advocatícios, fixados em 15% sobre o valor da causa.
Apelou o INSS requerendo a reforma da sentença, defendendo ser aplicável a disciplina do CPC de 1973 ao feito. Alegou que, sendo apenas o dispositivo sentencial que enseja a coisa julgada, a fundamentação atinente à qualidade de segurado inserida na demanda n º 07811200021480 não se mostra indiscutível nesta lide. Reafirmando a ausência de qualidade de segurada da de cujus, requereu a improcedência do benefício de pensão. Subsidiariamente, postulou, ainda, a redução do percentual referente à verba honorária.
A parte autora também apelou da sentença, requerendo a sua reforma no que toca ao termo inicial dos juros moratórios, para que sejam aplicados desde a citação, nos termos da Súmula 204 do STJ.
Oportunizadas as contrarrazões, subiram os autos.
O Ministério Público Federal, com assento nesta Corte, opinou pelo parcial provimento do apelo do INSS e pelo provimento do apelo do autor.
É o relatório.
VOTO
Do Direito Intertemporal
Considerando que o presente processo está sendo apreciado por esta Turma após o início da vigência da Lei n.º 13.105/15, novo Código de Processo Civil, necessário se faz a fixação, à luz do direito intertemporal, dos critérios de aplicação dos dispositivos processuais concernentes ao caso em apreço, a fim de evitar eventual conflito aparente de normas.
Para tanto, cabe inicialmente ressaltar que o CPC/2015 procurou estabelecer, em seu CAPÍTULO I, art. 1º que 'o processo civil será ordenado, disciplinado e interpretado conforme os valores e as normas fundamentais estabelecidos na Constituição da República Federativa do Brasil, observando-se as disposições deste Código'; em seu CAPÍTULO II, art. 14, que 'a norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada'; bem como, em suas DISPOSIÇÕES FINAIS E TRANSITÓRIAS, art. 1.046, caput, que 'ao entrar em vigor este Código, suas disposições se aplicarão desde logo aos processos pendentes, ficando revogada a Lei no 5.869, de 11 de janeiro de 1973' (grifo nosso).
Neste contexto, percebe-se claramente ter o legislador pátrio adotado o princípio da irretroatividade da norma processual, em consonância com o art. 5º, inc. XXXVI da Constituição Federal, o qual estabelece que 'a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada'.
Desta forma, a fim de dar plena efetividade às referidas disposições normativas, e tendo em vista ser o processo constituído por um conjunto de atos, dirigidos à consecução de uma finalidade, qual seja, a composição do litígio, adoto, como critério de solução de eventual conflito aparente de normas, a Teoria dos Atos Processuais Isolados, segundo a qual cada ato deve ser considerado separadamente dos demais para o fim de se determinar a lei que o rege, a qual será, segundo o princípio tempus regit actum, aquela que estava em vigor no momento em que o ato foi praticado.
Por consequência, para deslinde da antinomia aparente supracitada, deve ser aplicada no julgamento a lei vigente:
(a) Na data do ajuizamento da ação, para a verificação dos pressupostos processuais e das condições da ação;
(b) Na data da citação (em razão do surgimento do ônus de defesa), para a determinação do procedimento adequado à resposta do réu, inclusive quanto a seus efeitos;
(c) Na data do despacho que admitir ou determinar a produção probatória, para o procedimento a ser adotado, inclusive no que diz respeito à existência de cerceamento de defesa;
(d) Na data da publicação da sentença (entendida esta como o momento em que é entregue em cartório ou em que é tornado público o resultado do julgamento), para fins de verificação dos requisitos de admissibilidade dos recursos, de seus efeitos, da sujeição da decisão à remessa necessária, da aplicabilidade das disposições relativas aos honorários advocatícios, bem como de sua majoração em grau recursal.
Remessa Oficial
Conforme já referido, tratando-se de sentença publicada na vigência do CPC/73, inaplicável o disposto no art. 496 do CPC/2015 quanto à remessa necessária.
Consoante decisão da Corte Especial do STJ (EREsp nº 934642/PR), em matéria previdenciária, as sentenças proferidas contra o Instituto Nacional do Seguro Social só não estarão sujeitas ao duplo grau obrigatório se a condenação for de valor certo (líquido) inferior a sessenta salários mínimos.
Não sendo esse o caso, tenho como interposta a remessa oficial.
Prescrição Quinquenal
Tendo o requerimento administrativo sido protocolado em 13/12/2011 (fl. 11), e a ação sido ajuizada em 14/05/2014, não há parcelas atingidas pela prescrição, restando afastada a preliminar argüida.
Ademais, a considerando que o autor, nascido em 20/02/2002 era absolutamente incapaz na data do óbito, na data do requerimento administrativo e no ajuizamento da demanda, seus direitos encontram-se resguardados da prescrição, que contra ele não corre, a teor do art. 198, inciso I, do Código Civil c/c os artigos 79 e 103, parágrafo único da Lei de Benefícios.
Da pensão por morte
Como é sabido, a pensão por morte independe de carência e rege-se pela legislação vigente quando da sua causa legal. No caso, tendo o óbito ocorrido em 16/04/2007 (fl. 14), são aplicáveis as disposições da Lei 8.213/91, com a redação dada pela Lei 9.528/97, que estatui:
Art. 74. A pensão por morte será devida ao conjunto dos dependentes do segurado que falecer, aposentado ou não, a contar da data:
I - do óbito, quando requerida até 30 (trinta) dias depois deste;
II - do requerimento, quando requerida após o prazo previsto no inciso anterior;
III - da decisão judicial, no caso de morte presumida.
Art. 76. (...)
§ 2º - O cônjuge divorciado ou separado judicialmente ou de fato que recebia pensão de alimentos concorrerá em igualdade de condições com os dependentes referidos no inc. I do art. 16 desta Lei.
Art. 77. A pensão por morte, havendo mais de um pensionista será rateada entre todos em partes iguais.
§1º Reverterá em favor dos demais a parte daquele cujo direito à pensão cessar.
§2º A parte individual da pensão extingue-se:
I - pela morte do pensionista;
II - para o filho, a pessoa a ele equiparada ou o irmão, de ambos os sexos, pela emancipação ou ao completar 21 (vinte e um) anos de idade, salvo se for inválido ou com deficiência intelectual ou mental que o torne absoluta ou relativamente incapaz, assim declarado judicialmente;
III - para o pensionista inválido pela cessação da invalidez e para o pensionista com deficiência intelectual ou mental, pelo levantamento da interdição.
§3º Com a extinção da parte do último pensionista a pensão extinguir-se-á.
§ 4º A parte individual da pensão do dependente com deficiência intelectual ou mental que o torne absoluta ou relativamente incapaz, assim declarado judicialmente, que exerça atividade remunerada, será reduzida em 30% (trinta por cento), devendo ser integralmente restabelecida em face da extinção da relação de trabalho ou da atividade empreendedora.
Art. 26. Independe de carência a concessão das seguintes prestações:
I - pensão por morte, auxílio-reclusão, salário-família, salário-maternidade e auxílio-acidente;
(...)
III - os benefícios concedidos na forma do inciso I do artigo 39, aos segurados especiais referidos no inciso VII do art. 11 desta Lei.
Art. 16. São beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condição de dependentes do segurado:
I - o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental que o torne absoluta ou relativamente incapaz, assim declarado judicialmente;
II - os pais;
III - o irmão não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental que o torne absoluta ou relativamente incapaz, assim declarado judicialmente;
§1º A existência de dependente de qualquer das classes deste artigo exclui do direito às prestações os das classes seguintes.
§2º O enteado e o menor tutelado equiparam-se a filho mediante declaração do segurado e desde que comprovada a dependência econômica na forma estabelecida no Regulamento.
§3º Considera-se companheira ou companheiro a pessoa que, sem ser casada, mantém união estável com o segurado ou com a segurada, de acordo com o §3º do art. 226 da Constituição Federal.
§4º A dependência econômica das pessoas indicadas no inciso I é presumida e a das demais deve ser comprovada.
Isto é, para fazer jus à pensão por morte, o requerente deve comprovar a qualidade de segurado do de cujus quando do óbito e a dependência econômica, nos casos em que esta não é presumida.
Da condição de dependente
No caso concreto, não há discussão acerca da condição de dependência da parte autora, que é presumida, pois filho da falecida, conforme certidão de nascimento da fl. 16.
Cabe referir, acerca do ponto, que na certidão de nascimento do autor constou o registro do nome da autora como Ironi dos Santos, nome usado pela autora em razão do matrimônio datado de 26/03/1985, consoante se comprova pela certidão de casamento da fl. 15.
Da qualidade de segurado
Alega o INSS que a coisa julgada formada na demanda nº 07811200021480 não é capaz de produzir efeitos nesta demanda, uma vez que objetivamente, a coisa julgada limita-se ao dispositivo, tendo o juízo a quo se equivocado ao reconhecer a qualidade de segurada da falecida.
Observando-se a sentença proferida (fl. 36) conclui-se que foi reconhecida a qualidade de segurada especial da Sra. Ironi Generoso, quando da concessão da quota parte do benefício de pensão por morte postulado pela filha Mariza Generoso Scapini.
A sentença proferida nestes autos reconheceu que se operou a coisa julgada no que toca à qualidade de segurada da de cujus, de modo a não permitir a rediscussão da questão na presente demanda.
Com efeito, em aplicação direta dos artigos 469 e 470 do Código de Processo Civil, observa-se que apenas ao dispositivo se agrega o caráter de imutabilidade e indiscutibilidade da coisa julgada, somente a ele se atribuindo a condição de lei entre as partes, ainda que cumpra interpretar-lhe de acordo com a fundamentação de forma a fixar os contornos da coisa julgada que se formou.
Neste sentido, colho o ensejo para citar aresto do Superior Tribunal de Justiça:
PROCESSUAL CIVIL. TRANSAÇÃO. COISA JULGADA MATERIAL. OBITER DICTUM. 1. O art. 469, I, do CPC é categórico ao preconizar que não fazem coisa julgada "os motivos, ainda que importantes para determinar o alcance da parte dispositiva da sentença", de forma que apenas o dispositivo é recoberto pela intangibilidade prevista no art. 467 do CPC. 2. Por outro lado, os fundamentos da decisão são assaz relevantes para compreendê-la e permitir a determinação de seus limites objetivos, sendo indispensável que se realize uma interpretação conjugada das razões do julgado e de seu dispositivo. 3. No caso vertente, os motivos sobejaram a expressa decisão contida no dispositivo, e, nesse caso, a ambigüidade há de ser solucionada em favor deste último, o qual deve prevalecer em prejuízo da fundamentação. 4. Argumento de caráter narrativo que não constitui pressuposto lógico para atingir-se o provimento inserto no dispositivo consubstancia-se em verdadeiro obiter dictum, mera ponderação realizada pelo julgador, que não se reveste do manto da coisa julgada. 5. Recurso especial provido. (RESP 200701653593, CASTRO MEIRA, STJ - SEGUNDA TURMA, DJE DATA:27/02/2009 ..DTPB:.)
No caso dos autos, ainda que a qualidade de segurada da falecida tenha sido apreciada nos autos da referida demanda, não se pode deixar de observar que não se deu a tripla identidade necessária à configuração da coisa julgada, uma vez que o ora autor não esteve presente naquela demanda.
Deste modo, não incidente a coisa julgada ou seus efeitos na presente relação jurídica. Contudo, nada impede que se utilize todas as provas lá colhidas para a formação do convencimento.
Assim, passo a apreciar os elementos de prova carreados aos autos.
Do labor rural
O trabalho rural como segurado especial dá-se em regime individual (produtor usufrutuário, possuidor, assentado, parceiro ou meeiro outorgados, comodatário ou arrendatário rurais) ou de economia familiar, este quando o trabalho dos membros da família é indispensável à própria subsistência e ao desenvolvimento socioeconômico do núcleo familiar e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados permanentes (art. 11, VII e § 1º da Lei nº 8.213/91).
A atividade rural de segurado especial deve ser comprovada mediante início de prova material, complementada por prova testemunhal idônea, não sendo esta admitida exclusivamente, a teor do art. 55, § 3º, da Lei 8.213/91, e súmula 149 do STJ.
Desde logo ressalto que somente excluirá a condição de segurado especial a presença ordinária de assalariados - insuficiente a tanto o mero registro em ITR ou a qualificação como empregador rural (II b) - art. 1º, II, "b", do Decreto-Lei 1166, de 15.04.71. Já o trabalho urbano do cônjuge ou familiar, relevante e duradouro, não afasta a condição de regime de economia familiar quando excluído do grupo de trabalho rural. Finalmente, a constitucional idade mínima de dezesseis anos para o trabalho, como norma protetiva, deve ser interpretada em favor do protegido, não lhe impedindo o reconhecimento de direitos trabalhistas ou previdenciários quando tenham efetivamente desenvolvido a atividade laboral.
Quanto ao início de prova material, necessário a todo reconhecimento de tempo de serviço (§ 3º do art. 56 da Lei nº 8.213/91 e Súmula 149/STJ), por ser apenas inicial, tem sua exigência suprida pela indicação contemporânea em documentos do trabalho exercido, embora não necessariamente ano a ano, mesmo fora do exemplificativo rol legal (art. 106 da Lei nº 8.213/91), ou em nome de integrantes do grupo familiar (Admite-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental -Súmula 73 do TRF 4ª Região).
Nos casos de trabalhadores informais, especialmente em labor rural de bóia-fria, a dificuldade de obtenção de documentos permite maior abrangência na admissão do requisito legal de início de prova material, valendo como tal documentos não contemporâneos ou mesmo em nome terceiros (patrões, donos de terras arrendadas, integrantes do grupo familiar ou de trabalho rural). Se também ao bóia-fria é exigida prova documental do labor rural, o que com isto se admite é mais amplo do que seria exigível de um trabalhador urbano, que rotineiramente registra suas relações de emprego.
Do caso concreto
Como início de prova material do labor rural juntou a parte autora os seguintes documentos:
a) certidão de óbito da falecida, datada de 12/06/2008, em que foi qualificada como "aposentada" (fl. 14);
b) certidão de nascimento do autor, datada de 20/02/2002, em que a falecida foi qualificada como "do lar" (fl. 16);
c) notas fiscais de produtor expedidas por Olímpio Domeneghini e por Ironi dos Santos, datadas de 31/07/2000 (fl. 98), 07/12/2005 (fl. 102);
d) nota fiscal expedida por Moinho Silveira Giacomin, datada de 31/07/2002 em favor de Olimpio Domeneghini e Ironi dos Santos (fl. 99);
e) notas fiscais expedidas por Joãosinho Valdir Mazetto, datadas de 21/12/2004 (fl. 101), 07/12/2005 (fl. 103), 14/12/2005 (fl. 105), 11/10/2006 (fl. 107), 25/10/2006 (fl. 109), 01/09/2008 (fl. 115), 25/11/2009 (fl. 121), em favor de Olimpio Domeneghini e Ironi dos Santos;
f) nota fiscal expedida por Frutas e Verduras Sanaioto em favor de Olimpio Domeneghini e Ironi dos Santos, datada de 19/12/2007 (fl. 111), 08/04/2010 (fl. 119);
Cabe observar que a parte autora apresentou, ainda, várias notais fiscais de produção e de venda, que não foram arroladas por não permitirem a identificação do expedidor e/ou da data.
Tais documentos correspondem ao início de prova material exigido para o reconhecimento da condição de segurada especial da falecida.
A prova material foi corroborada pela prova testemunhal produzida nos autos da Justificação Administrativa (fls. 131-136), não impugnada pela autarquia previdenciária, a comprovar o trabalho rural desempenhado pelo de cujus, bem como a consequente qualidade de segurado especial da Previdência Social.
A Sra. Celeste Marinello declarou "que a falecida ajudava o companheiro na roça; que ajudava a plantar cebola, milho, feijão, batata e um pouco de tudo; que o que era produzido vinha da própria propriedade do companheiro; que o companheiro da falecida era agricultor, trabalhando com um pouco de tudo; que as terras eram do pai do Sr. Olímpio e que trabalhavam num pedaço destas terras; que não tinham a ajuda de terceiros; que nunca viu pessoas estranhas trabalhando com o casal; (...) afirma que mais ou menos cerca de 01 ano antes do falecimento da Sra. Ironi, a mesma não mais morava com o companheiro".
Luiz Damião Mercalli informou "que a profissão dela nesta época era de agricultora, que o companheiro também é agricultor; que as terras eram do pai do Olímpio; que nunca viu estranhos trabalhando juntos, não cediam terras para terceiros; não tinham empregados (...) que durante este período nunca viu a falecida trabalhando com outra atividade que não a rural; que a produção deles era vendida para fruteiros; que mais ou menos uns dois meses antes de falecer a Sra. Ironi não morava mais com o Sr. Olímpio, pois saiu da propriedade (...)".
Lourdes Zanella Cagliari declarou "que acredita que antes do falecimento ela tenha morado por volta de uns 07 anos com o companheiro; que eles trabalhavam na roça, plantando milho, batata, cebola e outras coisas; que chegou a ver a Sra. Ironi trabalhando na roça; que ela trabalhava com o companheiro Olímpio; (...), que nunca viu empregados; que na época da colheita pode ter tido ajuda do irmão dele (...); que as terras eram do pai do Olímpio; que desconhece a existência de contrato de parceria/arrendamento com outras pessoas (...) que o casal e os filhos sobreviviam da agricultura, vendendo os produtos que produziam. Que vendiam para o Masetto e outros fruteiros (...) que quando faleceu a requerente já não morava mais com o companheiro a mais ou menos uns dois meses; que não fazia muito tempo que a falecida tinha saído da casa do companheiro quando faleceu".
Há, com efeito, pequena divergência sobre o período mais próximo ao falecimento da segurada, uma vez que teria se afastado da propriedade, oscilando a indicação das testemunhas entre dois meses e um ano. Predomina, no entanto, a informação de que a autora teria se ausentado apenas por dois meses da atividade entretida, o que não macula sua condição de segurada da falecida.
Assim, presente início de prova material, complementada por prova oral, no período controverso, devida é a admissão da condição da parte autora como segurada especial à época do óbito.
Do termo inicial do benefício
Tendo em vista que transcorreram mais de 30 dias entre o falecimento e o requerimento administrativo, o marco inicial do benefício deveria ser fixado na data do protocolo administrativo (13/12/2011), nos termos do art. 74, II, da Lei 8.213/91.
Entretanto, a considerar que o autor é menor absolutamente incapaz na ocasião do óbito, é diverso o entendimento.
A formalização tardia da inscrição de dependente absolutamente incapaz para a concessão do benefício de pensão por morte não impede a percepção dos valores que lhe são devidos desde a data do óbito, não obstante os termos do inciso II do artigo 74 da Lei nº 8.213/91, instituído pela Lei nº 9.528/97, pois não pode ser prejudicado pela inércia de seu representante legal, até porque contra ele não corre prescrição, a teor do art. 198, inciso I, do Código Civil c/c os artigos 79 e 103, parágrafo único da Lei de Benefícios. (Neste sentido: TRF4, AC 0009072-52.2011.404.9999, Sexta Turma, Relator Luís Alberto D'AZEVEDO AURVALLE, D.E. 12/08/2011 e TRF4, AC 0009072-52.2011.404.9999, Sexta Turma, Relator Luís Alberto D'AZEVEDO AURVALLE, D.E. 12/08/2011).
Nesse contexto, considerando que o autor nasceu em 20/02/2002 (fl. 16), sendo absolutamente incapaz quando da entrada do requerimento administrativo, não incide a prescrição e o requerente tem direito à percepção do benefício desde a morte de seu genitor.
Entretanto, a considerar que não houve recurso quanto ao termo inicial fixado na sentença, tampouco se pode incidir em reformatio in pejus da Autarquia Previdenciária, mantenho o termo inicial do benefício na data do cumprimento da decisão liminar.
Esclareço, por fim, que deve ser paga apenas a quota parte da pensão que lhe cabe, visto que a outra metade já está sendo percebida por sua irmã Mariza Generoso Scapini, conforme corretamente determinou o decisum.
Conclusão
Deste modo, não merece reparos a sentença prolatada.
Consectários
Juros Moratórios e Correção Monetária.
De início, esclareço que a correção monetária e os juros de mora, sendo consectários da condenação principal, possuem natureza de ordem pública e podem ser analisados até mesmo de ofício. Assim, sua alteração não implica falar em reformatio in pejus.
A questão da atualização monetária das quantias a que é condenada a Fazenda Pública, dado o caráter acessório de que se reveste, não deve ser impeditiva da regular marcha do processo no caminho da conclusão da fase de conhecimento.
Firmado em sentença, em apelação ou remessa oficial o cabimento dos juros e da correção monetária por eventual condenação imposta ao ente público e seus termos iniciais, a forma como serão apurados os percentuais correspondentes, sempre que se revelar fator impeditivo ao eventual trânsito em julgado da decisão condenatória, pode ser diferida para a fase de cumprimento, observando-se a norma legal e sua interpretação então em vigor. Isso porque é na fase de cumprimento do título judicial que deverá ser apresentado, e eventualmente questionado, o real valor a ser pago a título de condenação, em total observância à legislação de regência.
O recente art. 491 do NCPC, ao prever, como regra geral, que os consectários já sejam definidos na fase de conhecimento, deve ter sua interpretação adequada às diversas situações concretas que reclamarão sua aplicação. Não por outra razão seu inciso I traz exceção à regra do caput, afastando a necessidade de predefinição quando não for possível determinar, de modo definitivo, o montante devido. A norma vem com o objetivo de favorecer a celeridade e a economia processuais, nunca para frear o processo.
E no caso, o enfrentamento da questão pertinente ao índice de correção monetária, a partir da vigência da Lei 11.960/09, nos débitos da Fazenda Pública, embora de caráter acessório, tem criado graves óbices à razoável duração do processo, especialmente se considerado que pende de julgamento no STF a definição, em regime de repercussão geral, quanto à constitucionalidade da utilização do índice da poupança na fase que antecede a expedição do precatório (RE 870.947, Tema 810).
Tratando-se de débito, cujos consectários são totalmente definidos por lei, inclusive quanto ao termo inicial de incidência, nada obsta a que seja diferida a solução definitiva para a fase de cumprimento do julgado, em que, a propósito, poderão as partes, se assim desejarem, mais facilmente conciliar acerca do montante devido, de modo a finalizar definitivamente o processo.
Sobre esta possibilidade, já existe julgado da Terceira Seção do STJ, em que assentado que "diante a declaração de inconstitucionalidade parcial do artigo 5º da Lei n. 11.960/09 (ADI 4357/DF), cuja modulação dos efeitos ainda não foi concluída pelo Supremo Tribunal Federal, e por transbordar o objeto do mandado de segurança a fixação de parâmetros para o pagamento do valor constante da portaria de anistia, por não se tratar de ação de cobrança, as teses referentes aos juros de mora e à correção monetária devem ser diferidas para a fase de execução. 4. Embargos de declaração rejeitados". (EDcl no MS 14.741/DF, Rel. Ministro JORGE MUSSI, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 08/10/2014, DJe 15/10/2014).
Na mesma linha vêm decidindo as duas turmas de Direito Administrativo desta Corte (2ª Seção), à unanimidade, (Ad exemplum: os processos 5005406-14.2014.404.7101, 3ª Turma, julgado em 01-06-2016 e 5052050-61.2013.404.7000, 4ª Turma, julgado em 25/05/2016)
Portanto, em face da incerteza quanto ao índice de atualização monetária, e considerando que a discussão envolve apenas questão acessória no contexto da lide, à luz do que preconizam os art. 4º, 6º e 8º do novo Código de Processo Civil, mostra-se adequado e racional diferir-se para a fase de execução a solução em definitivo acerca dos critérios de correção, ocasião em que, provavelmente, a questão já terá sido dirimida pelo tribunal superior, o que conduzirá à observância, pelos julgadores, ao fim e ao cabo, da solução uniformizadora.
A fim de evitar novos recursos, inclusive na fase de cumprimento de sentença, e anteriormente à solução definitiva pelo STF sobre o tema, a alternativa é que o cumprimento do julgado se inicie, adotando-se os índices da Lei 11.960/2009, inclusive para fins de expedição de precatório ou RPV pelo valor incontroverso, diferindo-se para momento posterior ao julgamento pelo STF a decisão do juízo sobre a existência de diferenças remanescentes, a serem requisitadas, acaso outro índice venha a ter sua aplicação legitimada.
Os juros de mora, incidentes desde a citação, como acessórios que são, também deverão ter sua incidência garantida na fase de cumprimento de sentença, observadas as disposições legais vigentes conforme os períodos pelos quais perdurar a mora da Fazenda Pública.
Evita-se, assim, que o presente feito fique paralisado, submetido a infindáveis recursos, sobrestamentos, juízos de retratação, e até ações rescisórias, com comprometimento da efetividade da prestação jurisdicional, apenas para solução de questão acessória.
Diante disso, difere-se para a fase de cumprimento de sentença a forma de cálculo dos consectários legais, adotando-se inicialmente o índice da Lei 11.960/2009, restando prejudicada a remessa necessária no ponto e reforma-se parcialmente a sentença para fixar o termo inicial da contagem dos juros moratórios na data da citação.
Honorários Advocatícios
Considerando que a sentença recorrida foi publicada antes de 18/03/2016, data da entrada em vigor do NCPC, e tendo em conta as explanações tecidas quando da análise do direito intertemporal, esclareço que as novas disposições acerca da verba honorária são inaplicáveis ao caso em tela, de forma que não se determinará a graduação conforme o valor da condenação (art. 85, §3º, I ao V, do CPC/2015), tampouco se estabelecerá a majoração em razão da interposição de recurso (art. 85, §11º, do CPC/2015).
Assim, os honorários advocatícios são devidos pelo INSS no percentual de 10% sobre as parcelas vencidas até a decisão judicial concessória do benefício previdenciário pleiteado, conforme definidos nas Súmulas nº 76 do TRF4 e nº 111 do STJ.
Logo, neste aspecto, merece provimento o recurso do INSS e a remessa oficial para reduzir a verba honorária ao percentual acima mencionado.
Custas Processuais
O INSS é isento do pagamento das custas no Foro Federal (art. 4, I, da Lei nº 9.289/96) e na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul, devendo, contudo, pagar eventuais despesas processuais, como as relacionadas a correio, publicação de editais e condução de oficiais de justiça (artigo 11 da Lei Estadual nº 8.121/85, com a redação da Lei Estadual nº 13.471/2010, já considerada a inconstitucionalidade formal reconhecida na ADI nº 70038755864 julgada pelo Órgão Especial do TJ/RS), isenções estas que não se aplicam quando demandado na Justiça Estadual do Paraná (Súmula 20 do TRF4), devendo ser ressalvado, ainda, que no Estado de Santa Catarina (art. 33, p. único, da Lei Complementar Estadual nº156/97), a autarquia responde pela metade do valor.
Tutela Antecipada
No tocante à antecipação dos efeitos da tutela, entendo que deve ser mantida a sentença no ponto, uma vez que presentes os pressupostos legais para o seu deferimento.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento ao recurso do INSS e à remessa oficial para reduzir a verba honorária para 10% do valor da condenação, excluídas as parcelas vincendas, dar parcial provimento ao recurso da parte autora para fixar o termo inicial dos juros moratórios na data da citação e, de ofício, diferir para a fase de cumprimento de sentença a forma de cálculo dos consectários legais, adotando-se inicialmente o índice da Lei 11.960/2009, restando prejudicada a remessa necessária no ponto.
Juíza Federal GABRIELA PIETSCH SERAFIN
Relatora
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 22/02/2017
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0012292-82.2016.4.04.9999/RS
ORIGEM: RS 00016040920148210078
RELATOR | : | Juíza Federal GABRIELA PIETSCH SERAFIN |
PRESIDENTE | : | Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
PROCURADOR | : | Dr. Flávio Augusto de Andrade Strapason |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELANTE | : | MAICON GENEROSO DOMENEGHINI |
ADVOGADO | : | Julieta Tomedi |
APELADO | : | (Os mesmos) |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 22/02/2017, na seqüência 819, disponibilizada no DE de 09/02/2017, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO DO INSS E À REMESSA OFICIAL PARA REDUZIR A VERBA HONORÁRIA PARA 10% DO VALOR DA CONDENAÇÃO, EXCLUÍDAS AS PARCELAS VINCENDAS, DAR PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO DA PARTE AUTORA PARA FIXAR O TERMO INICIAL DOS JUROS MORATÓRIOS NA DATA DA CITAÇÃO E, DE OFÍCIO, DIFERIR PARA A FASE DE CUMPRIMENTO DE SENTENÇA A FORMA DE CÁLCULO DOS CONSECTÁRIOS LEGAIS, ADOTANDO-SE INICIALMENTE O ÍNDICE DA LEI 11.960/2009, RESTANDO PREJUDICADA A REMESSA NECESSÁRIA NO PONTO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Juíza Federal GABRIELA PIETSCH SERAFIN |
VOTANTE(S) | : | Juíza Federal GABRIELA PIETSCH SERAFIN |
: | Juíza Federal MARINA VASQUES DUARTE DE BARROS FALCÃO | |
: | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
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