Apelação Cível Nº 5005434-08.2020.4.04.9999/PR
RELATOR: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ROSELI FERREIRA DOS SANTOS
RELATÓRIO
A parte autora ajuizou ação contra o INSS, pleiteando a concessão de pensão por morte em razão do óbito de Flavio Henrique dos Santos do Nascimento, desde a Data de Entrada do Requerimento administrativo (DER) em 25.09.2014.
Processado o feito, sobreveio sentença, publicada em 30.10.2019, por meio da qual o Juízo a quo julgou o pedido nos seguintes termos (ev. 43):
Em suas razões recursais (ev. 50), o INSS requer a reforma da sentença, sustentando, primeiramente, a tempestividade o recurso, bem como postulando o conhecimento da remessa oficial. No mérito, alega não ter restado comprovada a dependência econômica da autora em relação ao falecido filho, uma vez que este, nos dois últimos anos de vida, recebeu auxílio-doença em valor pouco superior ao mínimo, enquanto a mãe efetuou recolhimentos como contribuinte individual e manteve vínculo empregatício como servidora pública municipal.
Com contrarrazões, vieram os autos a esta Corte.
É o relatório.
Peço dia para julgamento.
VOTO
Remessa Oficial
Nos termos do artigo 496 do Código de Processo Civil (2015), está sujeita à remessa ex officio a sentença prolatada contra as pessoas jurídicas de direito público nele nominadas - à exceção dos casos em que, por simples cálculos aritméticos, seja possível concluir que o montante da condenação ou o proveito econômico obtido na causa é inferior a 1.000 salários mínimos.
Assim estabelecidos os parâmetros da remessa ex officio, registro que o artigo 29, § 2º, da Lei n. 8.213, de 1991 dispõe que o valor do salário de benefício não será superior ao limite máximo do salário de contribuição na data de início do benefício, e que a Portaria nº 914, de 13.01.2020, do Ministério da Economia, estabelece que a partir de 01.01.2020 o valor máximo do teto dos salários de benefícios pagos pelo INSS é de R$ 6.101,06. Decorrentemente, por meio de simples cálculos aritméticos é possível concluir que, mesmo na hipótese de concessão de benefício com renda mensal inicial (RMI) estabelecida no teto máximo, com o pagamento das parcelas em atraso nos últimos 05 anos acrescidas de correção monetária e juros de mora (artigo 103, parágrafo único, da Lei nº 8.213/91), o valor da condenação jamais excederá o montante de 1.000 salários mínimos.
Nesse sentido, o entendimento do Superior Tribunal de Justiça:
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. INEXISTÊNCIA. SENTENÇA ILÍQUIDA. CPC/2015. NOVOS PARÂMETROS. CONDENAÇÃO OU PROVEITO ECONÔMICO INFERIOR A MIL SALÁRIOS MÍNIMOS. REMESSA NECESSÁRIA. DISPENSA. 1. Conforme estabelecido pelo Plenário do STJ, "aos recursos interpostos com fundamento no CPC de 2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC" (Enunciado Administrativo n. 3). 2. Não merece acolhimento a pretensão de reforma do julgado por negativa de prestação jurisdicional, porquanto, no acórdão impugnado, o Tribunal a quo apreciou fundamentadamente a controvérsia, apontando as razões de seu convencimento, em sentido contrário à postulação recursal, o que não se confunde com o vício apontado. 3. A controvérsia cinge-se ao cabimento da remessa necessária nas sentenças ilíquidas proferidas em desfavor da Autarquia Previdenciária após a entrada em vigor do Código de Processo Civil/2015. 4. A orientação da Súmula 490 do STJ não se aplica às sentenças ilíquidas nos feitos de natureza previdenciária a partir dos novos parâmetros definidos no art. 496, § 3º, I, do CPC/2015, que dispensa do duplo grau obrigatório as sentenças contra a União e suas autarquias cujo valor da condenação ou do proveito econômico seja inferior a mil salários mínimos. 5. A elevação do limite para conhecimento da remessa necessária significa uma opção pela preponderância dos princípios da eficiência e da celeridade na busca pela duração razoável do processo, pois, além dos critérios previstos no § 4º do art. 496 do CPC/15, o legislador elegeu também o do impacto econômico para impor a referida condição de eficácia de sentença proferida em desfavor da Fazenda Pública (§ 3º). 6. A novel orientação legal atua positivamente tanto como meio de otimização da prestação jurisdicional - ao tempo em que desafoga as pautas dos Tribunais - quanto como de transferência aos entes públicos e suas respectivas autarquias e fundações da prerrogativa exclusiva sobre a rediscussão da causa, que se dará por meio da interposição de recurso voluntário. 7. Não obstante a aparente iliquidez das condenações em causas de natureza previdenciária, a sentença que defere benefício previdenciário é espécie absolutamente mensurável, visto que pode ser aferível por simples cálculos aritméticos, os quais são expressamente previstos na lei de regência, e são realizados pelo próprio INSS. 8. Na vigência do Código Processual anterior, a possibilidade de as causas de natureza previdenciária ultrapassarem o teto de sessenta salários mínimos era bem mais factível, considerado o valor da condenação atualizado monetariamente. 9. Após o Código de Processo Civil/2015, ainda que o benefício previdenciário seja concedido com base no teto máximo, observada a prescrição quinquenal, com os acréscimos de juros, correção monetária e demais despesas de sucumbência, não se vislumbra, em regra, como uma condenação na esfera previdenciária venha a alcançar os mil salários mínimos, cifra que no ano de 2016, época da propositura da presente ação, superava R$ 880.000,00 (oitocentos e oitenta mil reais). 9. Recurso especial a que se nega provimento. (REsp 1735097/RS, Rel. Min. GURGEL DE FARIA, 1ª T., DJe 11.10.2019)
Logo, não se trata de hipótese de sujeição da sentença à remessa ex officio.
Tempestividade da Apelação
Verifica-se que o prazo recursal teve início em 19.11.2019 (ev. 50), de maneira que o recurso interposto pela Autarquia é tempestivo.
Pensão por Morte
A Lei 8.213/1991, que dispõe sobre os benefícios da Previdência Social, preceitua em seu art. 74 ser devida pensão por morte aos dependentes do segurado falecido, não sendo exigido o cumprimento de carência (art. 26, I).
Assim, a concessão do benefício de pensão por morte depende do preenchimento dos seguintes requisitos: a) a ocorrência do evento morte; b) a condição de dependente de quem objetiva a pensão; c) a demonstração da qualidade de segurado do de cujus por ocasião do óbito.
Além disso, rege-se o benefício pela legislação vigente à época do falecimento.
Sobre a condição de dependência para fins previdenciários, dispõe o artigo 16 da Lei 8.213/91:
Art. 16. São beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condição de dependentes do segurado:
I - o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido; [redação alterada pela Lei nº 9.032/95]
II - os pais;
III - o irmão não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido; [redação alterada pela Lei nº 9.032/95]
IV - REVOGADO pela Lei nº 9.032/95.
§ 1º A existência de dependente de qualquer das classes deste artigo exclui do direito às prestações os das classes seguintes.
§ 2º O enteado e o menor tutelado equiparam-se a filho mediante declaração do segurado e desde que comprovada a dependência econômica na forma estabelecida no Regulamento. [redação alterada pela MP nº 1.523/96, reeditada até a conversão na Lei nº 9.528/97]
§ 3º Considera-se companheira ou companheiro a pessoa que, sem ser casada, mantém união estável com o segurado ou com a segurada, de acordo com o § 3º do art. 226 da Constituição Federal.
§ 4º A dependência econômica das pessoas indicadas no inciso I é presumida e a das demais deve ser comprovada.
O dependente, assim considerado na legislação previdenciária, pode valer-se de amplo espectro probatório de sua condição, seja para comprovar a relação de parentesco, seja para comprovar a dependência econômica. Esta pode ser parcial, devendo, contudo, representar um auxílio substancial, permanente e necessário, cuja falta acarretaria desequilíbrio dos meios de subsistência do dependente (Enunciado. 13 do Conselho de Recursos da Previdência Social - CRPS).
A dependência econômica dos genitores em relação aos filhos não é presumida, devendo ser comprovada, a teor do disposto no art. 16, inciso II, c/c § 4º, da Lei nº 8.213/1991.
Nesse sentido:
PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. DECISÃO PROFERIDA PELO RELATOR. PREVISÃO LEGAL. ART. 557, CAPUT, DO CPC. AÇÃO POSTULANDO PENSÃO DE FILHO. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA. NECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO. (...) 2. O julgamento do recurso, no presente caso, se deu pela via monocrática em razão de estar em contrariedade com a jurisprudência dominante desta Corte, segundo a qual, a teor do disposto no § 4º do inciso II do art. 16 da Lei 8.213/91, a dependência econômica da mãe em relação ao filho segurado falecido, para efeito de concessão de pensão por morte, não é presumida, mas deve ser comprovada.(...) (AgRg no AREsp 219.426/PR, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, 1ª T., j. 13.08.2013)
Outrossim, de acordo com a jurisprudência deste Tribunal Regional Federal, não há, na Lei nº 8.213/1991, exigência da exclusiva dependência econômica dos pais em relação aos filhos, sendo necessário, porém, que o auxílio prestado pelo filho falecido fosse substancial, indispensável à sobrevivência ou à manutenção dos genitores, para fins de ensejar o direito à pensão por morte (AC 0019172-61.2014.404.9999, 5ª T., Rel. Des. Federal Rogerio Favreto, D.E. 26.02.2015; APELREEX 0019142-26.2014.404.9999, 6ª T., Rel. Des. Federal Vânia Hack de Almeida, D.E. 04.12.2014).
Caso Concreto
O óbito de Flavio Henrique dos Santos do Nascimento, filho da autora, ocorreu em 23.09.2014 (ev. 1, outros 8).
A qualidade de segurado do falecido por ocasião do óbito não é contestada nesta ação, restando incontroversa.
A controvérsia, portanto, no caso, está limitada à discussão acerca da qualidade de dependente da autora da ação por ocasião do falecimento de seu filho.
Não obstante o entendimento manifestado na r. sentença, tenho que assiste razão ao INSS.
Com efeito, como se vê da documentação acostada ao ev. 14, outros 3, p. 6, o falecido, nos dois anos que antecederam seu óbito, percebeu auxílio-doença no valor de R$ 866,66, quando o salário-mínimo equivalia a R$ 724,00. Mesmo antes de receber o benefício, aliás, observa-se que a remuneração dele sempre foi pouco superior ao mínimo (ev. 50, outros 3).
Por outro lado. na mesma época, a autora não só recolhia contribuições como contribuinte individual, como mantinha vínculo como servidora estatutária do Município de São João do Caiuá (ev. 14, outros 3, p. 4), percebendo R$ 1.238,04, consoante informações extraídas do portal da transparência respectivo:
Ora, consoante remansosa orientação pretoriana, a existência de suficiente fonte de renda afasta a categoria jurídica de dependência econômica, requisito necessário à pensão dos dependentes de classe diversa da primeira - art. 16, § 4º, da Lei nº 8.213/91 (TRF4, AC n. 2001.04.01.063998-0, 6ª Turma, Rel. Néfi Cordeiro, DJU 23-07-2003).
Nesses termos, tenho que as eventuais despesas suportadas pelo falecido configuravam mero auxílio no orçamento familiar, não se revestindo do caráter substancial necessário ao reconhecimento da dependência econômica.
Sendo assim, deve ser reformada a sentença para julgar improcedente o pedido.
Honorários Advocatícios
Reformada a sentença e invertida a sucumbência, fixo a verba honorária em 10% sobre o valor atualizado da causa, cuja exigibilidade fica suspensa em face do benefício da gratuidade da justiça.
Custas
Inexigibilidade temporária também das custas, em face do benefício da assistência judiciária gratuita em favor da parte autora.
Tutela Antecipada
Reformada a sentença para afastar a concessão do benefício, deve ser cassada a antecipação da tutela concedida na sentença.
Prequestionamento
Objetivando possibilitar o acesso das partes às Instâncias Superiores, considero prequestionadas as matérias constitucionais e/ou legais suscitadas nos autos, conquanto não referidos expressamente os respectivos artigos na fundamentação do voto, nos termos do art. 1.025 do Código de Processo Civil.
Conclusão
- remessa ex officio: não conhecida;
- apelação: provida;
- cassada a antecipação da tutela.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por não conhecer da remessa oficial, dar provimento à apelação do INSS e cassar a antecipação da tutela.
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Apelação Cível Nº 5005434-08.2020.4.04.9999/PR
RELATOR: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ROSELI FERREIRA DOS SANTOS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. pensão por morte. REQUISITOS. VÍNCULO DE DEPENDÊNCIA ECONÔMICA Dos GENITORes com o FILHo SEGURADo.
1. A concessão do benefício de pensão por morte depende do preenchimento dos seguintes requisitos: a) a ocorrência do evento morte; b) a condição de dependente de quem objetiva a pensão; c) a demonstração da qualidade de segurado do de cujus por ocasião do óbito. O benefício independe de carência e é regido pela legislação vigente à época do óbito.
2. A dependência econômica dos genitores em relação aos filhos não é presumida, devendo ser comprovada, a teor do disposto no artigo 16, inciso II c/c § 4º, da Lei nº 8.213/91. Para auferir o quadro de dependência econômica, não se exige que esta seja plena ou comprovada apenas documentalmente, como tampouco um início de prova material, mas deve ser lastreada em evidências concretas de aportes regulares e significativos ao sustento da parte-requerente, consubstanciando-se em mais do que simples ajuda financeira aos pais.
3. Ausente a prova do preenchimento de todos os requisitos legais, não é possível a concessão do benefício à parte autora.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar do Paraná do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, não conhecer da remessa oficial, dar provimento à apelação do INSS e cassar a antecipação da tutela, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Curitiba, 12 de agosto de 2020.
Documento eletrônico assinado por MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001707264v3 e do código CRC b9481fe6.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 04/08/2020 A 12/08/2020
Apelação Cível Nº 5005434-08.2020.4.04.9999/PR
RELATOR: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
PRESIDENTE: Desembargador Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ROSELI FERREIRA DOS SANTOS
ADVOGADO: CYNTIA LUCIANA NERI BOREGAS PEDRAZZOLI (OAB PR030146)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 04/08/2020, às 00:00, a 12/08/2020, às 16:00, na sequência 1302, disponibilizada no DE de 24/07/2020.
Certifico que a Turma Regional suplementar do Paraná, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PARANÁ DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NÃO CONHECER DA REMESSA OFICIAL, DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS E CASSAR A ANTECIPAÇÃO DA TUTELA.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
Votante: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
Votante: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
Votante: Desembargador Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA
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