Apelação/Remessa Necessária Nº 5006349-28.2018.4.04.9999/RS
RELATOR: Juiz Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: UTELLINA DONATI FONTANELLA
RELATÓRIO
Cuida-se de apelação e reexame necessário de sentença publicada em 01/02/2016 na qual o juízo a quo julgou procedente o pedido, lançando o seguinte dispositivo:
Em razão do exposto, com fulcro no artigo 269, inciso l, do Código de Processo Civil, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido deduzido por UTELLINA DONATI FONTANELLA em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL- INSS, para o efeito: a) determinar ao réu a concessão do benefício de pensão por morte em favor da autora pelo falecimento de Agostinho Fontanella, a contar de 19 de abril de 1987; a.1) conceder antecipação de tutela e detemminar a implantaçao imediata do benefício em favor da parte autora, a ser efetivada em 5 (cinco) dias, mormente pelo seu caráter alimentar e necessidade de efetivação imediata dos direitos sociais fundamentais. b) condenar o réu a pagar os valores atrasados relativos à pensão por morte em favor da autora, obsen/ando-se a prescrição quinquenal (anterior ao ajuizamento da ação), ou seja, deverá o requerido pagar as parcelas a partir de 17 de junho de 2003. As parcelas vencidas, dessarte, nos termos da fundamentação supra, deverão ser corrigidas e acrescidas de juros (desde o vencimento das prestações), da seguinte forma (consoante evolução legislativa e jurisprudencial acerca dos consectários legais nas condenações contra a Fazenda Pública): - de 17/06/2003 (termo inicial da condenação das prestações pretéritas em razão da prescrição quinquenal) até 29/06/2009 (véspera da entrada em vigor da lei 11.960/2009 que alterou a lei 9.494/97) acrescida de correção monetária pelo INPC e juros legais de 1% ao mês. - De 30/06/2009 (entrada em vigor da lei 11.960/2009) até 25/03/2015 (data da modulação dos efeitos das ADI's 4357 e 4425 pelo STF) acrescida de correção monetária pela TR e juros nos mesmos moldes da caderneta de poupança, nos termos do art. 1°-F da lei 9494/97. - De 25/03/2015 (Data da modulação dos efeitos das ADI's 4357 e 4425 pelo STF) em diante, acréscimo de correção monetária pelo IPCA-E e juros conforme os da caderneta de poupança (eis que a condenação versa sobre débito não tributário, caso o débito fosse tributário o juros seriam calculados pela taxa Selic). Diante da sucumbência recíproca condeno a parte autora ao pagamento de 50% das custas e dos honorários dos procuradores do requerido, os quais fixo em R$ 1.500,00 (mil e quinhentos reais), em observância ao parágrafo 49 do art. 20 do CPC, cuja exigibilidade suspendo em razão da parte autora ser beneficiária da AJG (fls. 51). Ainda, condeno o réu ao pagamento de honorários advocatícios em favor dos procuradores da autora, na importância correspondente a 10% (dez por cento) do valor das parcelas objeto da condenação vencidas até a data da publicação da presente sentença, nos termos do Enunciado de Súmula nº 111 do Superior Tribunal de Justiça, forte o disposto no §49 do artigo 20 do Código de Processo Civil, tendo em vista os vetores estabelecidos nas alíneas "a", "b" e "c" do §39 do mesmo artigo, tais como a natureza da causa, a complexidade da matéria e o tempo de duração do processo. O réu é isento de custas processuais, nos termos do artigo 11, da Lei Estadual n9 8.121/85, com a redação dada pela Lei nº 13.471/2010. Sentenca sujeita a reexame necessário. Observe-se a prioridade na tramitação (Meta 2 CNJ). Publique-se. Registre-se. lntimem-se.
O INSS requereu a reforma da sentença diante da impossibilidade de cumulação da aposentadoria por velhice do trabalhador rural e pensão por morte rural sob a égide da LC 16/73. Subsidiariamente, requereu a aplicação da integralidade da disciplina da Lei nº 11.960/09 e, por fim, prequestionou a matéria debatida.
Processado o feito e por força da remessa oficial, vieram os autos a esta Corte para julgamento.
É o relatório.
VOTO
Do Direito Intertemporal
Aprecia-se o presente recurso sob a vigência da Lei n.º 13.105/15, o novo Código de Processo Civil, sendo necessário obviar, diante dos princípios constitucionais da irretroatividade e da imediatidade da lei processual, expressamente adotados no art. 14, inc. II e 1.046, caput do referido diploma processual e diante do princípio tempus regit actum, segundo o qual cada ato processual deve ser analisado segundo a lei vigente à época de sua realização, que considero adequada a aplicação da Teoria dos Atos Processuais Isolados para a solução de aparente antinomia entre as normas possivelmente aplicáveis.
Assim sendo, explicito a lei aplicável segundo o critério supra descrito. Será considerada aplicável a lei da data:
(a) do ajuizamento da ação, para a verificação dos pressupostos processuais e das condições da ação;
(b) da citação (em razão do surgimento do ônus de defesa), para a determinação do procedimento adequado à resposta do réu, inclusive quanto a seus efeitos;
(c) do despacho que admitir ou determinar a produção probatória, para o procedimento a ser adotado, inclusive no que diz respeito à existência de cerceamento de defesa;
(d) da publicação da sentença (entendida esta como o momento em que é entregue em cartório ou em que é tornado público o resultado do julgamento), para fins de verificação dos requisitos de admissibilidade dos recursos, de seus efeitos, da sujeição da decisão à remessa necessária, da aplicabilidade das disposições relativas aos honorários advocatícios, bem como de sua majoração em grau recursal.
Remessa Oficial
Nos termos da decisão da Corte Especial do STJ (EREsp nº 934642/PR), em matéria previdenciária, as sentenças proferidas contra o Instituto Nacional do Seguro Social só não estarão sujeitas ao duplo grau obrigatório caso a condenação for de valor certo (líquido) inferior a sessenta salários mínimos.
Não sendo esse o caso, conheço da remessa oficial.
Da habilitação
Nos termos do art. 112 da LBPS e diante da concordância expressa do INSS, homologo a habilitação de Iria Ilse Garmatz, Fátima Fontanella Doebber, Ires Maria Fontanella Garmatz, Lesia Fátima lanzarin, Rita Joana Fontanella Schacher e, na representação de Olmir César Fontanella, Rafael Fontanella e Caroline Fontanella, nos créditos da falecida Utellina Donati Fontanella.
Anote a secretaria.
Da prescrição
Em se tratando de obrigação de trato sucessivo e de verba alimentar, não há falar em prescrição do fundo de direito. Contudo, são atingidas pela prescrição as parcelas vencidas antes do quinquênio anterior à propositura da ação, conforme os termos do parágrafo único do art. 103 da Lei nº 8.213/91 e da Súmula 85/STJ.
No caso em tela, considerando que o benefício é devido a contar de 01/04/1987 e que a ação foi ajuizada em 18/06/2008, estão prescritas as parcelas anteriores a junho de 2003.
Da pensão por morte
No que diz respeito à pensão por morte, há que se referir que o aludido benefício rege-se pela legislação vigente quando da sua causa legal, pois tempus regit actum. No caso, tendo o óbito ocorrido em 19/02/1965 (evento 3, ANEXOS PET4, p. 12), são aplicáveis as disposições da LC 11/71, da Lei Orgânica da Previdência Social (LOPS - Lei 3.087/60) e da Lei 7.604/87, que assim estatuíam:
LC 11/71:
Art. 6º. A pensão por morte do trabalhador rural, concedida segundo a ordem preferencial dos dependentes, consistirá numa prestação mensal equivalente a 50% (cinquenta por cento) do salário-mínimo de maior valor no País.
Art. 3º. São beneficiários do Programa de Assistência instituído nesta Lei Complementar o trabalhador rural e seus dependentes.
§1º. Omissis
§2º. Considera-se dependente o definido como tal na Lei Orgânica da Previdência Social e legislação posterior em relação aos segurados do Sistema Geral de Previdência Social.
LOPS:
Art. 11. Consideram-se dependentes dos segurados, para os efeitos desta Lei:
I - a esposa, o marido inválido, a companheira, mantida há mais de 5 (cinco) anos, os filhos de qualquer condição menores de 18 (dezoito) anos ou inválidos, e as filhas solteiras de qualquer condição, menores de 21 (vinte e um) anos ou inválidas.
II - Omissis
Art. 13. A dependência econômica das pessoas indicadas no item I do art. 11 é presumida e a das demais deve ser comprovada.
Lei 7.604/87:
Art. 4º A pensão de que trata o art. 6º da Lei Complementar nº 11, de 25 de maio de 1971, passará a ser devida a partir de 1º de abril de 1987 aos dependentes do trabalhador rural, falecido em data anterior a 26 de maio de 1971.
Observa-se que foi superada a Súmula 613 do STF:
Os dependentes de trabalhador rural não têm direito à pensão previdenciária, se o óbito ocorreu anteriormente à vigência da Lei Complementar nº 11/71. DJ 31/10/1984.
Em cumprimento à orientação constitucional este foi o entendimento desta Corte, como exemplificam os seguintes arestos:
PREVIDENCIA SOCIAL. PENSÃO DE VIUVA DE TRABALHADOR RURAL. FIRMOU-SE A JURISPRUDENCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL NO SENTIDO DO ENUNCIADO DA SUMULA 613: 'OS DEPENDENTES DE TRABALHADOR RURAL NÃO TEM DIREITO A PENSÃO PREVIDENCIARIA, SE O OBITO OCORREU ANTERIORMENTE A VIGENCIA DA LEI COMPLEMENTAR 11/71.'. (TRF4, AC 89.04.17660-3, TERCEIRA TURMA, Relator para Acórdão SILVIO DOBROWOLSKI, DJ 29/11/1989)
PREVIDENCIARIO. FUNRURAL. APOSENTADORIA INVALIDEZ. ACIDENTE OCORRIDO EM 1962. DESCABIMENTO. NÃO FAZ JUZ A APOSENTADORIA INVALIDEZ PELO FUNRURAL, AQUELE QUE SOFREU ACIDENTE, RESULTANDO INVALIDO, MUITOS ANOS DA INSTITUIÇÃO DO SISTEMA. EFICACIA 'AD FUTURUM' DA LEI E FALTA DE FONTE DE CUSTEIO (CONSTITUIÇÃO DE 1969, ARTIGO 165, PARAGRAFO UNICO), A INVIABILIZAR A PRETENSÃO (TRF4, AC 89.04.00962-6, TERCEIRA TURMA, Relator SILVIO DOBROWOLSKI, DJ 01/08/1990)
Entretanto, com o tempo, foi alterada a orientação desta Corte, em especial em virtude da previsão contida na Lei nº 7.604/87. Neste sentido:
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE DE TRABALHADOR RURAL. ÓBITO ANTERIOR À LC 11/71. LIMINAR. AUSÊNCIA DE FUMUS BONI IURIS. 1. É devida pensão rural por morte de trabalhador rural mesmo que o óbito tenha ocorrido anteriormente à edição da Lei Complementar nº 11/71, face à previsão expressa do art. 4º da Lei nº 7.604/87. 2. Ausente um dos pressupostos para concessão da liminar, qual seja, o fumus boni iuris, não há como deferir a urgência pretendida. (TRF4, AGRAR 96.04.05393-0, TERCEIRA SEÇÃO, Relator TADAAQUI HIROSE, DJ 02/02/2000)
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. TRABALHADOR RURAL. ÓBITO ANTERIOR A 26-05-1971. LC 11/71. LEI 7.604/87. QUALIDADE DE SEGURADO. INÍCIO RAZOÁVEL DE PROVA MATERIAL. PROVA TESTEMUNHAL. DEPENDÊNCIA DO CÔNJUGE PRESUMIDA. 1. Nos termos do art. 4º da Lei nº 7.604, de 26-05-87, deve ser concedida a pensão por morte, com base na LC nº 11/71, que estendeu os benefícios previdenciários aos trabalhadores rurais e seus dependentes, a partir de 1º de abril de 1987, nos casos em que o óbito ocorreu em data anterior a 26-05-1971. 2. Considera-se comprovado o exercício de atividade rural e a condição de segurado especial do de cujus havendo início de prova material corroborada por prova testemunhal idônea e consistente, contemporânea à data do óbito, circunstância que enseja a concessão do benefício de pensão ao seu dependente previdenciário. 3. Segundo o art. 16, inciso I, da Lei 8.213/91, são beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condição de dependentes do segurado, dentre outros, o cônjuge, cuja dependência é presumida, nos termos do § 4º, do mesmo artigo. 4. Comprovada qualidade de segurado do falecido e o matrimônio com a autora, é devida a pensão por morte à mesma. (TRF4, AC 2002.04.01.018906-0, QUINTA TURMA, Relator OTÁVIO ROBERTO PAMPLONA, DJ 13/07/2005)
DECISÃO: Trata-se de agravo de instrumento interposto em face de decisão que, nos autos de ação ordinária objetivando a concessão de pensão por morte, deferiu o pedido de antecipação de tutela. Assevera o agravante que não estão presentes a verossimilhança da alegação e o fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação, nos termos do art. 273 do CPC. Aduz, também, a irreversibilidade do provimento antecipatório, salientando que tal requisito negativo não foi examinado pelo julgador a quo, sendo nula a decisão. Refere que o demandante postulou a concessão de pensão por morte ocorrida em 23/06/1957, quando sequer havia previsão do referido amparo ao trabalhador rural. É o relatório. Decido. Quanto ao deferimento da antecipação de tutela inaudita altera parte, tenho que, convencendo-se da verossimilhança da alegação contida na inicial, e consideradas a natureza alimentar do benefício, bem assim a impossibilidade de a parte autora exercer atividade laborativa que lhe possa prover o sustento, nada impede que se defira a pretendida medida, postergando o contraditório, até mesmo porque, consoante prescreve o art. 273, § 4º, do CPC, "a tutela antecipada poderá ser revogada ou modificada a qualquer tempo, em decisão fundamentada". Na hipótese em apreço, o autor ajuizou ação ordinária alegando ser incapaz em razão de deficiência mental e, na qualidade de dependente, postulou a concessão do benefício de pensão por morte, decorrente do óbito de seu pai, ocorrido em 23/06/1957 (fl. 39), requerendo a antecipação dos efeitos da tutela. Entretanto, no caso em tela, a verossimilhança do direito alegado não se encontra evidenciada, ao menos em sede de cognição sumária. Isso porque, conforme Enunciado da Súmula 613 do STF, "Os dependentes de trabalhador rural não têm direito à pensão previdenciária, se o óbito ocorreu anteriormente à vigência da lei complementar 11/1971", como se verifica no presente caso. Ademais, não resta caracterizado o perigo de dano irreparável ou de difícil reparação, uma vez que a decisão se reporta à hipótese fática ocorrida há mais de 50 anos, de modo que resta mitigada a urgência da medida. Vale registrar, ainda, que o demandante já recebe pensão por morte decorrente do falecimento de sua mãe (fl. 65), não estando desprovido de recursos. Assim, impõe a razoabilidade que se aguarde a instrução do feito. Do exposto, defiro o pedido de efeito suspensivo. Intimem-se, sendo o agravado para os fins do art. 527, V, do CPC. Publique-se. Comunique-se. Após, ao MPF. (TRF4, AG 0005987-48.2012.4.04.0000, QUINTA TURMA, Relator RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA, D.E. 26/06/2012)
Assim, entendo que diante da referida alteração legislativa, não mais persiste a orientação do STF, que não teve oportunidade de manifestar-se acerca da matéria após a Constituição de 1988.
Desta forma, para fazer jus à pensão por morte, o requerente deve comprovar a qualidade de segurado do de cujus quando do óbito e a dependência econômica, nos casos em que esta não é presumida.
Da qualidade de segurado
O trabalho rural como segurado especial dá-se em regime individual (produtor usufrutuário, possuidor, assentado, parceiro ou meeiro outorgados, comodatário ou arrendatário rurais) ou de economia familiar, este quando o trabalho dos membros da família é indispensável à própria subsistência e ao desenvolvimento socioeconômico do núcleo familiar e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados permanentes (art. 11, VII e § 1º da Lei nº 8.213/91).
A atividade rural de segurado especial deve ser comprovada mediante início de prova material, complementada por prova testemunhal idônea, não sendo esta admitida exclusivamente, a teor do art. 55, § 3º, da Lei 8.213/91, e súmula 149 do STJ.
Desde logo ressalto que somente excluirá a condição de segurado especial a presença ordinária de assalariados - insuficiente a tanto o mero registro em ITR ou a qualificação como empregador rural (II b) - art. 1º, II, "b", do Decreto-Lei 1166, de 15.04.71. Já o trabalho urbano do cônjuge ou familiar, relevante e duradouro, não afasta a condição de regime de economia familiar quando excluído do grupo de trabalho rural. Finalmente, a constitucional idade mínima de dezesseis anos para o trabalho, como norma protetiva, deve ser interpretada em favor do protegido, não lhe impedindo o reconhecimento de direitos trabalhistas ou previdenciários quando tenham efetivamente desenvolvido a atividade laboral.
Quanto ao início de prova material, necessário a todo reconhecimento de tempo de serviço (§ 3º do art. 56 da Lei nº 8.213/91 e Súmula 149/STJ), por ser apenas inicial, tem sua exigência suprida pela indicação contemporânea em documentos do trabalho exercido, embora não necessariamente ano a ano, mesmo fora do exemplificativo rol legal (art. 106 da Lei nº 8.213/91), ou em nome de integrantes do grupo familiar (Admite-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental - Súmula 73 do TRF 4ª Região).
Nos casos de trabalhadores informais, especialmente em labor rural de bóia-fria, a dificuldade de obtenção de documentos permite maior abrangência na admissão do requisito legal de início de prova material, valendo como tal documentos não contemporâneos ou mesmo em nome terceiros (patrões, donos de terras arrendadas, integrantes do grupo familiar ou de trabalho rural). Se também ao bóia-fria é exigida prova documental do labor rural, o que com isto se admite é mais amplo do que seria exigível de um trabalhador urbano, que rotineiramente registra suas relações de emprego.
Do caso concreto
Como início de prova material do labor rural juntou a parte autora os seguintes documentos:
a) certidão de óbito, datada de 27/02/2008, referente a assento lavrado em 03/03/1965, em que o falecido Agostinho Fontanella foi qualificado como agricultor (evento 3, ANEXOS PET4, p. 12);
b) certidão de casamento da autora e do falecido, datada de 25/09/1948, em que o nubente foi qualificado como agricultor (evento 3, ANEXOS PET4, p. 13);
c) formal de partilha de lote colonial indicado como terra de cultura da herança de Agostinho Fontanella (evento 3, ANEXOS PET4, p. 16-24);
d) notas fiscais de entrada de feijão, emitida pela SAMRIG de produtos remetidos por Ortenila Fontanella datadas de 03/07/1974, 30/04/1975 (pp. 26 e 28); de soja, remetida por Ortenila Fontanella datada de 09/05/1977 (evento 3, ANEXOS PET4, p. 34)
e) nota fiscal de produtor expedida por Ortenila Fontanella, datadas de 27/04/1976 (p. 29) e 25/11/1976 (p. 33), 13/04/1977 (p. 35), 03/04/1978 (p. 36), 29/03/1978 (p. 37).
f) nota de moagem ou benefíciamento expedida em favor de Ortenila Fontanella por Moinho Colorado Ltda. Indústria e Comércio, datada 11/02/1976 (evento 3, ANEXOS PET4, p. 30);
g) aviso de débito relativo ao ITR de propriedade rural do Município de Colorado, em nome de Hortelina Fontanella e filhos, datada de 30/03/1972 (evento 3, ANEXOS PET4, p. 38);
h) certificados de cadastro perante ao Ministério da Agricultura relativo ao ITR de propriedade rural no município de Colorado, em nome de Utenila Donatti Fontanella, referente aos exercícios de 1971, 1980, 1976, 1973 (evento 3, ANEXOS PET4, pp. 39, 40, 42, 43);
j) guia de recolhimento de contribuição sindical emitida pelo Sindicato dos Trabalhadoresa Rurais de Colorado em nome de Ortenila Fontanella, referente ao exercício de 1964 a 1969 (evento 3, ANEXOS PET4, p. 41).
Considero presente o início de prova material necessário, apesar de terem sido apresentados documentos com data posterior ao óbito que, por esta razão, não podem ser considerados como início de prova material da atividade rural (alíneas "d" a "h") e declaração de entidade sindical (alínea "j") sem a devida homologação do INSS (art. 106, inc. III, da Lei nº 8.213/91), que não constitui início de prova material do exercício de atividade rurícola, pois extemporânea ao fatos narrado, equivalendo apenas a mero testemunho reduzido a termo (STJ, AgRg no Resp nº 416.971, Rel. Min. Hélio Quaglia Barbosa, T6, U. DJ 27-03-06, p. 349, e AR nº 2.454, Rel. Min. José Arnaldo da Fonseca, S3, U. DJ 03-11-04, p. 131).
A prova material juntada aos autos foi devidamente corroborada pela prova testemunhal colhida em audiência de instrução, transcrita na sentença (evento 3, SENT43), nos seguintes termos:
A testemunha Américo Gobbi (CD da fl. 73) confirmou que a autora foi casada, porém, não recordava o nome do esposo, somente sabia informar que o esposo era falecido há mais de 40 anos. Informou que o esposo era agricultor, sendo que a autora auxiliava no cultivo da terra (16 hectares). Afirmou que plantavam feijao, arroz, mandioca, sem auxílio de maquinário e empregados.
A testemunha Virgílio Lanzarin (CD da fl. 73) referiu que conhecia a autora há mais de 30 (trinta) anos, bem como que tinha conhecimento de que a autora e seu esposo exerciam a atividade campesina, sem empregados e sem auxílio de maquinário. Afirmou que cultivavam uma área de aproximadamente 16 hectares, na qual plantavam diversas culturas.
A testemunha Maximico Secco (CD da fl. 73) declarou que conhecia a autora desde 1985, sendo que ela sempre exerceu a atividade agricola. Sustentou que tinha conhecimento, por comentários, de que a autora e seu esposo sempre exerceram atividade agrícola, na propriedade de aproximadamente 18 hectares, na qual plantavam várias culturas, milho, feijão, entre outras.
Assim, considero presente início de prova material, complementada por prova oral, no período controverso, é devida a admissão da condição do falecido como segurado especial à época do óbito.
Da condição de dependente
Não há controvérsia acerca da condição de dependente da autora, viúva do falecido, nos termos da certidão de casamento apresentada (evento 3, ANEXOS PET4, p. 13).
Da cumulação de benefícios
Alega o INSS que, de acordo com a LC 16/73 são inacumuláveis os benefícios de pensão por morte e aposentadoria por invalidez. Observe-se o teor da referida lei complementar:
Art. 6 º É fixada, a partir de janeiro de 1974, em 50% (cinquenta por cento) do salário mínimo de maior valor vigente no País, a mensalidade da pensão de que trata o artigo 6º, da Lei Complementar nº 11, de 25 de maio de 1971.
§.1º A pensão não será diminuída por redução do número de dependentes do trabalhador rural chefe ou arrimo da unidade familiar falecido, e o seu pagamento será sempre efetuado, pelo valor global, ao dependente que assumir a qualidade de novo chefe ou arrimo da unidade familiar.
§ 2º Fica vedada a acumulação do benefício da pensão com o da aposentadoria por velhice ou por invalidez de que tratam os artigos 4º e 5º da Lei Complementar nº 11, de 25 de maio de 1971, ressalvado ao novo chefe ou arrimo da unidade familiar o direito de optar pela aposentadoria quando a ela fizer jus, sem prejuízo do disposto no parágrafo anterior.
A LC 11/71, em seus artigos 4º e 5º por sua vez dispõe:
Art. 4º A aposentadoria por velhice corresponderá a uma prestação mensal equivalente a 50% (cinqüenta por cento) do salário-mínimo de maior valor no País, e será devida ao trabalhador rural que tiver completado 65 (sessenta e cinco) anos de idade.
Parágrafo único. Não será devida a aposentadoria a mais de um componente da unidade familiar, cabendo apenas o benefício ao respectivo chefe ou arrimo.
Art. 5º A aposentadoria por velhice, corresponderá a uma prestação igual a da aposentadoria por velhice, e com ela não acumulável, devida ao trabalhador vítima de enfermidade ou lesão orgânica, total e definitivamente incapaz para o trabalho, observado o princípio estabelecido no parágrafo único do artigo anterior.
Vê-se que a proibição de acumulação prevista na legislação refere-se a pensão por morte rural e aposentadoria por invalidez rural, as únicas tratadas na Lei Complementar.
A autora fora titular do benefício de aposentadoria por velhice rural até 18/11/2016, quando do seu falecimento (evento 3, APELAÇÃO47, p. 169), sendo inacumulável o benefício postulado.
Deste modo, improcede o pedido da parte autora.
Honorários Advocatícios
Considerando que a sentença recorrida foi publicada antes da entrada em vigor do NCPC, e diante do exposto no tópico relativo ao direito intertemporal, esclareço que são inaplicáveis as regras do CPC ao caso e, portanto, não se determinará a graduação conforme o valor da condenação (art. 85, §3º, I ao V, do CPC/2015), tampouco se estabelecerá a majoração em razão da interposição de recurso (art. 85, §11º, do CPC).
Assim, considerando a reforma do julgado, com a sucumbência de maior monta da parte autora, condeno-a ao pagamento de custas e honorários advocatícios, que fixo em R$ 900,00 (novecentos reais), suspensa a exigibilidade em razão do benefício da gratuidade de justiça.
Da tutela antecipada
A considerar que o benefício foi cessado diante do óbito da autora, desnecesária a revogação da tutela.
Conclusão
Neste contexto, merece provimento a remessa oficial e o apelo do INSS para julgar improcedente o pedido.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar provimento à remessa oficial e ao apelo do INSS.
Documento eletrônico assinado por ALTAIR ANTONIO GREGORIO, Juiz Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40000500035v14 e do código CRC e209b10e.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): ALTAIR ANTONIO GREGORIO
Data e Hora: 12/12/2018, às 17:39:25
Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 15:56:27.
Apelação/Remessa Necessária Nº 5006349-28.2018.4.04.9999/RS
RELATOR: Juiz Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: UTELLINA DONATI FONTANELLA
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. RURAL. ANTERIOR À LC 11/71. cumulação de benefícios. LC 16/73. benefício indevido.
1. Os requisitos para a obtenção do benefício de pensão por morte estão elencados na legislação previdenciária vigente à data do óbito, cabendo a parte interessada preenchê-los. No caso, a parte deve comprovar: (a) ocorrência do evento morte; (b) a qualidade de segurado do de cujus e (c) a condição de dependente de quem objetiva a pensão. 2. Nos termos do art. 4º da Lei nº 7.604/87, deve ser concedida a pensão por morte, com base na LC nº 11/71, desde 01/04/1987, aos casos em que o óbito foi anterior a 26/05/1971. 3. A cumulação de que trata o §2º do art. 6º da LC 16/73 se estabelece entre aposentadoria por idade ou por invalidez rural e a pensão por morte rural, segundo a dicção da própria lei.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade dar provimento à remessa oficial e à apelação do INSS, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 11 de dezembro de 2018.
Documento eletrônico assinado por ALTAIR ANTONIO GREGORIO, Juiz Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40000500036v4 e do código CRC f7a90116.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): ALTAIR ANTONIO GREGORIO
Data e Hora: 12/12/2018, às 17:39:25
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 11/12/2018
Apelação/Remessa Necessária Nº 5006349-28.2018.4.04.9999/RS
RELATOR: Juiz Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO
PRESIDENTE: Juiz Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO
PROCURADOR(A): VITOR HUGO GOMES DA CUNHA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: UTELLINA DONATI FONTANELLA
ADVOGADO: GLAUBER CASARIN
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 11/12/2018, na sequência 324, disponibilizada no DE de 26/11/2018.
Certifico que a 5ª Turma , ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A 5ª TURMA , DECIDIU, POR UNANIMIDADE DAR PROVIMENTO À REMESSA OFICIAL E À APELAÇÃO DO INSS.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Juiz Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO
Votante: Juiz Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO
Votante: Juíza Federal GISELE LEMKE
Votante: Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA
Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 15:56:27.