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Apelação Cível Nº 5051164-43.2019.4.04.7100/RS
RELATOR: Desembargador Federal ROGER RAUPP RIOS
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: JULIO CLOVES ALVES DA SILVA (AUTOR)
ADVOGADO: ALEX SANDRO MEDEIROS DA SILVA (OAB RS078605)
RELATÓRIO
JULIO CLOVES ALVES DA SILVA ajuizou ação de procedimento comum contra o INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS postulando a concessão do benefício de aposentadoria por tempo especial ou por tempo de contribuição, a contar da DER (11/11/2014), mediante o reconhecimento do exercício de atividades especiais.
Processado o feito, sobreveio sentença com o seguinte dispositivo:
III - DISPOSITIVO
Ante o exposto, resolvo o mérito do processo, julgando procedentes os pedidos (CPC, art. 487, I), para condenar o INSS a:
a) averbar como tempo especial e converter para comum pelo fator 1,4 os períodos de 03/12/1977 a 05/08/1978, 01/02/1980 a 01/02/1981, 30/10/1981 a 12/05/1982, 14/01/1983 a 08/03/1983, 24/11/1983 a 02/03/1984, 03/07/1984 a 28/11/1987, 01/02/1989 a 26/04/1991, 29/04/1992 a 18/03/1993, 02/05/1994 a 13/02/1995, 05/07/1995 a 24/01/1996, 25/03/1996 a 23/04/1996, 01/08/1997 a 14/11/2002, 01/04/2004 a 30/11/2006, 02/07/2007 a 17/09/2009 e 08/03/2010 a 11/11/2014;
b) averbar, para fins de carência, o tempo de benefício de auxílio-doença por acidente de trabalho, de 07/02/2014 a 31/05/2015;
c) pagar à parte autora (CONCESSÃO), com RMI a calcular, dentre os benefícios abaixo, o que lhe for mais vantajoso:
c.1) a aposentadoria especial, NB 46/167.832.860-7, desde a DER em 11/11/2014, a qual será cessada se houver continuidade ou retomada do exercício de atividade sujeita a agentes nocivos;
c.2) a aposentadoria integral por tempo de contribuição, com DER/DIB em 11/11/2014.
Nas parcelas vencidas, incidem os seguintes encargos: i) correção monetária: desde o vencimento de cada prestação, pelo mesmo índice utilizado para os reajustamentos dos benefícios do RGPS, sendo o INPC a partir de 04/2006, substituído pelo IPCA-E em 07/2009; ii) juros de mora: desde a citação, pelos índices oficiais de remuneração básica e juros aplicáveis à caderneta de poupança; ou desde que devidas as prestações, se posterior à citação.
Considerando a natureza continuada das relações previdenciárias e a proibição da desaposentação (LBPS, art. 18 e STF, RE 381367, rel. Min. Marco Aurélio; REs 661256 e 827833, rel. Min. Luís Roberto Barroso, julg. em 26/10/2016), se implantada uma aposentadoria diversa da discutida nesta lide, das espécies por tempo de contribuição, por idade e especial, a parte autora deverá escolher entre a manutenção desse benefício ou a substituição pela aposentadoria deferida nos presentes autos, procedendo-se ao encontro de contas da integralidade das prestações, já que são inacumuláveis. Ou seja, deverá a parte autora escolher entre o benefício aqui deferido e o recebimento das respectivas prestações vencidas e vincendas ou a manutenção da aposentadoria implantada pelo INSS, hipótese em que nada será devido pelo benefício discutido neste processo, nem mesmo a título de honorários, afinal não terá havido proveito econômico.
Honorários nos termos da fundamentação.
Custas pelo INSS, o qual é isento (Lei n° 9.289/1996, art. 4°, I).
Publique-se e intimem-se.
Sentença não sujeita à remessa necessária, pois é nula a possibilidade de o valor da condenação atingir o limite mínimo de mil salários mínimos (R$1.045.000,00) estabelecido para essa providência no artigo 496, § 3°, I do CPC 2015. Isso porque, em valores atualizados e acrescidos de juros de mora e honorários advocatícios de 10%, o citado limite somente seria alcançado pela condenação ao pagamento do valor integral das prestações mensais pelo teto previdenciário devidas desde, ao menos, 01/2005. Por esses motivos, deixo de aplicar a Súmula 490 do STJ.
Havendo apelação, intime-se a parte contrária para contrarrazões. Após, remetam-se os autos ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Se não interposta a apelação, certifique-se o trânsito em julgado e proceda-se ao cumprimento da sentença.
Apela o INSS.
Alega: (a) quanto aos intervalos de 03/12/1977 a 05/08/1978, 01/02/1980 a 01/02/1981, 30/10/1981 a 12/05/1982, 14/01/1983 a 08/03/1983, 24/11/1983 a 02/03/1984, 03/07/1984 a 01/10/1986, 02/10/1986 a 28/11/1987, 01/02/1989 a 26/04/1991, 29/04/1992 a 18/03/1993, 05/07/1995 a 24/01/1996 e de 25/03/1996 a 23/04/1996 afirma não ser possível o enquadramento por atividade no período, não tendo sido juntados documentos na esfera administrativa o que, configura, inclusive, ausência de interesse de agir; (b) impossibilidade de reconhecimento do tempo de atividade rural como especial, tendo em vista a inexistência de desempenho de atividade como contratado por empresa agroindustrial ou agrocomercial, sendo necessário o desempenho de atividade agropecuária e não meramente na lavoura ou pecuária; (c) inexistência de enquadramento por categoria profissional "trabalhador na indústria calçadista", não sendo possível a extensão previdenciária à categoria não contemplada em lei sem prévia fonte de custeio; (d) apenas a atividade de fabricação de cimento pode ser considerada especial, não o simples manuseio, sendo que a profissão de pedreiro não se encontra naquelas elencadas no Decreto 53.831/64, que autorizam contagem diferenciada; (e) com relação aos agentes químicos, aponta que a mera referência à expressão genérica hidrocarbonetos é insuficiente à caracterização da nocividade, sendo que a relação dos Decretos é exaustiva, além de necessária avaliação quantitativa; (f) quanto ao ruído, defende a necessidade de, a partir de 18/11/2003, ser adotada a metodologia estabelecida na NHO 01 da FUNDACENTRO; (g) o período de gozo de benefício por incapacidade, ainda que intercalado, não supre o período de carência;.
Apresentadas as contrarrazões, vieram os autos a esta Corte.
A parte autora requereu prioridade de julgamento (evento 3).
É o relatório.
VOTO
Juízo de admissibilidade
Recebo o apelo do INSS, pois cabível, tempestivo e dispensado de preparo.
Preliminar: interesse de agir (períodos de 03/12/1977 a 05/08/1978, 01/02/1980 a 01/02/1981, 30/10/1981 a 12/05/1982, 14/01/1983 a 08/03/1983, 24/11/1983 a 02/03/1984, 03/07/1984 a 01/10/1986, 02/10/1986 a 28/11/1987, 01/02/1989 a 26/04/1991, 29/04/1992 a 18/03/1993, 05/07/1995 a 24/01/1996 e de 25/03/1996 a 23/04/1996)
Com relação ao interesse processual, esta Corte vem entendendo que se houve pedido de aposentadoria na via administrativa com comprovação de tempo laborado, ainda que não instruído de toda a documentação que poderia ser agregada, o indeferimento do pedido pelo INSS tende a ser suficiente para se ter por caracterizada a pretensão resistida.
Nesse sentido, é de se destacar que o Supremo Tribunal Federal ao julgar o RE nº 631.240/MG, em sede de repercussão geral, ao passo que firmou entendimento pela necessidade de prévio requerimento administrativo para a discussão judicial quanto à concessão de benefícios previdenciários, estabeleceu também a prescindibilidade do exaurimento da via administrativa como pressuposto do interesse de agir em juízo.
Na hipótese dos autos, a parte autora ingressou com o requerimento administrativo em 11/11/2014 (evento 1, PROCADM9, p. 1). Assim, independentemente de ter ou não o segurado apresentado a documentação necessária ao reconhecimento do tempo ora controverso, é forçoso reconhecer que, diante da apresentação de requerimento administrativo, houve descumprimento dos deveres decorrentes da boa-fé objetiva por parte do Instituto Previdenciário (dever de informação e orientação do segurado).
Isso porque a anotação do exercício de determinadas atividades em CTPS, já seria suficiente para que o INSS instruísse o segurado a trazer a documentação comprobatória da exposição a eventuais agentes nocivos, nos termos do art. 88 da Lei 8.213/91. No caso dos autos, constam na CTPS (evento 1, PROCADM9, p. 7-14), com relação aos apontados períodos, o exercício de atividades em empresas agrícolas; como servente, pedreiro e carpinteiro na construção civil; ajudante em indústria e serviços gerais e trocador de matriz em indústria calçadista.
Nesse contexto, cabia ao INSS orientar o segurado quanto à necessidade de melhor instruir o pedido, tendo, porém, tratado as atividades como comuns, quando havia indícios de que deveriam ser computadas com os acréscimos legais de tempo.
Assim, resta afastada a preliminar de ausência de interesse de agir.
Mérito
Pontos controvertidos
Nesta instância, são controvertidos os seguintes pontos:
- possibilidade de cômputo do período de gozo de benefício por incapacidade para fins de carência;
- comprovação do exercício de atividades especiais nos 03/12/1977 a 05/08/1978, 01/02/1980 a 01/02/1981, 30/10/1981 a 12/05/1982, 14/01/1983 a 08/03/1983, 24/11/1983 a 02/03/1984, 03/07/1984 a 28/11/1987, 01/02/1989 a 26/04/1991, 29/04/1992 a 18/03/1993, 02/05/1994 a 13/02/1995, 05/07/1995 a 24/01/1996, 25/03/1996 a 23/04/1996, 01/08/1997 a 14/11/2002, 01/04/2004 a 30/11/2006, 02/07/2007 a 17/09/2009 e 08/03/2010 a 11/11/2014;
Período em gozo de auxílio-doença como tempo de contribuição e para fins de carência
De acordo com o art. 55, II, da Lei n. 8.213/91, o tempo em que o segurado esteve usufruindo do benefício de auxílio-doença deve ser contado como carência, desde que esteja intercalado com contribuições recolhidas. Nesse sentido, transcreve-se o referido dispositivo.
"Art. 55. O tempo de serviço será comprovado na forma estabelecida no Regulamento, compreendendo, além do correspondente às atividades de qualquer das categorias de segurados de que trata o art. 11 desta Lei, mesmo que anterior à perda da qualidade de segurado:
(...)
II - o tempo intercalado em que esteve em gozo de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez;"
Recentemente, o tema foi objeto de apreciação pelo Supremo Tribunal Federal, culminando na formulação de tese para o Tema 1.125, com o seguinte teor:
É constitucional o cômputo, para fins de carência, do período no qual o segurado esteve em gozo do benefício de auxílio-doença, desde que intercalado com atividade laborativa.
No caso dos autos, o autor percebeu auxílio-doença por acidente de trabalho de 07/02/2014 a 31/05/2015, tendo voltado a exercer atividade laborativa após a cessação do benefício, razão pela qual deve ser computado como tempo de contribuição e para fins de carência.
Das atividades especiais
Considerações gerais
O reconhecimento da especialidade da atividade é disciplinado pela lei em vigor à época em que efetivamente exercida, passando a integrar, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador. Desse modo, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente uma lei nova que venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial.
Nesse sentido, é a orientação consolidada do Superior Tribunal de Justiça (AgInt no REsp 1603743/RS, Rel. Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, SEGUNDA TURMA, julgado em 21/05/2019, DJe 28/05/2019; REsp 1151363/MG, Rel. Ministro JORGE MUSSI, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 23/03/2011, DJe 05/04/2011) e desta Corte (TRF4, AC 5002503-16.2018.4.04.7117, QUINTA TURMA, Relator OSNI CARDOSO FILHO, juntado aos autos em 25/06/2021; TRF4, AC 5042509-86.2017.4.04.9999, SEXTA TURMA, Relatora TAÍS SCHILLING FERRAZ, juntado aos autos em 17/06/2021; TRF4, ARS 5042818-97.2018.4.04.0000, TERCEIRA SEÇÃO, Relator CELSO KIPPER, juntado aos autos em 06/04/2020).
Dessa forma, considerando a diversidade de diplomas legais que se sucederam na disciplina da matéria, necessário definir qual a legislação aplicável ao caso concreto, ou seja, qual a legislação vigente quando da prestação da atividade pela parte autora.
Tem-se, então, a seguinte evolução legislativa quanto ao tema sub judice:
a) No período de trabalho até 28/04/1995, quando vigente a Lei n.º 3.807/60 (Lei Orgânica da Previdência Social) e suas alterações e, posteriormente, a Lei n.º 8.213/91 (Lei de Benefícios), em sua redação original (arts. 57 e 58), possível o reconhecimento da especialidade do trabalho quando houver a comprovação do exercício de atividade enquadrável como especial nos decretos regulamentadores e/ou na legislação especial, ou quando demonstrada a sujeição do segurado a agentes nocivos por qualquer meio de prova, exceto para os agentes nocivos ruído e calor (STJ, AgRg no REsp n. 941885/SP, Quinta Turma, Rel. Ministro Jorge Mussi, DJe de 04-08-2008; e STJ, REsp n. 639066/RJ, Quinta Turma, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, DJ de 07-11-2005), em que necessária a mensuração de seus níveis por meio de perícia técnica, carreada aos autos ou noticiada em formulário emitido pela empresa, a fim de se verificar a nocividade ou não desses agentes;
b) A partir de 29/04/1995, inclusive, foi definitivamente extinto o enquadramento por categoria profissional - à exceção daquelas a que se refere a Lei n.º 5.527/68, cujo enquadramento por categoria deve ser feito até 13/10/1996, dia anterior à publicação da Medida Provisória n.º 1.523, de 14/10/1996, que revogou expressamente a Lei em questão - de modo que, no interregno compreendido entre 29/04/1995 (ou 14/10/1996) e 05/03/1997, em que vigentes as alterações introduzidas pela Lei n.º 9.032/95 no art. 57 da Lei de Benefícios, necessária a demonstração efetiva de exposição, de forma permanente, não ocasional nem intermitente, a agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, por qualquer meio de prova, considerando-se suficiente, para tanto, a apresentação de formulário-padrão preenchido pela empresa, sem a exigência de embasamento em laudo técnico, ressalvados os agentes nocivos ruído e calor, em relação aos quais é imprescindível a realização de perícia técnica, conforme visto acima;
c) A partir de 06/03/1997, data da entrada em vigor do Decreto n.º 2.172/97, que regulamentou as disposições introduzidas no art. 58 da Lei de Benefícios pela Medida Provisória n.º 1.523/96 (convertida na Lei n.º 9.528/97), passou-se a exigir, para fins de reconhecimento de tempo de serviço especial, a comprovação da efetiva sujeição do segurado a agentes agressivos por meio da apresentação de formulário-padrão, embasado em laudo técnico, ou por meio de perícia técnica.
Observo, ainda, quanto ao enquadramento das categorias profissionais, que devem ser considerados os Decretos n.º 53.831/64 (Quadro Anexo - 2ª parte), n.º 72.771/73 (Quadro II do Anexo) e n.º 83.080/79 (Anexo II) até 28/04/1995, data da extinção do reconhecimento da atividade especial por presunção legal, ressalvadas as exceções acima mencionadas. Já para o enquadramento dos agentes nocivos, devem ser considerados os Decretos n.º 53.831/64 (Quadro Anexo - 1ª parte), n.º 72.771/73 (Quadro I do Anexo) e n.º 83.080/79 (Anexo I) até 05/03/1997, e os Decretos n.º 2.172/97 (Anexo IV) e n.º 3.048/99 a partir de 06/03/1997, ressalvado o agente nocivo ruído, ao qual se aplica também o Decreto n.º 4.882/03. Além dessas hipóteses de enquadramento, sempre possível também a verificação da especialidade da atividade no caso concreto, por meio de perícia técnica, nos termos da Súmula n.º 198 do extinto Tribunal Federal de Recursos (STJ, AGRESP n. 228832/SC, Relator Ministro Hamilton Carvalhido, Sexta Turma, DJU de 30-06-2003).
Do ruído
Especificamente quanto ao agente nocivo ruído, o reconhecimento da especialidade do labor exige, em qualquer período, a comprovação da efetiva sujeição do segurado a agentes agressivos por meio da apresentação de formulário-padrão, embasado em laudo técnico, ou por meio de perícia técnica. Ou seja, não basta, aqui, mesmo no período anterior a 28/04/1995, o enquadramento por categoria profissional, sendo exigida prova da exposição ao agente nocivo.
O Quadro Anexo do Decreto n.º 53.831, de 25/03/1964, o Anexo I do Decreto n.º 83.080, de 24/01/1979, o Anexo IV do Decreto n.º 2.172, de 05/03/1997, e o Anexo IV do Decreto n.º 3.048, de 06/05/1999, alterado pelo Decreto n.º 4.882, de 18/11/2003, consideram insalubres as atividades que expõem o segurado a níveis de pressão sonora superiores a 80, 85 e 90 decibéis, de acordo com os Códigos 1.1.6, 1.1.5, 2.0.1 e 2.0.1, in verbis:
Período trabalhado | Enquadramento | Limites de tolerância |
Até 05/03/1997 | 1. Anexo do Decreto nº 53.831/64; 2. Anexo I do Decreto nº 83.080/79; | 1. Superior a 80 dB; 2. Superior a 90 dB. |
De 06/03/1997 a 06/05/1999 | Anexo IV do Decreto nº 2.172/97 | Superior a 90 dB. |
De 07/05/1999 a 18/11/2003 | Anexo IV do Decreto nº 3.048/99, na redação original | Superior a 90 dB. |
A partir de 19/11/2003 | Anexo IV do Decreto nº 3.048/99, com a alteração introduzida pelo Decreto nº 4.882/2003 | Superior a 85 dB. |
Quanto ao período anterior a 05/03/97, são aplicáveis concomitantemente, para fins de enquadramento, os Decretos n.ºs 53.831/64 e 83.080/79 até 05/03/97, data imediatamente anterior à publicação do Decreto n.º 2.172/971. Desse modo, até então, é considerada nociva à saúde a atividade sujeita a ruídos superiores a 80 decibéis, conforme previsão mais benéfica do Decreto n.º 53.831/64.
O Decreto n.º 4.882/2003, que reduziu o limite de tolerância ao agente físico ruído para 85 decibéis, não pode ser aplicado retroativamente. Dessa forma, entre 06/03/1997 e 18/11/2003, o limite de tolerância ao ruído corresponde a 90 decibéis, consoante o código 2.0.1 do Anexo IV dos Decretos n° 2.172/1997 e 3.048/1999. O Superior Tribunal de Justiça examinou a matéria em recurso especial repetitivo e fixou a seguinte tese:
Tema 694: O limite de tolerância para configuração da especialidade do tempo de serviço para o agente ruído deve ser de 90 dB no período de 6.3.1997 a 18.11.2003, conforme Anexo IV do Decreto 2.172/1997 e Anexo IV do Decreto 3.048/1999, sendo impossível aplicação retroativa do Decreto 4.882/2003, que reduziu o patamar para 85 dB, sob pena de ofensa ao art. 6º da LINDB (ex-LICC). (REsp 1.398.260/PR, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 14/05/2014, DJe 05/12/2014)
Portanto, considera-se especial a atividade desenvolvida com exposição a ruído superior a 80 dB até 05/03/1997, superior a 90 dB entre 06/03/1997 a 18/11/2003 e superior a 85 dB a partir de 19/11/2003.
Cabe destacar, ainda, que, embora a partir da edição da MP n.º 1.729/98, convertida na Lei n.º 9.732/98, que alterou o § 2º do art. 58 da Lei n.º 8.213/91, a utilização de equipamentos de proteção individual (EPIs) seja relevante para reconhecimento da atividade exercida sob condições especiais, com relação ao agente nocivo ruído, o uso de EPI revela-se ineficaz para neutralizar os danos causados ao organismo humano.
Isso porque, consoante já identificado pela medicina do trabalho, a exposição a níveis elevados de ruído não causa danos apenas à audição, de sorte que protetores auriculares não são capazes de neutralizar os riscos à saúde do trabalhador. Os ruídos ambientais não são absorvidos apenas pelos ouvidos e suas estruturas condutivas, mas também pela estrutura óssea da cabeça, sendo que o protetor auricular reduz apenas a transmissão aérea e não a óssea, daí que a exposição, durante grande parte do tempo de serviço do segurado produz efeitos nocivos a longo prazo, como zumbidos e distúrbios do sono.
Por essa razão, o STF, no julgamento Tema 555 (ARE nº 664.335) fixou tese segundo a qual “na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria”.
Metodologia de aferição de ruído
Conforme a Norma de Higiene Ocupacional nº 1 (NHO 01), da Fundação Jorge Duprat Figueiredo de Segurança e Medicina do Trabalho (FUNDACENTRO) - norma que estabelece a metodologia para a avaliação ambiental da exposição a ruído (art. 68, § 12, Decreto nº 3.048/99) -, o ruído deve ser calculado mediante uma média ponderada.
Quando esse dado (média ponderada) constar do processo, é ele que deve ser usado para fins de verificação do enquadramento da atividade como especial, uma vez que essa metodologia, que considera as variações da incidência de ruído, efetivamente retrata de modo fiel as condições de trabalho a que o segurado está submetido.
No entanto, quando não houver indicação da metodologia, ou for utilizada metodologia diversa, o enquadramento deve ser analisado de acordo com a aferição do ruído que for apresentada no processo, bastando que a exposição esteja embasada em estudo técnico realizado por profissional habilitado para tanto (AC 5015224-47.2015.4.04.7200, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SC, Relator PAULO AFONSO BRUM VAZ, em 19/09/2019; AC 5001695-25.2019.4.04.7101, SEXTA TURMA, Relator JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, em 06/08/2020; AC 5003527-77.2017.4.04.7129, QUINTA TURMA, Relatora GISELE LEMKE, em 08/07/2020; TRF4, AC 5020691-74.2019.4.04.7100, SEXTA TURMA, Relatora TAÍS SCHILLING FERRAZ, juntado aos autos em 07/06/2021).
De qualquer forma, cabe esclarecer que os períodos de atividade especial reconhecidos em virtude do ruído são anteriores a 18/11/2003.
Hidrocarbonetos e óleos minerais
Com relação ao agente nocivo hidrocarbonetos (e outros compostos de carbono), o Quadro Anexo do Decreto n.º 53.831, de 25/03/1964, o Anexo I do Decreto n.º 83.080, de 24/01/1979, e o Anexo IV do Decreto n.º 2.172, de 05/03/1997, cuidando de detalhar os critérios para efeitos de concessão da aposentadoria especial aos 25 anos de serviço, consideravam insalubres as atividades expostas a poeiras, gases, vapores, neblinas e fumos de derivados do carbono nas operações executadas com derivados tóxicos do carbono, em que o segurado ficava sujeito habitual e permanentemente (Códigos 1.2.11, 1.2.10; 1.0.3, 1.017 e 1.0.19, na devida ordem).
Os hidrocarbonetos abrangem, em verdade, uma multiplicidade de substâncias químicas derivadas de carbono. Daí por que o fato de o decreto regulamentar não mencionar a expressão 'hidrocarbonetos' não significa que não tenha encampado, como agentes nocivos, diversos agentes químicos que podem ser assim qualificados.
Nesse passo, é de se destacar a tese firmada pelo Superior Tribunal no julgamento do Tema 534 de no sentido de que “as normas regulamentadoras que estabelecem os casos de agentes e atividades nocivos à saúde do trabalhador são exemplificativas, podendo ser tido como distinto o labor que a técnica médica e a legislação correlata considerarem como prejudiciais ao obreiro, desde que o trabalho seja permanente, não ocasional, nem intermitente, em condições especiais (art. 57, § 3º, da Lei 8.213/1991).”.
Assim, mesmo que não haja previsão, atualmente, em decreto regulamentar, se comprovada a insalubridade do ambiente de trabalho pela exposição habitual e permanente a hidrocarbonetos, há o enquadramento de atividade especial. Os riscos ocupacionais gerados por esses agentes não requerem a análise quantitativa de sua concentração ou intensidade máxima e mínima no ambiente de trabalho, dado que são caracterizados pela avaliação qualitativa (art. 278, § 1º, I da IN 77/2015), pois se trata de agente nocivo constante no Anexo 13 da NR-15, aprovada pela Portaria n.º 3.214/1978 do Ministério do Trabalho e Emprego.
Portanto, a sua manipulação já é suficiente para o reconhecimento da atividade especial; embora seja possível, a partir da vigência da Lei n.º 9.732/98, a mitigação da nocividade pela utilização de equipamentos de proteção individual eficazes.
Do caso concreto
Na hipótese vertente, os períodos de atividade laboral exercidos em condições especiais foram assim analisados na sentença:
Passo ao exame, em separado, de cada um dos períodos controvertidos nesta ação, com base nos elementos contidos nos autos e nas razões acima expostas, para concluir pelo cabimento ou não do reconhecimento da natureza especial da atividade desenvolvida.
Período 1 | 03/12/1977 a 05/08/1978 |
Empregador | SALVADOR GULLO |
Atividade/função | Auxiliar de agricultura. |
Agente nocivo | Atividade. |
Prova | CTPS (Evento 1, CTPS4, p. 4) |
Enquadramento | Atividade de trabalhador rural: código 2.2.1 do Quadro Anexo ao Decreto nº 53.831/1964. |
Conclusão | SIM, é reconhecida a natureza especial da atividade. Observação: O ramo agrícola do empregador e a função do autor na sua carteira de trabalho são suficientes para comprovar as atividades por ele realizadas. |
Período 2 | 01/02/1980 a 01/02/1981 |
Empregador | DIDIO & DIDIO LTDA. |
Atividade/função | Servente |
Agente nocivo | Atividade. |
Prova | CTPS (Evento 1, CTPS4, p. 4) |
Enquadramento | Atividade em edifícios, barragens ou pontes: código 2.3.3 do Quadro Anexo ao Decreto nº 53.831/1964. |
Conclusão | SIM, é reconhecida a natureza especial da atividade.Observação: O ramo de construção civil do empregador e a função do autor na sua carteira de trabalho são suficientes para comprovar as atividades por ele realizadas. |
Períodos 3 | 30/10/1981 a 12/05/1982 05/07/1995 a 24/01/1996 25/03/1996 a 23/04/1996 |
Empregador | GERALDO ALVES DA SILVA |
Atividade/função | Pedreiro; carpinteiro. |
Agente nocivo | Atividade. |
Prova | CTPS (Evento 1, CTPS4, pp. 5, 10 e 11); informação da empregadora (Evento 23, INF1) |
Enquadramento | Atividade em edifícios, barragens ou pontes: vide acima. |
Conclusão | SIM, é reconhecida a natureza especial da atividade.Observação: O ramo de construção civil do empregador e a função do autor na sua carteira de trabalho são suficientes para comprovar as atividades por ele realizadas. |
Período 4 | 14/01/1983 a 08/03/1983 |
Empregador | KUNTEK DO BRASIL ISOLAMENTOS INDUSTRIAIS LTDA. |
Atividade/função | Ajudante industrial (exercia funções de auxiliar de soldador). |
Agente nocivo | Atividade. |
Prova | CTPS (Evento 1, CTPS4, p. 6); declaração (Evento 32, DECL2) |
Enquadramento | Atividade de auxiliar de soldador (por analogia à função de soldador): código 2.5.3 do Quadro Anexo ao Decreto nº 53.831/1964. |
Conclusão | SIM, é reconhecida a natureza especial da atividade. |
Período 5 | 24/11/1983 a 02/03/1984 |
Empregador | EMPREITEIRA PETRY LTDA. |
Atividade/função | Servente. |
Agente nocivo | Atividade. |
Prova | CTPS (Evento 1, CTPS4, p. 6) |
Enquadramento | Atividade em edifícios, barragens ou pontes: vide acima. |
Conclusão | SIM, é reconhecida a natureza especial da atividade.Observação: O ramo da empregadora e a função do autor na sua carteira de trabalho são suficientes para comprovar as atividades por ele realizadas. |
Períodos 6 | 03/07/1984 a 01/10/1986 02/10/1986 a 28/11/1987 |
Empregador | ELDORADO INDÚSTRIA E COMÉRCIO (STRASSBURGER S/A IND. COM.) |
Atividade/função | Serviços gerais de oficina; trocador de matriz |
Agente nocivo | Ruído superior a 80 dB(A); hidrocarbonetos (solventes) |
Prova | CTPS (Evento 1, CTPS4, p. 7); laudos periciais judiciais adotados como prova emprestada (Evento 25, LAUDO1; LAUDO2; LAUDO3; LAUDO4) |
Enquadramento | 1. Ruído: superior a 80 dB(A) até 05/03/1997, códigos 1.1.6 do Quadro Anexo do Decreto nº 53.831/1964 e 1.1.5 do Anexo I do Decreto nº 83.080/1979. Quanto ao equipamento de proteção individual - EPI, aplico a jurisprudência do STF, no julgamento do ARE 664335, acima mencionado; 2. Hidrocarbonetos: código 1.2.11 do Quadro Anexo do Decreto nº 53.831/1964; código 1.2.10 do Anexo I ao Decreto nº 83.080/1979. |
Conclusão | SIM, é reconhecida a natureza especial da atividade.Observação 1: O ramo de indústria de calçados da empregadora e as funções na CTPS são suficientes para comprovar as atividades do demandante. Observação 2: Utilizo as informações constantes nos laudos periciais judiciais adotados como prova emprestada, pois elaborados por peritos de confiança do juízo e fazerem referência às mesmas atividades realizadas pelo autor. |
Período 7 | 01/02/1989 a 26/04/1991 |
Empregador | JOSÉ CARLOS TEIXEIRA |
Atividade/função | Pedreiro. |
Agente nocivo | Atividade. |
Prova | CTPS (Evento 1, CTPS4, p. 8) |
Enquadramento | Atividade em edifícios, barragens ou pontes: vide acima. |
Conclusão | SIM, é reconhecida a natureza especial da atividade.Observação: O ramo do empregador de construção civil e as anotações na CTPS são suficientes para comprovar as atividades do demandante. |
Período 8 | 29/04/1992 a 18/03/1993 |
Empregador | CONSTRUTORA PORTELLA IND COM LTDA. |
Atividade/função | Carpinteiro. |
Agente nocivo | Atividade. |
Prova | CTPS (Evento 1, CTPS4, p. 9) |
Enquadramento | Atividade em edifícios, barragens ou pontes: vide acima. |
Conclusão | SIM, é reconhecida a natureza especial da atividade.Observação: O ramo do empregador de construção civil e as anotações na CTPS são suficientes para comprovar as atividades do demandante. |
Período 9 | 02/05/1994 a 13/02/1995 |
Empregador | COMÉRCIO DE COMBUSTÍVEIS GIOVANELLA LTDA. |
Atividade/função | Frentista |
Agente nocivo | Hidrocarbonetos (combustível, óleos minerais) |
Prova | CTPS (Evento 1, CTPS4, p. 10); PPP (Evento 7, PPP3); laudo técnico (Evento 7, LAUDO2); laudo pericial judicial adotado como prova emprestada (Evento 25, LAUDO5) |
Enquadramento | Hidrocarbonetos: vide acima. |
Conclusão | SIM, é reconhecida a natureza especial da atividade.Observação: Quanto ao uso de laudo emprestado, reporto-me às razões expostas na observação 2 do quadro 6 acima. |
Período 10 | 01/08/1997 a 14/11/2002 |
Empregador | AUTO POSTO GAÚCHO LTDA. |
Atividade/função | Frentista. |
Agente nocivo | Hidrocarbonetos (combustível, óleos minerais) |
Prova | CTPS (Evento 1, CTPS4, p. 11); PPP (Evento 1, PPP6, pp. 1/2); laudo técnico (Evento 1, PPP6, pp. 3/6); laudo pericial judicial adotado como prova emprestada (Evento 25, LAUDO5) |
Enquadramento | Hidrocarbonetos: códigos 1.0.19 do Anexo IV do Decreto nº 2.172/1997 e do Anexo IV do Decreto nº 3.048/1999. |
Conclusão | SIM, é reconhecida a natureza especial da atividade.Observação: Quanto ao uso de laudo emprestado, reporto-me às razões expostas na observação 2 do quadro 6 acima. |
Períodos 11 | 01/04/2004 a 30/11/2006 02/07/2007 a 17/09/2009 08/03/2010 a 11/11/2014 |
Empregador | TRANSPORTE RODOVIÁRIOS GIOVANELLA LTDA. |
Atividade/função | Frentista. |
Agente nocivo | Hidrocarbonetos (combustível, óleos minerais) |
Prova | CTPS (Evento 1, CTPS4, p. 12); PPP (Evento 1, PPP7); laudo pericial judicial adotado como prova emprestada (Evento 25, LAUDO5) |
Enquadramento | Hidrocarbonetos: vide acima. |
Conclusão | SIM, é reconhecida a natureza especial da atividade.Observação: Quanto ao uso de laudo emprestado, reporto-me às razões expostas na observação 2 do quadro 6 acima. |
Com relação à possibilidade de cômputo de período de atividade rural como especial, cabe ressaltar que a jurisprudência desta Corte entende pela impossibilidade do reconhecimento do labor prestado a empregado pessoa física antes da vigência da Lei 8.213/91, porquanto não havia tal previsão na LC 11/71, norma que previa o amparo previdenciário do empregado rural (art. 3.º, § 1.º, alínea a), verbis:
PREVIDENCIÁRIO. ATIVIDADE ESPECIAL. TRABALHADOR RURAL EMPREGADO POR PESSOA FÍSICA. PERÍODOS ANTERIORES À VIGÊNCIA DA LEI 8.213/1991. IMPOSSIBILIDADE. PERÍODOS POSTERIORES À VIGÊNCIA DA LEI 8.213/1991. POSSIBILIDADE. ENQUADRAMENTO POR CATEGORIA PROFISSIONAL DOS TRABALHADORES DA AGROPECUÁRIA. ATIVIDADE ESPECIAL. CONCESSÃO DE APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ART. 29-C DA LEI 8.213/1991 DIREITO AO BENEFÍCIO MAIS VANTAJOSO. REAFIRMAÇÃO DA DER. TUTELA ESPECÍFICA. 1. É indevido o reconhecimento da especialidade do tempo de serviço prestado como empregado rural de pessoa física anteriormente à edição da Lei 8.213/1991, pois, na vigência da Lei Complementar 11/1971, norma que previa o amparo previdenciário do empregado rural, não havia previsão de concessão de aposentadoria especial, exceção feita apenas ao trabalhador rural vinculado à empresa agroindustrial ou agrocomercial, uma vez que, nos termos do artigo 6º da CLPS/1984, esse tipo de empregado vinculava-se ao Regime de Previdência Urbana. 2. A partir da edição da Lei 8.213/91, que unificou os sistemas de previdência dos trabalhadores rurais e urbanos, é possível o reconhecimento da especialidade do tempo de serviço desempenhado pelo empregado rural, seja em razão de comprovada exposição a agentes nocivos, seja em razão do enquadramento por categoria profissional dos trabalhadores da agropecuária, permitido até 28.04.1995, data do advento da Lei n.º 9.032/1995. 3. Apresentada a prova necessária a demonstrar o exercício de atividade sujeita a condições especiais, conforme a legislação vigente na data da prestação do trabalho, o respectivo tempo de serviço especial deve ser reconhecido. (...) (TRF4, AC 5005877-58.2018.4.04.7111, SEXTA TURMA, Relator JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, juntado aos autos em 08/07/2021)
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE ESPECIAL. EMPREGADO RURAL VINCULADO A PESSOA FÍSICA. PERÍODO ANTERIOR À LEI 8.213/91. IMPOSSIBILIDADE. AGENTES BIOLÓGICOS. NOCIVOS. RECONHECIMENTO. CONVERSÃO.REAFIRMAÇÃO DA D.E.R. A lei em vigor quando da prestação dos serviços define a configuração do tempo como especial ou comum, o qual passa a integrar o patrimônio jurídico do trabalhador, como direito adquirido. Até 28.4.1995 é admissível o reconhecimento da especialidade do trabalho por categoria profissional; a partir de 29.4.1995 é necessária a demonstração da efetiva exposição, de forma não ocasional nem intermitente, a agentes prejudiciais à saúde, por qualquer meio de prova; a contar de 06.5.1997 a comprovação deve ser feita por formulário-padrão embasado em laudo técnico ou por perícia técnica. É indevido o reconhecimento da especialidade do tempo de serviço prestado como empregado rural de pessoa física anteriormente à edição da Lei 8.213/1991, pois, na vigência da Lei Complementar 11/1971, norma que previa o amparo previdenciário do empregado rural, não havia previsão de concessão de aposentadoria especial, exceção feita apenas ao trabalhador rural vinculado à empresa agroindustrial ou agrocomercial, uma vez que, nos termos do artigo 6º, da CLPS/1984, esse tipo de empregado vinculava-se ao Regime de Previdência Urbana. (...) (TRF4 5015862-20.2018.4.04.9999, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, Relator MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA, juntado aos autos em 09/06/2021)
Uma vez que, no período de 03/12/1977 a 05/08/1978, o autor prestava serviço rural a empregador pessoa física, não é possível o reconhecimento da especialidade do labor, devendo ser reformada a sentença no ponto.
Quanto aos períodos como trabalhador na construção civil, houve o reconhecimento em virtude do enquadramento pela categoria profissional.
Como bem entendeu o Julgador monocrático, as informações contidas na CTPS são suficientes para delimitar as atividades exercidas pelo autor no período, as quais são passíveis de enquadramento por categoria profissional para fins de reconhecimento da especialidade, conforme jurisprudência desta Corte:
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. SEGURADO TRABALHADOR RURAL. PERÍODO ANTERIOR À LEI Nº 8.213/1991. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. ATIVIDADE DE SERVENTE E PEDREIRO EM OBRA DE CONSTRUÇÃO CIVIL. HIDROCARBONETOS: NOCIVIDADE. EXPOSIÇÃO A AGENTES QUÍMICOS. PROVA EMPRESTADA. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO. CONSECTÁRIOS. ÍNDICES DE ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA. HONORÁRIOS MAJORADOS. 1. O reconhecimento da especialidade e o enquadramento da atividade exercida sob condições especiais são disciplinados pela lei em vigor à época em que efetivamente prestada, passando a integrar, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador. 2. O tempo de serviço do segurado trabalhador rural, anterior à data de início de vigência da Lei nº 8.213/1991, será computado independentemente do recolhimento das contribuições, exceto para efeito de carência. 3. Até 28 de abril de 1995, as atividades de pedreiro e de servente, exercidas em obra de construção civil, enquadram-se como especiais, pela categoria profissional, em conformidade com o código 2.3.3 do Decreto nº 53.831/1964. 4. Os hidrocarbonetos constituem agentes químicos nocivos, mesmo a partir de 06/03/1997, pois possuem previsão no Anexo IV do Decreto nº 2.172/1997 e no Anexo IV do Decreto nº 3.048/99 (códigos 1.0.3, 1.0.7 e 1.0.19) e, ainda que não a tivessem, dada a índole exemplificativa do rol constante nos atos regulamentares, a prejudicialidade destes compostos à saúde humana justifica o reconhecimento da natureza especial da atividade exercida por quem está sujeito à sua exposição. 5. Para os agentes químicos previstos no Anexo 13 da Norma Regulamentadora - NR 15, entre os quais os hidrocarbonetos e outros compostos tóxicos de carbono, é desnecessária a avaliação quantitativa. 6. Admite-se a prova emprestada, uma vez que o seu uso não apenas respeita o princípio da economia processual, mas também possibilita que os princípios do contraditório e da ampla defesa possam também ser exercidos no processo para o qual a prova foi trasladada. 7. É possível a conversão do tempo especial em comum, sendo irrelevante, nesse particular, o advento da MP nº 1.663, convertida na Lei nº 9.711/1998. (...) (TRF4, AC 5006715-33.2015.4.04.7102, QUINTA TURMA, Relator OSNI CARDOSO FILHO, juntado aos autos em 15/03/2020) [grifei]
Contudo, como já referido, o enquadramento por categoria profissional somente é possível até 28/04/1995, devendo ser afastado o reconhecimento do exercício de atividade especial no intervalo de 25/03/1996 a 23/04/1996, merecendo reforma a sentença no ponto.
Relativamente aos períodos laborados em indústria calçadista, ao contrário do que alega o INSS, não houve o enquadramento por categoria profissional, mas em virtude da exposição a ruído e agentes químicos.
Com efeito, é notório que a indústria calçadista sempre depende da cola para a industrialização dos seus produtos. Os vapores da cola são hidrocarbonetos aromáticos e alifáticos que causam tontura, dor de cabeça, náuseas, tosse, ardência nos olhos, além de outros problemas de saúde ao trabalhador. Acrescente-se que este tipo de indústria também precisa de produtos químicos e vários outros insumos que contêm na sua composição diversos agentes nocivos à saúde.
Reitero, nesse ponto, que os riscos ocupacionais gerados por esses agentes não requerem a análise quantitativa de sua concentração ou intensidade máxima e mínima no ambiente de trabalho, dado que são caracterizados pela avaliação qualitativa (art. 278, § 1º, I da IN 77/2015), pois se trata de agente nocivo constante no Anexo 13 da NR-15, aprovada pela Portaria n.º 3.214/1978 do Ministério do Trabalho e Emprego.
Assim, restam mantidos os períodos de atividade especial reconhecidos na sentença, com exceção dos intervalos de 03/12/1977 a 05/08/1978 e de 25/03/1996 a 23/04/1996.
Mesmo com a exclusão da especialidade dos referidos intervalos, o autor permanece com direito à aposentadoria especial, uma vez que computa mais de 25 anos de atividade especial na DER, bem como à aposentadoria por tempo de contribuição, devendo optar pelo mais vantajoso, conforme reconhecido na sentença.
Consectários legais
Correção monetária
Segundo decidiu o Superior Tribunal de Justiça no Tema 905 (REsp n.º 1.495.146), interpretando o julgamento do Supremo Tribunal Federal no Tema 810 (RE 870.947), as condenações judiciais previdenciárias sujeitam-se à atualização monetária pelo INPC:
As condenações impostas à Fazenda Pública de natureza previdenciária sujeitam-se à incidência do INPC, para fins de correção monetária, no que se refere ao período posterior à vigência da Lei 11.430/2006, que incluiu o art. 41-A na Lei 8.213/91.
Dessa forma, a correção monetária das parcelas vencidas dos benefícios previdenciários será calculada conforme os seguintes índices e respectivos períodos:
- IGP-DI de 05/96 a 03/2006 (art. 10 da Lei n.º 9.711/98, combinado com o art. 20, §§5º e 6º, da Lei n.º 8.880/94);
- INPC a partir de 04/2006 (art. 41-A da lei 8.213/91).
Por outro lado, quanto às parcelas vencidas de benefícios assistenciais, deve ser aplicado o IPCA-E.
Juros moratórios
Os juros de mora incidem a contar da citação, conforme Súmula 204 do STJ, da seguinte forma:
- 1% ao mês até 29/06/2009;
- a partir de então, incidem segundo a remuneração oficial da caderneta de poupança (art. 1º-F da Lei 9.494/97, com redação dada pela Lei n. 11.960/2009).
Registre-se que, quanto aos juros de mora, não houve declaração de inconstitucionalidade no julgamento do RE 870.947 pelo STF. Ainda, cabe referir que devem ser calculados sem capitalização.
Honorários recursais
Considerando o disposto no art. 85, § 11, CPC, e que está sendo dado parcial provimento ao recurso, não é o caso de serem majorados os honorários fixados na sentença, eis que, conforme entendimento desta Turma, "a majoração dos honorários advocatícios fixados na decisão recorrida só tem lugar quando o recurso interposto pela parte vencida é integralmente desprovido; havendo o provimento, ainda que parcial, do recurso, já não se justifica a majoração da verba honorária" (TRF4, APELREEX n.º 5028489-56.2018.4.04.9999/RS, Relator Osni Cardoso Filho, julgado em 12/02/2019).
Tutela específica - implantação do benefício
Tendo em vista o disposto no art. 497 do CPC/2015, correspondente ao art. 461 do CPC/1973, e a circunstância de que os recursos excepcionais, em regra, não possuem efeito suspensivo, o julgado deve ser cumprido imediatamente (QUOAC 2002.71.00.050349-7, Relator p/ Acórdão Celso Kipper, D.E. 01/10/2007), no prazo máximo de trinta dias úteis.
Conclusão
Apelo do INSS provido em parte para afastar o reconhecimento do exercício de atividade especial nos períodos de 03/12/1977 a 05/08/1978 e de 25/03/1996 a 23/04/1996.
Critérios de correção monetária alterados de ofício.
Determinada a implantação do benefício.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento ao apelo do INSS, alterar, de ofício, os critérios de correção monetária e determinar a implantação do benefício.
Documento eletrônico assinado por ROGER RAUPP RIOS, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002865206v18 e do código CRC dad22064.Informações adicionais da assinatura:
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Apelação Cível Nº 5051164-43.2019.4.04.7100/RS
RELATOR: Desembargador Federal ROGER RAUPP RIOS
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: JULIO CLOVES ALVES DA SILVA (AUTOR)
ADVOGADO: ALEX SANDRO MEDEIROS DA SILVA (OAB RS078605)
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. PERÍODO EM GOZO DE BENEFÍCIO POR INCAPACIdaDE. CÔMPUTO PARA FINS DE CARÊNCIA. LABOR EXERCIDO EM CONDIÇÕES ESPECIAIS. DIREITO ADQUIRIDO. TRABALHADOR RURAL EMPREGADO POR PESSOA FÍSICA. pedreiro e SERVENTE NA CONSTRUÇÃO CIVIL. ENQUADRAMENTO POR CATEGORIA PROFISSIONAL. ruído. hidrocarbonetos. correção monetária. implantação.
1. O período de manutenção de auxílio-doença deve ser computado para a integração da carência, desde que intercalado entre períodos em que houve o recolhimento de contribuições previdenciárias. Tese firmada pelo Supremo Tribunal Federal para o Tema 1.125.
2. Comprovado o exercício de atividade especial, conforme os critérios estabelecidos na lei vigente à época do exercício, o segurado tem direito adquirido ao cômputo do tempo de serviço como tal.
3. Até 28/04/1995, é admissível o reconhecimento da especialidade do trabalho por categoria profissional; a partir de 29/04/1995, necessária a demonstração da efetiva exposição, de forma não ocasional nem intermitente, a agentes prejudiciais à saúde, por qualquer meio de prova; e, a contar de 06/05/1997 a comprovação deve ser feita por formulário-padrão embasado em laudo técnico ou por perícia técnica.
4. É indevido o reconhecimento da especialidade do tempo de serviço prestado como empregado rural de pessoa física anteriormente à edição da Lei 8.213/1991, pois, na vigência da Lei Complementar 11/1971, norma que previa o amparo previdenciário do empregado rural, não havia previsão de concessão de aposentadoria especial.
5. Até 28 de abril de 1995, as atividades de pedreiro e de servente, exercidas em obra de construção civil, enquadram-se como especiais, pela categoria profissional, em conformidade com o código 2.3.3 do Anexo do Decreto nº 53.831/1964.
6. Considera-se especial a atividade desenvolvida com exposição a ruído superior a 80 dB até 05/03/1997; superior a 90 dB entre 06/03/1997 a 18/11/2003 e superior a 85 dB a partir de 19/11/2003 (REsp 1.398.260). Persiste a condição especial do labor, mesmo com a redução do ruído aos limites de tolerância pelo uso de EPI.
7. Apesar de não haver previsão específica de especialidade pela exposição a hidrocarbonetos em decreto regulamentador, a comprovação da manipulação dessas substâncias químicas de modo habitual e permanente é suficiente para o reconhecimento da especialidade atividade exposta ao referido agente nocivo, dado o caráter exemplificativo das normas regulamentadoras que estabelecem os casos de agentes e atividades nocivos à saúde do trabalhador (Tema 534 do STJ); sendo desnecessária a avaliação quantitativa (art. 278, § 1º, I da IN 77/2015 c/c Anexo 13 da NR-15).
8. Diante do reconhecimento da inconstitucionalidade do uso da TR como índice de correção monetária (Tema 810 do STF), aplicam-se, nas condenações previdenciárias, o IGP-DI de 05/96 a 03/2006 e o INPC a partir de 04/2006. Por outro lado, quanto às parcelas vencidas de benefícios assistenciais, deve ser aplicado o IPCA-E.
9. Determinada a imediata implantação do benefício.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento ao apelo do INSS, alterar, de ofício, os critérios de correção monetária e determinar a implantação do benefício, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 09 de novembro de 2021.
Documento eletrônico assinado por ROGER RAUPP RIOS, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002865207v8 e do código CRC 14638d2b.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 28/10/2021 A 09/11/2021
Apelação Cível Nº 5051164-43.2019.4.04.7100/RS
RELATOR: Desembargador Federal ROGER RAUPP RIOS
PRESIDENTE: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
PROCURADOR(A): FÁBIO BENTO ALVES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: JULIO CLOVES ALVES DA SILVA (AUTOR)
ADVOGADO: ALEX SANDRO MEDEIROS DA SILVA (OAB RS078605)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 28/10/2021, às 00:00, a 09/11/2021, às 16:00, na sequência 447, disponibilizada no DE de 19/10/2021.
Certifico que a 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 5ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PARCIAL PROVIMENTO AO APELO DO INSS, ALTERAR, DE OFÍCIO, OS CRITÉRIOS DE CORREÇÃO MONETÁRIA E DETERMINAR A IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal ROGER RAUPP RIOS
Votante: Desembargador Federal ROGER RAUPP RIOS
Votante: Juiz Federal FRANCISCO DONIZETE GOMES
Votante: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
LIDICE PEÑA THOMAZ
Secretária
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