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PREVIDENCIÁRIO. PRESTAÇÃO DE SAÚDE. CIRURGIA. COLOCAÇÃO DE PRÓTESE. SÚMULA Nº 100/TRF4. URGÊNCIA NÃO DEMONSTRADA. TRF4. 5002317-68.2019.4.04.7113...

Data da publicação: 12/07/2020, 15:35:42

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. PRESTAÇÃO DE SAÚDE. CIRURGIA. COLOCAÇÃO DE PRÓTESE. SÚMULA Nº 100/TRF4. URGÊNCIA NÃO DEMONSTRADA. A ingerência judicial na ordem de espera estabelecida no SUS exige redobrada cautela do magistrado e substanciais elementos de prova a indicar a verossimilhança das alegações, notadamente quanto à situação de urgência da parte autora, sob pena de fragilizar, no aspecto jurídico, o princípio da isonomia e, no aspecto médico, a avaliação da urgência clínica que é feita por ocasião da inserção do paciente na respectiva listagem em face da posição dos demais usuários. (TRF4, AC 5002317-68.2019.4.04.7113, QUINTA TURMA, Relator OSNI CARDOSO FILHO, juntado aos autos em 05/07/2020)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5002317-68.2019.4.04.7113/RS

RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO

APELANTE: DOMINGOS CARON (AUTOR)

APELADO: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO (RÉU)

APELADO: MUNICÍPIO DE BENTO GONÇALVES/RS (RÉU)

APELADO: ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de ação ordinária ajuizada por Domingos Caron por meio da qual postula a realização urgente de procedimento cirúrgico para colocação de prótese total no quadril.

A sentença julgou improcedente o pedido, sob o fundamento de que não há nos autos prova de que há uma urgência médica extraordinária no caso particular, que a diferencie de outros casos similares que vêm sendo atendidos pelo Estado por meio do Sistema Único de Saúde - SUS, a ponto de ser lhe priorizado o atendimento.

O apelante defende a presença de perigo de dano, sob a justificativa de que o procedimento é crucial para evitar outras graves complicações. Alternativamente, pede a anulação da sentença e a reabertura da fase de instrução, para que seja realizada nova prova pericial.

Com contrarrazões, vieram os autos.

VOTO

De início, cumpre registrar que a sentença não padece de vício a ensejar a sua anulação. Reserva-se ao julgador, presente o seu livre convencimento motivado, margem para a apreciação das provas produzidas nos autos.

A parte autora postula a declaração de nulidade da sentença para que seja realizada complementação da perícia médica, alegando que o especialista não investigou adequadamente a natureza da sua doença.

No caso, foi nomeado médico perito, o qual apresentou laudo (origem, evento 42, LAUDOPERIC1) que se mostra formalmente completo, coerente e sem contradições formais, pelo que se mostra desnecessária a realização de nova perícia.

Vale dizer, a prova é destinada ao juiz, a quem cabe avaliar a necessidade de produção de novas provas para seu próprio convencimento e materialização da verdade. Pode o magistrado, inclusive, indeferi-las, caso o laudo apresentado pelo perito seja suficiente para o deslinde da causa.

O perito judicial é profissional de confiança do juízo, que tem por compromisso examinar a parte com imparcialidade. A finalidade da perícia médica judicial não é a de diagnosticar ou tratar as patologias apresentadas pela parte, mas apenas de esclarecer as questões técnicas submetidas à apreciação, cabendo ao juízo, qualquer que seja a especialidade do profissional nomeado, a decisão sobre suas habilidades para conhecimento do caso concreto.

A mera discordância da parte quanto às conclusões periciais, quando os quesitos foram satisfatoriamente respondidos, não constitui fundamento bastante a justificar a realização de nova perícia ou a complementação da já efetivada.

Nesse sentido é a jurisprudência do Tribunal Regional Federal da 4ª Região:

PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. AUXILIO-DOENÇA. CERCEAMENTO DE DEFESA. HIPÓTESE NÃO COMPROVADA. REALIZAÇÃO DE NOVA PERICIA MÉDICA. DESNECESSIDADE. CONJUNTO PROBATÓRIO SUFICIENTE. INCAPACIDADE NÃO COMPROVADA. HONORÁRIOS. (...) 2. Não há necessidade de realização de nova perícia com médico especialista quando o conjunto probatório constante nos autos é suficiente para a formação da convicção do órgão julgador. 3. Embora o magistrado não esteja vinculado ao laudo pericial, a formação do convencimento judicial se dá predominantemente a partir das conclusões do perito; apenas em hipóteses excepcionais é que cabe ao juiz, com base em sólida prova em contrário, afastar-se da conclusão apresentada pelo expert. (...) (TRF4, AC 5007831-11.2018.4.04.9999, QUINTA TURMA, Relator OSNI CARDOSO FILHO, juntado aos autos em 08/08/2018)

Desse modo, rejeita-se a alegação de cerceamento de defesa.

A Constituição Federal (CF) consagra a saúde como direito fundamental, seja ao contemplá-la como direito social no art. 6º, seja ao estabelecê-la como "direito de todos e dever do Estado", no art. 196. O constituinte assegurou, com efeito, a satisfação desse direito "mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doenças e de outros agravos", bem como o "acesso universal e igualitário às ações e serviços para a sua promoção, proteção e recuperação."

Daí não se depreende, todavia, a existência de direito subjetivo a fornecimento de todo e qualquer assistência. Afinal, mesmo o direito à saúde, a despeito de sua elevada importância, não constitui um direito absoluto. A pretensão de cada postulante deve ser considerada não apenas sob perspectiva individual, mas também à luz do contexto político e social em que esse direito fundamental é tutelado. Isto é, a proteção do direito à saúde, sob o enfoque particular, não pode comprometer a sua promoção em âmbito coletivo, por meio das políticas públicas articuladas para esse fim.

A denominada “judicialização do direito à saúde” impõe, com efeito, tensões de difícil solução. De um lado, a proteção do núcleo essencial do direito à saúde e do “mínimo existencial” da parte requerente, intimamente ligado à dignidade da pessoa humana, fundamento da República Federativa do Brasil (art. 1º, III). De outro, o respeito ao direito dos demais usuários do SUS e a atenção à escassez e à finitude dos recursos públicos, que se projetam no princípio da reserva do possível. Associado a este problema está, de modo mais amplo, o exame do papel destinado ao Poder Judiciário na tutela dos direitos sociais, conforme a Constituição Federal de 1988, que consagra, como se sabe, tanto a inafastabilidade do acesso à justiça (art. 5º, XXXV) como a separação dos Poderes (art. 2º).

A jurisprudência tem apontado parâmetros para equacionar essa contradição, orientando o magistrado no exame, caso a caso, das pretensões formuladas em juízo. Assume especial relevo, nesse contexto, a decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal na Suspensão de Tutela Antecipada nº 175, de relatoria do Min. Gilmar Mendes, após a realização de audiências públicas e amplo debate sobre o tema. Nesse precedente, foi assentado: esse direito subjetivo público é assegurado mediante políticas sociais e econômicas, ou seja, não há um direito absoluto a todo e qualquer procedimento necessário para a proteção, promoção e recuperação da saúde, independentemente da existência de uma política pública que o concretize” (STA 175 AgR, Relator(a): Min. GILMAR MENDES (Presidente), Tribunal Pleno, julgado em 17/03/2010, DJe-076 DIVULG 29-04-2010 PUBLIC 30-04-2010 EMENT VOL-02399-01 PP-00070).

Deduzidas essas considerações sobre a questão de fundo, passa-se ao exame do mérito do recurso.

O autor é portador de coxartrose bilateral resultante de displasia (CDI M16.2), doença que "atinge de forma degenerativa a cartilagem no quadril, além de causar grande limitação na mobilidade e dores severas" (p. 2, petição inicial). O médico assistente apontou a necessidade de cirurgia para colocação de prótese total no quadril (origem, evento 1, ATESTMED13 e 14).

Sobre o tema, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região editou a Súmula nº 100, que especifica:

SÚMULA 100 - Nas ações em que se busca o deferimento judicial de prestações de saúde sujeitas à ordem de espera, somente se deferirá o pedido caso haja demonstração de que a urgência do caso impõe a respectiva realização antes do prazo apontado pelo Poder Público, administrativamente ou nos autos, para entrega administrativa da prestação.

No caso em apreço, não é possível identificar a presença do risco de dano irreparável a legitimar o deferimento imediato da medida requerida.

Embora exista o risco de agravamento do quadro, no laudo médico não houve apontamento específico sobre a urgência do caso, o que sugere a necessidade de se aguardar os trâmites inerentes ao sistema público de saúde.

Cabe a determinação judicial de fornecimento de medicamentos e tratamentos em situações não-previstas apenas em caráter excepcional, desde que sejam comprovadamente inadequados ao paciente os protocolos clínicos e diretrizes terapêuticas instituídas no âmbito do SUS.

Desse modo, embora se possa considerar a premência da cirurgia sob a perspectiva clínica, noutro prisma há que se considerar a insuficiência de elementos probatórios que demandem a priorização de atendimento do autor frente a tantos outros casos que se submetem igualmente à espera, sobretudo porque não se vislumbra, aqui, o requisito da urgência, a ponto de autorizar a ruptura do sistema de atendimentos do SUS.

Confira-se, a propósito, trechos do laudo pericial:

(...)

4) A não realização do procedimento de forma imediata trará prejuízos ao Autor? Em caso positivo, especificar.

Não trará prejuízos.

(...)

6) A parte autora necessita da cirurgia específica mencionada na petição inicial? Em caso positivo, esclarecer a razão.

Sim, há indicação de cirurgia principalmente pela sintomatologia relatada pelo periciado e pelo grau de evolução da coxartrose.

7) O S.U.S. realiza regularmente esta cirurgia em situação clínica como a da parte autora?

Sim.

8) A cirurgia em questão implica na colocação de alguma órtese ou prótese? Em caso positivo, o SUS usualmente fornece a órtese/prótese necessária?

Sim. Sim.

9) Existe alguma alternativa menos custosa para o tratamento da saúde da parte autora, como terapia, tratamento medicamentoso ou outro tipo de cirurgia? Em caso positivo, especificar.

Paliativamente se pode realizar fisioterapia e utilizar antiinflamatórios e analgésicos, porém de forma definitiva, somente a cirurgia.

(...)

11) A cirurgia postulada pela parte autora é urgente? Em caso positivo, esclarecer a razão.

Não, é eletiva sem urgência

(...)

04) Quais as consequências da não realização do procedimento cirúrgico solicitado?

Permanecer sintomático e progressão natural da degeneração.

05) Há urgência na realização do procedimento que justifique a impossibilidade de se aguardar o atendimento regular pelo SUS?

Não.

A ingerência judicial na ordem de espera estabelecida no SUS exige redobrada cautela do magistrado e substanciais elementos de prova a indicar a verossimilhança das alegações, notadamente quanto à situação de urgência da parte autora, sob pena de fragilizar, no aspecto jurídico, o princípio da isonomia e, no aspecto médico, a avaliação da urgência clínica que é feita por ocasião da inserção do paciente na respectiva listagem em face da posição dos demais usuários.

Nesta linha de consideração, o apelante não pode se furtar a se submeter aos trâmites burocráticos do SUS aos quais todos os que dele se socorrem estão obrigados.

Exige-se, portanto, a demonstração de que a solicitação do procedimento cirúrgico está sendo inadequadamente manejada. Revela-se prematura, antes disso, a concessão da tutela pleiteada.

Não é caso de majoração dos honorários advocatícios por conta do art. 85, §11, do Código de Processo Civil, uma vez que a verba foi arbitrada em 10% (dez por cento) do valor da causa (R$ 60.000,00 - sessenta mil reais), em patamar superior ao que este tribunal entende cabível em ações que possuem por objeto a prestação de serviço de saúde.

A exigibilidade da verba honorária permanece suspensa enquanto perdurar os efeitos da assistência judiciária gratuita deferida ao autor.

Em face do que foi dito, voto por negar provimento à apelação.



Documento eletrônico assinado por OSNI CARDOSO FILHO, Desembargador Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001774633v8 e do código CRC 9d946123.Informações adicionais da assinatura:
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5002317-68.2019.4.04.7113
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Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5002317-68.2019.4.04.7113/RS

RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO

APELANTE: DOMINGOS CARON (AUTOR)

APELADO: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO (RÉU)

APELADO: MUNICÍPIO DE BENTO GONÇALVES/RS (RÉU)

APELADO: ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RÉU)

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. PRESTAÇÃO DE SAÚDE. CIRURGIA. COLOCAÇÃO DE PRÓTESE. súmula nº 100/trf4. URGÊNCIA NÃO DEMONSTRADA.

A ingerência judicial na ordem de espera estabelecida no SUS exige redobrada cautela do magistrado e substanciais elementos de prova a indicar a verossimilhança das alegações, notadamente quanto à situação de urgência da parte autora, sob pena de fragilizar, no aspecto jurídico, o princípio da isonomia e, no aspecto médico, a avaliação da urgência clínica que é feita por ocasião da inserção do paciente na respectiva listagem em face da posição dos demais usuários.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 23 de junho de 2020.



Documento eletrônico assinado por OSNI CARDOSO FILHO, Desembargador Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001774634v3 e do código CRC 2530a81a.Informações adicionais da assinatura:
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Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 15/06/2020 A 23/06/2020

Apelação Cível Nº 5002317-68.2019.4.04.7113/RS

RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO

PRESIDENTE: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO

PROCURADOR(A): FÁBIO BENTO ALVES

APELANTE: DOMINGOS CARON (AUTOR)

ADVOGADO: GREICE MARIN (OAB RS097021)

APELADO: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO (RÉU)

APELADO: MUNICÍPIO DE BENTO GONÇALVES/RS (RÉU)

APELADO: ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RÉU)

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 15/06/2020, às 00:00, a 23/06/2020, às 14:00, na sequência 336, disponibilizada no DE de 03/06/2020.

Certifico que a 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 5ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO

Votante: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO

Votante: Juiz Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO

Votante: Juíza Federal GISELE LEMKE

LIDICE PEÑA THOMAZ

Secretária



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