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PREVINDENCIÁRIO. BENEFÍCIOS POR INCAPACIDADE. ÓBITO DO SEGURADO. LAUDO PERICIAL. INCAPACIDADE NAO DEMONSTRADA. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. NEXO DE CAUSALIDA...

Data da publicação: 19/05/2023, 07:00:58

EMENTA: PREVINDENCIÁRIO. BENEFÍCIOS POR INCAPACIDADE. ÓBITO DO SEGURADO. LAUDO PERICIAL. INCAPACIDADE NAO DEMONSTRADA. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. NEXO DE CAUSALIDADE. INOCORRÊNCIA. 1. A a responsabilidade civil do Estado pelos danos causados por seus agenes é objetiva, bastando, para sua caracterização, a ocorrência do evento danoso, o nexo causal e a conduta ilícita. 2. Nas ações objetivando benefícios por incapacidade, o julgador firma a sua convicção com base na perícia médica produzida no curso do processo, uma vez que a inaptidão laboral é questão que demanda conhecimento técnico, na forma do artigo 156 do CPC. 3. No caso dos autos, a falecida submeteu-se a perícia administrativa, onde verificou o perito do INSS, em agosto de 2017 a ausência de incapacidade laborativa e para as atividades habituais da segurada e a pericial judicial, na ação previdenciária em janeiro de 2018, que a falecida não estava incapacidatada para as atividades laborais que exercia, apresentando, contudo, pequena limitação aos grandes esforços. 4. À toda evidência, é certo que a segurada era portadora de cardiopatia. Entretanto, não há como se vincular, acima de qualquer dúvida razoável, a ocorrência do óbito e a atividade laboral exercida no momento imediatamente anterior à sua morte, ou seja, não há demonstração evidente do nexo causal. 5. Recurso desprovido. (TRF4, AC 5001177-92.2020.4.04.7006, DÉCIMA TURMA, Relatora CLÁUDIA CRISTINA CRISTOFANI, juntado aos autos em 11/05/2023)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5001177-92.2020.4.04.7006/PR

RELATORA: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI

APELANTE: CRISTIAN TIAGO TLUMASKI (Absolutamente Incapaz (Art. 3º CC)) (AUTOR)

APELANTE: NEILA PAULA TLUMASKI (AUTOR)

APELANTE: NELSON TLUMASKI (AUTOR)

APELADO: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO (RÉU)

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

RELATÓRIO

Cuida-se de ação interposta por CRISTIAN TIAGO TLUMASKI, NEILA PAULA TLUMASKI e NELSON TLUMASKI contra o INSS, a União e RICARDO DEL SEGUE VILLAS-BÔAS, objetivando a reparação de danos materiais (pensão civil e reembolso de despesas funerárias) e morais, ao argumento de que BERNADETE GUILOUSKI TLUMASKI, mãe e esposa dos requerentes, faleceu em 02/02/2018 em razão de não ter tido a incapacidade laboral reconhecida em perícias previdenciária administrativa e judicial, o que configuraria erro médico.

Os pedidos foram julgados improcedentes, na forma do art. 487, I, do Código de Processo Civil (ev. 337, SENT1).

Inconformados, os autores apelaram (ev. 350). Em suas razões, defendem que a falecida veio a óbito em decorrência de sua cardiopatia, por realizar esforço físico em sua atividade laboral, para a qual, a autarquia e o médico consideraram estar capacitada, concluindo por inexistência de incapacidade laborativa, apesar de seu médico particular atestar risco de óbito caso a mesma continuasse trabalhando. Assim, defendem a análise inadequada do quadro de saúde da de cujus. Alegam que os documentos colacionados ao feito atestam a incapacidade permanente para o trabalho, evidenciando erro pericial e, consequentemente, a responsabilidade civil, na forma do art. 37, §6º, da Constituição Federal. Além disso, não restam dúvidas quanto a equivocada sentença a quo, a qual, julgou improcedente o pedido inicial dos apelantes, posto que no caso em apreço, é certa a existência de abalos morais devastadores na “psique” dos apelantes, pois perderam a mãe e esposa, portanto, presente o dano extrapatrimonial, que não se trata de mero dissabor, tampouco, mero aborrecimento do cotidiano. Pugnam pelo prequestionamento de dispositivos legais e o provimento do apelo.

Apresentadas contrarrazões (ev. 354).

É o relatório. Peço dia.

VOTO

Controverte-se, em síntese, quanto à possibilidade de se imputar reparação - com lastro no artigo 37, §6º, da Constituição Federal - ao INSS, em razão de supostos erros médicos na perícia médica administrativa, realizada pela Autarquia Previdenciária, bem como em perícia judicial, realizada em ação previdenciária.

Segundo a defesa dos apelantes, a ação potencialmente causadora de dano seria a ausência de reconhecimento, por peritos médicos previdenciário e judicial, de situação de incapacidade total e definitiva para o trabalho de Bernadete Guilouski Tlumaski, o que teria ocasionado o óbito de referida pessoa enquanto estava no exercício de atividade laboral.

De início, vale dizer que, acaso constatada a responsabilidade da Auatrquia Previdenciária ela seria objetiva, na forma do que dispõe o art. 37, §6º, da Constituição Federal:

"Art. 37 (...)

§6º As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa."

Conclui-se, portanto, que a responsabilidade civil do Estado pelos danos causados por seus agenes é objetiva, bastando, para sua caracterização, a ocorrência do evento danoso, o nexo causal e a conduta ilícita.

Veja-se ementa do acórdão relativo ao Recurso Extraordinário n. 109.615-2, inscreveu o Ministro CELSO DE MELLO:

"Os elementos que compõem a estrutura e delineiam o perfil da responsabilidade civil objetiva do Poder Público compreendem (a) a alteridade do dano, (b) a causalidade material entre o eventus damni e o comportamento positivo (ação) ou negativo (omissão) do agente público, (c) a oficialidade da atividade causal e lesiva, imputável a agente do Poder Público, que tenha, nessa condição funcional, incidido em conduta comissiva ou omissiva, independentemente da licitude, ou não, do comportamento funcional (RTJ 140/636) e (d) a ausência de causa excludente da responsabilidade estatal (RTJ 55/503 – RTJ 71/99 – RTJ 91/377 – RTJ 99/1155 – RTJ 131/417).

Concludentemente, o Estado responde objetivamente pelo evento causado, desde que comprovados o nexo causal entre o fato lesivo e o dano, bem como o seu montante.

Todavia, não parece ser este o caso dos autos pelas razões que passo a explicitar.

Assim, a MM. Muíza Federal MARTA RIBEIRO PACHECO, analisando o caso concreto, assim decidiu (ev. 337):

Trata-se de ação proposta por Cristian Tiago Tlumaski, Neila Paula Tlumaski e Nelson Tlumaski contra o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, a União e Ricardo Del Segue Villas-Bôas, objetivando a reparação de danos materiais (pensão civil e reembolso de despesas funerárias) e morais. Para tanto, alegaram que Bernadete Guilouski Tlumaski, mãe e esposa dos requerentes, faleceu em 02/02/2018 em razão de não ter tido a incapacidade laboral reconhecida em perícias previdenciária administrativa e judicial, o que configuraria erro médico. Narraram que a falecida padecia de grave cardiopatia e, portanto, não poderia exercer qualquer trabalho, tal como aquele que exercia no momento do óbito (diarista/empregada doméstica). Disseram que o perito médico judicial (terceiro réu) reconheceu a existência da alegada incapacidade total para o trabalho somente depois de ocorrida a morte da segurada. Discorreram sobre os critérios de cálculo da pensão civil e do reembolso de despesas funerárias.

Gratuidade de justiça deferida aos autores no evento 3, DESPADEC1.

Contestações no evento 51, CONTES1 (União), evento 52, CONTES1 (INSS) e evento 55, CONTES1 (Ricardo Del Segue Villas-Bôas).

Réplicas às contestações no evento 61, IMPUGNA1, evento 61, IMPUGNA2 e evento 61, IMPUGNA3.

Manifestação do Ministério Público Federal no evento 64, PARECER1, sem abordar o mérito.

A decisão do evento 66, DESPADEC1 reconheceu a ilegitimidade passiva de Ricardo Del Segue Villas-Bôas, excluindo-o da lide. No mais, foram rejeitadas as demais preliminares e fixados os pontos controvertidos, determinando-se a realização de audiência de instrução, que ocorreu no evento 120 (oitiva de um informante e duas testemunhas).

No evento 142, DESPADEC1 foi deferida a realização de prova pericial médica indireta, cujo laudo foi anexado ao evento 259, LAUDOPERIC1, com complementações no evento 300, RESPOSTA1 e no evento 319, RESPOSTA1.

Sobre o laudo pericial e complementações, as partes se manifestaram nos eventos 270, 272, 273, 274, 310, 312, 313, 326 e 329.

O Ministério Público Federal ratificou o procedimento de não se manifestar sobre o mérito (evento 333, PROMO_MPF1).

É o relatório. Decido.

II - FUNDAMENTOS

Não há questões preliminares ou prejudiciais pendentes de apreciação.

Não é necessária a produção de outras provas pois, "(...) Nos termos do disposto no art. 371 do Código de Processo Civil, não está obrigado o magistrado a julgar a questão posta a seu exame de acordo com o pleiteado pelas partes, mas sim com o seu livre convencimento, utilizando-se dos fatos, provas, jurisprudência e aspectos pertinentes ao tema, bem como da legislação que entender aplicável ao caso. O juiz, de ofício ou a requerimento da parte, determina as provas necessárias à instrução do processo, indeferindo as diligências inúteis ou meramente protelatórias (art. 370, caput e § único, do CPC). (...)" (TRF4, AC 5007768-37.2015.4.04.7009, 3ª Turma, Relator Fernando Quadros da Silva, juntado aos autos em 05/04/2017).

Pensão civil e reembolso de despesas com funeral

A lide tem como fundamento a existência de supostos erros médicos: tanto a perícia médica administrativa, realizada no âmbito do INSS em agosto de 2017 (evento 1, INDEFERIMENTO26), como o ato pericial judicial, ocorrido no bojo de ação previdenciária em janeiro de 2018 (evento 1, LAUDOPERIC29), teriam, erroneamente, refutado a existência de incapacidade total da segurada Bernadete Guilouski Tlumaski para o trabalho. Considerando que esta veio a óbito enquanto estaria exercendo atividade laboral como diarista/empregada doméstica, o fato de não ter tido reconhecida a situação de incapacidade laboral teria contribuído diretamente para a morte pois, por ser portadora de grave cardiopatia, não poderia realizar esforços físicos, sob pena de morte súbita.

Para que seja procedente a pretensão exposta na inicial, a parte autora deve comprovar que o óbito de Bernadete, ocorrido em 02/02/2018 (evento 1, CERTOBT28), decorre do exercício de atividade laboral em momento em que estaria totalmente incapacitada para tanto, com necessidade de se abster da realização de qualquer esforço físico. Além disso, deve restar demonstrado, de maneira robusta, que a causa mortis tem relação direta com a enfermidade da qual era portadora e que ensejaria a situação de invalidez não reconhecida pelos peritos médicos do INSS e judicial.

A prova oral produzida na audiência de instrução do 120 demonstra, de maneira firme, que a morte de Bernadete Guilouski Tlumaski ocorreu enquanto esta desempenhava a atividade de diarista, exercendo lides domésticas (limpando o chão, lavando louças etc).

De acordo com o laudo pericial judicial produzido nestes autos, por profissional de confiança do Juízo e equidistante das partes, assim restou consignado, nos trechos que mais interessam ao deslinde da causa:

Laudo pericial do evento 259.1:

"a.1) se a parte submetida à perícia indireta era portadora de alguma doença (informar o código CID-10)?

a.1) A sra. Bernadete Guilouski Tlumaski era portadora das seguintes doenças:

Hipertensão arterial essencial – CID-10 I10

Cardiomiopatia hipertrófica septal assimétrica – CID-10: I42.2

(...)

a.4) foram apresentados exames, laudos e receitas médicas que o periciado realizou? Quais? Foram suficientes ao diagnóstico da doença?

a.4). Foram realizados vários exames e atestados médicos ao longo dos anos incluindo eletrocardiogramas, ecocardiogramas, teste ergométrico e ecocardiograma sob estresse físico. Além disso, constam relatórios de atendimento de urgência e receitas médicas. Tais exames foram suficientes para diagnóstico da doença.

(...)

a.8) é possível relacionar, de qualquer modo, a enfermidade da qual a periciada era portadora à causa mortis constante da certidão de óbito? Justificar.

a.8) Entre as hipóteses para o diagnóstico “parada cardíaca” consta a doença cardiomiopatia hipertrófica (inclusa como diagnóstico prévio) com significativa probabilidade de nexo causal, no caso em questão. A hipótese de “infarto agudo do miocárdio”, assim como de outras etiologias de origem cardíaca ou de outros sistemas, apesar de não se correlacionarem necessariamente com o diagnóstico prévio (cardiomiopatia hipertrófica) não podem ser excluídas sem análise de mais dados médico-legais.

a.9) é possível relacionar, de qualquer modo, a causa mortis ao exercício da atividade habitual da falecida, como empregada doméstica/diarista? Justificar.

a.9) Faltam elementos para análise adequada da condição clínica na época em que ocorreu a morte súbita. Não obtive acesso às informações a respeito da abordagem médica clínica entre o atendimento de urgência ocorrido em 23 de janeiro de 2018 e a data do óbito – 02 de fevereiro de 2018. O descritivo de síncope inexplicada constitui o elemento mais forte para estratificação de risco aumentado de morte súbita cardíaca. Dentre os documentos anteriores anexados, destaca-se a sugestão de incapacidade permanente descrita em 2017 pelo cardiologista assistente na ocasião (descrevendo síncope entre os sintomas). No que se refere aos exames anexados, nenhum deles indica forte correlação entre uma atividade física leve a moderada ao risco aumentado de morte súbita. Os exames “ecocardiograma sob estresse farmacológico” e “teste ergométrico”, realizado em março de 2017, não acrescentam sinais de risco adicional ao exercício. Os exames ressonância magnética cardíaca e holter não foram realizados ou não foram anexados.

Laudo complementar do evento 300.1:

6. Se a senhora Bernadete Guilouski Tlumaski evitasse o esforço físico, o necessário para a realização de serviços como empregada doméstica, evitaria ou diminuiria os riscos de morte súbita?

Possivelmente, mas não há como afirmar precisamente.

7. Considerando que a dona Bernadete Guilouski Tlumaski faleceu na data de 2 de fevereiro de 2018, tendo como causa (conforme certidão de óbito) a parada cardíaca - infarto agudo do miocárdio, é possível afirmar que a causa da morte está relacionada com esse quadro clinico de doença cardíaca da senhora Bernadete Guilouski Tlumaski?

Não. Para tal informação seria necessária necrópsia.

8. Considerando que na data de 23 de janeiro de 2018, a dona Bernadete Guilouski Tlumaski apresentou queixas álgicas, e ainda que, a perícia médica entendeu pela capacidade da requerente foi realizada em 31 de janeiro 2018, ou seja, 8 dias depois, e por fim que, o óbito da senhora Bernadete ocorreu na data de 2 de fevereiro 2021. Desta forma, considerando o curto período entre a perícia e a morte da senhora Bernadete, é possível afirmar que o diagnóstico pericial que entendeu pela capacidade laboral da senhora Bernadete foi equivocado?

Faltam dados para embasar esta resposta.

Laudo complementar do evento 319.1:

De acordo com os exames médicos, a doença apresentada pela Sra. Bernadete Guilouski Tlumaski, poderia ter ocasionado o seu óbito, independentemente de estar trabalhando?

Sim, poderia."

Do que se extrai da prova pericial, a falecida, efetivamente, era portadora de grave cardiopatia. Contudo, não há como se vincular, de forma robusta, a ocorrência do óbito à atividade laboral exercida no momento imediatamente anterior à morte. Inicialmente, é de se observar a inexistência de necrópsia, exame médico-legal que poderia indicar, com certeza, o motivo da morte de Bernadete. Além disso, o perito judicial afirmou que não há nos documentos médicos apresentados quaisquer indicações de restrições ao exercício de atividades leves/moderadas, que pudessem representar agravamento do risco de morte súbita. Também se destaca a conclusão de que a enfermidade da qual era portadora poderia ocasionar o óbito independentemente do exercício de qualquer trabalho: mesmo que fosse afastada do trabalho, a enfermidade ainda poderia implicar no resultado morte. Por fim, restou asseverado que a causa mortis informada na certidão de óbito ("parada cardíaca" e "infarto agudo do miocárdio" - evento 1, CERTOBT28) não tem correlação direta com a cardiopatia reconhecida pelo médico assistente da falecida.

Em suma, inexistem elementos suficientes para o acolhimento da pretensão exposta na inicial, tendo em vista que não há prova de que a ausência de afastamento do trabalho como diarista tenha provocado a morte da mãe/esposa dos autores. Logo, não há direito a pensão civil nem a reembolso de despesas funerárias.

Danos materiais e morais

Na forma do artigo 186 do Código Civil, "aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito". Por sua vez, o artigo 927 do referido diploma legal estabelece que "aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo".

A responsabilidade da parte ré, contudo, é objetiva, nos moldes do artigo 37, §6º, da Constituição Federal:

Constituição Federal

"Art. 37 (...)

§6º As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa."

Assim, para haver dano indenizável na situação em comento, é imprescindível a ocorrência concomitante dos seguintes requisitos: a) ação ou omissão do agente; b) dano; c) nexo de causalidade entre a ação e omissão e o dano.

A ação potencialmente causadora de dano seria a ausência de reconhecimento, por peritos médicos previdenciário e judicial, de situação de incapacidade total e definitiva para o trabalho de Bernadete Guilouski Tlumaski, o que teria ocasionado o óbito de referida pessoa enquanto estava no exercício de atividade laboral.

Todavia, conforme a fundamentação do tópico anterior desta sentença, não há vício a ser reconhecido quanto aos atos periciais questionados, pois não há prova robusta de que a cardiopatia da falecida tenha sido a causa da morte nem de que o exercício da atividade de diarista/empregada doméstica tenha sido determinante ao falecimento. Assim, não configurado sequer o ato danoso, também improcede a tese exposta inicial neste ponto.

III - DISPOSITIVO

Ante o exposto, julgo improcedentes os pedidos iniciais, extinguindo o processo, com resolução de mérito, nos termos do artigo 487, I, do Código de Processo Civil.

Em regra, nas ações objetivando benefícios por incapacidade, o julgador firma a sua convicção com base na perícia médica produzida no curso do processo, uma vez que a inaptidão laboral é questão que demanda conhecimento técnico, na forma do artigo 156 do CPC.

O perito deve examinar a parte autora com imparcialidade e apresentar as suas conclusões de forma clara, coesa e fundamentada.

No caso dos autos, a falecida submeteu-se a perícia administrativa, onde verificou o perito do INSS, em agosto de 2017 (evento 1, INDEFERIMENTO26) a ausência de incapacidade laborativa e para as atividades habituais da segurada e a pericial judicial, na ação previdenciária em janeiro de 2018 (evento 1, LAUDOPERIC29), que a falecida não estava incapacidatada para as atividades laborais que exercia, apresentando, contudo, pequena limitação aos grandes esforços.

A concessão de benefícios por incapacidade para o exercício de atividade laboral está prevista nos artigos 42 e 59 da Lei nº 8.213/91, verbis:

Art. 42. A aposentadoria por invalidez, uma vez cumprida, quando for o caso, a carência exigida, será devida ao segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, e ser-lhe-á paga enquanto permanecer nesta condição.

§ 1º A concessão de aposentadoria por invalidez dependerá da verificação da condição de incapacidade mediante exame médico-pericial a cargo da Previdência Social, podendo o segurado, às suas expensas, fazer-se acompanhar de médico de sua confiança.

§ 2º A doença ou lesão de que o segurado já era portador ao filiar-se ao Regime Geral de Previdência Social não lhe conferirá direito à aposentadoria por invalidez, salvo quando a incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento dessa doença ou lesão.

(...)

Art. 59. O auxílio-doença será devido ao segurado que, havendo cumprido, quando for o caso, o período de carência exigido nesta Lei, ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual por mais de 15 dias consecutivos.

Extraem-se da leitura dos dispositivos acima transcritos os três requisitos para a concessão dos benefícios por incapacidade: 1) a qualidade de segurado; 2) o cumprimento do período de carência de 12 (doze) contribuições mensais; 3) a incapacidade para o trabalho de caráter permanente (aposentadoria por invalidez) ou temporário (auxílio-doença).

No tocante à incapacidade, se for temporária, ainda que total ou parcial, para a sua atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias consecutivos, caberá a concessão de auxílio-doença.

O auxílio-doença, posteriormente, será convertido em aposentadoria por invalidez, se sobrevier incapacidade total e permanente, ou em auxílio-acidente, se a incapacidade temporária for extinta e o segurado restar com sequela permanente que reduza sua capacidade laborativa, ou extinto, em razão da cura do segurado.

De outro lado, a aposentadoria por invalidez pressupõe incapacidade total e permanente e restar impossibilitada a reabilitação para o exercício de outra atividade laborativa.

Em ambos os casos, a incapacidade para o exercício de atividade que garanta a subsistência do segurado será averiguada pelo julgador, ao se valer de todos os meios de prova acessíveis e necessários para análise das condições de saúde do requerente, sobretudo o exame médico-pericial, e o benefício terá vigência enquanto essa condição persistir.

Nesse contexto, é necessário esclarecer que não basta estar o segurado acometido de doença grave ou lesão, mas, sim, demonstrar que sua incapacidade para o labor delas decorre, o que não restou evidenciado tanto no procedimento administrativo, como na perícia realizada em juízo.

No caso em tela, do exame pericial realizado em juízo, colhem-se as seguintes informações:

Laudo pericial do evento 259.1:

"a.1) se a parte submetida à perícia indireta era portadora de alguma doença (informar o código CID-10)?

a.1) A sra. Bernadete Guilouski Tlumaski era portadora das seguintes doenças:

Hipertensão arterial essencial – CID-10 I10

Cardiomiopatia hipertrófica septal assimétrica – CID-10: I42.2

(...)

a.4) foram apresentados exames, laudos e receitas médicas que o periciado realizou? Quais? Foram suficientes ao diagnóstico da doença?

a.4). Foram realizados vários exames e atestados médicos ao longo dos anos incluindo eletrocardiogramas, ecocardiogramas, teste ergométrico e ecocardiograma sob estresse físico. Além disso, constam relatórios de atendimento de urgência e receitas médicas. Tais exames foram suficientes para diagnóstico da doença.

(...)

a.8) é possível relacionar, de qualquer modo, a enfermidade da qual a periciada era portadora à causa mortis constante da certidão de óbito? Justificar.

a.8) Entre as hipóteses para o diagnóstico “parada cardíaca” consta a doença cardiomiopatia hipertrófica (inclusa como diagnóstico prévio) com significativa probabilidade de nexo causal, no caso em questão. A hipótese de “infarto agudo do miocárdio”, assim como de outras etiologias de origem cardíaca ou de outros sistemas, apesar de não se correlacionarem necessariamente com o diagnóstico prévio (cardiomiopatia hipertrófica) não podem ser excluídas sem análise de mais dados médico-legais.

a.9) é possível relacionar, de qualquer modo, a causa mortis ao exercício da atividade habitual da falecida, como empregada doméstica/diarista? Justificar.

a.9) Faltam elementos para análise adequada da condição clínica na época em que ocorreu a morte súbita. Não obtive acesso às informações a respeito da abordagem médica clínica entre o atendimento de urgência ocorrido em 23 de janeiro de 2018 e a data do óbito – 02 de fevereiro de 2018. O descritivo de síncope inexplicada constitui o elemento mais forte para estratificação de risco aumentado de morte súbita cardíaca. Dentre os documentos anteriores anexados, destaca-se a sugestão de incapacidade permanente descrita em 2017 pelo cardiologista assistente na ocasião (descrevendo síncope entre os sintomas). No que se refere aos exames anexados, nenhum deles indica forte correlação entre uma atividade física leve a moderada ao risco aumentado de morte súbita. Os exames “ecocardiograma sob estresse farmacológico” e “teste ergométrico”, realizado em março de 2017, não acrescentam sinais de risco adicional ao exercício. Os exames ressonância magnética cardíaca e holter não foram realizados ou não foram anexados.

Laudo complementar do evento 300.1:

6. Se a senhora Bernadete Guilouski Tlumaski evitasse o esforço físico, o necessário para a realização de serviços como empregada doméstica, evitaria ou diminuiria os riscos de morte súbita?

Possivelmente, mas não há como afirmar precisamente.

7. Considerando que a dona Bernadete Guilouski Tlumaski faleceu na data de 2 de fevereiro de 2018, tendo como causa (conforme certidão de óbito) a parada cardíaca - infarto agudo do miocárdio, é possível afirmar que a causa da morte está relacionada com esse quadro clinico de doença cardíaca da senhora Bernadete Guilouski Tlumaski?

Não. Para tal informação seria necessária necrópsia.

8. Considerando que na data de 23 de janeiro de 2018, a dona Bernadete Guilouski Tlumaski apresentou queixas álgicas, e ainda que, a perícia médica entendeu pela capacidade da requerente foi realizada em 31 de janeiro 2018, ou seja, 8 dias depois, e por fim que, o óbito da senhora Bernadete ocorreu na data de 2 de fevereiro 2021. Desta forma, considerando o curto período entre a perícia e a morte da senhora Bernadete, é possível afirmar que o diagnóstico pericial que entendeu pela capacidade laboral da senhora Bernadete foi equivocado?

Faltam dados para embasar esta resposta.

Laudo complementar do evento 319.1:

De acordo com os exames médicos, a doença apresentada pela Sra. Bernadete Guilouski Tlumaski, poderia ter ocasionado o seu óbito, independentemente de estar trabalhando?

Sim, poderia."

Desse modo, com razão a Julgadora de origem.

À toda evidência, é certo que a segurada era portadora de cardiopatia. Entretanto, não há como se vincular, acima de qualquer dúvida razoável, a ocorrência do óbito e a atividade laboral exercida no momento imediatamente anterior à sua morte, ou seja, não há demonstração evidente do nexo causal.

Nexo causal é o vínculo lógico entre determinada conduta e o dano suportado pelo agente1. Ou seja, é preciso que o ato ensejador da responsabilidade seja a causa do dano e que o prejuízo sofrido pela vítima seja decorrência desse ato.

Na hipótese, em nenhum momento restou comprovado que a doença que acometia a falecida tenha sido a causa da morte nem de que o exercício da atividade de diarista/empregada doméstica tenha sido determinante ao falecimento.

Destaque-se que restou reconhecido que restou asseverado que a causa mortis informada na certidão de óbito ("parada cardíaca" e "infarto agudo do miocárdio" - evento 1, CERTOBT28) não tem correlação direta com a cardiopatia reconhecida pelo médico assistente da falecida.

Logo, não há qualquer reparo no julgado.

CONCLUSÃO

Desprovimento do apelo.

HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS

Na espécie, diante do não acolhimento do apelo, impõe-se a majoração dos honorários advocatícios, fixados na sentença nos percentuais mínimos previstos nos incisos do §3º do artigo 85 do CPC sobre o valor atualizado da causa, em 50% sobre o valor apurado em cada faixa, de modo que, sobre a primeira faixa, são majorados de 10% para 15%, e assim proporcionalmente se a liquidação apurar valores sobre as faixas mais elevadas, considerando o artigo 85, § 2º, incisos I a IV, e §11, do CPC. Contudo, resta mantida a suspensão da exigibilidade da verba em razão da gratuidade da justiça.

PREQUESTIONAMENTO

Objetivando possibilitar o acesso das partes às instâncias superiores, considero prequestionadas as matérias constitucionais e/ou legais suscitadas, conquanto não referidos expressamente os respectivos artigos na fundamentação do voto.

DISPOSITIVO

Ante o exposto, voto por negar provimento ao agravo de instrumento.



Documento eletrônico assinado por CLÁUDIA CRISTINA CRISTOFANI, Desembargadora Federal Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003837261v11 e do código CRC 5f14b976.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): CLÁUDIA CRISTINA CRISTOFANI
Data e Hora: 11/5/2023, às 19:41:46


1. Nexo de causalidade na responsabilidade civil: conceito e teorias explicativas, Renata Pozzi Kretzmann

5001177-92.2020.4.04.7006
40003837261.V11


Conferência de autenticidade emitida em 19/05/2023 04:00:58.

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5001177-92.2020.4.04.7006/PR

RELATORA: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI

APELANTE: CRISTIAN TIAGO TLUMASKI (Absolutamente Incapaz (Art. 3º CC)) (AUTOR)

APELANTE: NEILA PAULA TLUMASKI (AUTOR)

APELANTE: NELSON TLUMASKI (AUTOR)

APELADO: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO (RÉU)

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

EMENTA

previndenciário. benefícios por incapacidade. óbito do segurado. laudo pericial. incapacidade nao demonstrada. responsabilidade objetiva. nexo de causalidade. inocorrência.

1. A a responsabilidade civil do Estado pelos danos causados por seus agenes é objetiva, bastando, para sua caracterização, a ocorrência do evento danoso, o nexo causal e a conduta ilícita.

2. Nas ações objetivando benefícios por incapacidade, o julgador firma a sua convicção com base na perícia médica produzida no curso do processo, uma vez que a inaptidão laboral é questão que demanda conhecimento técnico, na forma do artigo 156 do CPC.

3. No caso dos autos, a falecida submeteu-se a perícia administrativa, onde verificou o perito do INSS, em agosto de 2017 a ausência de incapacidade laborativa e para as atividades habituais da segurada e a pericial judicial, na ação previdenciária em janeiro de 2018, que a falecida não estava incapacidatada para as atividades laborais que exercia, apresentando, contudo, pequena limitação aos grandes esforços.

4. À toda evidência, é certo que a segurada era portadora de cardiopatia. Entretanto, não há como se vincular, acima de qualquer dúvida razoável, a ocorrência do óbito e a atividade laboral exercida no momento imediatamente anterior à sua morte, ou seja, não há demonstração evidente do nexo causal.

5. Recurso desprovido.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 10ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento ao agravo de instrumento, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Curitiba, 09 de maio de 2023.



Documento eletrônico assinado por CLÁUDIA CRISTINA CRISTOFANI, Desembargadora Federal Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003837262v4 e do código CRC 7a34882d.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): CLÁUDIA CRISTINA CRISTOFANI
Data e Hora: 11/5/2023, às 19:41:46


5001177-92.2020.4.04.7006
40003837262 .V4


Conferência de autenticidade emitida em 19/05/2023 04:00:58.

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 02/05/2023 A 09/05/2023

Apelação Cível Nº 5001177-92.2020.4.04.7006/PR

RELATORA: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI

PRESIDENTE: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI

PROCURADOR(A): MAURICIO PESSUTTO

APELANTE: CRISTIAN TIAGO TLUMASKI (Absolutamente Incapaz (Art. 3º CC)) (AUTOR)

ADVOGADO(A): GUILHERME ZAIATS (OAB PR098867)

ADVOGADO(A): LEONARDO BELIN (OAB PR096761)

ADVOGADO(A): DIARLE LUCAS MEDEIROS (OAB PR104965)

APELANTE: NEILA PAULA TLUMASKI (AUTOR)

ADVOGADO(A): GUILHERME ZAIATS (OAB PR098867)

ADVOGADO(A): LEONARDO BELIN (OAB PR096761)

ADVOGADO(A): DIARLE LUCAS MEDEIROS (OAB PR104965)

APELANTE: NELSON TLUMASKI (AUTOR)

ADVOGADO(A): GUILHERME ZAIATS (OAB PR098867)

ADVOGADO(A): LEONARDO BELIN (OAB PR096761)

ADVOGADO(A): DIARLE LUCAS MEDEIROS (OAB PR104965)

APELADO: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO (RÉU)

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 02/05/2023, às 00:00, a 09/05/2023, às 16:00, na sequência 789, disponibilizada no DE de 19/04/2023.

Certifico que a 10ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 10ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO AO AGRAVO DE INSTRUMENTO.

RELATORA DO ACÓRDÃO: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI

Votante: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI

Votante: Juiz Federal OSCAR VALENTE CARDOSO

Votante: Juíza Federal MÁRCIA VOGEL VIDAL DE OLIVEIRA

SUZANA ROESSING

Secretária



Conferência de autenticidade emitida em 19/05/2023 04:00:58.

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