Agravo de Instrumento Nº 5052854-67.2019.4.04.0000/SC
RELATORA: Desembargadora Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
AGRAVANTE: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO
AGRAVADO: SONIA COUTO
RELATÓRIO
Trata-se de agravo de instrumento, com pedido de efeito suspensivo, em ação ordinária, contra decisão que deferiu pedido de tutela de urgência, para determinar o imediato restabelecimento da pensão por morte em nome da parte autora.
Sustentou a parte agravante, em síntese, que os atos da administração pública na presente situação seguiram as determinações do TCU (relatório final da auditoria que apurou a existência de pagamentos indevidos de pensões concedidas pelo art. 5º, da Lei nº 3.373/1958). Aduziu que o direito à percepção da pensão está condicionado à permanência como solteira, a não ocupação de cargo público permanente e à dependência econômica em relação ao instituidor. Ressaltou que a agravada dispõe de meio apropriado de sustento e não deve ser beneficiária da pensão ora em discussão, já que inexiste dependência econômica em relação ao instituidor, requisito indispensável para manutenção da pensão concedida com base na Lei nº 3.373/58. Pugnou pela atribuição de efeito suspensivo ao recurso.
Indeferido o efeito suspensivo, foi oportunizada a apresentação de contraminuta.
É o relatório.
VOTO
Quando da análise do pedido de efeito suspensivo, foi proferida a seguinte decisão:
"No caso dos autos, em que pese as alegações da parte agravante, tenho que deve ser prestigiada a decisão recorrida, não existindo nos autos situação que justifique, nesse momento processual, alteração do que foi decidido:
"Analiso o pedido liminar
1. Trata-se de ação com pedido liminar requerendo o imediato restabelecimento de pensão por morte.
Narra que é pensionista de seu pai, funcionário da Receita Federal, desde o ano de 1980. No entanto, a União em decisão administrativa recente cancelou o pagamento do benefício da pensão, em razão da constatação de união estável da parte autora com Aguinaldo Ratzke. Aduz que não possui união estável com Aguinaldo e o cancelamento da pensão, portanto, é indevido.
É o breve relato. Decido.
2. O artigo 300 do Código de Processo Civil prevê que o juiz poderá antecipar, total ou parcialmente, os efeitos da tutela pretendida no pedido inicial, desde que se convença da probabilidade do direito, bem como exista perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo.
Acerca da questão a Lei nº 3.373/58 (dispõe sobre o Plano de Assistência ao Funcionário e sua Família) dispõe:
Art 5º Para os efeitos do artigo anterior, considera-se família do segurado: (Vide Lei nº 5.703, de 1971)
I - Para percepção de pensão vitalícia:
a) a espôsa, exceto a desquitada que não receba pensão de alimentos;
b) o marido inválido;
c) a mãe viúva ou sob dependência econômica preponderante do funcionário, ou pai inválido no caso de ser o segurado solteiro ou viúvo;
II - Para a percepção de pensões temporárias:
a) o filho de qualquer condição, ou enteado, até a idade de 21 (vinte e um) anos, ou, se inválido, enquanto durar a invalidez;
b) o irmão, órfão de pai e sem padrasto, até a idade de 21 (vinte e um) anos, ou, se inválido enquanto durar a invalidez, no caso de ser o segurado solteiro ou viúvo, sem filhos nem enteados.
Parágrafo único. A filha solteira, maior de 21 (vinte e um) anos, só perderá a pensão temporária quando ocupante de cargo público permanente.
Assim, a Lei n. 3.373, de 12.3.1958, ao tratar das pensões vitalícias e temporárias de funcionários da União, determinou que a filha solteira, maior de 21 (vinte e um) anos, só perderá a pensão temporária quando ocupante de cargo público permanente.
Assim, os requisitos são: (1) pemanecer solteira e (2) não ocupar cargo público permanente.
A questão controvertida no caso dos autos diz respeito ao estado civil da parte autora.
A União entendeu administrativamente que a parte autora possui união estável com Aguinaldo Ratke, o que impede o recebimento da pensão. Os argumentos da União foram tratados na decisão administrativa anexada no evento 1, CARTA7, dos quais destaco: (a) há indícios de que poderia ter havido ou haver no momento união estável; (b) há coincidência de endereços de residência e CEP entre os anos de 2016 a 2018; (c) a parte autora não apresentou administrativamente comprovantes de endereço em nome de Aguinaldo Ratzke; (d) há dois filhos em comum - André Agnaldo Couto e Anderson Couto.
De início, importante destacar que a decisão administrativa cita indícios de união estável.
A confrontar o ato administrativo, o próprio Aguinaldo Ratke apresentou declaração nos autos de próprio punho afirmando que nunca existiu união estável entre ele e a parte autora (evento 1, DECL9).
A parte autora esclarece ainda que Aguinaldo foi casado até 2009 e os filhos nasceram em 1978 e 1985 de encontros casuais, conforme o seguinte trecho da petição inicial:
Ocorreu de fato, como vida em comum, a mera aproximação eventual com encontros íntimos, que veio a gerar 02 (dois) filhos, sem a intenção de constituir família (Aguinaldo era casado)e sem as dependências pessoais e econômicasentre ambos, até porque jamais houve a publicidade dessa intenção.
Tratou-se de encontros casuais e descompromissados,estando diante da ausência dos requisitos essenciais à caracterização de uma união estávelAunião estável, conforme proclamada acima e preconizado na lei:devendo a lei facilitar sua conversão em casamento,ocorre quando é possível o casamento entre as partes,de modo distinto do caso presente onde a autora é solteira e Aguinaldo Ratzke é casado com Maria Soeli Retzke, de quem se divorciou somente em 18/12/2009, conforme certidão de casamento em anexo.
Dessa forma, não poderiam as partes se casarem até tal evento.O nascimento dos filhos em comum, André Agnaldo Couto Ratzkee Anderson Couto Ratzke, ocorreram em 02/12/1978 e 28/02/1985, respectivamente,enquanto o nome RATZKE foi acrescentado decorrente de ESCRITURA DE RECONHECIMENTO DE PATERNIDADE, firmado pelo pai em 24/01/1994, ou seja,09 (nove) anos depois do nascimento do segundo filho, em 1985,conforme os documentos anexos (certidões de nascimento e escritura pública).Destaca-se dos fatos que a autora não convivia em união estável com Aguinaldo Ratzke porque seria impossível se casarem,dado o matrimônio deste,e também se conclui pela inexistência da união devido a falta de reconhecimento por ocasião dos nascimentosdos filhos.
Cumpre registrar que a parte autora recebe o benefício de pensão desde 1980, portanto, há quase 30 anos.
Ademais, a existência ou não da união estável é questão controvertida, a qual demanda dilação probatória.
Neste caso, a jurisprudência entende que deve permanecer o pagamento da pensão, ao menos até a sentença, quando a situação será analisada em cognição exauriente.
Com efeito, em sendo controvertida a existência de união estável, a afastar a condição da autora de filha solteira, para efeito de percepção de pensão por morte, é de se restabelecer o pagamento do benefício de natureza alimentar, mantido há quase 30 (trinta) anos.
Nesse sentido, veja-se:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. ADMINISTRATIVO. PENSÃO POR MORTE. LEI N°3.373/58. UNIÃO ESTÁVEL. NECESSIDADE DE DILAÇÃO PROBATÓRIA. 1. A parte autora recebe o benefício há mais de 30 anos. A retirada do pagamento sem o devido exame das provas sobre a efetiva situação de solteira ou unida estavelmente é descabida. 2. O andamento processual poder demonstrar a realidade dos fatos. Por isso, a dilação probatória se faz necessária para fins de esclarecer os contornos da lide e apurar a procedência das alegações de ambos os polos. 3. No presente momento, não estão preenchidos os requisitos autorizadores de concessão de liminar. Não há periculum in mora para a União, porém, há para a autora. E o fumus boni iuris demanda a mencionada dilação probatória. (TRF4, AG 5019618-27.2019.4.04.0000, TERCEIRA TURMA, Relatora MARGA INGE BARTH TESSLER, juntado aos autos em 16/08/2019)
Do voto:
Em que pese a insurgência recursal, afiguram-se irrefutáveis as considerações desenvolvidas na decisão agravada, as quais transcrevo tomando-as como próprias, eis que despiciendo utilizar-se de tautologia para exame de situações jurídicas aqui envolvidas. Verbis:
Dispõe o artigo 300 do Código de Processo Civil que a tutela de urgência de natureza antecipada será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano.
Tenho que o pedido de liminar deve ser deferido.
Em que pese não tenha sido integralmente anexado o processo administrativo que culminou com a decisão de cessação do benefício até então percebido pela parte autora, verifico que a pensão foi instituída em 06/05/1983 (CHEQ6, evento 01), o que revela que está sendo pago pela administração há mais de 35 (trinta e cinco) anos, bem como que o principal fundamento da referida decisão está na existência de indícios de união estável.
Embora os fatos sejam controvertidos, não vejo óbice ao deferimento da tutela provisória para assegurar a manutenção do pagamento da pensão, preservando-se o resultado útil do processo e para evitar maior prejuízo à parte autora, sendo que tal decisão pode ser revista após a regular instrução do feito.
Com efeito, apesar das argumentações da União, a parte autora recebe o benefício há mais de 30 anos. A retirada do pagamento sem o devido exame das provas sobre a efetiva situação de solteira ou unida estavelmente é descabida.
O andamento processual poder demonstrar a realidade dos fatos. Por isso, a dilação probatória se faz necessária para fins de esclarecer os contornos da lide e apurar a procedência das alegações de ambos os polos.
No presente momento, não estão preenchidos os requisitos autorizadores de concessão de liminar. Não há periculum in mora para a União, porém, há para a autora. E o fumus boni iuris demanda a mencionada dilação probatória.
(...)
ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. TUTELA DE URGÊNCIA. PENSÃO. SERVIDOR PÚBLICO. FILHA MAIOR SOLTEIRA. UNIÃO ESTÁVEL. NECESSIDADE DE DILAÇÃO PROBATÓRIA. Em sendo controvertida a existência de união estável, a afastar a condição da autora de filha solteira, para efeito de percepção de pensão por morte, é de se restabelecer o pagamento do benefício de natureza alimentar, mantido há mais de 31 (trinta e um) anos, a fim de oportunizar o devido contraditório e ampla defesa. (TRF4, AG 5007269-89.2019.4.04.0000, QUARTA TURMA, Relatora VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, juntado aos autos em 01/07/2019)
ADMINISTRATIVO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. PENSÃO ESPECIAL TEMPORÁRIA. FILHA MAIOR SOLTEIRA. RESTABELECIMENTO. UNIÃO ESTÁVEL. SITUAÇÃO FÁTICO-JURÍDICA CONTROVERTIDA. ATO ADMINISTRATIVO. PRESUNÇÃO DE LEGALIDADE E LEGITIMIDADE. LEI N.º 3.373/1958. NECESSIDADE DE DILAÇÃO PROBATÓRIA. NATUREZA ALIMENTAR. Não obstante milite em favor dos atos administrativos a presunção de legalidade e legitimidade e não reste evidenciada ofensa à ampla defesa no processo administrativo, a situação fático-jurídica é controvertida (existindo informações contaditórias, inclusive na declaração anual de rendimentos) e exige dilação probatória, o que recomenda a manutenção do pagamento do benefício - que já perdura por anos (desde 1969) -, pelo menos até a prolação da sentença (juízo de cognição exauriente, após instrução probatória), dada sua natureza alimentar (TRF4, AG 5033351-60.2019.4.04.0000, QUARTA TURMA, Relator SÉRGIO RENATO TEJADA GARCIA, juntado aos autos em 27/09/2019)
Do voto:
Por ocasião da análise do pedido suspensivo, foi prolatada decisão nos seguintes termos:
O eg. Supremo Tribunal Federal manifestou-se sobre o tema, ao analisar medida cautelar em mandado de segurança coletivo (MS 34.677 MC/DF), impetrado pela Associação Nacional da Previdência e da Seguridade Social, envolvendo a execução do Acórdão n.º 2.780/2016 do Plenário do Tribunal de Contas da União - o qual determinou a revisão de benefícios previdenciários de pensão por morte titularizados por filhas solteiras de servidores públicos civis, instituídas com base no art. 5º, II, § único, da Lei n.º 3.373/1958 -, nos seguintes termos:
(...)
Feitas essas considerações, anoto que a concessão de medida liminar em mandado de segurança pressupõe o atendimento dos requisitos contidos no artigo 7º, III, da Lei 12.016/2009, quais sejam, a existência de fundamento relevante e a possibilidade de que a medida seja ineficaz caso se aguarde o julgamento definitivo do writ. A matéria em comento está adstrita à legalidade do ato do Tribunal de Contas da União que reputa necessária a comprovação de dependência econômica da pensionista filha solteira maior de 21 anos, para o reconhecimento do direito à manutenção de benefício de pensão por morte concedida sob a égide do art. 5º, II, parágrafo único, da Lei 3.373/58. Partindo dessa premissa, o TCU determinou a reanálise de pensões concedidas a mulheres que possuem outras fontes de renda, além do benefício decorrente do óbito de servidor público, do qual eram dependentes na época da concessão. Dentre as fontes de renda, incluem-se: renda advinda de relação de emprego, na iniciativa privada, de atividade empresarial, na condição de sócias ou representantes de pessoas jurídicas ou de benefícios do INSS; recebimento de pensão com fundamento na Lei 8.112/90, art. 217, I, alíneas a, b e c (pensão na qualidade de cônjuge de servidor); recebimento de pensão com fundamento na Lei 8.112/90, art. 217, inciso I, alíneas d e e (pais ou pessoa designada) e inciso II, alíneas a, c e d (filhos até 21 anos, irmão até 21 anos ou inválido ou pessoa designada até 21 anos ou inválida); a proveniente da ocupação de cargo público efetivo federal, estadual, distrital ou municipal ou aposentadoria pelo RPPS; ocupação de cargo em comissão ou de cargo em empresa pública ou sociedade de economia mista. Discute-se, portanto, se a dependência econômica em relação ao instituidor do benefício e do valor pago a título de pensão por morte encontra-se no rol de requisitos para a concessão e manutenção do benefício em questão. Inicialmente, assento a jurisprudência consolidada neste Supremo Tribunal Federal quanto à incidência, aos benefícios previdenciários, da lei em vigência ao tempo em que preenchidos os requisitos necessários à sua concessão. Trata-se da regra "tempus regit actum", a qual aplicada ao ato de concessão de pensão por morte significa dizer: a lei que rege a concessão do benefício de pensão por morte é a vigente na data do óbito do segurado. Neste sentido: "AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. ADMINISTRATIVO. FISCAIS DE RENDA. PENSÃO POR MORTE. 1) A pensão por morte rege-se pela legislação em vigor na data do falecimento do segurado. Princípio da lei do tempo rege o ato (tempus regit actum). Precedentes. 2) Impossibilidade de análise de legislação local (Lei Complementar estadual n. 69/1990 e Lei estadual n. 3.189/1999). Súmula n. 280 do Supremo Tribunal Federal. Agravo regimental ao qual se nega provimento" (ARE 763.761AgR, Rel. Min. Cármen Lúcia, Segunda Turma, DJe 10.12.2013)."Agravo regimental em recurso extraordinário com agravo. 2. Pensão por morte. É firme a jurisprudência desta Corte no sentido de que o valor da pensão por morte deve observar o padrão previsto ao tempo do evento que enseja o benefício. Tempus regit actum. 3. Evento instituidor do benefício anterior à vigência da Emenda Constitucional 20/1998. Descabe emprestar eficácia retroativa à diretriz constitucional. 4. Agravo regimental a que se nega provimento" (ARE 717.077AgR, Rel. Min. Gilmar Mendes, Segunda Turma, DJe 12.12.2012).A tese foi assentada, inclusive, no julgamento do RE 597.389-RG-QO, sob a sistemática da repercussão geral.As pensões cujas revisões foram determinadas no Acórdão 2.780/2016 - Plenário - TCU, tiveram suas concessões amparadas na Lei 3.373/58, que dispunha sobre o Plano de Assistência ao Funcionário e sua Família (regulamentando os artigos 161 e 256 da Lei 1.711/1952, a qual, por sua vez, dispunha sobre o Estatuto dos Funcionários Públicos Civis da União), cujos artigos 3º e 5º tinham a seguinte redação:Art. 3º O Seguro Social obrigatório garante os seguintes benefícios: I - Pensão vitalícia; II - Pensão temporária; III - Pecúlio especial. (...) Art. 5º Para os efeitos do artigo anterior, considera-se família do segurado: I - Para percepção de pensão vitalícia: a) a espôsa, exceto a desquitada que não receba pensão de alimentos; b) o marido inválido; c) a mãe viúva ou sob dependência econômica preponderante do funcionário, ou pai inválido no caso de ser o segurado solteiro ou viúvo; II - Para a percepção de pensões temporárias: a) o filho de qualquer condição, ou enteado, até a idade de 21 (vinte e um) anos, ou, se inválido, enquanto durar a invalidez; b) o irmão, órfão de pai e sem padrasto, até a idade de 21 (vinte e um) anos, ou, se inválido enquanto durar a invalidez, no caso de ser o segurado solteiro ou viúvo, sem filhos nem enteados. Parágrafo único. A filha solteira, maior de 21 (vinte e um) anos, só perderá a pensão temporária quando ocupante de cargo público permanente.Os requisitos para a concessão da pensão por morte aos filhos dos servidores públicos civis federais eram, portanto, serem menores de 21 (vinte e um anos) ou inválidos. Excepcionalmente, a filha que se mantivesse solteira após os 21 anos não deixaria de receber a pensão por morte, exceto se passasse a ocupar cargo público permanente. Não se exigiam outros requisitos como, por exemplo, a prova da dependência econômica da filha em relação ao instituidor ou ser a pensão sua única fonte de renda. De igual modo, não havia na lei hipótese de cessação da pensão calcada no exercício, pela pensionista, de outra atividade laborativa que lhe gerasse algum tipo de renda, à exceção de cargo público permanente. A superação da qualidade de beneficiário da pensão temporária ocorria, apenas, em relação aos filhos do sexo masculino após os 21 anos, quando da recuperação da capacidade laborativa pelo filho inválido, e, no que tange à filha maior de 21 anos, na hipótese de alteração do estado civil ou de posse em cargo público. A Lei 1.711/1952 e todas as que a regulamentavam, incluída a Lei 3.373/58, foram revogadas pela Lei 8.112/90, que dispôs sobre o regime jurídico dos servidores públicos civis da União, das autarquias e das fundações públicas federais, à luz na nova ordem constitucional inaugurada em 1988. Nesse novo estatuto a filha solteira maior de 21 anos não mais figura no rol de dependentes habilitados à pensão temporária. Atualmente, considerando as recentes reformas promovidas pela Lei 13.135/2015, somente podem ser beneficiários das pensões, cujos instituidores sejam servidores públicos civis, o cônjuge ou companheiro, os filhos menores de 21 anos, inválidos ou com deficiência mental ou intelectual, e os pais ou irmão que comprovem dependência econômica. Nesse contexto, as pensões cuja revisão suscita o Tribunal de Contas da União no Acórdão 2.780/2016 foram concedidas entre o início e o término de vigência da Lei 3.373/58, ou seja, de março de 1958 a dezembro de 1990. A respeito do prazo para a revisão do ato de concessão de benefícios previdenciários a servidor público ou a seus dependentes, a Lei 9.784/99 dispõe, no artigo 54, ser de cinco anos o prazo para a Administração anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis aos destinatários. Com efeito, pende de julgamento neste Supremo Tribunal Federal o tema em que se discute o termo inicial do prazo decadencial para revisar atos de pensão ou aposentadoria pelo Tribunal de Contas da União, se da concessão da aposentadoria/pensão ou se do julgamento pela Corte de Contas, em sede de repercussão geral no bojo de RE 636.553, pendente ainda o julgamento do mérito. No entanto, o Acórdão impugnado diz respeito a atos de concessão cuja origem são óbitos anteriores a dezembro de 1990, sendo muito provável que o prazo de cinco anos, contados da concessão ou do julgamento, já tenha expirado. De todo modo, não houve, no Acórdão do TCU, menção ao respeito ao prazo decadencial de revisão previsto no artigo 9.784/99, porquanto o entendimento lá sustentado diz respeito à possibilidade de revisão a qualquer tempo em que se modificarem as condições fáticas da dependência econômica. Haure-se, portanto, da leitura rasa da jurisprudência e da legislação acima citadas a seguinte conclusão: as pensões concedidas às filhas maiores sob a égide da Lei 3.373/58 que preenchiam os requisitos pertinentes ao estado civil e à não ocupação de cargo público de caráter permanente encontram-se consolidadas e somente podem ser alteradas, é dizer, cessadas, se um dos dois requisitos for superado, ou seja, se deixarem de ser solteiras ou se passarem a ocupar cargo público permanente. O Tribunal de Contas da União, contudo, não interpreta do mesmo modo a legislação e a jurisprudência transcritas acima e esclarece, no ato coator, ter havido uma "evolução na jurisprudência recente do TCU a respeito do tema". O TCU adotava a tese firmada no Poder Judiciário no sentido de que à pensão por morte aplica-se a lei vigente à época da concessão. Permitia, ainda, nos termos da Súmula 168, que a filha maior solteira que viesse a ocupar cargo público permanente na Administração Direta e Indireta optasse entre a pensão e a remuneração do cargo público, considerando a situação mais vantajosa. No entanto, em 2012, após consulta formulada pelo Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, o que resultou na confecção do Acórdão 892/2012, o TCU alterou a interpretação sobre o tema "a partir da evolução social" e considerou revogar a Súmula 168, bem como reputar necessária a comprovação da dependência econômica das filhas em relação ao valor da pensão da qual são titulares. Para a Corte de Contas, "a dependência econômica constitui requisito cujo atendimento é indispensável tanto para a concessão da pensão quanto para a sua manutenção, ou seja, a eventual perda de tal dependência por parte da pensionista significará a extinção do direito à percepção do benefício em referência." Partindo dessa premissa, ou seja, de que para a obtenção e manutenção da pensão por morte é exigida a prova da dependência econômica, o TCU definiu ser incompatível com a manutenção desse benefício a percepção, pela pensionista, de outras fontes de renda, ainda que não decorrentes da ocupação de cargo público permanente. Editou, então, a Súmula 285, de seguinte teor: "A pensão da Lei 3.373/1958 somente é devida à filha solteira maior de 21 anos enquanto existir dependência econômica em relação ao instituidor da pensão, falecido antes do advento da Lei 8.112/1990." Ademais, foram fixadas diretrizes para a análise do novo requisito: "Se comprovado que o salário, pró-labore e/ou benefícios não são suficientes para a subsistência condigna da beneficiária, ela poderá acumular a economia própria com o benefício pensional. De outra forma, se a renda for bastante para a subsistência condigna, não há que se falar em habilitação ou na sua permanência como beneficiária da pensão." (eDOC 30, p. 8) Estabeleceu-se como parâmetro da análise de renda "condigna da beneficiária" o valor do teto dos benefícios do INSS. Entendo, no entanto, ao menos em análise própria do pedido cautelar, que os princípios da legalidade e da segurança jurídica não permitem a subsistência in totum da decisão do Tribunal de Contas da União contida no Acórdão 2.780/2016. A violação ao princípio da legalidade se dá pelo estabelecimento de requisitos para a concessão e manutenção de benefício cuja previsão em lei não se verifica. Ainda que a interpretação evolutiva do princípio da isonomia entre homens e mulheres após o advento da Constituição Federal de 1988 (artigo 5º, I) inviabilize, em tese, a concessão de pensão às filhas mulheres dos servidores públicos, maiores e aptas ao trabalho, pois a presunção de incapacidade para a vida independente em favor das filhas dos servidores não mais se sustenta com o advento da nova ordem constitucional, as situações jurídicas já consolidadas sob a égide das constituições anteriores e do arcabouço legislativo que as regulamentavam não comportam interpretação retroativa à luz do atual sistema constitucional. Nesse sentido, embora o princípio da igualdade não tenha sido uma novidade na Constituição Federal de 1988, por já constar dos ideais revolucionários em 1879 e formalmente nas constituições brasileiras desde a do Império, de 1824, a sua previsão não se revelou suficiente para impedir a escravidão ou para impor o sufrágio universal, por exemplo, tampouco para extirpar do Código Civil de 1916 a condição de relativamente incapazes das mulheres casadas, o que somente ocorreu em 1962, com a Lei 4.121/62. Do escólio doutrinário de Celso Ribeiro Bastos e Ives Gandra Martins, em comentários ao art. 5º, I, da CF/88, extrai-se o seguinte:"é preciso todavia reconhecer que o avanço jurídico conquistado pelas mulheres não corresponde muitas vezes a um real tratamento isonômico no que diz respeito à efetiva fruição de uma igualdade material. Isso a nosso ver é devido a duas razões fundamentais: as relações entre homens e mulheres obviamente se dão em todos os campos da atividade social, indo desde as relações de trabalho, na política, nas religiões e organizações em geral, até chegar ao recanto próprio do lar, onde homem e mulher se relacionam fundamentalmente sob a instituição do casamento. É bem de ver que, se é importante a estatuição de iguais direitos entre homem e mulher, é forçoso reconhecer que esta disposição só se aperfeiçoa e se torna eficaz na medida em que a própria cultura se altere." (Comentários à Constituição do Brasil. v. 2. São Paulo: Saraiva, 1989. p. 18, grifos meus) Nesse contexto, revelava-se isonômico, quando da disciplina do estatuto jurídico do servidor público no ano de 1958, salvaguardar às filhas solteiras uma condição mínima de sobrevivência à falta dos pais. Essa situação não mais subsiste e soaria não só imoral, mas inconstitucional, uma nova lei de tal modo protetiva na sociedade concebida sob os preceitos de isonomia entre homens e mulheres insculpidos na atual ordem constitucional. No entanto, a interpretação evolutiva dada pelo Tribunal de Contas da União não pode ter o condão de modificar os atos constituídos sob a égide da legislação protetiva, cujos efeitos jurídicos não estão dissociados da análise do preenchimento dos requisitos legais à época da concessão, pois "não é lícito ao intérprete distinguir onde o legislador não distinguiu" (RE 71.284, Rel. Min. Aliomar Baleeiro). Além disso, o teor da lei 3.373/58 e o histórico retro mencionado acerca da situação da mulher na sociedade pré Constituição de 1988, revela claramente a presunção de dependência econômica das filhas solteiras maiores de vinte e um anos, não se revelando razoável, exceto se houver dúvida no tocante à lisura da situação das requerentes no momento da solicitação da pensão (o que não se pode extrair das razões do ato impugnado), exigir que faça prova positiva da dependência financeira em relação ao servidor instituidor do benefício à época da concessão. Veja-se que a legislação de regência, quando previu, em relação a benefícios de caráter temporário, a possibilidade de "superação da qualidade de beneficiário", o fez expressamente. A Lei 3.373/58, por exemplo, estabelecia a manutenção da invalidez como "condição essencial" à percepção da pensão do filho ou do irmão inválido. De igual modo, a Lei 8.112/90, atual estatuto jurídico dos servidores públicos civis federais, no artigo 222, enumera de modo expresso as hipóteses para a "perda da qualidade de beneficiário": falecimento, anulação de casamento, cessação de invalidez ou afastamento de deficiência, acumulação de pensões, renúncia expressa ou, em relação ao cônjuge, o decurso dos prazos de que tratou a Lei 13.135/2015. Mesmo para os benefícios devidos aos pais e aos irmãos, que necessitam comprovar a dependência econômica para a concessão do benefício, a superação dessa condição não consta dentre as hipóteses de perda da qualidade de beneficiário. A respeito especificamente desse tema, o Supremo Tribunal Federal, ao julgar o RE 234.543, de relatoria do Ministro Ilmar Galvão, expressamente considerou que a Lei 8.112/90 (art. 217, II, a, e 222, IV), ao revogar o benefício de pensão por morte à filha solteira maior de 21 anos, não poderia retroagir para atingir benefícios concedidos antes de sua vigência. Eis a ementa do julgado:ADMINISTRATIVO. FILHA DE EX-SERVIDOR DA CÂMARA DOS DEPUTADOS. PENSÃO TEMPORÁRIA. LEI 3.373/58. ALTERAÇÕES PELA LEI 8.112/90. DIREITO ADQUIRIDO. A garantia insculpida no art. 5º, inc. XXXVI, da Constituição Federal impede que lei nova, ao instituir causa de extinção de benefício, não prevista na legislação anterior, retroaja para alcançar situação consolidada sob a égide da norma então em vigor. Conquanto tenha a Lei 8.112/90 alterado as hipóteses de concessão de pensão temporária, previstas na Lei 3.373/58, tais modificações não poderiam atingir benefícios concedidos antes de sua vigência. Recurso extraordinário não conhecido. (RE 234.543, Relator(a): Min. ILMAR GALVÃO, Primeira Turma, julgado em 20/04/1999, DJ 06-08-1999 PP-00051 EMENT VOL-01957-14 PP-02953)Ademais, dizer que a pensão é temporária não significa suscitar a sua revisão a cada dia ou a cada mês para verificar se persistem os requisitos que ensejaram a sua concessão. Significa que esse tipo de benefício tem condições resolutivas pré-estabelecidas: para os filhos, o atingimento da idade de 21 anos; para os inválidos, a superação dessa condição; para as filhas maiores de 21 anos, a alteração do estado civil ou a ocupação de cargo público de caráter permanente. Assim, enquanto a titular da pensão permanece solteira e não ocupa cargo permanente, independentemente da análise da dependência econômica, porque não é condição essencial prevista em lei, tem ela incorporado ao seu patrimônio jurídico o direito à manutenção dos pagamentos da pensão concedida sob a égide de legislação então vigente, não podendo ser esse direito extirpado por legislação superveniente, que estipulou causa de extinção outrora não prevista. No mesmo sentido, o Plenário do STF, no julgamento do MS 22.604, de relatoria do Ministro Maurício Corrêa, expressamente assenta a impossibilidade de reversão de pensão considerando o direito adquirido já consolidado: PENSÃO. DISPUTA ENTRE HERDEIRAS. APLICAÇÃO DA LEI Nº 6.782/80. ATO ADMINISTRATIVO DO TCU. FILHA SEPARADA APÓS O ÓBITO DO PAI. REVERSÃO DO BENEFÍCIO. DIREITO ADQUIRIDO. EXISTÊNCIA. 1. Filha viúva, divorciada ou desquitada equipara-se à filha solteira, se provada dependência econômica ao instituidor, à data da sucessão pensional. 2. Verificado o óbito desse quando da vigência da Lei nº 6.782/80, a filha solteira, enquanto menor, faz jus à pensão, perdendo-a ao se casar. 3. Quota-parte da pensão cabível àquela que se casou transferida para a outra. Impossibilidade da reversão tempos depois em face da consolidação do direito adquirido. Mandado de Segurança conhecido e deferido. (MS 22604, Relator(a): Min. MAURÍCIO CORRÊA, Tribunal Pleno, julgado em 28/04/1998, DJ 08-10-1999 PP-00039 EMENT VOL-01966-01 PP-00032) Nesse contexto, viola, a piori, o princípio da legalidade o entendimento lançado no Acórdão 2.780/2016 no sentido de que qualquer fonte de renda que represente subsistência condigna seja apta a ensejar o cancelamento da pensão ou de outra fonte de rendimento das titulares de pensão concedida na forma da Lei 3.373/58 e mantida nos termos do parágrafo único do artigo 5º dessa lei. Em segundo lugar, o acórdão do TCU não subsiste a uma apreciação à luz do princípio da segurança jurídica. Como dito, a Lei 9.784/99 impõe prazo decadencial para a revisão, pela Administração, de atos administrativos dos quais decorram efeitos favoráveis aos destinatários, salvo comprovada má-fé. Assim, ressalvados os casos em que as pensionistas deliberadamente violaram a lei, é dizer, usaram de má-fé para a obtenção ou manutenção do benefício previdenciário em questão, a revisão do ato de concessão há de observar o prazo decadencial previsto na Lei 9.784/99, pois o STF, no julgamento do RE 626.489, sob a sistemática da repercussão geral, assentou entendimento segundo o qual, com base na segurança jurídica e no equilíbrio financeiro e atuarial, não podem ser eternizados os litígios. A exceção à prova de má-fé não consta do Acórdão 2.780/2016, porque a interpretação que deu o TCU à manutenção das pensões temporárias é a de que elas podem ser revogadas a qualquer tempo, constatada a insubsistência dos requisitos que ensejaram a sua concessão, especialmente a dependência econômica, a qual, para o TCU, não é presumida. Por derradeiro, observo que um dos principais fundamentos do Acórdão 2.780/2016 é a "evolução interpretativa" realizada pelo TCU à luz da nova ordem constitucional, a permitir que se exija a comprovação da dependência econômica da pensionista em relação ao valor percebido. Veja-se que a nova interpretação resultou inclusive na revogação de Súmula do TCU que tratava da acumulação da pensão com cargo público. Ainda que fosse admissível a exigibilidade da dependência econômica como condição para a manutenção da pensão em debate nestes autos, a aplicação da inovação interpretativa aos atos já consolidados encontra óbice no inciso XIII do parágrafo único do artigo 2º da Lei 9.784/99, o qual veda a aplicação retroativa de nova interpretação na análise de processos administrativos. O Supremo Tribunal Federal reconheceu a necessidade de se conferir efeitos ex nunc às decisões administrativas que modificam posicionamentos anteriores, a fim de dar segurança jurídica a atos já consolidados e até mesmo para evitar que justificativas como "orçamento público" sejam utilizadas para rever atos dos quais decorram efeitos financeiros favoráveis ao beneficiário. Precedente: AO 1.656, Rel. Min. Cármen Lúcia, Segunda Turma, DJe de 10.10.2014. Ante todo o exposto, considero, a priori, plausíveis de serem revistos apenas os atos de concessão de pensões por morte cujas titulares deixaram de se enquadrar na previsão legal vigente na época do preenchimento dos requisitos legais, ou seja, é possível a revisão das pensões cujas titulares ocupem cargo público de caráter permanente ou recebam outros benefícios decorrentes da alteração do estado civil, como a pensão prevista no art. 217, inciso I, alíneas a, b e c, Lei 8.112/90, ou a pensão prevista no art. 74 c/c art. 16, I, ambos da Lei 8.213/91, ou seja, pensões por morte de cônjuges. Assentadas essas premissas, há plausibilidade jurídica no pedido formulado, no sentido de que, reconhecida a qualidade de dependente na filha solteira maior de vinte e um anos em relação ao instituidor da pensão e não se verificando a superação das condições essenciais previstas em lei, a pensão é, prima facie, devida e deve ser mantida. Ademais, tratando-se de verba de natureza alimentar, tenho como presente a possibilidade de que a demora na concessão do provimento possa resultar na sua ineficácia, já que a revisão do ato de concessão da pensão, nos moldes como determinada pelo TCU no ato impugnado, poderá resultar na cessação de uma das fontes de renda recebidas pela Impetrante. Com essas considerações, havendo fundamento relevante e risco de ineficácia da medida, defiro parcialmente o pedido de liminar, nos termos do art. 7º, III, da Lei 12.016/2009, para suspender, em parte, os efeitos do Acórdão 2.780/2016 em relação às pensionistas associadas à Impetrante até o julgamento definitivo deste mandado de segurança, mantendo-se a possibilidade de revisão em relação às pensões cujas titulares ocupem cargo público de caráter permanente ou recebam outros benefícios decorrentes da alteração do estado civil, como a pensão prevista no art. 217, inciso I, alíneas a, b e c, da Lei 8.112/90, ou a pensão prevista no art. 74 c/c art. 16, I, ambos da Lei 8.213/91, ou seja, pensões por morte de cônjuges. (...) (grifei)
Esse posicionamento foi reafirmado no bojo do mandado de segurança n.º 34.873-AgR, apreciado por aquela e. Corte (STF, 2ª Turma, MS 34.873 AgR, Rel. Min. Edson Fachin, julgado em 14.12.2018).
Depreende-se da análise dos autos que a agravante percebe pensão especial temporária, desde 03/12/1969 (PROCADM2 evento 1 dos autos originários), com amparo na Lei n.º 3.373/1958, e, diante de indícios de que mantém união estável com o Sr. Lury Bonetto, apontados pelo Tribunal de Contas da União, foi determinado o cancelamento do benefício (Ofício SEI n.º 26/2019/DIGEP/SAMF-RS/SPOA/SE-ME, PROCADM2 do evento 1 dos autos originários).
A agravante refere que o relacionamento com Lury Bonetto é de simples amizade, pois eles envidam esforços conjuntos para criar e educar o filho da melhor forma possível, inclusive cedendo o endereço para recebimento de correspondências ou concedendo empréstimos entre si, sem que isso signifique, repita-se, convivência duradoura e estabilizada, com intuito de formar núcleo familiar, ou seja, união estável.
Não obstante milite em favor dos atos administrativos a presunção de legalidade e legitimidade e não reste evidenciada ofensa à ampla defesa no processo administrativo, a situação fático-jurídica é controvertida (existindo informações contaditórias, inclusive na declaração anual de rendimentos) e exige dilação probatória, o que recomenda a manutenção do pagamento do benefício - que já perdura por anos (desde 1969) -, pelo menos até a prolação da sentença (juízo de cognição exauriente, após instrução probatória), dada sua natureza alimentar
Ante o exposto, defiro o pedido de antecipação da tutela recursal. Intimem-se, sendo a agravada para contrarrazões.
Portanto, não obstante milite em favor dos atos administrativos a presunção de legalidade e legitimidade e não reste evidenciada ofensa à ampla defesa no processo administrativo, a situação fático-jurídica é controvertida e exige dilação probatória, o que recomenda a manutenção do pagamento do benefício - que já perdura por anos -, pelo menos até a prolação da sentença (juízo de cognição exauriente, após instrução probatória), dada sua natureza alimentar
Assim, demonstrada a probabilidade do direito.
O perigo de dano, por sua vez, também se encontra presente, pois há cessação do pagamento de verba alimentar, já ocorrida ou na sua iminência, trazendo prejuízos à autora.
3. Ante o exposto, defiro o pedido de tutela de urgência para determinar o imediato restabelecimento da pensão por morte em nome da parte autora."
Com efeito, em juízo de cognição sumária, tenho que a orientação adotada pela Administração Pública contraria disposição literal da lei de regência da pensão. Senão, vejamos. Dispõe o artigo 5º, parágrafo único, da Lei nº 3.373/58, com base no qual foi concedida a pensão:
"A filha solteira, maior de 21 (vinte e um) anos, só perderá a pensão temporária quando ocupante de cargo público permanente."
Assim, em princípio, os únicos requisitos da referida legislação para a percepção de pensão, nos termos da lei, pela filha maior de 21 anos, são a condição de solteira e o não desempenho de cargo público permanente.
Neste sentindo, andou bem a decisão proferida pelo magistrado de primeiro grau, tendo em vista que há apenas indícios de que a autora mantém união estável com o Sr. Lury Bonetto, carecendo tal fato de instrução probatória nos autos.
Ainda, no que diz respeito à questão da manutenção da dependência econômica, o STF julgou, recentemente, medida cautelar em mandado de segurança coletivo (MS 34.677 MC/DF) impetrado pela Associação Nacional da Previdência e da Seguridade Social, em que requereu a suspensão do Acórdão nº 2.780/2016 do Plenário do TCU, o qual, por sua vez, determina a revisão de benefícios previdenciários de pensão por morte titularizados por filhas de servidores públicos civis, instituídas com base no art. 5º, II, § único, da Lei nº 3.373/1958.
A medida cautelar foi concedida pelo Ministro Edson Fachin, nos seguintes termos:
(...) Feitas essas considerações, anoto que a concessão de medida liminar em mandado de segurança pressupõe o atendimento dos requisitos contidos no artigo 7º, III, da Lei 12.016/2009, quais sejam, a existência de fundamento relevante e a possibilidade de que a medida seja ineficaz caso se aguarde o julgamento definitivo do writ. A matéria em comento está adstrita à legalidade do ato do Tribunal de Contas da União que reputa necessária a comprovação de dependência econômica da pensionista filha solteira maior de 21 anos, para o reconhecimento do direito à manutenção de benefício de pensão por morte concedida sob a égide do art. 5º, II, parágrafo único, da Lei 3.373/58. Partindo dessa premissa, o TCU determinou a reanálise de pensões concedidas a mulheres que possuem outras fontes de renda, além do benefício decorrente do óbito de servidor público, do qual eram dependentes na época da concessão. Dentre as fontes de renda, incluemse: renda advinda de relação de emprego, na iniciativa privada, de atividade empresarial, na condição de sócias ou representantes de pessoas jurídicas ou de benefícios do INSS; recebimento de pensão com fundamento na Lei 8.112/90, art. 217, I, alíneas a, b e c (pensão na qualidade de cônjuge de servidor); recebimento de pensão com fundamento na Lei 8.112/90, art. 217, inciso I, alíneas d e e (pais ou pessoa designada) e inciso II, alíneas a, c e d (filhos até 21 anos, irmão até 21 anos ou inválido ou pessoa designada até 21 anos ou inválida); a proveniente da ocupação de cargo público efetivo federal, estadual, distrital ou municipal ou aposentadoria pelo RPPS; ocupação de cargo em comissão ou de cargo em empresa pública ou sociedade de economia mista. Discute-se, portanto, se a dependência econômica em relação ao instituidor do benefício e do valor pago a título de pensão por morte encontra-se no rol de requisitos para a concessão e manutenção do benefício em questão. Inicialmente, assento a jurisprudência consolidada neste Supremo Tribunal Federal quanto à incidência, aos benefícios previdenciários, da lei em vigência ao tempo em que preenchidos os requisitos necessários à sua concessão. Trata-se da regra “tempus regit actum”, a qual aplicada ao ato de concessão de pensão por morte significa dizer: a lei que rege a concessão do benefício de pensão por morte é a vigente na data do óbito do segurado. Neste sentido: “AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. ADMINISTRATIVO. FISCAIS DE RENDA. PENSÃO POR MORTE. 1) A pensão por morte rege-se pela legislação em vigor na data do falecimento do segurado. Princípio da lei do tempo rege o ato (tempus regit actum). Precedentes. 2) Impossibilidade de análise de legislação local (Lei Complementar estadual n. 69/1990 e Lei estadual n. 3.189/1999). Súmula n. 280 do Supremo Tribunal Federal. Agravo regimental ao qual se nega provimento” (ARE 763.761AgR, Rel. Min. Cármen Lúcia, Segunda Turma, DJe 10.12.2013).
“Agravo regimental em recurso extraordinário com agravo. 2. Pensão por morte. É firme a jurisprudência desta Corte no sentido de que o valor da pensão por morte deve observar o padrão previsto ao tempo do evento que enseja o benefício. Tempus regit actum. 3. Evento instituidor do benefício anterior à vigência da Emenda Constitucional 20/1998. Descabe emprestar eficácia retroativa à diretriz constitucional. 4. Agravo regimental a que se nega provimento” (ARE 717.077AgR, Rel. Min. Gilmar Mendes, Segunda Turma, DJe 12.12.2012).
A tese foi assentada, inclusive, no julgamento do RE 597.389-RG-QO, sob a sistemática da repercussão geral.
As pensões cujas revisões foram determinadas no Acórdão 2.780/2016 – Plenário – TCU, tiveram suas concessões amparadas na Lei 3.373/58, que dispunha sobre o Plano de Assistência ao Funcionário e sua Família (regulamentando os artigos 161 e 256 da Lei 1.711/1952, a qual, por sua vez, dispunha sobre o Estatuto dos Funcionários Públicos Civis da União), cujos artigos 3º e 5º tinham a seguinte redação:
Art. 3º O Seguro Social obrigatório garante os seguintes benefícios: I - Pensão vitalícia; II - Pensão temporária; III - Pecúlio especial. (...) Art. 5º Para os efeitos do artigo anterior, considera-se família do segurado: I - Para percepção de pensão vitalícia: a) a espôsa, exceto a desquitada que não receba pensão de alimentos; b) o marido inválido; c) a mãe viúva ou sob dependência econômica preponderante do funcionário, ou pai inválido no caso de ser o segurado solteiro ou viúvo; II - Para a percepção de pensões temporárias: a) o filho de qualquer condição, ou enteado, até a idade de 21 (vinte e um) anos, ou, se inválido, enquanto durar a invalidez; b) o irmão, órfão de pai e sem padrasto, até a idade de 21 (vinte e um) anos, ou, se inválido enquanto durar a invalidez, no caso de ser o segurado solteiro ou viúvo, sem filhos nem enteados. Parágrafo único. A filha solteira, maior de 21 (vinte e um) anos, só perderá a pensão temporária quando ocupante de cargo público permanente.
Os requisitos para a concessão da pensão por morte aos filhos dos servidores públicos civis federais eram, portanto, serem menores de 21 (vinte e um anos) ou inválidos. Excepcionalmente, a filha que se mantivesse solteira após os 21 anos não deixaria de receber a pensão por morte, exceto se passasse a ocupar cargo público permanente. Não se exigiam outros requisitos como, por exemplo, a prova da dependência econômica da filha em relação ao instituidor ou ser a pensão sua única fonte de renda. De igual modo, não havia na lei hipótese de cessação da pensão calcada no exercício, pela pensionista, de outra atividade laborativa que lhe gerasse algum tipo de renda, à exceção de cargo público permanente. A superação da qualidade de beneficiário da pensão temporária ocorria, apenas, em relação aos filhos do sexo masculino após os 21 anos, quando da recuperação da capacidade laborativa pelo filho inválido, e, no que tange à filha maior de 21 anos, na hipótese de alteração do estado civil ou de posse em cargo público. A Lei 1.711/1952 e todas as que a regulamentavam, incluída a Lei 3.373/58, foram revogadas pela Lei 8.112/90, que dispôs sobre o regime jurídico dos servidores públicos civis da União, das autarquias e das fundações públicas federais, à luz na nova ordem constitucional inaugurada em 1988. Nesse novo estatuto a filha solteira maior de 21 anos não mais figura no rol de dependentes habilitados à pensão temporária. Atualmente, considerando as recentes reformas promovidas pela Lei 13.135/2015, somente podem ser beneficiários das pensões, cujos instituidores sejam servidores públicos civis, o cônjuge ou companheiro, os filhos menores de 21 anos, inválidos ou com deficiência mental ou intelectual, e os pais ou irmão que comprovem dependência econômica. Nesse contexto, as pensões cuja revisão suscita o Tribunal de Contas da União no Acórdão 2.780/2016 foram concedidas entre o início e o término de vigência da Lei 3.373/58, ou seja, de março de 1958 a dezembro de 1990. A respeito do prazo para a revisão do ato de concessão de benefícios previdenciários a servidor público ou a seus dependentes, a Lei 9.784/99 dispõe, no artigo 54, ser de cinco anos o prazo para a Administração anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis aos destinatários. Com efeito, pende de julgamento neste Supremo Tribunal Federal o tema em que se discute o termo inicial do prazo decadencial para revisar atos de pensão ou aposentadoria pelo Tribunal de Contas da União, se da concessão da aposentadoria/pensão ou se do julgamento pela Corte de Contas, em sede de repercussão geral no bojo de RE 636.553, pendente ainda o julgamento do mérito. No entanto, o Acórdão impugnado diz respeito a atos de concessão cuja origem são óbitos anteriores a dezembro de 1990, sendo muito provável que o prazo de cinco anos, contados da concessão ou do julgamento, já tenha expirado. De todo modo, não houve, no Acórdão do TCU, menção ao respeito ao prazo decadencial de revisão previsto no artigo 9.784/99, porquanto o entendimento lá sustentado diz respeito à possibilidade de revisão a qualquer tempo em que se modificarem as condições fáticas da dependência econômica. Haure-se, portanto, da leitura rasa da jurisprudência e da legislação acima citadas a seguinte conclusão: as pensões concedidas às filhas maiores sob a égide da Lei 3.373/58 que preenchiam os requisitos pertinentes ao estado civil e à não ocupação de cargo público de caráter permanente encontram-se consolidadas e somente podem ser alteradas, é dizer, cessadas, se um dos dois requisitos for superado, ou seja, se deixarem de ser solteiras ou se passarem a ocupar cargo público permanente. O Tribunal de Contas da União, contudo, não interpreta do mesmo modo a legislação e a jurisprudência transcritas acima e esclarece, no ato coator, ter havido uma “evolução na jurisprudência recente do TCU a respeito do tema”. O TCU adotava a tese firmada no Poder Judiciário no sentido de que à pensão por morte aplica-se a lei vigente à época da concessão. Permitia, ainda, nos termos da Súmula 168, que a filha maior solteira que viesse a ocupar cargo público permanente na Administração Direta e Indireta optasse entre a pensão e a remuneração do cargo público, considerando a situação mais vantajosa. No entanto, em 2012, após consulta formulada pelo Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, o que resultou na confecção do Acórdão 892/2012, o TCU alterou a interpretação sobre o tema “a partir da evolução social” e considerou revogar a Súmula 168, bem como reputar necessária a comprovação da dependência econômica das filhas em relação ao valor da pensão da qual são titulares. Para a Corte de Contas, “a dependência econômica constitui requisito cujo atendimento é indispensável tanto para a concessão da pensão quanto para a sua manutenção, ou seja, a eventual perda de tal dependência por parte da pensionista significará a extinção do direito à percepção do benefício em referência.” Partindo dessa premissa, ou seja, de que para a obtenção e manutenção da pensão por morte é exigida a prova da dependência econômica, o TCU definiu ser incompatível com a manutenção desse benefício a percepção, pela pensionista, de outras fontes de renda, ainda que não decorrentes da ocupação de cargo público permanente. Editou, então, a Súmula 285, de seguinte teor: “A pensão da Lei 3.373/1958 somente é devida à filha solteira maior de 21 anos enquanto existir dependência econômica em relação ao instituidor da pensão, falecido antes do advento da Lei 8.112/1990.” Ademais, foram fixadas diretrizes para a análise do novo requisito: “Se comprovado que o salário, pró-labore e/ou benefícios não são suficientes para a subsistência condigna da beneficiária, ela poderá acumular a economia própria com o benefício pensional. De outra forma, se a renda for bastante para a subsistência condigna, não há que se falar em habilitação ou na sua permanência como beneficiária da pensão.” (eDOC 30, p. 8) Estabeleceu-se como parâmetro da análise de renda “condigna da beneficiária” o valor do teto dos benefícios do INSS. Entendo, no entanto, ao menos em análise própria do pedido cautelar, que os princípios da legalidade e da segurança jurídica não permitem a subsistência in totum da decisão do Tribunal de Contas da União contida no Acórdão 2.780/2016. A violação ao princípio da legalidade se dá pelo estabelecimento de requisitos para a concessão e manutenção de benefício cuja previsão em lei não se verifica. Ainda que a interpretação evolutiva do princípio da isonomia entre homens e mulheres após o advento da Constituição Federal de 1988 (artigo 5º, I) inviabilize, em tese, a concessão de pensão às filhas mulheres dos servidores públicos, maiores e aptas ao trabalho, pois a presunção de incapacidade para a vida independente em favor das filhas dos servidores não mais se sustenta com o advento da nova ordem constitucional, as situações jurídicas já consolidadas sob a égide das constituições anteriores e do arcabouço legislativo que as regulamentavam não comportam interpretação retroativa à luz do atual sistema constitucional. Nesse sentido, embora o princípio da igualdade não tenha sido uma novidade na Constituição Federal de 1988, por já constar dos ideais revolucionários em 1879 e formalmente nas constituições brasileiras desde a do Império, de 1824, a sua previsão não se revelou suficiente para impedir a escravidão ou para impor o sufrágio universal, por exemplo, tampouco para extirpar do Código Civil de 1916 a condição de relativamente incapazes das mulheres casadas, o que somente ocorreu em 1962, com a Lei 4.121/62. Do escólio doutrinário de Celso Ribeiro Bastos e Ives Gandra Martins, em comentários ao art. 5º, I, da CF/88, extrai-se o seguinte:
“é preciso todavia reconhecer que o avanço jurídico conquistado pelas mulheres não corresponde muitas vezes a um real tratamento isonômico no que diz respeito à efetiva fruição de uma igualdade material. Isso a nosso ver é devido a duas razões fundamentais: as relações entre homens e mulheres obviamente se dão em todos os campos da atividade social, indo desde as relações de trabalho, na política, nas religiões e organizações em geral, até chegar ao recanto próprio do lar, onde homem e mulher se relacionam fundamentalmente sob a instituição do casamento. É bem de ver que, se é importante a estatuição de iguais direitos entre homem e mulher, é forçoso reconhecer que esta disposição só se aperfeiçoa e se torna eficaz na medida em que a própria cultura se altere.” (Comentários à Constituição do Brasil. v. 2. São Paulo: Saraiva, 1989. p. 18, grifos meus) Nesse contexto, revelava-se isonômico, quando da disciplina do estatuto jurídico do servidor público no ano de 1958, salvaguardar às filhas solteiras uma condição mínima de sobrevivência à falta dos pais. Essa situação não mais subsiste e soaria não só imoral, mas inconstitucional, uma nova lei de tal modo protetiva na sociedade concebida sob os preceitos de isonomia entre homens e mulheres insculpidos na atual ordem constitucional. No entanto, a interpretação evolutiva dada pelo Tribunal de Contas da União não pode ter o condão de modificar os atos constituídos sob a égide da legislação protetiva, cujos efeitos jurídicos não estão dissociados da análise do preenchimento dos requisitos legais à época da concessão, pois “não é lícito ao intérprete distinguir onde o legislador não distinguiu” (RE 71.284, Rel. Min. Aliomar Baleeiro). Além disso, o teor da lei 3.373/58 e o histórico retro mencionado acerca da situação da mulher na sociedade pré Constituição de 1988, revela claramente a presunção de dependência econômica das filhas solteiras maiores de vinte e um anos, não se revelando razoável, exceto se houver dúvida no tocante à lisura da situação das requerentes no momento da solicitação da pensão (o que não se pode extrair das razões do ato impugnado), exigir que faça prova positiva da dependência financeira em relação ao servidor instituidor do benefício à época da concessão. Veja-se que a legislação de regência, quando previu, em relação a benefícios de caráter temporário, a possibilidade de “superação da qualidade de beneficiário”, o fez expressamente. A Lei 3.373/58, por exemplo, estabelecia a manutenção da invalidez como “condição essencial” à percepção da pensão do filho ou do irmão inválido. De igual modo, a Lei 8.112/90, atual estatuto jurídico dos servidores públicos civis federais, no artigo 222, enumera de modo expresso as hipóteses para a “perda da qualidade de beneficiário”: falecimento, anulação de casamento, cessação de invalidez ou afastamento de deficiência, acumulação de pensões, renúncia expressa ou, em relação ao cônjuge, o decurso dos prazos de que tratou a Lei 13.135/2015. Mesmo para os benefícios devidos aos pais e aos irmãos, que necessitam comprovar a dependência econômica para a concessão do benefício, a superação dessa condição não consta dentre as hipóteses de perda da qualidade de beneficiário. A respeito especificamente desse tema, o Supremo Tribunal Federal, ao julgar o RE 234.543, de relatoria do Ministro Ilmar Galvão, expressamente considerou que a Lei 8.112/90 (art. 217, II, a, e 222, IV), ao revogar o benefício de pensão por morte à filha solteira maior de 21 anos, não poderia retroagir para atingir benefícios concedidos antes de sua vigência. Eis a ementa do julgado:
ADMINISTRATIVO. FILHA DE EX-SERVIDOR DA CÂMARA DOS DEPUTADOS. PENSÃO TEMPORÁRIA. LEI 3.373/58. ALTERAÇÕES PELA LEI 8.112/90. DIREITO ADQUIRIDO. A garantia insculpida no art. 5º, inc. XXXVI, da Constituição Federal impede que lei nova, ao instituir causa de extinção de benefício, não prevista na legislação anterior, retroaja para alcançar situação consolidada sob a égide da norma então em vigor. Conquanto tenha a Lei 8.112/90 alterado as hipóteses de concessão de pensão temporária, previstas na Lei 3.373/58, tais modificações não poderiam atingir benefícios concedidos antes de sua vigência. Recurso extraordinário não conhecido. (RE 234.543, Relator(a): Min. ILMAR GALVÃO, Primeira Turma, julgado em 20/04/1999, DJ 06-08-1999 PP-00051 EMENT VOL-01957-14 PP-02953)
Ademais, dizer que a pensão é temporária não significa suscitar a sua revisão a cada dia ou a cada mês para verificar se persistem os requisitos que ensejaram a sua concessão. Significa que esse tipo de benefício tem condições resolutivas pré-estabelecidas: para os filhos, o atingimento da idade de 21 anos; para os inválidos, a superação dessa condição; para as filhas maiores de 21 anos, a alteração do estado civil ou a ocupação de cargo público de caráter permanente. Assim, enquanto a titular da pensão permanece solteira e não ocupa cargo permanente, independentemente da análise da dependência econômica, porque não é condição essencial prevista em lei, tem ela incorporado ao seu patrimônio jurídico o direito à manutenção dos pagamentos da pensão concedida sob a égide de legislação então vigente, não podendo ser esse direito extirpado por legislação superveniente, que estipulou causa de extinção outrora não prevista. No mesmo sentido, o Plenário do STF, no julgamento do MS 22.604, de relatoria do Ministro Maurício Corrêa, expressamente assenta a impossibilidade de reversão de pensão considerando o direito adquirido já consolidado:
PENSÃO. DISPUTA ENTRE HERDEIRAS. APLICAÇÃO DA LEI Nº 6.782/80. ATO ADMINISTRATIVO DO TCU. FILHA SEPARADA APÓS O ÓBITO DO PAI. REVERSÃO DO BENEFÍCIO. DIREITO ADQUIRIDO. EXISTÊNCIA. 1. Filha viúva, divorciada ou desquitada equipara-se à filha solteira, se provada dependência econômica ao instituidor, à data da sucessão pensional. 2. Verificado o óbito desse quando da vigência da Lei nº 6.782/80, a filha solteira, enquanto menor, faz jus à pensão, perdendo-a ao se casar. 3. Quota-parte da pensão cabível àquela que se casou transferida para a outra. Impossibilidade da reversão tempos depois em face da consolidação do direito adquirido. Mandado de Segurança conhecido e deferido. (MS 22604, Relator(a): Min. MAURÍCIO CORRÊA, Tribunal Pleno, julgado em 28/04/1998, DJ 08-10-1999 PP-00039 EMENT VOL-01966-01 PP-00032) Nesse contexto, viola, a piori, o princípio da legalidade o entendimento lançado no Acórdão 2.780/2016 no sentido de que qualquer fonte de renda que represente subsistência condigna seja apta a ensejar o cancelamento da pensão ou de outra fonte de rendimento das titulares de pensão concedida na forma da Lei 3.373/58 e mantida nos termos do parágrafo único do artigo 5º dessa lei. Em segundo lugar, o acórdão do TCU não subsiste a uma apreciação à luz do princípio da segurança jurídica. Como dito, a Lei 9.784/99 impõe prazo decadencial para a revisão, pela Administração, de atos administrativos dos quais decorram efeitos favoráveis aos destinatários, salvo comprovada má-fé. Assim, ressalvados os casos em que as pensionistas deliberadamente violaram a lei, é dizer, usaram de má-fé para a obtenção ou manutenção do benefício previdenciário em questão, a revisão do ato de concessão há de observar o prazo decadencial previsto na Lei 9.784/99, pois o STF, no julgamento do RE 626.489, sob a sistemática da repercussão geral, assentou entendimento segundo o qual, com base na segurança jurídica e no equilíbrio financeiro e atuarial, não podem ser eternizados os litígios. A exceção à prova de má-fé não consta do Acórdão 2.780/2016, porque a interpretação que deu o TCU à manutenção das pensões temporárias é a de que elas podem ser revogadas a qualquer tempo, constatada a insubsistência dos requisitos que ensejaram a sua concessão, especialmente a dependência econômica, a qual, para o TCU, não é presumida. Por derradeiro, observo que um dos principais fundamentos do Acórdão 2.780/2016 é a “evolução interpretativa” realizada pelo TCU à luz da nova ordem constitucional, a permitir que se exija a comprovação da dependência econômica da pensionista em relação ao valor percebido. Veja-se que a nova interpretação resultou inclusive na revogação de Súmula do TCU que tratava da acumulação da pensão com cargo público. Ainda que fosse admissível a exigibilidade da dependência econômica como condição para a manutenção da pensão em debate nestes autos, a aplicação da inovação interpretativa aos atos já consolidados encontra óbice no inciso XIII do parágrafo único do artigo 2º da Lei 9.784/99, o qual veda a aplicação retroativa de nova interpretação na análise de processos administrativos. O Supremo Tribunal Federal reconheceu a necessidade de se conferir efeitos ex nunc às decisões administrativas que modificam posicionamentos anteriores, a fim de dar segurança jurídica a atos já consolidados e até mesmo para evitar que justificativas como “orçamento público” sejam utilizadas para rever atos dos quais decorram efeitos financeiros favoráveis ao beneficiário. Precedente: AO 1.656, Rel. Min. Cármen Lúcia, Segunda Turma, DJe de 10.10.2014. Ante todo o exposto, considero, a priori, plausíveis de serem revistos apenas os atos de concessão de pensões por morte cujas titulares deixaram de se enquadrar na previsão legal vigente na época do preenchimento dos requisitos legais, ou seja, é possível a revisão das pensões cujas titulares ocupem cargo público de caráter permanente ou recebam outros benefícios decorrentes da alteração do estado civil, como a pensão prevista no art. 217, inciso I, alíneas a, b e c, Lei 8.112/90, ou a pensão prevista no art. 74 c/c art. 16, I, ambos da Lei 8.213/91, ou seja, pensões por morte de cônjuges. Assentadas essas premissas, há plausibilidade jurídica no pedido formulado, no sentido de que, reconhecida a qualidade de dependente na filha solteira maior de vinte e um anos em relação ao instituidor da pensão e não se verificando a superação das condições essenciais previstas em lei, a pensão é, prima facie, devida e deve ser mantida. Ademais, tratando-se de verba de natureza alimentar, tenho como presente a possibilidade de que a demora na concessão do provimento possa resultar na sua ineficácia, já que a revisão do ato de concessão da pensão, nos moldes como determinada pelo TCU no ato impugnado, poderá resultar na cessação de uma das fontes de renda recebidas pela Impetrante. Com essas considerações, havendo fundamento relevante e risco de ineficácia da medida, defiro parcialmente o pedido de liminar, nos termos do art. 7º, III, da Lei 12.016/2009, para suspender, em parte, os efeitos do Acórdão 2.780/2016 em relação às pensionistas associadas à Impetrante até o julgamento definitivo deste mandado de segurança, mantendo-se a possibilidade de revisão em relação às pensões cujas titulares ocupem cargo público de caráter permanente ou recebam outros benefícios decorrentes da alteração do estado civil, como a pensão prevista no art. 217, inciso I, alíneas a, b e c, da Lei 8.112/90, ou a pensão prevista no art. 74 c/c art. 16, I, ambos da Lei 8.213/91, ou seja, pensões por morte de cônjuges. (...)
No caso dos autos, a autora recebe pensão especial temporária, o que não inviabiliza o recebimento do benefício tratado nos autos.
Outrossim, não parece haver o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo caso seja mantida a decisão agravada. Ao contrário, parece que risco de dano maior poderia ser suportado pela autora, que poderia ter seus proventos substancialmente reduzidos desde logo. Ainda, o perigo de dano reverso à administração é praticamente inexistente, seja porque o cancelamento refere-se a ato administrativo ocorrido há mais de 30 (trinta) anos, seja porque, no caso de improvimento da ação, poderá a União, por vias próprias, cobrar da agravada os valores recebidos em decorrência do deferimento da liminar nestes autos.
Por fim, ressalte-se que a decisão liminar que cuida do pedido de antecipação de tutela é ato jurídico dotado de precariedade, ou seja, passível de reversão, a qualquer tempo, nos termos do art. 296 do CPC. É inerente a própria natureza das medidas antecipatórias a precariedade, a provisoriedade e a revogabilidade. Em tal caso, devem as partes retornar à situação anterior, sendo exigido do requerente repor os danos advindos da execução da medida.
Nesse sentido é a jurisprudência do STJ:
PREVIDÊNCIA SOCIAL. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. REVERSIBILIDADE DA DECISÃO.
O grande número de ações, e a demora que disso resultou para a prestação jurisdicional, levou o legislador a antecipar a tutela judicial naqueles casos em que, desde logo, houvesse, a partir dos fatos conhecidos, uma grande verossimilhança no direito alegado pelo autor. O pressuposto básico do instituto é a reversibilidade da decisão judicial. Havendo perigo de irreversibilidade, não há tutela antecipada (CPC, art. 273, § 2º). Por isso, quando o juiz antecipa a tutela, está anunciando que seu decisum não é irreversível. Mal sucedida a demanda, o autor da ação responde pelo recebeu indevidamente. O argumento de que ele confiou no juiz ignora o fato de que a parte, no processo, está representada por advogado, o qual sabe que a antecipação de tutela tem natureza precária.
Para essa solução, há ainda o reforço do direito material. Um dos princípios gerais do direito é o de que não pode haver enriquecimento sem causa. Sendo um princípio geral, ele se aplica ao direito público, e com maior razão neste caso porque o lesado é o patrimônio público. O art. 115, II, da Lei nº 8.213, de 1991, é expresso no sentido de que os benefícios previdenciários pagos indevidamente estão sujeitos à repetição. Uma decisão do Superior Tribunal de Justiça que viesse a desconsiderá-lo estaria, por via transversa, deixando de aplicar norma legal que, a contrario sensu, o Supremo Tribunal Federal declarou constitucional. Com efeito, o art. 115, II, da Lei nº 8.213, de 1991, exige o que o art. 130, parágrafo único na redação originária (declarado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal - ADI 675) dispensava.
Orientação a ser seguida nos termos do art. 543-C do Código de Processo Civil: a reforma da decisão que antecipa a tutela obriga o autor da ação a devolver os benefícios previdenciários indevidamente recebidos.
Recurso especial conhecido e provido."
(RECURSO REPETITIVO Tema 692 - REsp 1401560 / MT - Relator(a) p/ Acórdão Ministro ARI PARGENDLER - DJe 13/10/2015)
Isto posto, indefiro o pedido de efeito suspensivo, nos termos da fundamentação.
Intime-se a parte contrária para os efeitos do artigo 1.019, inciso II, do Código de Processo Civil/2015."
Inexistem razões para alterar o entendimento inicial, cuja fundamentação integra-se ao voto.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por negar provimento ao agravo de instrumento.
Documento eletrônico assinado por VÂNIA HACK DE ALMEIDA, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001940546v3 e do código CRC 86bc704d.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): VÂNIA HACK DE ALMEIDA
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Agravo de Instrumento Nº 5052854-67.2019.4.04.0000/SC
RELATORA: Desembargadora Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
AGRAVANTE: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO
AGRAVADO: SONIA COUTO
EMENTA
processo civil. AGRAVO DE INSTRUMENTO. pensão temporária. filha maior de 21 anos. requisitos. manutenção de dependência econômica. benefício previdenciário. reposição de danos.
1. A orientação adotada pela Administração Pública contraria o disposto no artigo 5º, parágrafo único, da Lei nº 3.373/58, de forma que os únicos requisitos da referida legislação para a percepção de pensão, nos termos da lei, pela filha maior de 21 anos, são a condição de solteira e o não desempenho de cargo público permanente. Neste sentido, andou bem a decisão proferida pelo magistrado de primeiro grau, tendo em vista que há apenas indícios de que a autora mantém união estável com o Sr. Lury Bonetto, carecendo tal fato de instrução probatória nos autos.
2. Ainda, no que diz respeito à questão da manutenção da dependência econômica, o STF julgou, recentemente, medida cautelar em mandado de segurança coletivo (MS 34.677 MC/DF), o qual determina a revisão de benefícios previdenciários de pensão por morte titularizados por filhas de servidores públicos civis, instituídas com base no art. 5º, II, § único, da Lei nº 3.373/1958. A autora recebe pensão especial temporária, o que não inviabiliza o recebimento do benefício tratado nos autos. Outrossim, não parece haver o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo caso seja mantida a decisão agravada.
3. Por fim, ressalte-se que a decisão liminar que cuida do pedido de antecipação de tutela é ato jurídico dotado de precariedade, ou seja, passível de reversão, a qualquer tempo, nos termos do art. 296 do CPC. É inerente a própria natureza das medidas antecipatórias a precariedade, a provisoriedade e a revogabilidade. Em tal caso, devem as partes retornar à situação anterior, sendo exigido do requerente repor os danos advindos da execução da medida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento ao agravo de instrumento, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 25 de agosto de 2020.
Documento eletrônico assinado por VÂNIA HACK DE ALMEIDA, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001940547v4 e do código CRC aa4d59b1.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 12/08/2020 A 25/08/2020
Agravo de Instrumento Nº 5052854-67.2019.4.04.0000/SC
RELATORA: Desembargadora Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
PRESIDENTE: Desembargadora Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
PROCURADOR(A): ANDREA FALCÃO DE MORAES
AGRAVANTE: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO
AGRAVADO: SONIA COUTO
ADVOGADO: DJALMA PORCIUNCULA (OAB SC014189)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 12/08/2020, às 00:00, a 25/08/2020, às 14:00, na sequência 1432, disponibilizada no DE de 31/07/2020.
Certifico que a 3ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 3ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO AO AGRAVO DE INSTRUMENTO.
RELATORA DO ACÓRDÃO: Desembargadora Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
Votante: Desembargadora Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
Votante: Desembargadora Federal MARGA INGE BARTH TESSLER
Votante: Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO
MÁRCIA CRISTINA ABBUD
Secretária
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