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PROCESSO CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE OBTIDA MEDIANTE FRAUDE. CONDUTA CONFIGURADORA DE CRIME. MÁ-FÉ EVIDENCIADA. COBRANÇA PELO INSS DE V...

Data da publicação: 29/06/2020, 13:53:11

EMENTA: PROCESSO CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE OBTIDA MEDIANTE FRAUDE. CONDUTA CONFIGURADORA DE CRIME. MÁ-FÉ EVIDENCIADA. COBRANÇA PELO INSS DE VALORES RECEBIDOS INDEVIDAMENTE. POSSIBILIDADE. INTELIGÊNCIA DO ART. 115 DA LEI 8.213/91 E DO ART. 154 DO DECRETO 3.048/99. CONSECTÁRIOS LEGAIS. TAXA SELIC E MULTA. DESCABIMENTO. JUROS DE MORA. TERMO INICIAL. EVENTO DANOSO. 1. A boa-fé é um princípio geral de Direito, segundo o qual todos devem se comportar de acordo com um padrão ético de confiança e lealdade. Gera deveres secundários de conduta, que impõe às partes comportamentos necessários. Se o agente sabe que está descumprindo obrigação jurídica (no caso, apresentação de dados inverídicos para obtenção de aposentadoria por tempo de serviço), aí está configurada a má-fé. Há, portanto, consciência de que o indivíduo está descumprindo dever advindo de sua posição de beneficiário do sistema previdenciário, do qual faz parte. Ou seja, a má-fé está justamente neste descumprimento do que o indivíduo sabe ser indevido. 2. No caso, sub judice, constata-se que não se trata de erro administrativo do INSS. Ao contrário, a demandada, agiu de forma maliciosa, deliberada e intencional, visto que tendo conhecimento de que não fazia jus ao recebimento do benefício previdenciário, induziu e manteve em erro o INSS mediante a utilização de meio fraudulento (inserção de falsos vínculos empregatícios no CNIS e em sua CTPS) para a obtenção de indevida aposentadoria por idade. 3. Evidenciada a má-fé do segurado, à luz do art. 115 da Lei 8.213/91 c/c art. 154 do Decreto 3.048/99, é plenamente possível ao INSS proceder à cobrança dos valores sacados indevidamente. 4. Em face de não possuírem as parcelas a serem restituídas ao INSS natureza de crédito tributário, descabe aplicação de multa e a incidência da SELIC para atualizar o montante devido. 4. Quando se trata de ressarcimento decorrente de benefício previdenciário recebido com inequívoca comprovação de má-fé da demandada e resultando nítido o caráter ilícito na percepção, os juros de mora têm início a partir do evento danoso e não da citação. (TRF4 5016860-97.2014.4.04.7001, SEXTA TURMA, Relatora SALISE MONTEIRO SANCHOTENE, juntado aos autos em 30/03/2017)


APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5016860-97.2014.4.04.7001/PR
RELATORA
:
Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE
APELANTE
:
FRANCISCA RITA LEITE
ADVOGADO
:
Charles de Freitas Vilas Boas
APELANTE
:
INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO
:
OS MESMOS
MPF
:
MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
EMENTA
PROCESSO CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE OBTIDA MEDIANTE FRAUDE. CONDUTA CONFIGURADORA DE CRIME. MÁ-FÉ EVIDENCIADA. COBRANÇA PELO INSS DE VALORES RECEBIDOS INDEVIDAMENTE. POSSIBILIDADE. INTELIGÊNCIA DO ART. 115 DA LEI 8.213/91 E DO ART. 154 DO DECRETO 3.048/99. CONSECTÁRIOS LEGAIS. TAXA SELIC E MULTA. DESCABIMENTO. JUROS DE MORA. TERMO INICIAL. EVENTO DANOSO.
1. A boa-fé é um princípio geral de Direito, segundo o qual todos devem se comportar de acordo com um padrão ético de confiança e lealdade. Gera deveres secundários de conduta, que impõe às partes comportamentos necessários. Se o agente sabe que está descumprindo obrigação jurídica (no caso, apresentação de dados inverídicos para obtenção de aposentadoria por tempo de serviço), aí está configurada a má-fé. Há, portanto, consciência de que o indivíduo está descumprindo dever advindo de sua posição de beneficiário do sistema previdenciário, do qual faz parte. Ou seja, a má-fé está justamente neste descumprimento do que o indivíduo sabe ser indevido. 2. No caso, sub judice, constata-se que não se trata de erro administrativo do INSS. Ao contrário, a demandada, agiu de forma maliciosa, deliberada e intencional, visto que tendo conhecimento de que não fazia jus ao recebimento do benefício previdenciário, induziu e manteve em erro o INSS mediante a utilização de meio fraudulento (inserção de falsos vínculos empregatícios no CNIS e em sua CTPS) para a obtenção de indevida aposentadoria por idade. 3. Evidenciada a má-fé do segurado, à luz do art. 115 da Lei 8.213/91 c/c art. 154 do Decreto 3.048/99, é plenamente possível ao INSS proceder à cobrança dos valores sacados indevidamente. 4. Em face de não possuírem as parcelas a serem restituídas ao INSS natureza de crédito tributário, descabe aplicação de multa e a incidência da SELIC para atualizar o montante devido. 4. Quando se trata de ressarcimento decorrente de benefício previdenciário recebido com inequívoca comprovação de má-fé da demandada e resultando nítido o caráter ilícito na percepção, os juros de mora têm início a partir do evento danoso e não da citação.

ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Sexta Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento ao apelo do INSS e negar provimento ao recurso de Francisca Rita Leite, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que integram o presente julgado.
Porto Alegre/RS, 29 de março de 2017.
Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE
Relatora


Documento eletrônico assinado por Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8868725v6 e, se solicitado, do código CRC B3875FC7.
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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5016860-97.2014.4.04.7001/PR
RELATOR
:
SALISE MONTEIRO SANCHOTENE
APELANTE
:
FRANCISCA RITA LEITE
ADVOGADO
:
Charles de Freitas Vilas Boas
APELANTE
:
INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO
:
OS MESMOS
MPF
:
MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
RELATÓRIO
Trata-se de apelações interposta em face de sentença (evento 42 - SENT1 do eProc originário) julgou parcialmente o pedido do INSS para que Francisca Rita Leite restitua os valores recebidos indevidamente durante o período de 12-02-2004 a 04-05-2009, a título de aposentadoria por idade, NB 132.412.075-1, atualizadas as parcelas monetariamente pelo INPC e juros de mora de 1% ao mês, a contar da citação.
O INSS em seu apelo (evento 46 do eProc originário) pede a reforma da sentença para que os valores a serem devolvidos pela ré sejam atualizados monetariamente pela SELIC, juros de mora desde cada pagamento indevido e não somente a partir da citação e multa de 20% (vinte por cento) conforme preceitua o artigo 61 da Lei nº 9.430/96.
Por sua vez, a defesa de Francisca nas razões (evento 47 - REC2, do eProc originário) sustenta que não deve a Apelante ser condenada a devolver o benefício recebido, eis que, se por meio de fraude, não por sua atitude e ciência, e sim por ato praticado por terceiro. Anota que Francisca está passando por grave dificuldade financeira, sem qualquer rendimento e dependendo de familiares, inclusive para moradia. Pede a reforma da sentença para julgar improcedente a ação. Requer ainda seja a sentença recebida no efeito suspensivo.
Embora as partes tenham sido devidamente intimadas, foram apresentadas contrarrazões tão somente pelo INSS (evento 51 do processo originário). O feito eletrônico alçou a esta Corte, ocasião em que foi autuado e distribuído.
Com vista à Procuradoria Regional da República, sobreveio parecer pelo desprovimento dos recursos (evento 8 - PARECER1). É o relatório.
VOTO
Nos termos do artigo 1.046 do Código de Processo Civil (CPC), em vigor desde 18 de março de 2016, com a redação que lhe deu a Lei 13.105, de 16 de março de 2015, suas disposições aplicar-se-ão, desde logo, aos processos pendentes, ficando revogada a Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973.
Com as ressalvas feitas nas disposições seguintes a este artigo 1.046 do CPC, compreende-se que não terá aplicação a nova legislação para retroativamente atingir atos processuais já praticados nos processos em curso e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada, conforme expressamente estabelece seu artigo 14.
Restituição de valores pagos indevidamente.
É cediço que a Seguridade Social é um amplo sistema de proteção social inserido na Constituição Federal. Por esta razão, a proteção previdenciária oriunda de um sistema contributivo em que todos devem colaborar merece uma atenção destacada, de modo que os recursos financeiros sejam distribuídos com justiça e igualdade.
Assim, a Previdência Social pode buscar a devolução de valores percebidos indevidamente, em razão de três fundamentos jurídicos: a) poder/dever de auto-tutela da Administração Pública; b) supremacia do interesse público sobre o interesse privado e; c) vedação do enriquecimento sem causa do segurado.
A autorização legal para tal desiderato está estampada nos artigos 115 da Lei 8.213/91 e 154 do Decreto 3.048/99, in verbis:
Lei nº 8.213/91
Art. 115. Podem ser descontados dos benefícios:
I - contribuições devidas pelo segurado à Previdência Social;
II - pagamento de benefício além do devido; (...)
§ 1o Na hipótese do inciso II, o desconto será feito em parcelas, conforme dispuser o regulamento, salvo má-fé. (Incluído pela Lei nº 10.820, de 17.12.2003)
§ 2o Na hipótese dos incisos II e VI, haverá prevalência do desconto do inciso II. (Incluído pela Lei nº 10.820, de 17.12.2003)
Decreto nº 3.048/99
Art. 154. O Instituto Nacional do Seguro Social pode descontar da renda mensal do benefício:
I - contribuições devidas pelo segurado à previdência social;
II - pagamentos de benefícios além do devido, observado o disposto nos §§ 2º ao 5º;
§ 2º A restituição de importância recebida indevidamente por beneficiário da previdência social, nos casos comprovados de dolo, fraude ou má-fé, deverá ser feita de uma só vez, atualizada nos moldes do art. 175, independentemente de outras penalidades legais.
§ 2º A restituição de importância recebida indevidamente por beneficiário da previdência social, nos casos comprovados de dolo, fraude ou má-fé, deverá ser atualizada nos moldes do art. 175, e feita de uma só vez ou mediante acordo de parcelamento na forma do art. 244, independentemente de outras penalidades legais. (Redação dada pelo Decreto nº 5.699, de 2006)
§ 3º Caso o débito seja originário de erro da previdência social, o segurado, usufruindo de benefício regularmente concedido, poderá devolver o valor de forma parcelada, atualizado nos moldes do art. 175, devendo cada parcela corresponder, no máximo, a trinta por cento do valor do benefício em manutenção, e ser descontado em número de meses necessários à liquidação do débito.
§ 4º Se o débito for originário de erro da previdência social e o segurado não usufruir de benefício, o valor deverá ser devolvido, com a correção de que trata o parágrafo anterior, da seguinte forma. (...).
Logo, para a manutenção do equilíbrio financeiro do regime geral, tão caro à sociedade brasileira, o princípio da supremacia do interesse público deve ser invocado pela Autarquia Previdenciária para fazer retornar ao sistema da seguridade social valores que foram indevidamente pagos.
De outro lado, não se desconhece a remansosa jurisprudência pátria consolidada no sentido de que, havendo por parte da Autarquia má aplicação de norma jurídica, interpretação equivocada e erro da administração, não se autoriza, por si só, a devolução de valores recebidos indevidamente a título de benefício previdenciário, já que, em tese, foram recebidos de boa-fé pelos segurados. Afora isso, tais valores são considerados de natureza alimentar, sendo, portanto, irrepetíveis.
Nesse sentido, os seguintes julgados do STJ:
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 1973. APLICABILIDADE. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. BENEFÍCIO RECEBIDO INDEVIDAMENTE POR ERRO DA ADMINISTRAÇÃO. BOA-FÉ. VERBA DE CARÁTER ALIMENTAR. RESTITUIÇÃO DE VALORES. IMPOSSIBILIDADE. I - Consoante o decidido pelo Plenário desta Corte na sessão realizada em 09.03.2016, o regime recursal será determinado pela data da publicação do provimento jurisdicional impugnado. Assim sendo, in casu, aplica-se o Código de Processo Civil de 1973. II - Por força do princípio da irrepetibilidade dos alimentos, e, sobretudo, em razão da diretriz da boa-fé objetiva do segurado, não cabe a devolução de valores recebidos, a título de benefício previdenciário, por força de interpretação equivocada, má aplicação da lei ou erro da Administração. III - Recurso Especial não provido. (REsp 1550569/SC, Rel. Ministra REGINA HELENA COSTA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 03/05/2016, DJe 18/05/2016)
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. PAGAMENTO INDEVIDO. BOA-FÉ. ERRO DA ADMINISTRAÇÃO. VERBA DE CARÁTER ALIMENTAR. RESTITUIÇÃO DE VALORES. IMPOSSIBILIDADE. 1. Conforme a jurisprudência do STJ é incabível a devolução de valores percebidos por pensionista de boa-fé por força de interpretação errônea, má aplicação da lei ou erro da Administração. 2. É descabido ao caso dos autos o entendimento fixado no Recurso Especial 1.401.560/MT, julgado sob o rito do art. 543-C do CPC, pois não se discute na espécie a restituição de valores recebidos em virtude de antecipação de tutela posteriormente revogada. 3. Recurso Especial não provido. (REsp 1553521/CE, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 03/11/2015, DJe 02/02/2016)
No entanto, quando os benefícios previdenciários são obtidos, comprovadamente, mediante fraude, dolo e má-fé, há previsão legal autorizando a administração a adotar medidas administrativas para fazer cessar a ilicitude, bem como a buscar a via judicial para obter a restituição da verba indevidamente paga.
Pois bem. A boa-fé é um princípio geral de Direito, segundo o qual todos devem se comportar de acordo com um padrão ético de confiança e lealdade. Gera deveres secundários de conduta, que impõe às partes comportamentos necessários. Se o agente sabe que está descumprindo obrigação jurídica, aí está configurada a má-fé. Há, portanto, consciência de que o indivíduo está descumprindo dever advindo de sua posição de beneficiário do sistema previdenciário, do qual faz parte. Ou seja, a má-fé está justamente neste descumprimento do que o indivíduo sabe ser indevido.
Consoante ensina Wladimir Novaes Martinez em sua obra Cobrança de benefícios indevidos, Ed. LTR, 2012, página 97:
A má-fé lembra a idéia de fraude, deliberada e consciente intenção de causa prejuízo a alguém. Não é correto o autor ter esse procedimento relevado porque julga, por diferentes motivos, fazer jus ao bem maior pretendido. (...) Quem age de má-fé causa dano material ao erário público. Essa ação será comissiva (a mais comum) ou omissiva.
Examinando os elementos probantes do feito, tenho que não se trata de erro administrativo do INSS. Ao contrário, a segurada, evidentemente, agiu maliciosamente no sentido de obter - mediante fraude e engano - aposentadoria por idade e recebeu ilegalmente o benefício (NB 41/132.412.075-1 desde a DIB de 12-02-2004 até maio de 2009 quando ocorreu o cancelamento do pagamento.
Os argumentos defensivos não são capazes de elidir os sólidos fundamentos de fato e de direito constante da sentença (evento 42 - SENT1 do processo eletrônico originário), que merece ser mantida em todos seus termos. Para evitar tautologia, reproduzo seus fundamentos que, inclusive, adoto como razões de decidir:
Tem-se, assim, que foram apuradas irregularidades quanto aos vínculos empregatícios que foram considerados para a concessão do benefício, sendo que a Ré, devidamente intimada, alegou o extravio de sua CTPS e posteriormente não apresentou defesa na esfera administrativa, o que levou à cessação do benefício irregularmente concedido.
Conforme depoimento prestado pela Ré nos autos da ação penal nº 5007406-93.2014.404.7001, anexado em vídeo a estes autos no evento 29, na rodoviária de Londrina conheceu uma pessoa que lhe disse que conseguiria aposentadoria, relata ter entregue a sua CTPS à referida pessoa e que não viu sua CTPS posteriormente. Relata ainda não ter trabalhado na Construtora Brasília, na Retificadora de Motores Adelcin, na Retificadora de Motores Bandeirantes, na empresa Sassatani Uemo e Cia e na Açúcar e Álcool Bandeirantes.
Em contestação, a Requerida sustenta sua boa-fé no recebimento do benefício indevido.
No entanto, vislumbra-se do processo administrativo que foi a própria segurada quem deu entrada ao pedido de aposentadoria, oportunidade em que apresentou sua carteira de trabalho com vínculos empregatícios inexistentes ao INSS (evento 1 - PROCADM3, pp. 1/6).
Em que pese a parte ré tenha se declarado analfabeta, ao menos poderia ter notado a alteração em sua carteira de trabalho, visto que foram adicionados nada menos do que 5 vínculos empregatícios.
Registre-se que a Requerida admite que confiou seus documentos a pessoa que não conhecia, inclusive concordando em informar no INSS que residia em Assis/SP, mesmo sabendo que se tratava de informação não verídica.
Ademais, em resposta a ofício enviado pelo INSS, a Ré demonstrou ter ciência dos vínculos empregatícios adicionados em sua CTPS, ao afirmar que não teria como localizar os documentos das empresas solicitados pelo INSS:
Não tenho como localizar qualquer documento das empresas, pois elas já fecharam.
Não entendi muito bem o propósito desta exigência, pois quando dei entrada em meu pedido de benefício, o funcionário da agência, então em Assis-SP, conferiu todos os documentos que levei, analisou e concedeu a aposentadoria, sem sombra de dúvidas.
(...)
Espero ter esclarecido qualquer coisa, pois não sou conhecedora de como funciona essas regras de aposentadoria, apenas sei que com 60 anos poderia ser beneficiada" - destaquei (evento 1 - PROCADM2, p. 34).
Desta feita, resta descaracterizada a boa-fé alegada pela Ré.
Considerando que não houve contestação da irregularidade dos vínculos afastados na esfera administrativa, deve ser dado trânsito ao pedido do INSS de ressarcimento dos valores indevidamente recebidos a título de benefício previdenciário.
A propósito, ao caso, é extremamente relevante colacionar excerto da sentença prolatada no processo criminal nº 5007.406.93.2014.404.7001, demonstrando o agir malicioso de Francisca Rita Leite na obtenção do benefício:
De outro lado, não é crível que a ré FRANCISCA, ainda que pessoa simples e sem elevado grau de instrução, acreditasse que possuía a carência necessária para sua aposentadoria, uma vez que ela mesmo afirmou que não possuía o tempo em carteira, tendo apenas um registro em sua Carteira de Trabalho e Previdência Social:
"[...]QUE, este, agora conversando com a declarante após ter esta explicado toda a sua vida laboral afirmou que embora a interrogada não tivesse direito ao benefício, daria um jeito para consegui-lo em seu favor;
[...]
QUE, na única CTPS possuída pela interrogada, um único registro de atividade rural existiu; QUE, jamais exerceu qualquer atividade de natureza urbana; QUE, pelo serviço prestado pelo senhor referido, pagou a interrogada valor deduzido das primeiras parcelas do benefício recebidas" (evento 4 do IPL)
Perante o Juízo:
"Que já havia trabalhado com registro uma vez;" (evento 52)
Afirmou também, tanto em sede de IPL quanto em Juízo que nunca trabalhou nas empresas que constaram em sua Carteira de Trabalho:
"QUE, confirma jamais ter trabalhado em quaisquer das empresas arroladas no documento de fl. 52 do apenso;" (evento 4 do IPL);
"Que não trabalhou nas empresas Construtora Brasília, Retificadora de Motores Aldecin, Retificadora de Motores Bandeirantes, Sassatani Ueno e Cia e Açucar e Álcool Bandeirantes;" (evento 52).
Portanto resta afastada a tese de que a ré acreditava que não se tratava de fraude, vez que restou amplamente provado que tinha ciência que: i) não tinha direito ao benefício previdenciário de aposentadoria por idade; ii) possuía apenas um registro em sua Carteira de Trabalho e Previdência Social; iii) informou endereço incorreto perante o INSS propositalmente; iv) entregou sua Carteira de Trabalho e Previdência Social para que fossem inseridos vínculos empregatícios que sabia inexistentes; vii) não comprovou a real existência de "JOSÉ" que teria sido o responsável pela fraude, segundo alegou;
Além disso, a ré FRANCISCA foi quem se beneficiou da concessão indevida do benefício de aposentadoria, pois recebeu os valores do benefício ao qual não fazia jus.
Desse modo, por todo o contexto probatório, não resta dúvida de que FRANCISCA RITA LEITE foi autora dos fatos narrados na denúncia.
Dolo.
O tipo subjetivo do crime de estelionato é constituído pelo dolo (consciência e vontade de induzir ou manter a vítima em erro, mediante a utilização de meio fraudulento, causando prejuízo alheio) aliado ao elemento subjetivo do tipo, consistente em obter vantagem ilícita, para si ou para outrem.
A vontade da ré de obter para si vantagem ilícita mediante a utilização de meio fraudulento em detrimento do INSS está amplamente provada no processo.
As provas carreadas no autos demonstram a utilização da Carteira de Trabalho e Previdência Social da ré, com registros de contrato de trabalho fictícios, bem como a inclusão do seu nome no CNIS (Cadastro Nacional de Informações Sociais) através da entrega de GFIP´s (Guia de Recolhimento do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço) extemporâneas e RAIS igualmente extemporânea.
A ré confessou perante a autoridade policial que foi lhe informado que não tinha direito ao recebimento de aposentadoria e ainda assim concordou com a proposta ilícita em razão de dificuldades financeiras:
"QUE, este, agora conversando com a declarante após ter esta explicado toda a sua vida laboral afirmou que embora a interrogada não tivesse direito ao benefício, daria um jeito para consegui-lo em seu favor; QUE, concordou com tal proposta em virtude da necessidade financeira" (evento 4, fl. 3-4, do IPL)
Em seu interrogatório judicial disse:
"Que seu marido estava com a vista ruim, com glaucoma, por isso veio a Londrina; Que vieram de ônibus e na rodoviária tinha um senhor que estava arrumando aposentadoria; Que caiu nisso pois estava precisando; Que estava gastando muito com seu esposo que está cego e fez transplante porém não adiantou;" (evento 52)
Não se olvide ainda, que a ré ainda informou incorretamente e de maneira proposital seu endereço. A informação que repassou ao INSS foi de que residia em Assis/SP, quando ela na realidade reside em Cornélio Procópio/PR:
"QUE, tal senhor solicitou que a interrogada informasse endereço residencial errado, tendo a interrogada concordado em informar ao INSS residência no município de Assis/SP" (evento 4, fl. 3-4, do IPL)
Em Juízo:
"Que informou o endereço incorreto a mando deles;" (evento 52)
Ora, informou endereço incorreto para dificultar a constatação da fraude, especialmente porque parte das empresas que constaram em sua CTPS tinham sede em Londrina.
Nas defesas administrativas apresentada perante o INSS (apenso, fl. 54 e 62 do IPL) a ré afirmou que tentou localizar as empresas que havia, em tese, trabalhado porém elas não existiam mais, ambas as defesas assinadas pela ré. Ora, a ré confessou no seu interrogatório policial (evento 4,fl. 3-4, do IPL) e em Juízo (evento 52) que nunca trabalhou em tais empresas, portanto, evidencia-se com tais defesas perante o INSS o total conhecimento que FRANCISCA possuía acerca da obtenção fraudulenta do benefício previdenciário.
O dolo da ré FRANCISCA restou comprovado por todo o contexto probatório, em que pese ela ter alegado que foi enganada por "JOSÉ". Tal alegação é inverossímil, considerando as incongruências já referidas no tópico da autoria. Portanto, FRANCISCA tinha ciência, bem como concorreu para a confecção de toda documentação com informações inverídicas.
Reporta-se, aqui, por brevidade, à fundamentação contida no tópico sobre a autoria delitiva, para demonstrar igualmente o dolo da acusada. Com efeito, restaram afastadas todas as teses de negativa de autoria e de ausência de dolo do delito (inexistência de crime cometido pela ré) descrito na denúncia, restando demonstrado que a ré realizou ação típica com dolo, genérico e específico do tipo penal em questão, conforme narrado na denúncia.
Assim, a ré tinha conhecimento de que não fazia jus ao recebimento do benefício previdenciário, mas mesmo assim induziu e manteve em erro o INSS mediante a utilização de meio fraudulento (inserção de falsos vínculos empregatícios no CNIS e em sua CTPS).
Destarte, está provado o dolo aliado ao fim específico da ré para praticar a conduta descrita na denúncia.
Muito embora no processo penal tenha sido decretada a extinção da punibilidade pela prescrição da pretensão punitiva estatal, o agir malicioso da parte ré da demanda para a obtenção da aposentadoria por idade rural restou comprovado à saciedade.
A propósito, a prova dos autos, dá conta do dano/prejuízo causado à Autarquia, uma vez que o proceder de Francisca foi com nítido enriquecimento sem causa à custa do combalido sistema previdenciário pátrio.
Destarte, diante da robusta comprovação da má-fé da segurada, deve ser mantida a sentença de primeiro grau em todos os seus termos.
Apelo INSS
Correção monetária, termo inicial, juros e multa de mora.
Em face de não possuírem as parcelas a serem restituídas ao INSS natureza de crédito tributário, descabe aplicação de multa e a incidência da SELIC para atualizar o montante devido, razão pela qual deve ser mantida a sentença neste ponto.
No tocante aos juros, quando se trata de ressarcimento decorrente de benefício previdenciário recebido com inequívoca comprovação de má-fé da demandada e resultando nítido o caráter ilícito na percepção, os juros de mora têm início a partir do evento danoso e não da citação.
Isso porque, com o ilícito nasce, de imediato, em contrapartida, a obrigação ao ressarcimento pelo causador do ato, de sorte que desde o evento danoso surge a mora, pois somente mais tarde é que ele vem a repará-la. No tópico, é de ser provido o recurso da Autarquia Previdenciária.
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento ao apelo do INSS e negar provimento ao apelo de Francisca Rita Leite, nos termos da fundamentação supra.
Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE
Relatora


Documento eletrônico assinado por Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8868724v6 e, se solicitado, do código CRC FCFC24FF.
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Signatário (a): Salise Monteiro Sanchotene
Data e Hora: 30/03/2017 09:26




EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 29/03/2017
APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5016860-97.2014.4.04.7001/PR
ORIGEM: PR 50168609720144047001
RELATOR
:
Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE
PRESIDENTE
:
Desembargadora Federal Vânia Hack de Almeida
PROCURADOR
:
Procurador Regional da República Marcus Vinícius de Aguiar Macedo
APELANTE
:
FRANCISCA RITA LEITE
ADVOGADO
:
Charles de Freitas Vilas Boas
APELANTE
:
INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO
:
OS MESMOS
MPF
:
MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 29/03/2017, na seqüência 1066, disponibilizada no DE de 14/03/2017, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PARCIAL PROVIMENTO AO APELO DO INSS E NEGAR PROVIMENTO AO APELO DE FRANCISCA RITA LEITE, NOS TERMOS DA FUNDAMENTAÇÃO SUPRA.
RELATOR ACÓRDÃO
:
Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE
VOTANTE(S)
:
Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE
:
Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
:
Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
Gilberto Flores do Nascimento
Diretor de Secretaria


Documento eletrônico assinado por Gilberto Flores do Nascimento, Diretor de Secretaria, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8914324v1 e, se solicitado, do código CRC 883BE0DB.
Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): Gilberto Flores do Nascimento
Data e Hora: 30/03/2017 07:59




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