Apelação Cível Nº 5003613-61.2019.4.04.7102/RS
RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
APELANTE: IVO AFONSO FENGLER (IMPETRANTE)
APELADO: Gerente - INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS - Santa Maria (IMPETRADO)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (INTERESSADO)
RELATÓRIO
Ivo Afonso Fengler impetrou mandado de segurança contra o Gerente Executivo do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), com pedido de anulação da decisão administrativa que negou a implantação da aposentadoria por tempo de contribuição NB 176816922-2 e a consequente implantação do benefício.
Prestadas as informações e oferecido o parecer pelo Ministério Público Federal, foi entregue sentença denegatória da segurança.
.A impetrante apelou. Argumenta que a sentença merece reforma, pois no processo judicial anterior, o impetrante havia requerido reconhecimento do período rural de 25/03/1980 a 19/10/1985 como dependente dos pais, vindo a ser indeferido sob alegação de que os genitores possuíam outra fonte de renda. Já no novo pedido administrativo, que veio a ser acolhidos nas instâncias recursais, comprovou atividade rural com base em provas em nome próprio, ou seja, teve reconhecido atividade rural em nome próprio no período de 25/03/1980 a 19/10/1985. Alega se tratar de novo pedido, esse com novas provas documentais e com pedido de reconhecimento de tempo de atividade rural não mais na qualidade de dependente dos pais, mas sim, tempo rural em nome próprio.
Processado o recurso, vieram os autos ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região.
A Procuradoria Regional da República apresentou parecer pelo desprovimento da apelação.
VOTO
A coisa julgada, prevista no artigos 5º, XXXVI, da Constituição da República, está definida nos artigos 503, 505 e 508, do Código de Processo Civil, nos seguintes termos:
Art. 503. A decisão que julgar total ou parcialmente o mérito tem força de lei nos limites da questão principal expressamente decidida.
Art. 505. Nenhum juiz decidirá novamente as questões já decididas relativas à mesma lide, salvo:
I - se, tratando-se de relação jurídica de trato continuado, sobreveio modificação no estado de fato ou de direito, caso em que poderá a parte pedir a revisão do que foi estatuído na sentença;
II - nos demais casos prescritos em lei.
Art. 508. Transitada em julgado a decisão de mérito, considerar-se-ão deduzidas e repelidas todas as alegações e as defesas que a parte poderia opor tanto ao acolhimento quanto à rejeição do pedido.
No caso examinado, verifica-se que a parte autora ajuizou anterior ação judicial (processo n. 5002207-85.2013.4.04.7111), julgada no Juizado Especial Federal da 4ª Região, em que se discutiu, entre outras questões, o reconhecimento da atividade rural, em regime de economia familiar, do período de 25/03/1980 a 19/10/1985. Nesse sentido, transcreve-se excerto do voto proferido naquele feito (recurso cível nº 5002207-85.2013.4.04.7111):
"(...) Alega o requerente que exerceu atividade rural, em regime de economia familiar, juntamente com a mãe e irmãos, até o casamento.
Como início de prova material, apresentou os seguintes documentos: Atestado Escolar (1970 a 1973); Nota e/ou contra-nota de produtor rural, em nome do pai (1973, 1977 a 1983); Declaração de Transporte de Fumo, em nome do pai; Proposta de Associado do STR e Ficha de Sócio do STR (1980); Recibo do STR (1984 e 1985); Certidão de Casamento (1985), onde consta a profissão agricultor.
Entendo que os demais documentos apresentados satisfazem o requisito legal de início de prova material. No que tange à prova oral, as testemunhas confirmam o exercício da atividade rural no período declarado.
No entanto, embora o demandante tenha trazido aos autos diversos documentos que demonstrem a dedicação às lides rurais, não restaram configurados os elementos caracterizadores do regime de economia familiar, nos termos do art. 11, § 1º, da Lei nº 8.213/91 (aquele cujo trabalho dos membros da família é indispensável à sua própria subsistência e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração).
Com efeito, o contexto probatório demonstra, com clareza, que os pais do requerente sempre exerceram atividade urbana, sendo que o pai possuiu um único vínculo no período de 1955 a 1981, que gerou sua aposentadoria urbana e que a mãe possuiu empresa em seu nome do período de 1975 a 1992, atividade que também lhe gerou aposentadoria urbana, o que demonstra que a atividade rural era mera atividade complementar.
Nesse contexto, entendo que restou descaracterizada a qualidade de segurada especial da parte autora, mormente pela demonstração de que o grupo familiar não sobrevivia exclusivamente da produção agrícola.
Não comprovado o exercício de atividade rural em regime de economia familiar no período requerido, impõe-se a improcedência da demanda.
Na presente demanda, a parte autora busca, concessão da ordem, para que o tempo de atividade rural em regime de economia familiar de 25/03/1980 a 19/10/1985 seja computado no pedido de concessão do benefício NB 176816922-2, por terem sido posteriormente reconhecidos administrativamente.
Percebe-se, todavia, que os períodos em que se busca o reconhecimento da atividade rural são exatamente os mesmos.
A alegação referente à relativização da coisa julgada, sob o fundamento de ter obtido prova nova, ou de que o INSS veio a reconhecer administrativamente o desempenho de atividade rural não pode ser aqui admitida, tendo em vista a inviabilidade de se acolher, em matéria previdenciária, a tese da formação da coisa julgada secundum eventum probationis fundada em novas provas, se o pedido foi examinado em ação anterior, a qual foi extinta com julgamento de mérito.
Nesse sentido, colaciona-se as seguintes ementas:
PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. RECONHECIMENTO DE ATIVIDADE ESPECIAL. COISA JULGADA. PROVA NOVA. AÇÃO RESCISÓRIA. OMISSÃO. INOCORRÊNCIA. PREQUESTIONAMENTO. 1. O recurso dos embargos de declaração deve visar sanar eventual obscuridade, contradição ou omissão quanto a ponto sobre o qual se impunha o pronunciamento. 2. Não é o instrumento processual adequado para rediscutir o mérito do julgado recorrido. 3. Consoante o art. 1.025 do CPC, consideram-se incluídos no acórdão os elementos que o embargante suscitou, para fins de pré-questionamento, ainda que os embargos de declaração sejam inadmitidos ou rejeitados, caso o tribunal superior considere existentes erro, omissão, contradição ou obscuridade. 4. A alegação referente à relativização da coisa julgada, sob o fundamento de ter obtido prova nova, não pode ser aqui admitida, tendo em vista a inviabilidade de se acolher em matéria previdenciária a tese da formação da coisa julgada secundum eventum probationis, fundada em novas provas, se o pedido foi examinado em ação anterior extinta com julgamento de mérito. 5. A alegação da existência de prova nova objetiva emprestar a esta ação ordinária os efeitos próprios da ação rescisória, sendo o Tribunal incompetente para apreciá-la, na medida em que o julgado rescindendo foi proferido no âmbito do Juizado Especial Federal. (TRF4, AG 5045710-42.2019.4.04.0000, QUINTA TURMA, Relator ALTAIR ANTONIO GREGÓRIO, juntado aos autos em 02/07/2020)
PREVIDENCIÁRIO. TEMPO ESPECIAL. COISA JULGADA. OCORRÊNCIA. 1. Havendo identidade de partes, de pedido e de causa de pedir, em relação ao período postulado como tempo especial, deve ser extinto o feito sem julgamento do mérito, face ao reconhecimento de existência de coisa julgada. 2. Inviabilidade de se acolher a tese da formação da coisa julgada secundum eventum probationis, fundada em novas provas, se o pedido foi examinado em ação anterior, que foi extinta, com julgamento de mérito. (TRF4, AC 5006223-74.2016.4.04.7112, QUINTA TURMA, Relator ALTAIR ANTONIO GREGÓRIO, juntado aos autos em 02/07/2020)
PREVIDENCIÁRIO. COISA JULGADA. OCORRÊNCIA. REVISÃO DA RENDA MENSAL INICIAL DA APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. CABIMENTO. 1. Conforme precedentes deste Tribunal, a sentença tem força de lei nos limites da lide e das questões decididas e, quando não mais sujeita a recurso, faz coisa julgada material e adquire eficácia que a torna imutável e indiscutível. 2. Inviável a relativização da coisa julgada em matéria previdenciária ou mesmo se entenda pela formação de coisa julgada secundum eventum probationis em todas as situações nas quais a sentença considere frágil ou inconsistente a prova documental. 3. Preenchidos os requisitos legais, tem o segurado direito à revisão da aposentadoria por tempo de contribuição, com o cálculo que for mais favorável, a contar da data de entrada do requerimento administrativo. 4. A correção monetária das parcelas vencidas dos benefícios previdenciários será calculada conforme a variação do IGP-DI de 05/96 a 03/2006, e do INPC, a partir de 04/2006. 5. Os juros de mora devem incidir a contar da citação (Súmula 204 do STJ), na taxa de 1% (um por cento) ao mês, até 29 de junho de 2009. A partir de 30 de junho de 2009, os juros moratórios serão computados, uma única vez (sem capitalização), segundo percentual aplicável à caderneta de poupança. (TRF4, AC 5001926-07.2014.4.04.7108, QUINTA TURMA, Relator JOSÉ LUIS LUVIZETTO TERRA, juntado aos autos em 18/03/2020)
CONSTITUCIONAL, PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. COISA JULGADA MATERIAL. EXTINÇÃO DE PROCESSO ANTERIOR COM JULGAMENTO DO MÉRITO. IDENTIDADE ESSENCIAL DE PARTES, CAUSA DE PEDIR E PEDIDO. JULGAMENTO SECUNDUM EVENTUM PROBATIONIS. 1. Conforme precedentes deste Tribunal, a sentença tem força de lei nos limites da lide e das questões decididas e, quando não mais sujeita a recurso, faz coisa julgada material e adquire eficácia que a torna imutável e indiscutível. 2. Inviável a relativização da coisa julgada em matéria previdenciária ou mesmo se entenda pela formação de coisa julgada secundum eventum probationis em todas as situações nas quais a sentença considere frágil ou inconsistente a prova documental. 3. Está evidente e manifesta a identidade material de partes, causa de pedir e pedido, configurando coisa julgada. (TRF4, AG 5041403-45.2019.4.04.0000, SEXTA TURMA, Relator JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, juntado aos autos em 30/01/2020)
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. COISA JULGADA APOSENTADORIA ESPECIAL. TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL. 1. Tendo havido julgamento de improcedência, baseado na análise de provas então produzidas sobre os fatos alegados, a dedução de idêntico pedido, encontra óbice na coisa julgada. 2. Desacolhida pelo Superior Tribunal de Justiça a tese da coisa julgada secundum eventum probationis, há coisa julgada na repetição de demanda já julgada improcedente (com exame de mérito), ainda que fundada em novas provas. (TRF4, AC 5004109-31.2017.4.04.7112, QUINTA TURMA, Relatora GISELE LEMKE, juntado aos autos em 06/05/2019)
Assim, deve ser mantida a r. sentença, que reconheceu a existência de coisa julgada em relação à atividade rural. Por oportuno, transcreve-se excerto da sentença que tratou desse tema (evento 19, SENT1):
A decisão judicial transitada em julgado prevalece sobre a nova decisão administrativa, porquanto houve resolução do mérito. Os documentos, se fosse o caso, deveriam ter sido apresentados pelo impetrante na ação judicial que moveu contra a Autarquia Previdenciária. Abrange a causa de pedir da ação nº 5002207-85.2013.4.04.7111 o contexto da atividade do autor e de seus pais, porquanto diz respeito à atividade rural em regime de economia familiar, não se podendo distinguir entre pedir em nome próprio ou em nome da família, artificiosamente.
Nesse sentido:
EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. COISA JULGADA. 1. A mera formulação de novo requerimento administrativo não configura mudança da causa de pedir que possa tornar a nova demanda distinta da anterior, quanto aos fatos já apreciados e acobertados pela coisa julgada. 2. Hipótese em que a existência de coisa julgada quanto a parte do período controvertido impede o reconhecimento do direito à aposentadoria rural por idade, porquanto não preenchidos os requisitos exigidos para a concessão do benefício. (TRF4 5002657-84.2019.4.04.9999, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, Relator MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA, juntado aos autos em 21/08/2019)
Acertou, portanto, o INSS ao não implantar o benefício NB 176816922-2, sob pena de violar os artigos 5º, XXXVI, da Constituição da República, 503, 505 e 508, todos do CPC/2015.
Em face do que foi dito, voto no sentido de negar provimento à apelação.
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Apelação Cível Nº 5003613-61.2019.4.04.7102/RS
RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
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APELADO: Gerente - INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS - Santa Maria (IMPETRADO)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (INTERESSADO)
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. APOSENTADORIA. RECONHECIMENTO DE ATIVIDADE RURAL. PERÍODO EQUIVALENTE AO EXAMINADO EM AÇÃO ANTERIOR EXTINTA COM JULGAMENTO DE MÉRITO. COISA JULGADA. ALEGAÇÃO DE NOVAS PROVAS. IMPOSSIBILIDADE DE REEXAME DA QUESTÃO.
É inviável o acolhimento da tese da formação da coisa julgada secundum eventum probationis, fundada em novas provas, ou reconhecimento administrativo superveniente, se o pedido formulado na ação já foi examinado em outra precedente, a qual foi extinta com julgamento de mérito.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 20 de outubro de 2020.
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 13/10/2020 A 20/10/2020
Apelação Cível Nº 5003613-61.2019.4.04.7102/RS
RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
PRESIDENTE: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
PROCURADOR(A): ADRIANA ZAWADA MELO
APELANTE: IVO AFONSO FENGLER (IMPETRANTE)
ADVOGADO: EDU CARLOS LOUREIRO MENEZES (OAB RS109494)
ADVOGADO: TATIANE CANDIDA DOS SANTOS MENEZES (OAB RS059821)
APELADO: Gerente - INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS - Santa Maria (IMPETRADO)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (INTERESSADO)
MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (MPF)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 13/10/2020, às 00:00, a 20/10/2020, às 14:00, na sequência 188, disponibilizada no DE de 01/10/2020.
Certifico que a 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 5ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
Votante: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
Votante: Juiz Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO
Votante: Juíza Federal GISELE LEMKE
LIDICE PEÑA THOMAZ
Secretária
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