Apelação Cível Nº 5015364-95.2017.4.04.7108/RS
RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
APELANTE: CLEBER HOCH (AUTOR)
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: OS MESMOS
RELATÓRIO
Cleber Hoch e o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS interpuseram recursos de apelação contra sentença, proferida em 15/08/2018, que julgou parcialmente procedente o pedido, nos seguintes termos:
Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados na peça inicial, resolvendo o mérito da demanda, nos termos do art. 487, inc. I, do CPC/2015, nos seguintes termos:
(a) declaro, para fins previdenciários, o tempo de serviço especial da parte autora no(s) seguinte(s) período(s): de 01/12/1987 a 02/06/1998 e 03/07/2008 a 23/05/2016;
(b) declaro o direito ao recebimento de aposentadoria por tempo de contribuição desde 23/05/2016 (DER/DIB);
(c) determino ao INSS que, no prazo de 30 (trinta) dias a contar de sua intimação para tal finalidade, que ocorrerá após o trânsito em julgado, cumpra obrigações de fazer, consistentes em averbar o(s) período(s) acima referido(s) e em conceder o benefício, implantando-o no Sistema Único de Benefícios da Previdência Social (Plenus), com data de início de pagamentos (DIP) fixada no dia primeiro do mês de recebimento da intimação;
(d) condeno o INSS a pagar à parte autora - mediante requisição de pagamento (precatório/RPV) e após o trânsito em julgado (CF/88, art. 100) - as prestações vencidas ("atrasados"), compreendidas no período entre data de início do benefício (DIB) e a data de início dos pagamentos administrativos (DIP) que vier a ser fixada no Sistema Único de Benefícios da Previdência Social quando do cumprimento da obrigação de fazer, respeitada a prescrição quinquenal e abatidos eventuais benefícios inacumuláveis recebidos no período (LBPS, art. 124), aplicando-se juros e correção monetária nos termos da fundamentação;
(e) desacolho o pedido de conversão do tempo de serviço comum em especial, no que diz respeito aos períodos laborados antes de 28/04/1995, para fins de concessão de aposentadoria especial;
(f) condeno o INSS ao pagamento de honorários advocatícios de sucumbência, em percentual a ser fixado por ocasião da liquidação da sentença, nos termos do art. 85, § 4º, inc. II, do CPC/2015, a ser calculado sobre o valor da condenação, esclarecendo que a base de cálculo da verba honorária compreenderá apenas a soma das prestações vencidas até a data de publicação desta sentença (cf. súmulas n.º 76 do TRF/4 e 111 do STJ);
(g) condeno o réu ao pagamento de custas processuais, as quais, porém, ficam dispensadas, dada a isenção legal prevista na Lei n.º 9.289/96 (art. 4.º, inciso I), ressalvado o reembolso de custas porventura adiantadas pela parte vencedora.
IV - Disposições Finais
Deixo de submeter esta sentença à remessa necessária visto que, apesar de sua iliquidez, é certo que a condenação não superará o parâmetro fixado no CPC, de 1.000 salários mínimos (CPC/2015, art. 496, inciso I; REsp 101.727/PR).
Sentença publicada e registrada eletronicamente.
Intimem-se.
Havendo interposição tempestiva de recurso por qualquer das partes, dou-o(s) por recebidos nos efeitos previstos nos artigos 1.012 e 1.013 do Código de Processo Civil/2015. Intime(m)-se as partes para, querendo, ofertar(em) contrarrazões. Decorrido o prazo, desde já determino a remessa dos autos ao TRF da 4.ª Região.
Em sua apelação, a parte autora requereu, preliminarmente, a anulação da sentença em razão da ocorrência de cerceamento de defesa, uma vez que foi indeferido o pedido de expedição de ofício à empresa Gelita do Brasil "para que a empresa fornecesse a ficha de entrega e substituição doEPI; o comprovante de curso de treinamento quanto ao uso do EPI pelo empregado; a comprovação da compra do EPI com o respectivo certificado de aprovação apontado no PPP; E esclarecesse porque preencheu no PPP ruído de 85 dB se forneceu laudo que informa ruído de 92,8 dB e 91,05 dB para as atividades do Recorrente; e para que a empresa esclareça o motivo pelo qual somente informou o ruído de 85 dB no PPP se o laudo informa um ruído bem superior; e porque informou exposição alternada a agentes químicos". Defendeu a concessão de aposentadoria especial, mediante o reconhecimento da especialidade do trabalho prestado também nos períodos de 16/12/1985 a 30/11/1987 (Laticínios Ivoti Ltda.) e 17/09/1998 a 08/01/2008 (Gelita do Brasil Ltda.). Pretende a reforma da sentença, na parte em que estabeleceu a exigência de afastamento de atividades nocivas, nos termos do art. 57, §8º da Lei 8.213/91, como condição para concessão de aposentadoria especial ou início dos efeitos financeiros.
O INSS, em suas razões de apelação, argumentou não ser possível o reconhecimento da especialidade por exposição à eletricidade a partir da vigência do Decreto nº 2.172/97, em 05/03/1997.
Apresentadas contrarrazões pela parte autora.
VOTO
Cerceamento de defesa
Tendo em vista a manifestação do demandante no evento 28, onde informa que realizou diligências para que a empresa corrigisse os dados do PPP, e informa que deseja o reconhecimento da especialidade do período em que laborou na empresa Gelita do Brasil Ltda. em razão apenas do ruído, para o qual os EPIs não neutralizam a nocividade, o pedido está prejudicado.
Tempo de atividade especial
O reconhecimento da especialidade obedece à disciplina legal vigente na época em que a atividade foi exercida, passando a integrar, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador. Desse modo, havendo a prestação laboral sob a vigência de certa legislação, o segurado adquire o direito à contagem do tempo de serviço especial na forma estabelecida, bem como à comprovação das condições de trabalho como então exigido, não se aplicando retroativamente lei nova que venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial. Nesse sentido, a orientação adotada pela Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça (AR 3320/PR, Relatora Ministra Maria Thereza de Assis Moura, DJe 24-09-2008) e pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (EINF 2005.71.00.031824-5/RS, Terceira Seção, Luís Alberto D'Azevedo Aurvalle, D.E. 18-11-2009).
A evolução legislativa da matéria apresenta os seguintes marcos temporais:
a) até 28 de abril de 1995, quando esteve vigente a Lei nº 3.807/1960 (Lei Orgânica da Previdência Social) e suas alterações e, posteriormente, a Lei nº 8.213/1991 (Lei de Benefícios da Previdência Social), em sua redação original (artigos 57 e 58), a especialidade do tempo de serviço decorria do exercício de atividade profissional prevista como especial nos Decretos nº 53.831/1964 e nº 83.080/1979 e/ou na legislação especial. As normas regulamentares classificavam as atividades de duas formas: segundo os grupos profissionais, presumindo-se a sujeição do trabalhador a condições prejudiciais à saúde ou à integridade física; e segundo os agentes nocivos, caso em que deve ser demonstrada a exposição ao agente por qualquer meio de prova. Para os agentes nocivos ruído e calor, é necessário mensurar os seus níveis por meio de perícia técnica, documentada nos autos ou informada em formulário emitido pela empresa, a fim de verificar o grau de nocividade dos agentes envolvidos;
b) entre 29 de abril de 1995 a 05 de março de 1997, período em que estavam vigentes as alterações introduzidas pela Lei nº 9.032/1995 no artigo 57 da LBPS, torna-se necessária a demonstração efetiva da exposição, de forma permanente, não ocasional nem intermitente, a agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, por qualquer meio de prova, considerando-se suficiente, para tanto, a apresentação de formulário-padrão preenchido pela empresa, sem a exigência de embasamento em laudo técnico, ressalvados os agentes nocivos ruído e calor, em relação aos quais é imprescindível a realização de perícia técnica, conforme visto acima. Foi definitivamente extinto o enquadramento por categoria profissional - à exceção das atividades a que se refere a Lei nº 5.527/1968, cujo enquadramento por categoria deve ser feito até 13 de outubro de 1996, data imediatamente anterior à publicação da Medida Provisória nº 1.523/1996, que a revogou expressamente;
c) a partir de 06 de março de 1997, data da entrada em vigor do Decreto nº 2.172/1997, que regulamentou as disposições introduzidas no artigo 58 da LBPS pela Medida Provisória nº 1.523/1996 (convertida na Lei nº 9.528/1997), passou a ser exigida, para fins de reconhecimento de tempo de serviço especial, a comprovação da efetiva sujeição do segurado a agentes agressivos por meio da apresentação de formulário-padrão, embasado em laudo técnico de condições ambientais do trabalho, ou por meio de perícia técnica.
Para que se caracterize a habitualidade e a permanência do tempo de trabalho em condições especiais prejudiciais à saúde ou à integridade física (referidas no artigo 57, §3º, da Lei n° 8.213/91), a exposição ao agente nocivo deve ser ínsita ao desenvolvimento das atividades cometidas ao trabalhador, integrada à sua rotina de trabalho. Exegese diversa levaria à inutilidade da norma protetiva, pois em raras atividades a sujeição direta ao agente nocivo se dá durante toda a jornada de trabalho e, em muitas delas, a exposição em tal intensidade seria absolutamente impossível (EINF n.º 0003929-54.2008.404.7003, TRF 4ª Região, 3ª Seção, Rel. Des. Federal Rogério Favreto, D.E. 24-10-2011; EINF n.º 2007.71.00.046688-7, TRF 4ª Região, 3ª Seção, Rel. Des. Federal Celso Kipper, D.E. 07-11-2011). Em suma, somente se a exposição ao agente nocivo for eventual ou ocasional, está afastada a especialidade do tempo de serviço.
Além disso, conforme o tipo de atividade, a exposição ao agente nocivo, ainda que não diuturna, configura atividade apta à concessão de aposentadoria especial, tendo em vista que a intermitência na exposição não reduz os danos ou riscos inerentes à atividade. Não é razoável que se retire do trabalhador o direito à redução do tempo de serviço para a aposentadoria, deixando-lhe apenas os ônus da atividade perigosa ou insalubre (EINF n° 2005.72.10.000389-1, TRF 4ª Região, 3ª Seção, Rel. Des. Federal João Batista Pinto Silveira, D.E. 18-05-2011; EINF n° 2008.71.99.002246-0, TRF 4ª Região, 3ª Seção, Rel. Des. Federal Luís Alberto D'Azevedo Aurvalle, D.E. 08-01-2010).
A respeito da utilização de equipamento de proteção individual (EPI), a partir de 03/12/1998, data da publicação da MP nº 1.729, convertida na Lei nº 9.732, que modificou a redação dos §§ 1º e 2º do art. 58 da Lei nº 8.213/1991, a legislação previdenciária estabelece que a existência de tecnologia de proteção individual eficaz, que comprovadamente neutralize os agentes nocivos ou diminua a sua intensidade a limites de tolerância, afasta o efetivo prejuízo à saúde ou integridade física do trabalhador, razão pela qual a atividade não pode ser qualificada como especial.
O Supremo Tribunal Federal, em julgado com repercussão geral, firmou entendimento no sentido de que, se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não há direito à aposentadoria especial. Contudo, havendo demonstração de que o uso do EPI, no caso concreto, não é suficiente para afastar a nocividade, deve ser reconhecida a especialidade do trabalho. Em relação ao ruído, o STF considerou que a exposição a níveis superiores aos limites de tolerância causa prejuízos ao organismo humano que vão além dos relacionados à perda das funções auditivas. Assim, a utilização do EPI não garante a eliminação dos efeitos do agente nocivo ruído, pois existem fatores de difícil ou impossível controle que influenciam a sua efetividade. Esta é a redação da tese firmada no Tema nº 555:
I - O direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo a sua saúde, de modo que, se o Equipamento de Proteção Individual (EPI) for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial; II - Na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria. (ARE 664335, Relator(a): Min. LUIZ FUX, Tribunal Pleno, julgado em 04/12/2014, ACÓRDÃO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-029 DIVULG 11-02-2015 PUBLIC 12-02-2015)
Uma vez que se incorpora ao patrimônio jurídico do trabalhador a prestação de trabalho em condições especiais, regida pela legislação em vigor na época do exercício da atividade, é possível a conversão do tempo especial para comum, independente da data da prestação do trabalho ou do requerimento de benefício. A respeito, cabe registrar que, embora o art. 28 da MP nº 1.663-10 tenha revogado o § 5º do artigo 57 da Lei nº 8.213/1991, a lei de conversão (Lei nº 9.711/1998) não manteve o dispositivo, permanecendo a possibilidade de soma do tempo de serviço especial, após a respectiva conversão, ao tempo de atividade comum, para a concessão de qualquer benefício.
A atual redação do artigo 70 do Decreto nº 3.048/1999 estabelece que as regras de conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de atividade comum aplicam-se ao trabalho prestado em qualquer período. Contudo, o fator de conversão do tempo especial em comum a ser utilizado é o previsto na legislação vigente na data da concessão do benefício, e não aquele em vigor quando o serviço foi prestado. A matéria foi decidida em recurso especial repetitivo, firmando-se a seguinte tese no Tema nº 546 do STJ: 'A lei vigente por ocasião da aposentadoria é a aplicável ao direito à conversão entre tempos de serviço especial e comum, independentemente do regime jurídico à época da prestação do serviço'(REsp 1.310.034/PR, Rel. Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, julgado em 24-10-2012, DJe 19-12-2012).
De acordo com o art. 70 do Decreto nº 3.048/1999, com a redação dada pelo Decreto nº 4.827/2003, o fator de conversão a ser observado é de 1,4 para o homem e de 1,2 para a mulher (considerando, em ambos os casos, o exercício de atividade que ensejaria a aposentadoria especial em 25 anos).
Ruído
Como visto, em se tratando do agente nocivo ruído, o reconhecimento da especialidade do labor exige, em qualquer período, a comprovação da efetiva sujeição do segurado a agentes agressivos por meio da apresentação de formulário-padrão, embasado em laudo técnico, ou por meio de perícia técnica. Ou seja, não basta, aqui, mesmo no período anterior a 28/04/1995, o enquadramento por categoria profissional, sendo exigida prova da exposição ao agente nocivo.
Em relação ao agente nocivo ruído, consideram-se os níveis de pressão sonora estabelecidos na legislação em vigor na data da prestação do trabalho, conforme o quadro a seguir:
Período trabalhado | Enquadramento | Limites de tolerância |
até 05/03/1997 | 1. Decreto nº 53.831/1964; 2. Decreto nº 83.080/1979. | 1. Superior a 80 dB; 2. Superior a 90 dB. |
de 06/03/1997 a 06/05/1999 | Decreto nº 2.172/1997. | Superior a 90 dB. |
de 07/05/1999 a 18/11/2003 | Decreto nº 3.048/1999, na redação original. | Superior a 90 dB. |
a partir de 19/11/2003 | Decreto nº 3.048/1999 com alteração introduzida pelo Decreto nº 4.882/2003. | Superior a 85 dB. |
Cabe esclarecer que os Decretos nº 53.831/1964 e 83.080/1979 tiveram vigência concomitante até a edição do Decreto nº 2.172/1997, que revogou de forma expressa o fundamento de validade da legislação então vigente. Dessa forma, até 05/03/1997, é considerada nociva à saúde a atividade sujeita a ruídos superiores a 80 decibéis, conforme previsão mais benéfica do Decreto n° 53.831/64.
O Decreto nº 4.882/2003, que reduziu o limite de tolerância ao agente físico ruído para 85 decibéis, não pode ser aplicado retroativamente. Dessa forma, entre 06 de março de 1997 e 18 de novembro de 2003, o limite de tolerância ao ruído corresponde a 90 decibéis, consoante o código 2.0.1 do Anexo IV dos Decretos n° 2.172/1997 e 3.048/1999. O Superior Tribunal de Justiça examinou a matéria em recurso especial repetitivo e fixou a seguinte tese:
Tema nº 694: O limite de tolerância para configuração da especialidade do tempo de serviço para o agente ruído deve ser de 90 dB no período de 6.3.1997 a 18.11.2003, conforme Anexo IV do Decreto 2.172/1997 e Anexo IV do Decreto 3.048/1999, sendo impossível aplicação retroativa do Decreto 4.882/2003, que reduziu o patamar para 85 dB, sob pena de ofensa ao art. 6º da LINDB (ex-LICC). (REsp 1.398.260/PR, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 14/05/2014, DJe 05/12/2014)
Cumpre perquirir, também, sobre a possibilidade de o uso de equipamento de proteção individual (EPI) eficaz afastar a nocividade provocada pelo ruído, descaracterizando, assim, a especialidade desse tempo de serviço.
Primeiramente, note-se que a utilização de equipamentos de proteção individual só passou a ter relevância, para fins de reconhecimento das atividades exercidas em condições especiais, a partir da MP nº 1.729/98, convertida na Lei nº 9.732/98, que alterou o § 2º do artigo 58 da Lei 8.213/91, determinando que o laudo técnico contenha informação sobre a existência de tecnologia de proteção individual que diminua a intensidade do agente agressivo a limites de tolerância e recomendação sobre a sua adoção pelo estabelecimento respectivo. Trata-se, aliás, de entendimento sedimentado pelo próprio INSS na esfera administrativa (IN nº 45/2010, art. 238, § 6º).
No período posterior à MP nº 1.729/98, embora esteja assentada a relevância do uso do EPI para reconhecimento da especialidade do labor, cumpre observar que, em relação ao agente nocivo ruído, o uso de EPI se revela, de per si, ineficaz para neutralizar os danos causados ao organismo humano. Com efeito, consoante já identificado pela medicina do trabalho, a exposição a níveis elevados de ruído não causa danos apenas à audição, de sorte que protetores auriculares não são capazes de neutralizar os riscos à saúde do trabalhador. Os ruídos ambientais não são absorvidos apenas pelos ouvidos e suas estruturas condutivas, mas também pela estrutura óssea da cabeça, sendo que o protetor auricular reduz apenas a transmissão aérea e não a óssea, daí que a exposição, durante grande parte do tempo de serviço do segurado produz efeitos nocivos a longo prazo, como zumbidos e distúrbios do sono.
Por essa razão, o STF, no julgamento do ARE nº 664335 (tema reconhecido com repercussão geral sob o número 555), assentou a tese segundo a qual, 'na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), não descaracteriza o tempo de serviço especial para a aposentadoria.'
Não destoa desse entendimento a jurisprudência sedimentada por esta Corte Regional, senão vejamos:
PREVIDENCIÁRIO. ATIVIDADE URBANA. ATIVIDADE ESPECIAL. AGENTES NOCIVOS. EQUIPAMENTOS DE PROTEÇÃO INDIVIDUAL. CONCESSÃO DE APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. TUTELA ESPECÍFICA. 1. Comprovado o tempo de serviço urbano, por meio de prova material idônea, devem os períodos urbanos ser averbados previdenciariamente. 2. O registro constante na CTPS goza da presunção de veracidade juris tantum, devendo a prova em contrário ser inequívoca, constituindo, desse modo, prova plena do serviço prestado nos períodos ali anotados. 3. Apresentada a prova necessária a demonstrar o exercício de atividade sujeita a condições especiais, conforme a legislação vigente na data da prestação do trabalho deve ser reconhecido o respectivo tempo de serviço. 4. A exposição habitual e permanente a níveis de ruído acima dos limites de tolerância estabelecidos na legislação pertinente à matéria sempre caracteriza a atividade como especial, independentemente da utilização ou não de EPI ou de menção, em laudo pericial, à neutralização de seus efeitos nocivos. 5. Os equipamentos de proteção individual não são suficientes, por si só, para descaracterizar a especialidade da atividade desempenhada pelo segurado, devendo cada caso ser apreciado em suas particularidades. Possível afastar o enquadramento da atividade especial somente quando comprovada a efetiva utilização de equipamentos de proteção individual que elidam a insalubridade. 6. Se o segurado implementar os requisitos para a obtenção de aposentadoria pelas regras anteriores à Emenda Constitucional n.º 20/98, pelas Regras de Transição e/ou pelas Regras Permanentes, poderá inativar-se pela opção que lhe for mais vantajosa. 7. Determina-se o cumprimento imediato do acórdão naquilo que se refere à obrigação de implementar o benefício, por se tratar de decisão de eficácia mandamental que deverá ser efetivada mediante as atividades de cumprimento da sentença stricto sensu previstas no art. 497 do CPC/15, sem a necessidade de um processo executivo autônomo (sine intervallo). (TRF4, AC 5007203-21.2016.404.7209, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SC, Relator JORGE ANTONIO MAURIQUE, juntado aos autos em 20/09/2017)
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA ESPECIAL. ATIVIDADE ESPECIAL. CATEGORIA PROFISSIONAL. PINTORES DE PISTOLA. AGENTES NOCIVOS. RUÍDO. HIDROCARBONETOS AROMÁTICOS. AGENTES QUÍMICOS - QUANTIDADE DE EXPOSIÇÃO. HABITUALIDADE E PERMANÊNCIA NA EXPOSIÇÃO AOS AGENTES NOCIVOS. PERÍCIA EM DATA POSTERIOR AO LABOR. EPI. FONTE DE CUSTEIO. REQUISITOS IMPLEMENTADOS - DIREITO À CONCESSÃO DE APOSENTADORIA ESPECIAL. TERMO INICIAL. EXIGÊNCIA DE AFASTAMENTO DA ATIVIDADE. ART. 57, §8º, DA LEI N. 8.213/91. INCONSTITUCIONALIDADE.CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA. FASE DE CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. DIFERIMENTO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.CUSTAS. 1. O reconhecimento da especialidade e o enquadramento da atividade exercida sob condições nocivas são disciplinados pela lei em vigor à época em que efetivamente exercidos, passando a integrar, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador. 2. (...) 10. Não havendo provas consistentes de que o uso de EPIs neutralizava os efeitos dos agentes nocivos a que foi exposto o segurado durante o período laboral, deve-se enquadrar a respectiva atividade como especial. Em se tratando de ruído nem mesmo a comprovação de que a utilização de protetores reduzia a intensidade do som a níveis inferiores aos máximos deve afastar o reconhecimento da especialidade da atividade, pois já comprovado que a exposição por períodos prolongados produz danos em decorrência das vibrações transmitidas, que não são eliminadas pelo uso do equipamento de proteção. 11. (...) (TRF4, AC 0015614-47.2015.404.9999, SEXTA TURMA, Relatora TAÍS SCHILLING FERRAZ, D.E. 22/09/2017)
Sob essas premissas, portanto, é que deve ser avaliada a especialidade decorrente da exposição a ruído.
Umidade e frio
A umidade e o frio eram considerados agentes nocivos durante a vigência do Decreto nº 53.831/1964 (códigos 1.1.2 e 1.1.3 do quadro anexo). No entanto, mesmo que os atos normativos infralegais posteriores não prevejam o enquadramento da atividade como especial, se for constatado o efetivo prejuízo à saúde do trabalhador, é possível o reconhecimento da especialidade do labor desempenhado. Conforme o entendimento consolidado pelo STJ em recurso repetitivo, 'à luz da interpretação sistemática, as normas regulamentadoras que estabelecem os casos de agentes e atividades nocivos à saúde do trabalhador são exemplificativas, podendo ser tido como distinto o labor que a técnica médica e a legislação correlata considerarem como prejudiciais ao obreiro' (REsp 1.306.113 - Tema nº 534). Nesse sentido, aliás, já dispunha a Súmula nº 198 do extinto TFR: 'Atendidos os demais requisitos, é devida a aposentadoria especial, se perícia judicial constata que a atividade exercida pelo segurado é perigosa, insalubre ou penosa, mesmo não inscrita em Regulamento.'
A Norma Regulamentadora 15, aprovada pela Portaria nº 3.214/1978, do Ministério do Trabalho, nos Anexos 9 e 10, prevê, respectivamente, a insalubridade das atividades ou operações executadas no interior de câmaras frigoríficas ou em locais que apresentem condições similares, que exponham os trabalhadores ao frio, sem a proteção adequada, e em locais com umidade excessiva, capazes de produzir danos à saúde dos trabalhadores. Dessa forma, é possível o reconhecimento da especialidade em razão da exposição ao frio e à umidade, ainda que o trabalho tenha sido prestado após a vigência dos Decretos nº 2.173/1997 e nº 3.048/1999. A matéria já foi apreciada por este Tribunal:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA ESPECIAL. ATIVIDADE ESPECIAL. AGENTES NOCIVOS. RUÍDO. FRIO. UMIDADE. EPI. APOSENTADORIA ESPECIAL. REQUISITOS IMPLEMENTADOS. CONCESSÃO. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA. 1. O reconhecimento da especialidade e o enquadramento da atividade exercida sob condições nocivas são disciplinados pela lei em vigor à época em que efetivamente exercidos, passando a integrar, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador. 2. Até 28-04-1995 é admissível o reconhecimento da especialidade por categoria profissional ou por sujeição a agentes nocivos, admitindo-se qualquer meio de prova (exceto para ruído e calor); a partir de 29-04-1995 não mais é possível o enquadramento por categoria profissional, sendo necessária a comprovação da exposição do segurado a agentes nocivos por qualquer meio de prova até 05-03-1997 e, a partir de então, através de formulário embasado em laudo técnico, ou por meio de perícia técnica. 3. A exposição aos agentes nocivos frio e umidade excessiva, cuja insalubridade veio atestada por meio de laudo pericial judicial, enseja o reconhecimento da especialidade das atividades, com fundamento na Súmula n.º 198 do extinto Tribunal Federal de Recursos. (...) (TRF4, APELREEX 0019290-03.2015.4.04.9999, SEXTA TURMA, Relatora TAÍS SCHILLING FERRAZ, D.E. 31/07/2018)
PREVIDENCIÁRIO. ATIVIDADE ESPECIAL. FRIO. PERICULOSIDADE. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA. . Comprovada a exposição do segurado a agente nocivo, na forma exigida pela legislação previdenciária aplicável à espécie, possível reconhecer-se a especialidade da atividade laboral por ele exercida. . O reconhecimento da especialidade e o enquadramento da atividade exercida sob condições nocivas são disciplinados pela lei em vigor à época em que efetivamente exercidos, passando a integrar, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador. . Comprovado o exercício de atividade em área de risco (Anexo 2 da NR 16) com a consequente exposição do segurado a agente perigoso - periculosidade decorrente da exposição a substâncias inflamáveis - deve ser reconhecido o respectivo tempo de serviço como especial, dado o risco de explosão desses produtos. . A exposição a frio, com temperaturas inferiores a 12ºC, enseja o reconhecimento do tempo de serviço como especial. A permanência, em relação ao agente físico frio, deve ser considerada em razão da constante entrada e saída do empregado da câmara fria durante a jornada de trabalho e não como a permanência do segurado na câmara frigorífica, não sendo razoável exigir que a atividade seja desempenhada integralmente em temperaturas abaixo de 12ºC. . Correção monetária desde cada vencimento, pelo IPCA-E. Juros de mora conforme o art. 5º da Lei 11.960/2009, que deu nova redação ao art.1º-F da Lei 9.494/1997, sem capitalização. . Determinada a imediata implantação do benefício. (TRF4, AC 5011357-77.2014.4.04.7104, QUINTA TURMA, Relatora LUCIANE MERLIN CLÈVE KRAVETZ, juntado aos autos em 02/08/2018)
Eletricidade
Apesar da ausência de previsão expressa pelos Decretos 2.172/1997 e 3.048/1999, é possível o reconhecimento da especialidade do labor desenvolvido com exposição à tensão elétrica superior a 250 Volts após 5/3/1997, com fundamento na Súmula 198 do extinto Tribunal Federal de Recursos e na Lei 7.369/1985, regulamentada pelo Decreto 93.412/1996 (TRF4, EINF 2007.70.00.023958-3, 3.ª Seção, Relator Luís Alberto D'Azevedo Aurvalle, D.E. 15/12/2010; STJ, EDcl no AgRg no REsp 1119586/RS, Relator Ministro Og Fernandes, DJe 21/11/2011).
Além disso, no que tange à periculosidade, há enquadramento no item '1-a' (atividades ou operações em instalações ou equipamentos elétricos energizados em alta tensão) do Anexo n° 4 (Atividades e Operações Perigosas com Energia Elétrica) da Norma Regulamentadora 16 (Atividades e Operações Perigosas) do Capítulo V, Título II, da Consolidação das Leis do Trabalho, aprovada pela Portaria MTB n° 3.214/1978.
Impende destacar a diferença essencial entre a exposição a certos agentes, como o frio e o calor, que atuam lentamente, e cujas condições negativas sobre o organismo humano geralmente exigem maior de tempo de contato, e a exposição à periculosidade. Neste último caso, deve-se sopesar o risco (maior ou menor) em relação ao tempo (mais curto ou longo) de contato com o referido agente, buscando-se uma solução de equilíbrio que não exija o contato permanente a um agente extremamente perigoso, ou tampouco um contato eventual em relação a um fator cujos riscos se mostrem mais amenos.
Nesses termos, a exposição do trabalhador às tensões elétricas, conforme enunciadas, revelam um fator de risco bem superior à média, porquanto um único momento de desatenção pode implicar em uma fatalidade, o que não é o caso de outros agentes que exigem maior tempo de contato. Nestas condições, exigir do trabalhador um contato permanente com o agente eletricidade seria o mesmo que exigir condições não humanas de trabalho, que demandariam atenção redobrada durante todo o período da jornada de trabalho, e muito provavelmente implicariam o perecimento físico, ou pelo menos na degradação psicológica do segurado.
Uso de EPI e eletricidade
Não há EPI que seja eficaz para elidir o risco elétrico. Nesse sentido:
PREVIDENCIÁRIO. TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL. PPP. ELETRICIDADE. HABITUALIDADE E PERMANÊNCIA. EQUIPAMENTO DE PROTEÇÃO INDIVIDUAL. CONVERSÃO DE ATIVIDADE COMUM EM ESPECIAL. INDEFERIMENTO APOSENTADORIA ESPECIAL. DEFERIMENTO PEDIDO SUCESSIVO DE APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. TUTELA ESPECÍFICA.
1. a 4. (omissis).
5. Tratando-se de hipótese de periculosidade ou de enquadramento por categoria profissional, não se cogita de afastamento da especialidade pelo uso de EPI.
6. a 15 (...).
(APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5004281-23.2014.4.04.7000/PR, Rel. Ézio Teixeira, 19/04/2017).
Permanência na atividade especial após a aposentadoria
O artigo 57, § 8º, da Lei nº 8.213/91, na redação conferida pela Lei nº 9.732/98, aduz que 'aplica-se o disposto no art. 46 ao segurado aposentado nos termos deste artigo que continuar no exercício de atividade ou operação que o sujeite aos agentes nocivos constantes da relação referida no art. 58 desta Lei'. Por seu turno, o mencionado artigo 46 refere que 'o aposentado por invalidez que retornar voluntariamente à atividade terá sua aposentadoria automaticamente cancelada, a partir da data do retorno'.
No julgamento do RE nº 791.961/RS (Tema 709), o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que o trabalhador não tem direito à continuidade do recebimento de aposentadoria especial quando prossegue ou retorna a trabalhar em atividade nociva à saúde, ainda que diferente da que motivou o requerimento de aposentação em menor tempo. A decisão foi tomada na sessão virtual do Plenário em 05/06/2020, fixando-se a seguinte tese representativa da controvérsia:
i) 'É constitucional a vedação de continuidade da percepção de aposentadoria especial se o beneficiário permanece laborando em atividade especial ou a ela retorna, seja essa atividade especial aquela que ensejou a aposentação precoce ou não'.
ii) 'Nas hipóteses em que o segurado solicitar a aposentadoria e continuar a exercer o labor especial, a data de início do benefício será a data de entrada do requerimento, remontando a esse marco, inclusive, os efeitos financeiros. Efetivada, contudo, seja na via administrativa, seja na judicial a implantação do benefício, uma vez verificado o retorno ao labor nocivo ou sua continuidade, cessará o benefício previdenciário em questão'.
Assim, o segurado que retornar voluntariamente ao desempenho de atividade nociva está sujeito ao cancelamento da aposentadoria especial. Todavia, como se observa, foi rejeitada a fixação da data do afastamento da atividade como marco para o início da aposentadoria especial. Logo, nas hipóteses em que o trabalhador solicitar a aposentadoria e continuar a exercer atividade especial, a data de início do benefício será a de entrada do requerimento (DER), inclusive para efeitos de pagamento retroativo.
Caso concreto
A seguir, discriminam-se os períodos de tempo de serviço comum (ou especial) controvertidos:
Período | Ruído (db) | Limite (db) | Agente nocivo com análise qualitativa | Agente nocivo com análise quantitativa | Nível | Limite | EPI eficaz | Reconhecido em sentença |
16/12/1985 a 30/11/1987 | - | 80 | - | - | - | - | não | não |
19/07/1998 a 31/10/2000 | 85,1 | 90 | - | - | - | - | não | não |
01/11/2000 a 18/11/2003 | 91,5 | 90 | - | - | - | - | não | não |
19/11/2003 a 08/01/2008 | 91,5 | 85 | - | - | - | - | não | não |
03/07/2008 a 30/09/2012 | - | 80 | eletricidade | - | - | - | não | sim |
01/10/2012 a 23/05/2016 | - | 80 | eletricidade | - | - | - | não | sim |
Período: 16/12/1985 a 30/11/1987 |
Empresa: Laticínios Ivoti Ltda. |
Função/atividades: lavador de veículos |
Agentes nocivos: Nenhum |
Provas: evento 1, PROCADM4, Página 27 |
Não ficou comprovada exposição a agentes nocivos de forma a caracterizar a especialidade da atividade, motivo pelo qual a sentença deve ser mantida pelos seus próprios fundamentos a seguir transcritos:
Conclusão: não há especialidade, não havendo reparos a serem feitos na sentença.
Período: 19/07/1998 a 31/10/2000 |
Empresa: Gelita do Brasil Ltda. |
Função/atividades: mecânico C |
Agentes nocivos: Ruído |
Provas: evento 28, PPP2 |
Conclusão: não há especialidade, não havendo reparos a serem feitos na sentença.
Período: 01/11/2000 a 18/11/2003 |
Empresa: Gelita do Brasil Ltda. |
Função/atividades: eletromecânico A/B |
Agentes nocivos: Ruído |
Provas: evento 28, PPP2 |
Conclusão: ficou devidamente comprovado nos autos o exercício de atividade especial pela parte autora no período indicado, conforme a legislação aplicável à espécie, em virtude de sua exposição a ruído acima de 90 decibéis.
Período: 19/11/2003 a 08/01/2008 |
Empresa: Gelita do Brasil Ltda. |
Função/atividades: eletromecânico A/B |
Agentes nocivos: Ruído |
Provas: evento 28, PPP2 |
Conclusão: ficou devidamente comprovado nos autos o exercício de atividade especial pela parte autora no período indicado, conforme a legislação aplicável à espécie, em virtude de sua exposição a ruído acima de 85 decibéis.
Período: 03/07/2008 a 30/09/2012 |
Empresa: Madeireira Herval LTDA |
Função/atividades: técnico manutenção elétrica |
Agentes nocivos: eletricidade |
Provas: Evento 1, PROCADM4, Página 89 |
Conclusão: ficou devidamente comprovado nos autos o exercício de atividade especial pela parte autora no período indicado, conforme a legislação aplicável à espécie, em virtude de sua exposição a eletricidade.
Período: 01/10/2012 a 23/05/2016 |
Empresa: Herval Ind Moveis Colchões Espumas LTDA |
Função/atividades: eletricista técnico |
Agentes nocivos: eletricidade |
Provas: Evento 1, PROCADM4, Página 91 |
Conclusão: ficou devidamente comprovado nos autos o exercício de atividade especial pela parte autora no período indicado, conforme a legislação aplicável à espécie, em virtude de sua exposição a eletricidade.
Assim, em relação ao(s) período(s) 16/12/1985 a 30/11/1987 e 19/07/1998 a 31/10/2000, não há indicação de que a parte autora estivesse exposta a qualquer agente nocivo em nível superior ao limite de tolerância, nem a agente nocivo que independe de análise quantitativa. A sentença não reconheceu a especialidade do(s) período(s), não havendo reparos a serem feitos neste ponto.
Em relação ao(s) período(s) 01/11/2000 a 18/11/2003 e 19/11/2003 a 08/01/2008, a parte autora esteve exposta a ruído em nível(is) superior(es) ao(s) limite(s) de tolerância. A sentença não reconheceu a especialidade do(s) período(s), motivo pelo qual deve ser acolhida a apelação do autor para reconhecer a especialidade do(s) período(s).
Em relação ao(s) período(s) 03/07/2008 a 30/09/2012 e 01/10/2012 a 23/05/2016, a parte autora esteve exposta a agentes nocivos que independem de análise quantitativa. A sentença reconheceu a especialidade do(s) período(s), não havendo reparos a serem feitos neste ponto.
Concessão de aposentadoria especial
Para fazer jus à aposentadoria especial, a parte autora deve preencher os requisitos previstos no art. 57 da Lei nº 8.213/91, quais sejam: a carência prevista no art. 142 da referida lei e o tempo de trabalho sujeito a condições prejudiciais à sua saúde ou à sua integridade física durante 15, 20 ou 25 anos, a depender da atividade desempenhada. Cumpre observar que, a partir da Lei nº 9.032/95, não é possível a conversão de tempo comum em especial, de modo que, para a concessão de aposentadoria especial, a atividade deve ser exercida, durante todo o período (15, 20 ou 25 anos), sob condições nocivas.
No caso dos autos, a contagem de tempos de atividade especial segue a tabela abaixo:
Nº | ATIVIDADE ESPECIAL | |||||
Data inicial | Data final | Dias | Anos | Meses | Dias | |
1 | 01/12/1987 | 02/06/1998 | 3832 | 10 | 06 | 02 |
2 | 03/07/2008 | 23/05/2016 | 2876 | 07 | 10 | 21 |
3 | 01/11/2000 | 18/11/2003 | 1113 | 03 | 00 | 18 |
4 | 19/11/2003 | 08/01/2008 | 1510 | 04 | 01 | 20 |
Total | 9331 | 25 | 06 | 26 |
Diante de tais considerações, verifica-se, portanto, que o autor trabalhou em condições especiais, prejudiciais à saúde ou à integridade física por mais de 25 anos, cumprindo, ainda, a carência, de modo que faz jus à concessão de aposentadoria especial desde a DER.
Importa referir, outrossim, que a renda mensal inicial do benefício deve ser calculada sem a incidência do fator previdenciário, ex vi do art. 29, II, da Lei nº 8.213/91.
Correção monetária e juros
Correção monetária
Após o julgamento, pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal, em regime de repercussão geral, do Tema 810 (RE n. 870.947), a que se seguiu, o dos embargos de declaração da mesma decisão, rejeitados e com afirmação de inexistência de modulação de efeitos, deve a atualização monetária obedecer ao Tema 905 do Superior Tribunal de Justiça, que estabelece para as condenações judiciais de natureza previdenciária:
As condenações impostas à Fazenda Pública de natureza previdenciária sujeitam-se à incidência do INPC, para fins de correção monetária, no que se refere ao período posterior à vigência da Lei 11.430/2006, que incluiu o art. 41-A na Lei 8.213/91.
Assim, a correção monetária das parcelas vencidas dos benefícios previdenciários será calculada conforme a variação dos seguintes índices, que se aplicam conforme a pertinente incidência ao período compreendido na condenação:
- IGP-DI de 05/96 a 03/2006 (art. 10 da Lei n.º 9.711/98, combinado com o art. 20, §§5º e 6º, da Lei n.º 8.880/94);
- INPC a partir de 04/2006 (art. 41-A da lei 8.213/91)
Tratando-se, por fim, da apuração de montante correspondente às parcelas vencidas de benefícios assistenciais, deve observar-se a aplicação do IPCA-E.
Juros moratórios
Os juros de mora, de 1% (um por cento) ao mês, serão aplicados a contar da citação (Súmula 204 do STJ), até 29 de junho de 2009. A partir de 30 de junho de 2009, os juros moratórios serão computados de forma equivalente aos aplicáveis à caderneta de poupança, conforme dispõe o art. 5º da Lei nº 11.960/09, que deu nova redação ao art. 1º-F da Lei nº 9.494/97.
Honorários recursais
O atual CPC inovou de forma significativa com relação aos honorários advocatícios, buscando valorizar a atuação profissional dos advogados, especialmente por se tratar de verba de natureza alimentar (§14 do art. 85, CPC).
Ainda, destaca-se que o atual diploma processual estabeleceu critérios objetivos para fixar a verba honorária nas causas em que a Fazenda Pública for parte, conforme se extrai da leitura do §3º, incisos I a V, do art. 85.
Referidos critérios buscam valorizar a advocacia, evitando o arbitramento de honorários em percentual ou valor aviltante que, ao final, poderia acarretar verdadeiro desrespeito à profissão. Ao mesmo tempo, objetiva desestimular os recursos protelatórios pela incidência de majoração da verba em cada instância recursal.
De qualquer maneira, levando em conta o improvimento do recurso do INSS, associado ao trabalho adicional realizado nesta instância no sentido de manter a sentença de procedência, a verba honorária deve ser majorada em favor do patrono da parte vencedora.
Assim sendo, em atenção ao disposto no art. 85, §4º, II, do CPC de 2015, os honorários advocatícios, a serem fixados pelo juízo de origem por ocasião da liquidação da sentença, observadas as Súmulas nº 76 deste Tribunal e nº 111 do Superior Tribunal de Justiça, deverão contemplar o trabalho exercido pelo profissional em grau recursal.
Caso o valor da condenação a ser apurada em liquidação do julgado venha a superar a faixa correspondente ao percentual definido pelo art. 85, §3º do novo CPC, o excedente deverá observar a faixa subsequente e sucessivamente, conforme §5º do referido dispositivo. O percentual definitivo a incidir sobre o eventual excedente, contudo, deverá observar aquele correspondente à majoração ora determinada.
Implantação imediata do benefício
Considerando os termos do art. 497 do CPC, que repete dispositivo constante do art. 461 do antigo CPC, e o fato de que, em princípio, esta decisão não está sujeita a recurso com efeito suspensivo (TRF4, AC 2002.71.00.050349-7, Terceira Seção, Relator para Acórdão Celso Kipper, D.E. 01/10/2007), o julgado deve ser cumprido imediatamente, observando-se o prazo de trinta dias úteis para a implantação do benefício postulado, observado o Tema 709 do STF.
Dispositivo
Em face do que foi dito, voto no sentido de negar provimento à apelação do INSS, dar parcial provimento à apelação da parte autora para reconhecer a especialidade do(s) período(s) de 01/11/2000 a 18/11/2003 e 19/11/2003 a 08/01/2008 e, de ofício, determinar a implantação imediata do benefício, fixar os índices de correção monetária aplicáveis e majorar os honorários advocatícios.
Documento eletrônico assinado por OSNI CARDOSO FILHO, Desembargador Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002134893v3 e do código CRC 78ddbeb1.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): OSNI CARDOSO FILHO
Data e Hora: 5/12/2020, às 11:29:9
Conferência de autenticidade emitida em 16/12/2020 16:03:06.
Apelação Cível Nº 5015364-95.2017.4.04.7108/RS
RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
APELANTE: CLEBER HOCH (AUTOR)
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: OS MESMOS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. APOSENTADORIA. RECONHECIMENTO DE TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL. RUÍDO. LIMITES DE TOLERÂNCIA. EQUIPAMENTO DE PROTEÇÃO INDIVIDUAL. FRIO E UMIDADE. AGENTE NOCIVO ELETRICIDADE. APOSENTADORIA ESPECIAL. PERMANÊNCIA NA ATIVIDADE ESPECIAL.
1. O limite de tolerância para o agente físico ruído é de 90 (noventa) decibéis, no período entre 6 de março de 1997 e 18 de novembro de 2003 (Tema nº 694 do Superior Tribunal de Justiça).
2. A declaração prestada pelo empregador a respeito da eficácia de equipamento de proteção individual não é suficiente para afastar o reconhecimento da especialidade em razão da sujeição ao ruído.
3. Havendo a comprovação do efetivo prejuízo à saúde do trabalhador, é possível o reconhecimento da especialidade com base na exposição ao frio e à umidade, pois as normas regulamentares não encerram todos os agentes nocivos a que pode se sujeitar.
4. O equipamento de proteção individual somente pode ser considerado eficaz, se for adequado para proteger ou neutralizar os efeitos dos agentes nocivos específicos a que se expõe o trabalhador.
5. A atenuação dos efeitos nocivos do frio exige o fornecimento dos equipamentos de proteção individual referidos na Norma Regulamentadora - NR-06.
6. É cabível o reconhecimento da especialidade de atividade profissional sujeita à tensão elétrica superior a 250 volts, mesmo após 05-03-1997, tendo em conta a vigência da Lei nº 7.369/85 e do Decreto n.º 93.412/86 (que a regulamenta), que estabeleceram a periculosidade inerente à exposição à eletricidade. A intermitência, por seu turno, não descaracteriza o risco produzido pela energia elétrica a esta voltagem.
7. Para ter direito à aposentadoria especial, a parte autora deve preencher os requisitos previstos no art. 57 da Lei nº 8.213, quais sejam: a carência prevista no art. 142 da referida lei e o tempo de trabalho sujeito a condições prejudiciais à sua saúde ou à sua integridade física durante 15, 20 ou 25 anos, a depender da atividade desempenhada.
8. O Supremo Tribunal Federal (STF), por maioria, julgou o mérito do RE 791.961, no regime de repercussão geral (Tema 709), em que assentou a seguinte tese: É constitucional a vedação de continuidade da percepção de aposentadoria especial se o beneficiário permanece laborando em atividade especial ou a ela retorna, seja essa atividade especial aquela que ensejou a aposentação precoce ou não. II) Nas hipóteses em que o segurado solicitar a aposentadoria e continuar a exercer o labor especial, a data de início do benefício será a data de entrada do requerimento, remontando a esse marco, inclusive, os efeitos financeiros. Efetivada, contudo, seja na via administrativa, seja na judicial a implantação do benefício, uma vez verificado o retorno ao labor nocivo ou sua continuidade, cessará o benefício previdenciário em questão.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação do INSS, dar parcial provimento à apelação da parte autora para reconhecer a especialidade do(s) período(s) de 01/11/2000 a 18/11/2003 e 19/11/2003 a 08/01/2008 e, de ofício, determinar a implantação imediata do benefício, fixar os índices de correção monetária aplicáveis e majorar os honorários advocatícios, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 19 de novembro de 2020.
Documento eletrônico assinado por OSNI CARDOSO FILHO, Desembargador Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002134894v3 e do código CRC 40aea2fc.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): OSNI CARDOSO FILHO
Data e Hora: 5/12/2020, às 11:29:9
Conferência de autenticidade emitida em 16/12/2020 16:03:06.
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 12/11/2020 A 19/11/2020
Apelação Cível Nº 5015364-95.2017.4.04.7108/RS
RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
PRESIDENTE: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
PROCURADOR(A): THAMEA DANELON VALIENGO
APELANTE: CLEBER HOCH (AUTOR)
ADVOGADO: LUCRECIA BORGES DE OLIVEIRA (OAB RS031230)
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: OS MESMOS
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 12/11/2020, às 00:00, a 19/11/2020, às 14:00, na sequência 187, disponibilizada no DE de 03/11/2020.
Certifico que a 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 5ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS, DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA PARA RECONHECER A ESPECIALIDADE DO(S) PERÍODO(S) DE 01/11/2000 A 18/11/2003 E 19/11/2003 A 08/01/2008 E, DE OFÍCIO, DETERMINAR A IMPLANTAÇÃO IMEDIATA DO BENEFÍCIO, FIXAR OS ÍNDICES DE CORREÇÃO MONETÁRIA APLICÁVEIS E MAJORAR OS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
Votante: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
Votante: Juiz Federal JOSÉ LUIS LUVIZETTO TERRA
Votante: Juíza Federal GISELE LEMKE
LIDICE PEÑA THOMAZ
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 16/12/2020 16:03:06.