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PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. CERCEAMENTO DE DEFESA. DEMONSTRAÇÃO DO DIREITO. TRF4. 5006744-82.2017.4.04.7112...

Data da publicação: 30/11/2020, 23:03:07

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. CERCEAMENTO DE DEFESA. DEMONSTRAÇÃO DO DIREITO. 1. Cerceamento de defesa afastado para a prova de tempo especial, diante do conjunto probatório específico desfavorável para a formação do juízo. 2. Tempo de atividade alegadamente sujeito a atividades nocivas não comprovado de forma suficiente e adequada, que não é possível suprir mediante depoimento de uma só testemunha. (TRF4, AC 5006744-82.2017.4.04.7112, QUINTA TURMA, Relator OSNI CARDOSO FILHO, juntado aos autos em 20/11/2020)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5006744-82.2017.4.04.7112/RS

RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO

APELANTE: JOAO PEDRO DE MELLO DA SILVA (AUTOR)

ADVOGADO: IMILIA DE SOUZA (OAB RS036024)

ADVOGADO: IMILIA DE SOUZA

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

RELATÓRIO

João Pedro De Mello da Silva interpôs recurso de apelação contra sentença, proferida em 21/03/2019, que julgou parcialmente procedente o pedido, nos seguintes termos:

Pelo exposto, julgo PROCEDENTE EM PARTE o pedido, na forma do art. 487, I, do CPC, para:
a) julgar improcedente pedido de conversão de tempo comum em especial;
b) reconhecer a atividade especial de 11/04/85 a 30/03/89, 25/02/91 a 29/08/91, 01/04/97 a 04/09/01 e de 01/04/02 a 10/06/03 - com fator de conversão 1,4;
c) condenar o INSS a implantar o NB 42/178.139.560-5 com RMI de 100% do salário de benefício e aplicação do fator previdenciário, nos moldes da fundamentação, e DIP a partir de 15/07/16. As prestações deverão ser corrigidas monetariamente desde o vencimento de cada parcela com aplicação de juros de mora, nos moldes da fundamentação, por meio de requisição de pagamento;
d) condenar o INSS ao pagamento dos honorários de sucumbência, fixados no percentual mínimo de cada faixa estipulada pelo artigo 85, § 3°, do Novo Código de Processo Civil, dependendo da apuração do montante em eventual cumprimento de sentença, sempre observando o § 5° do artigo 85 do CPC. A base de cálculo será o valor da condenação, limitado ao valor das parcelas vencidas até a sentença (Súmula 111, STJ; Súmula 76, TRF4);
e) condenar a parte autora ao pagamento de honorários advocatícios, fixados no percentual mínimo de cada faixa estipulada pelo artigo 85, § 3°, do Novo Código de Processo Civil, tomando-se por base a diferença entre aposentadoria especial (pedido principal) e a aposentadoria por tempo de contribuição (pedido sucessivo), cuja execução dos valores fica suspensa enquanto perdurar o benefício da justiça gratuita, nos termos e prazos dos art. 98 do CPC.
Em que pese ilíquida a sentença, o valor da condenação claramente é inferior a 1.000 (mil) salários-mínimos. Assim, dispensada a remessa necessária, nos termos do art. 496, § 3º, I, do CPC.
Na hipótese de interposição de recursos voluntários, intime-se a parte contrária para apresentação de contrarrazões, no devido prazo. Após a juntada das referidas peças, remetam-se os autos ao TRF da 4ª Região.
Sentença registrada e publicada por meio eletrônico. Intimem-se.

Em sua apelação, a parte autora requereu, preliminarmente, a anulação da sentença em razão da ocorrência de cerceamento de defesa, uma vez que foi indeferida a oitiva da testemunha indicada para o período 04/09/2007 a 15/07/2016. No mérito, defendeu a concessão de aposentadoria especial, mediante o reconhecimento da especialidade do trabalho prestado também no referido período. Subsidiariamente, pediu a manutenção da aposentadoria por tempo de contribuição reconhecida na sentença.

VOTO

Cerceamento de defesa

No presente caso, ao ajuizar a ação o autor pediu o reconhecimento do período de 04/09/2007 a 15/07/2016, com as seguintes informações:

(...)

Período: 04/09/2007 a 15/07/2016 – segue em atividade

Tempo de Contribuição: 08 anos, 10 meses e 12 dias

EMPRESA: JOÃO PEDRO DE MELLO DA SILVA-ME

Função:Afiador ferramenteiro

Descrição das atividades: Realiza a afiação de ferramentas em esmeril, faz a limpeza do setor e das ferramentas. Utilizava máquina de solda.

Agentes Agressivos: Ruído e agentes químicos (querosene, cádmio, cromo, óleos e graxas de origem mineral).

Documentos Juntados: Requerimento de Empresário, documento da JUCERGSe PPRA.

Visando comprovar as atividades exercidas pelo autor, requer a oitiva de testemunha (cliente da empresa) ao final arrolada, uma vez que o PPRA da empresa acostado ao feito comprova a especialidade do labor.

[...]

e. 6) Pela designação de audiência para a oitiva das testemunhas abaixo, a fim de comprovar definitivamente as atividades e que o autor laborou exposto a agentes agressivos na empresa João Pedro de Mello da Silva-ME, as quais comparecerá(ao) independente de intimação do juízo, porquanto a parte autora se compromete em levá-la(s) à audiência, presumindo-se, caso não compareça(m), a desistência de sua inquirição, conforme § 2º art. 455 do NCPC:

•VALDERI LUIS PADILHA, brasileiro, portador do RG 7037679417 e do CPF nº461.670.210-15. Residente e domiciliado na Rua Três Pinheiros, nº 20, Mato Grande, Canoas/RS.

Embora o autor seja o proprietário/administrador da empresa, juntou apenas um "requerimento de empresário", registrado na Junta Comercial; uma consulta da Junta Comercial na qual aparece como empresário (evento 1, PROCADM10, fls. 40/41) e um LTCAT da empresa (tão somente as páginas 1, 4, 28, 31 e 32), no qual sequer consta a função de afiador ferramenteiro.

Em decisão constante do evento 19 foi indeferida a produção de prova em relação a vários vínculos, inclusive este.

Peticionou o autor, em seguida, postulando apenas a reconsideração e a oitiva da testemunha (no evento 25).

Sobreveio a sentença recorrida, que assim tratou o vínculo:

O autor pretende reconhecimento de tempo especial de 2007 a 2016, período em que foi empresário na João Pedro de Mello da Silva - ME (fl. 61 do PA).

O laudo técnico da empresa da qual é o proprietário (fls. 62-67 do PA) mostra que o soldador estava exposto a ruído abaixo de 80 dB(A) e a agentes químicos, para os quais havia EPI. Na função de operador de disco de corte, a exposição era acima de 85 dB(A). Na função na administração da empresa (emissão de nota fiscal, contato com clientes, realização de pagamentos e recebimentos de contas), havia exposição a ruído abaixo de 80 dB(A).

Por ser dirigente da empresa, o autor necessariamente realizava atividades concernentes à administração dela (em destaque, contato com os clientes), situação em que não havia exposição a agentes nocivos.

Portanto, reputo que não havia exposição agentes nocivos de forma permanente. A partir da Lei 9.032/95, necessária permanência para caracterizar a especialidade.

Em relação à petição do evento 25, mantida a decisão do evento 19 pelos seus próprios fundamentos.

Rejeito a especialidade de 04/09/07 a 15/07/16.

A parte autora, em sua apelação, requer, em preliminar, a anulação da sentença em razão da ocorrência de cerceamento de defesa.

Nos termos do art. 370 do Código de Processo Civil (CPC), caberá ao juiz, de ofício ou a requerimento da parte, determinar as provas necessárias ao julgamento do mérito, indeferindo as diligências inúteis ou meramente protelatórias.

Para a verificação da especialidade das atividades exercidas com exposição a agentes nocivos, leva-se em consideração, em regra, o conteúdo da documentação técnica lavrada pela empresa (formulários, laudos e perfil profissiográfico previdenciário (PPP), por exemplo). Contudo, em caso de dúvida sobre a fidedignidade ou suficiência desta documentação, tem lugar a possibilidade de produção de laudo pericial por ordem judicial.

Nesse sentido, transcreve-se recente precedente da 3ª Seção do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, no sentido da viabilidade da elaboração da prova técnica judicial, não obstante a existência de PPP, inclusive quando guarnecido por laudos lavrados pelo empregadora, acaso a higidez das informações nele(s) contida(s) seja questionada pelo trabalhador. O aresto a seguir reproduzido reflete a síntese da tese resultante da apreciação do IRDR nº 15 desta Corte:

PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. INCIDENTE DE RESOLUÇÃO DE DEMANDAS REPETITIVAS. EPI. NEUTRALIZAÇÃO DOS AGENTES NOCIVOS. PROVA. PPP. PERÍCIA. 1. O fato de serem preenchidos os específicos campos do PPP com a resposta 'S' (sim) não é, por si só, condição suficiente para se reputar que houve uso de EPI eficaz e afastar a aposentadoria especial. 2. Deve ser propiciado ao segurado a possibilidade de discutir o afastamento da especialidade por conta do uso do EPI, como garantia do direito constitucional à participação do contraditório. 3. Quando o LTCAT e o PPP informam não ser eficaz o EPI, não há mais discussão, isso é, há a especialidade do período de atividade. 4. No entanto, quando a situação é inversa, ou seja, a empresa informa no PPP a existência de EPI e sua eficácia, deve se possibilitar que tanto a empresa quanto o segurado, possam questionar - no movimento probatório processual - a prova técnica da eficácia do EPI. 5. O segurado pode realizar o questionamento probatório para afastar a especialidade da eficácia do EPI de diferentes formas: A primeira (e mais difícil via) é a juntada de uma perícia (laudo) particular que demonstre a falta de prova técnica da eficácia do EPI - estudo técnico-científico considerado razoável acerca da existência de dúvida científica sobre a comprovação empírica da proteção material do equipamento de segurança. Outra possibilidade é a juntada de uma prova judicial emprestada, por exemplo, de processo trabalhista onde tal ponto foi questionado. 5. Entende-se que essas duas primeiras vias sejam difíceis para o segurado, pois sobre ele está todo o ônus de apresentar um estudo técnico razoável que aponte a dúvida científica sobre a comprovação empírica da eficácia do EPI. 6. Uma terceira possibilidade será a prova judicial solicitada pelo segurado (após analisar o LTCAT e o PPP apresentados pela empresa ou INSS) e determinada pelo juiz com o objetivo de requisitar elementos probatórios à empresa que comprovem a eficácia do EPI e a efetiva entrega ao segurado. 7. O juízo, se entender necessário, poderá determinar a realização de perícia judicial, a fim de demonstrar a existência de estudo técnico prévio ou contemporâneo encomendado pela empresa ou pelo INSS acerca da inexistência razoável de dúvida científica sobre a eficácia do EPI. Também poderá se socorrer de eventuais perícias existentes nas bases de dados da Justiça Federal e Justiça do Trabalho. 8. Não se pode olvidar que determinada situações fáticas, nos termos do voto, dispensam a realização de perícia, porque presumida a ineficácia dos EPI´s. (TRF4 5054341-77.2016.4.04.0000, TERCEIRA SEÇÃO, Relator para Acórdão JORGE ANTONIO MAURIQUE, juntado aos autos em 11/12/2017).

É necessário, igualmente, avaliar a utilidade da prova que se pretende produzir e a possibilidade material de sua produção. Afinal, a referida prova objetiva conferir segurança ao julgamento, propiciando ao seu destinatário suficientes elementos para avaliação quanto aos argumentos que respaldam a pretensão articulada na petição inicial.

No caso sob exame, não houve cerceamento de defesa, suficiente a oportunidade que teve o recorrente, mediante conjunto probatório específico para demonstrar, ou não, o tempo de atividade sujeito a atividades especiais.

Demais, não há justificativa para a determinação de ofício da prova.

A oitiva de uma testemunha não seria suficiente para demonstrar a especialidade pretendida.

Embora o autor defenda que a testemunha prestaria informações relativas à jornada de trabalho e que o laudo técnico pericial não deixa dúvidas da atividade insalubre desempenhada, os documentos apresentados pelo autor, que é proprietário da empresa, sequer referem a atividade de afiador ferramenteiro.

Tempo de atividade especial

O reconhecimento da especialidade obedece à disciplina legal vigente na época em que a atividade foi exercida, passando a integrar, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador. Desse modo, havendo a prestação laboral sob a vigência de certa legislação, o segurado adquire o direito à contagem do tempo de serviço especial na forma estabelecida, bem como à comprovação das condições de trabalho como então exigido, não se aplicando retroativamente lei nova que venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial. Nesse sentido, a orientação adotada pela Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça (AR 3320/PR, Relatora Ministra Maria Thereza de Assis Moura, DJe 24-09-2008) e pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (EINF 2005.71.00.031824-5/RS, Terceira Seção, Luís Alberto D'Azevedo Aurvalle, D.E. 18-11-2009).

A evolução legislativa da matéria apresenta os seguintes marcos temporais:

a) até 28 de abril de 1995, quando esteve vigente a Lei nº 3.807/1960 (Lei Orgânica da Previdência Social) e suas alterações e, posteriormente, a Lei nº 8.213/1991 (Lei de Benefícios da Previdência Social), em sua redação original (artigos 57 e 58), a especialidade do tempo de serviço decorria do exercício de atividade profissional prevista como especial nos Decretos nº 53.831/1964 e nº 83.080/1979 e/ou na legislação especial. As normas regulamentares classificavam as atividades de duas formas: segundo os grupos profissionais, presumindo-se a sujeição do trabalhador a condições prejudiciais à saúde ou à integridade física; e segundo os agentes nocivos, caso em que deve ser demonstrada a exposição ao agente por qualquer meio de prova. Para os agentes nocivos ruído e calor, é necessário mensurar os seus níveis por meio de perícia técnica, documentada nos autos ou informada em formulário emitido pela empresa, a fim de verificar o grau de nocividade dos agentes envolvidos;

b) entre 29 de abril de 1995 a 05 de março de 1997, período em que estavam vigentes as alterações introduzidas pela Lei nº 9.032/1995 no artigo 57 da LBPS, torna-se necessária a demonstração efetiva da exposição, de forma permanente, não ocasional nem intermitente, a agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, por qualquer meio de prova, considerando-se suficiente, para tanto, a apresentação de formulário-padrão preenchido pela empresa, sem a exigência de embasamento em laudo técnico, ressalvados os agentes nocivos ruído e calor, em relação aos quais é imprescindível a realização de perícia técnica, conforme visto acima. Foi definitivamente extinto o enquadramento por categoria profissional - à exceção das atividades a que se refere a Lei nº 5.527/1968, cujo enquadramento por categoria deve ser feito até 13 de outubro de 1996, data imediatamente anterior à publicação da Medida Provisória nº 1.523/1996, que a revogou expressamente;

c) a partir de 06 de março de 1997, data da entrada em vigor do Decreto nº 2.172/1997, que regulamentou as disposições introduzidas no artigo 58 da LBPS pela Medida Provisória nº 1.523/1996 (convertida na Lei nº 9.528/1997), passou a ser exigida, para fins de reconhecimento de tempo de serviço especial, a comprovação da efetiva sujeição do segurado a agentes agressivos por meio da apresentação de formulário-padrão, embasado em laudo técnico de condições ambientais do trabalho, ou por meio de perícia técnica.

Para que se caracterize a habitualidade e a permanência do tempo de trabalho em condições especiais prejudiciais à saúde ou à integridade física (referidas no artigo 57, §3º, da Lei n° 8.213/91), a exposição ao agente nocivo deve ser ínsita ao desenvolvimento das atividades cometidas ao trabalhador, integrada à sua rotina de trabalho. Exegese diversa levaria à inutilidade da norma protetiva, pois em raras atividades a sujeição direta ao agente nocivo se dá durante toda a jornada de trabalho e, em muitas delas, a exposição em tal intensidade seria absolutamente impossível (EINF n.º 0003929-54.2008.404.7003, TRF 4ª Região, 3ª Seção, Rel. Des. Federal Rogério Favreto, D.E. 24-10-2011; EINF n.º 2007.71.00.046688-7, TRF 4ª Região, 3ª Seção, Rel. Des. Federal Celso Kipper, D.E. 07-11-2011). Em suma, somente se a exposição ao agente nocivo for eventual ou ocasional, está afastada a especialidade do tempo de serviço.

Além disso, conforme o tipo de atividade, a exposição ao agente nocivo, ainda que não diuturna, configura atividade apta à concessão de aposentadoria especial, tendo em vista que a intermitência na exposição não reduz os danos ou riscos inerentes à atividade. Não é razoável que se retire do trabalhador o direito à redução do tempo de serviço para a aposentadoria, deixando-lhe apenas os ônus da atividade perigosa ou insalubre (EINF n° 2005.72.10.000389-1, TRF 4ª Região, 3ª Seção, Rel. Des. Federal João Batista Pinto Silveira, D.E. 18-05-2011; EINF n° 2008.71.99.002246-0, TRF 4ª Região, 3ª Seção, Rel. Des. Federal Luís Alberto D'Azevedo Aurvalle, D.E. 08-01-2010).

A respeito da utilização de equipamento de proteção individual (EPI), a partir de 03/12/1998, data da publicação da MP nº 1.729, convertida na Lei nº 9.732, que modificou a redação dos §§ 1º e 2º do art. 58 da Lei nº 8.213/1991, a legislação previdenciária estabelece que a existência de tecnologia de proteção individual eficaz, que comprovadamente neutralize os agentes nocivos ou diminua a sua intensidade a limites de tolerância, afasta o efetivo prejuízo à saúde ou integridade física do trabalhador, razão pela qual a atividade não pode ser qualificada como especial.

O Supremo Tribunal Federal, em julgado com repercussão geral, firmou entendimento no sentido de que, se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não há direito à aposentadoria especial. Contudo, havendo demonstração de que o uso do EPI, no caso concreto, não é suficiente para afastar a nocividade, deve ser reconhecida a especialidade do trabalho. Em relação ao ruído, o STF considerou que a exposição a níveis superiores aos limites de tolerância causa prejuízos ao organismo humano que vão além dos relacionados à perda das funções auditivas. Assim, a utilização do EPI não garante a eliminação dos efeitos do agente nocivo ruído, pois existem fatores de difícil ou impossível controle que influenciam a sua efetividade. Esta é a redação da tese firmada no Tema nº 555:

I - O direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo a sua saúde, de modo que, se o Equipamento de Proteção Individual (EPI) for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial; II - Na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria. (ARE 664335, Relator(a): Min. LUIZ FUX, Tribunal Pleno, julgado em 04/12/2014, ACÓRDÃO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-029 DIVULG 11-02-2015 PUBLIC 12-02-2015)

Uma vez que se incorpora ao patrimônio jurídico do trabalhador a prestação de trabalho em condições especiais, regida pela legislação em vigor na época do exercício da atividade, é possível a conversão do tempo especial para comum, independente da data da prestação do trabalho ou do requerimento de benefício. A respeito, cabe registrar que, embora o art. 28 da MP nº 1.663-10 tenha revogado o § 5º do artigo 57 da Lei nº 8.213/1991, a lei de conversão (Lei nº 9.711/1998) não manteve o dispositivo, permanecendo a possibilidade de soma do tempo de serviço especial, após a respectiva conversão, ao tempo de atividade comum, para a concessão de qualquer benefício.

A atual redação do artigo 70 do Decreto nº 3.048/1999 estabelece que as regras de conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de atividade comum aplicam-se ao trabalho prestado em qualquer período. Contudo, o fator de conversão do tempo especial em comum a ser utilizado é o previsto na legislação vigente na data da concessão do benefício, e não aquele em vigor quando o serviço foi prestado. A matéria foi decidida em recurso especial repetitivo, firmando-se a seguinte tese no Tema nº 546 do STJ: 'A lei vigente por ocasião da aposentadoria é a aplicável ao direito à conversão entre tempos de serviço especial e comum, independentemente do regime jurídico à época da prestação do serviço'(REsp 1.310.034/PR, Rel. Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, julgado em 24-10-2012, DJe 19-12-2012).

De acordo com o art. 70 do Decreto nº 3.048/1999, com a redação dada pelo Decreto nº 4.827/2003, o fator de conversão a ser observado é de 1,4 para o homem e de 1,2 para a mulher (considerando, em ambos os casos, o exercício de atividade que ensejaria a aposentadoria especial em 25 anos).

No caso concreto:

* de 04/09/2007 a 15/07/2016 - João Pedro de Mello da Silva - ME - administrador/proprietário - contribuinte individual

Reitera-se as informações constantes no item cerceamento de defesa.

Conforme referido naquele tópico, o autor postulou a especialidade afirmando atuar na função de "afiador ferramenteiro". Todavia, é proprietário e administrador da empresa e sequer juntou o LTCAT em sua integralidade.

Chama a atenção, na identificação deste documento, o registro de que a empresa tem um funcionário, mas na página 28 refere a função de "soldador", na página 31, a de "operador de disco de corte" e, na página, 32, a função "administrativo". Não foi trazido, porém, qualquer registro de "afiador ferramenteiro".

A sentença, a meu ver acertadamente, considerou que o autor, por ser dirigente da empresa, necessariamente realizava atividades concernentes à administração dela (em destaque, contato com os clientes), situação em que não havia exposição a agentes nocivos.

Embora a função de administrador não afaste, por si, a caracterização da especialidade, no caso concreto não razoável acreditar que, se encontrando a empresa em atividade e sendo o autor o seu proprietário e administrador, não existissem provas materiais que embasassem a alegação de quase nove anos de exposição a agentes nocivos.

Desta forma, deve ser mantida a sentença.

Implantação imediata do benefício

Considerando os termos do art. 497 do CPC, que repete dispositivo constante do art. 461 do antigo CPC, e o fato de que, em princípio, esta decisão não está sujeita a recurso com efeito suspensivo (TRF4, AC 2002.71.00.050349-7, Terceira Seção, Relator para Acórdão Celso Kipper, D.E. 01/10/2007), o julgado deve ser cumprido imediatamente, observando-se o prazo de trinta dias úteis para a implantação do benefício reconhecido na sentença.

Dispositivo

Em face do que foi dito, voto no sentido de negar provimento à apelação e, de ofício, determinar a implantação imediata do benefício reconhecido na sentença.



Documento eletrônico assinado por OSNI CARDOSO FILHO, Desembargador Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001986277v17 e do código CRC 8271303f.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): OSNI CARDOSO FILHO
Data e Hora: 20/11/2020, às 13:19:17


5006744-82.2017.4.04.7112
40001986277.V17


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Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5006744-82.2017.4.04.7112/RS

RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO

APELANTE: JOAO PEDRO DE MELLO DA SILVA (AUTOR)

ADVOGADO: IMILIA DE SOUZA (OAB RS036024)

ADVOGADO: IMILIA DE SOUZA

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. CERCEAMENTO DE DEFESA. DEMONSTRAÇÃO DO DIREITO.

1. Cerceamento de defesa afastado para a prova de tempo especial, diante do conjunto probatório específico desfavorável para a formação do juízo.

2. Tempo de atividade alegadamente sujeito a atividades nocivas não comprovado de forma suficiente e adequada, que não é possível suprir mediante depoimento de uma só testemunha.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação e, de ofício, determinar a implantação imediata do benefício reconhecido na sentença, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 22 de setembro de 2020.



Documento eletrônico assinado por OSNI CARDOSO FILHO, Desembargador Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001986278v7 e do código CRC f58a7e3d.Informações adicionais da assinatura:
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5006744-82.2017.4.04.7112
40001986278 .V7


Conferência de autenticidade emitida em 30/11/2020 20:03:06.

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 14/09/2020 A 22/09/2020

Apelação Cível Nº 5006744-82.2017.4.04.7112/RS

RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO

PRESIDENTE: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO

PROCURADOR(A): JOÃO HELIOFAR DE JESUS VILLAR

APELANTE: JOAO PEDRO DE MELLO DA SILVA (AUTOR)

ADVOGADO: IMILIA DE SOUZA (OAB RS036024)

ADVOGADO: IMILIA DE SOUZA

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 14/09/2020, às 00:00, a 22/09/2020, às 14:00, na sequência 232, disponibilizada no DE de 02/09/2020.

Certifico que a 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 5ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO E, DE OFÍCIO, DETERMINAR A IMPLANTAÇÃO IMEDIATA DO BENEFÍCIO RECONHECIDO NA SENTENÇA.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO

Votante: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO

Votante: Juiz Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO

Votante: Juíza Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO

LIDICE PEÑA THOMAZ

Secretária



Conferência de autenticidade emitida em 30/11/2020 20:03:06.

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