APELAÇÃO CÍVEL Nº 5001462-40.2015.4.04.7207/SC
RELATOR | : | SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
APELANTE | : | CAULINO ALVES DOS SANTOS |
ADVOGADO | : | MAICON SCHMOELLER FERNANDES |
: | LUCAS NASCIMENTO FERREIRA | |
: | VALMIR MEURER IZIDORIO | |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
EMENTA
PROCESSO CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. COBRANÇA DE VALORES RECEBIDOS INDEVIDAMENTE. POSSIBILIDADE. ART. 115 DA LEI 8.213/91. PRELIMINAR DE NULIDADE DA SENTENÇA POR CERCEAMENTO DEFESA. REJEIÇÃO. PERÍODO DE GOZO DE AUXÍLIO DOENÇA. OCULTAÇÃO MALICIOSA DO RETORNO AO LABORO. PROVA. MÁ-FÉ EVIDENCIADA. SENTENÇA MANTIDA.
1. Não caracteriza cerceamento de defesa o fato de o magistrado não ter deferido o pedido do autor de realização de prova testemunhal, uma vez que o destinatário da prova é o próprio juízo e não as partes litigantes e, assim, cabe ao magistrado decidir pela realização de outras provas ou pela complementação da prova realizada. Tampouco o indeferimento da prova testemunhal implica em nulidade do processo. 2. No caso, a sentença louvou-se não somente no que foi decidido em outra ação movida pelo apelante, mas, evidentemente, nos elementos constantes do presente feito, dos quais foi perquirida a ausência da boa-fé do segurado no recebimento dos valores previdenciários. 3. Na verdade, ainda que se produzissem tais provas, o convencimento do julgador quanto à irregularidade do recebimento já se encontrava firmado nos demais elementos probantes do processo administrativo instaurado pelo INSS, bem como na ação judicial movida para restabelecer o pagamento do benefício e afastar a cobrança dos valores tidos por devido à Autarquia Previdenciária. 4. A boa-fé é um princípio geral de Direito, segundo o qual todos devem se comportar de acordo com um padrão ético de confiança e lealdade. Gera deveres secundários de conduta, que impõe às partes comportamentos necessários. Se o agente sabe que está descumprindo obrigação jurídica (no caso de comunicação ao INSS que retornou ao trabalho), aí está a má-fé. Há, portanto, consciência de que o agente está descumprindo dever advindo de sua posição de beneficiário do sistema previdenciário do qual faz parte. Ou seja, a má-fé está justamente neste descumprimento que ele sabe ser indevido. 5. Em exame dos elementos probantes do feito, perquire-se não tratar o caso de erro administrativo do INSS. Ao contrário, o segurado, evidentemente, agiu maliciosamente no sentido de ocultar da Autarquia Previdenciária - para fins de manter o recebimento do auxílio doença - que laborava em dois estabelecimentos comerciais. Se o apelante estava apto para o trabalho, por certo tinha conhecimento de que não fazia jus ao benefício por incapacidade. 6. Percebe-se, nítido enriquecimento sem causa à custa do combalido sistema previdenciário pátrio. 7. Evidenciada a má-fé do segurado, o INSS pode proceder à cobrança dos valores pagos indevidamente a título de auxílio-doença. 8. Apelo desprovido.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Sexta Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que integram o presente julgado.
Porto Alegre/RS, 26 de outubro de 2016.
Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE
Relatora
| Documento eletrônico assinado por Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8577123v4 e, se solicitado, do código CRC 8D7CB1E7. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Salise Monteiro Sanchotene |
| Data e Hora: | 27/10/2016 09:51 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5001462-40.2015.4.04.7207/SC
RELATOR | : | SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
APELANTE | : | CAULINO ALVES DOS SANTOS |
ADVOGADO | : | MAICON SCHMOELLER FERNANDES |
: | LUCAS NASCIMENTO FERREIRA | |
: | VALMIR MEURER IZIDORIO | |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
RELATÓRIO
Trata-se de apelação interposta por Caulino Alves dos Santos em face de sentença (evento 20 - SENT1 do eProc originário) que julgou procedente o pedido do INSS de verem ressarcidos pelo segurado valores pagos durante a manutenção do benefício de auxílio-doença n. 31/600.704.290-5, no período de 19/02/2013 a 30/09/2013.
Nas razões (evento 27) a defesa de Caulino, em sede preliminar, sustenta ter havido cerceamento de defesa no curso do processo, porquanto a prova foi produzida unilateralmente pelo INSS, e que o magistrado singular entendendo desnecessária qualquer dilação probatória não considerou a produção de prova testemunhal requerida em contestação. Pede, seja declarada a nulidade da sentença, com a consequente reabertura da instrução processual. No mérito, diz que Caulino não pode ser compelido à devolução de qualquer valor recebido a título do benefício previdenciário de auxílio doença, uma vez que não exerceu qualquer atividade laborativa durante o período em que foi agraciado pelo benefício. Assevera que na qualidade de consumidor e de amigo dos proprietários e dos ex-colegas de trabalho, o apelante freqüentou os locais onde laborava, mas não exerceu qualquer atividade no período, por estar recebendo auxílio doença. Por fim, diz ser indiscutível que o benefício não foi recebido indevidamente, mas sim de boa fé, devendo ser reformada na íntegra a decisão de primeiro grau, condenando-se o INSS em ônus de sucumbência.
O INSS apresentou contrarrazões (evento 33). O feito eletrônico alçou a esta Corte, ocasião em que foi autuado e distribuído.
Com vista à Procuradoria Regional da República, sobreveio parecer pelo provimento do recurso do INSS (evento 5 - PARECER1).
É o relatório.
VOTO
Preliminar. Nulidade da sentença.
A defesa de Caulino Alves dos Santos pede seja declarada nulidade da sentença, em razão de não ter havido a indispensável dilação probatória no processo judicial. Refere que na contestação houve solicitação expressa de interrogatório das partes e oitiva de testemunhas, as quais seriam arroladas posteriormente.
No caso, a despeito das razões do patrono de Caulino, não antevejo ter havido cerceamento de defesa, porquanto não foi somente do presente processo que o magistrado singular extraiu os elementos probantes acerca do indevido recebimento do auxílio doença.
Consoante se vê dos fundamentos da sentença ora hostilizada (evento 20 do Eproc originário), após ter instaurado procedimento administrativo, com devida notificação do segurado, facultando-se a ampla defesa e contraditório na esfera administrativa, ao final o INSS providenciou a cessação do pagamento do benefício nº 31/600.704.290-5, bem como tomou as medidas cabíveis para a restituição dos valores recebidos indevidamente.
Em face disso, Caulino ajuizou ação (processo nº 5007483-66.2014.4.04.7207), requerendo o restabelecimento do auxílio doença e que fosse determinado ao INSS que se abstivesse de cobrar a restituição dos valores, os quais, no seu entendimento, foram recebidos entre 12-02-2013 a 30-09-2013 de boa-fé. Seus pedidos foram julgados improcedentes. Caulino opôs recurso inominado, tendo a Turma Recursal de Santa Catarina, à unanimidade, desprovido, mantendo a sentença daquele feito pelos próprios fundamentos. Registre-se que na aludida ação de restabelecimento houve participação efetiva do ora apelante, sendo, portanto, plenamente possível a utilização da conclusão do julgador, quanto à prova lá produzida, no sentido de que houve efetivamente recebimento indevido dos valores alcançados pelo INSS a título de auxílio doença.
O sistema processual pátrio consagra o princípio do livre convencimento motivado, sendo facultado ao magistrado firmar sua convicção a partir de qualquer elemento de prova legalmente produzido, desde que fundamente sua decisão.
É certo que a prova testemunhal juntamente com os demais elementos de provas acostados ao feito mostra-se de extrema relevância como subsídio ao juiz para a formação de sua convicção a respeito do bem da vida a ser decidido na lide. O depoimento pessoal das partes envolvidas também pode ter forte influência no convencimento do julgador.
Com efeito. É cediço ser possível o julgamento do processo quando se entende substancialmente instruído o feito com declaração de existência de provas suficientes para o convencimento do magistrado. (art. 130 do CPC).
No caso, a sentença louvou-se não somente no que foi decidido na ação movida por Caulino, mas, evidentemente, nos elementos constantes do presente feito, dos quais foi comprovada a ausência da boa-fé do segurado no recebimento dos valores previdenciários. Na verdade, ainda que se produzissem tais provas, o convencimento do julgador quanto à irregularidade do recebimento já se encontrava firmado nos demais elementos probantes do processo administrativo instaurado pelo INSS, bem como na ação judicial movida para restabelecer o pagamento do benefício e afastar a cobrança dos valores tidos por devido à Autarquia Previdenciária.
Consoante se comprova do processo nº 5007483-66.2014.4.04.7207 e do processo administrativo (evento 1 - PROCADM4 do feito originário) Caulino exerceu amplamente seu direito de defesa, de modo que não lhe socorre a alegação de nulidade da sentença.
Nesse sentido:
PREVIDENCIÁRIO. RESTABELECIMENTO DE BENEFÍCIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. CERCEAMENTO DE DEFESA. COMPROVAÇÃO DE TEMPO DE SERVIÇO. NECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO DE INÍCIO DE PROVA MATERIAL. PROVA EXCLUSIVAMENTE TESTEMUNHAL. IMPOSSIBILIDADE. CONJUNTO PROBATÓRIO INSUFICIENTE PARA DEMONSTRAR VÍNCULO LABORAL NO PERÍODO ALEGADO. RECONHECIMENTO DE TEMPO ESPECIAL. COMPROVAÇÃO DE EXPOSIÇÃO A AGENTES NOCIVOS. LITIGÂNCIA DE MÁ FÉ. 1. Não caracteriza cerceamento de defesa o fato de o magistrado não ter deferido o pedido do autor de realização de prova testemunhal, uma vez que o destinatário da prova é o próprio juízo e não as partes litigantes e, assim, cabe ao magistrado decidir pela realização de outras provas ou pela complementação da prova realizada. Tampouco o indeferimento da prova testemunhal implica em nulidade do processo, na medida em que, in casu, não houve indicio de prova material. Para o reconhecimento de tempo de serviço, seja na condição de trabalhador urbano ou rural, é exigido o início razoável de prova material, sendo inadmissível a prova exclusivamente testemunhal a qual se equipara a justificação judicial, ressalvada a ocorrência de força maior ou caso fortuito, previstos pelo § 3º do art. 55 da Lei n. 8.213/91. (...) 5. Se os elementos dos autos denunciam que o Autor, agiu com o ardil intuito de obter vantagem indevida (concessão de benefício previdenciário), mediante a afirmação de que desconhece a razão pela qual constou do seu pedido de benefício formulado vínculo de empresa inexistente, atribuindo à responsabilidade ao INSS, o que contraria as provas produzidas nos autos, deve ser mantida sua condenação no pagamento de 1% sobre o valor da causa, além de indenização no importe de 20% sobre o valor da causa, por violação ao art. 14, I, II e III, e art. 17, II e III, todos do Código de Processo Civil. 6. Apelações e remessa oficial a que se nega provimento. Determinada a retificação da autuação para constar a remessa oficial.(TRF1, AC 2009.01.99.071424-5, Primeira Turma, Rel. Juiz Federal Wagner Mota Alves de Souza, publicado no DJF1 em 23-02-2016).
Logo, inexistindo prejuízo à defesa, rejeito a preliminar.
Mérito
Restituição de valores recebidos do INSS indevidamente.
É cediço que a Seguridade Social é um amplo sistema de proteção social inserido na Constituição Federal. Por esta razão, a proteção previdenciária oriunda de um sistema contributivo em que todos devem colaborar merece uma atenção destacada, de modo que os recursos financeiros sejam distribuídos com justiça e igualdade.
Assim, a Previdência Social pode buscar a devolução de valores percebidos indevidamente, em razão de três fundamentos jurídicos: a) poder/dever de auto-tutela da Administração Pública; b) supremacia do interesse público sobre o interesse privado e; c) vedação do enriquecimento sem causa do segurado.
A autorização legal para tal desiderato está estampada nos artigos 115 da Lei 8.213/91 e 154 do Decreto 3.048/99, in verbis:
Lei nº 8.213/91
Art. 115. Podem ser descontados dos benefícios:
I - contribuições devidas pelo segurado à Previdência Social;
II - pagamento de benefício além do devido; (...)
§ 1o Na hipótese do inciso II, o desconto será feito em parcelas, conforme dispuser o regulamento, salvo má-fé. (Incluído pela Lei nº 10.820, de 17.12.2003)
§ 2o Na hipótese dos incisos II e VI, haverá prevalência do desconto do inciso II. (Incluído pela Lei nº 10.820, de 17.12.2003)
Decreto nº 3.048/99
Art. 154. O Instituto Nacional do Seguro Social pode descontar da renda mensal do benefício:
I - contribuições devidas pelo segurado à previdência social;
II - pagamentos de benefícios além do devido, observado o disposto nos §§ 2º ao 5º;
§ 2º A restituição de importância recebida indevidamente por beneficiário da previdência social, nos casos comprovados de dolo, fraude ou má-fé, deverá ser feita de uma só vez, atualizada nos moldes do art. 175, independentemente de outras penalidades legais.
§ 2º A restituição de importância recebida indevidamente por beneficiário da previdência social, nos casos comprovados de dolo, fraude ou má-fé, deverá ser atualizada nos moldes do art. 175, e feita de uma só vez ou mediante acordo de parcelamento na forma do art. 244, independentemente de outras penalidades legais. (Redação dada pelo Decreto nº 5.699, de 2006)
§ 3º Caso o débito seja originário de erro da previdência social, o segurado, usufruindo de benefício regularmente concedido, poderá devolver o valor de forma parcelada, atualizado nos moldes do art. 175, devendo cada parcela corresponder, no máximo, a trinta por cento do valor do benefício em manutenção, e ser descontado em número de meses necessários à liquidação do débito.
§ 4º Se o débito for originário de erro da previdência social e o segurado não usufruir de benefício, o valor deverá ser devolvido, com a correção de que trata o parágrafo anterior, da seguinte forma:
Logo, para a manutenção do equilíbrio financeiro do regime geral, tão caro à sociedade brasileira, o princípio da supremacia do interesse público deve ser invocado pela Autarquia Previdenciária para fazer retornar ao sistema da seguridade social valores que foram indevidamente pagos.
De outro lado, não se desconhece a remansosa jurisprudência pátria consolidada no sentido de que, havendo por parte da Autarquia má aplicação de norma jurídica, interpretação equivocada e erro da administração, não se autoriza, por si só, a devolução de valores recebidos indevidamente a título de benefício previdenciário, já que, em tese, foram recebidos de boa-fé pelos segurados. Afora isso, tais valores são considerados de natureza alimentar, sendo, portanto, irrepetíveis.
Nesse sentido, julgados do STJ:
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 1973. APLICABILIDADE. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. BENEFÍCIO RECEBIDO INDEVIDAMENTE POR ERRO DA ADMINISTRAÇÃO. BOA-FÉ. VERBA DE CARÁTER ALIMENTAR. RESTITUIÇÃO DE VALORES. IMPOSSIBILIDADE. I - Consoante o decidido pelo Plenário desta Corte na sessão realizada em 09.03.2016, o regime recursal será determinado pela data da publicação do provimento jurisdicional impugnado. Assim sendo, in casu, aplica-se o Código de Processo Civil de 1973. II - Por força do princípio da irrepetibilidade dos alimentos, e, sobretudo, em razão da diretriz da boa-fé objetiva do segurado, não cabe a devolução de valores recebidos, a título de benefício previdenciário, por força de interpretação equivocada, má aplicação da lei ou erro da Administração. III - Recurso Especial não provido. (REsp 1550569/SC, Rel. Ministra REGINA HELENA COSTA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 03/05/2016, DJe 18/05/2016)
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. PAGAMENTO INDEVIDO. BOA-FÉ. ERRO DA ADMINISTRAÇÃO. VERBA DE CARÁTER ALIMENTAR. RESTITUIÇÃO DE VALORES. IMPOSSIBILIDADE. 1. Conforme a jurisprudência do STJ é incabível a devolução de valores percebidos por pensionista de boa-fé por força de interpretação errônea, má aplicação da lei ou erro da Administração. 2. É descabido ao caso dos autos o entendimento fixado no Recurso Especial 1.401.560/MT, julgado sob o rito do art. 543-C do CPC, pois não se discute na espécie a restituição de valores recebidos em virtude de antecipação de tutela posteriormente revogada. 3. Recurso Especial não provido. (REsp 1553521/CE, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 03/11/2015, DJe 02/02/2016)
No entanto, quando os benefícios previdenciários são obtidos, comprovadamente, mediante fraude, dolo e má-fé, há previsão legal autorizando a administração a adotar medidas administrativas para fazer cessar a ilicitude, bem como a buscar a via judicial para obter a restituição da verba indevidamente paga.
Nessa direção, os seguintes arestos:
PREVIDENCIÁRIO. PAGAMENTOS FEITOS INDEVIDAMENTE. AUSÊNCIA DE BOA-FÉ. DEVOLUÇÃO. POSSIBILIDADE. A despeito da manifesta natureza alimentar da prestação, evidenciada a má-fé, impõe-se a condenação da requerida na devolução dos valores recebidos indevidamente. (TRF4 5006912-07.2014.404.7204, QUINTA TURMA, Relator ROGERIO FAVRETO, juntado aos autos em 15/06/2016)
PREVIDENCIÁRIO. RESTABELECIMENTO. FRAUDE. COMPROVAÇÃO. NECESSIDADE DE DEVOLUÇÃO DOS VALORES PERCEBIDOS PELO SEGURADO. Nos termos do art. 115 da Lei n° 8.213/91, o INSS é competente para proceder ao desconto dos valores pagos indevidamente ao segurado. Contudo, a jurisprudência do STJ e desta Corte já é consolidada no sentido de que, estando de boa-fé o segurado, as parcelas são irrepetíveis, porque alimentares. No entanto, caso comprovada a má-fé do segurado com provas que superam a dúvida razoável, é devido ao INSS proceder à cobrança dos valores pagos indevidamente. (AC 0004498-56.2007.404.7208-SC, Relator LUÍS ALBERTO D'AZEVEDO AURVALLE, Sexta Turma, D.E. 22/04/2010).
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO CONCEDIDO MEDIANTE DECLARAÇÕES INVERÍDICAS. AUSÊNCIA DE BOA-FÉ DO SEGURADO. REPETIÇÃO DOS VALORES RECEBIDOS. POSSIBILIDADE. SENTENÇA REFORMADA. 1. Após a revisão ou anulação do ato concessório, somente está autorizada a cobrança dos valores pagos ao titular do benefício revisto ou anulado nos caso de comprovada má-fé do beneficiário. (...) 2. A parte autora cumulou indevidamente a percepção de LOAS (DIB em 16.05.2002) e pensão por morte vinculada a RPPS (DIB em 16.04.2006) decorrente do falecimento de seu ex esposo, servidor púbico estadual. 3. No caso dos autos, a demandante colaborou para o erro administrativo do INSS, não havendo que se falar em boa-fé. No processo concessório do LOAS, informou a autora residir sozinha, sem qualquer renda mensal (fl. 15). Tal fato foi corroborado pela declaração de fl. 21 a qual, em que pese não ter sido subscrita pela demandante, o foi por duas testemunhas, e deu conta de que estava separada de fato de ÉRICO GOMES FERRÃO desde 1975. Se de fato estivesse a autora separada, por óbvio não lhe teria sido concedida a pensão decorrente do falecimento do seu ex esposo. 4. Sequer foi aventada a possibilidade de, ao tempo em que concedido o LOAS, estar a parte autora separada de fato, retomando o relacionamento em momento posterior, o que teria perdurado até o evento morte. 5. Sendo a pensão custeada pelo Estado da Bahia, dificultou-se sobremaneira a fiscalização por parte do INSS, o que só veio a ser possível após um acordo de cooperação celebrado com o ente Estadual. 6. Evidenciado o ardil da parte autora que, com o intento de ser beneficiada pelo LOAS, faltou com a verdade perante o INSS, declarando que não convivia com seu esposo, servidor público estadual dotado de renda muito superior a um salário mínimo. 7. Poder-se-ia cogitar, é certo, que a fraude foi perpetrada contra o ESTADO DA BAHIA, quando do requerimento da pensão estatutária, que veio a ser concedida à parte autora. No entanto, das manifestações apresentadas pela parte autora tanto neste processo quanto na instância administrativa, depreende-se que o seu intuito é de continuar recebendo a pensão, donde se dessume que ela, Autora, admite que o benefício previdenciário fora concedido de forma regular, porque ela, de fato, continuava a conviver com o instituidor da pensão, ao contrário do que afirmara quando do requerimento do benefício assistencial. Ausente, portanto, boa-fé da parte autora, reputando-se devida a cobrança dos valores objeto dos autos. 8. Apelação e Remessa Oficial providas. Sentença reformada. Pedido julgado improcedente (...)..(TRF1, AC 004413776.2012.401.3300, 1ª Câmara Regional Previdenciária da Bahia, Rel. Juiz Federal Fábio Rogério França Souza, publicado no e-DJF1 de 29-06-2016)
PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. VALORES RECEBIDOS INDEVIDAMENTE. OCORRÊNCIA DE FRAUDE. RESTITUIÇÃO DA QUANTIA APÓS PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO. POSSIBILIDADE. DESCONTO DOS VALORES. REGULARIDADE. I - (...) V - Entendendo-se pela caracterização da má-fé do requerente no recebimento dos valores, não há como se obstar a conduta da Administração de procurar reaver os valores pagos indevidamente. VI - Apelação improvida. Extinção do processo com resolução do mérito. (TRF5, AC 000066558.2012.405.8200, 2ª Turma, Rel. Des. Federal Ivan Lira de Carvalho, publicado no DJE de 30-06-2016).
No caso concreto, após receber denúncia, foi determinado pela chefia da Agência do INSS em Tubarão/SC que um servidor de seus quadros fosse à Churrascaria Castelinho Ltda. ME e à Pizzaria Markus Boliche Bar Ltda. ME., para verificar a veracidade das informações.
O servidor Ademir Schmoeller, no período de 12 agosto a 10 de setembro de 2013, em visita por mais de uma vez àqueles estabelecimentos ,confirmou que Caulino estava exercendo atividade laboral concomitantemente ao recebimento do auxílio doença. Vejam-se suas declarações (evento 1 - PROCADM4, fls. 13-4):
Estive nesta data, mais uma vez na Churrascaria Castelinho e também no Restaurante Marcos Bar e Boliche, ambos em Braço do Norte-SC, com vistas a conclusão da presente S.P., relativa ao segurado Caulino Alves dos Santos. Desde o recebimento da presente pesquisa ocorrido em 12.08.2013, até a presente data, fui in loco averiguar a veracidade da situação nos locais informados, por volta de aproximadamente oito vezes, e em todas as vezes em que compareci nos locais apontados na presente denúncia em que o segurado supostamente estaria exercendo atividades laborativas encontrei o mesmo exercendo suas atividades normais, no período matutino e vespertino na Churrascaria Castelinho nas proximidades do trevo de acesso a cidade, e no período noturno no Restaurante Marcos Bar e Boliche, no centro da cidade de braço do Norte-SC. Nos locais informados estive conversando com várias pessoas e que pediram para não serem identificadas e as informações obtidas, foi de que, o segurado desde o início da concessão de seu benefício por incapacidade, nunca deixou de exercer as suas funções de forma normal, ou seja, mesmo o segurado recebendo benefício por incapacidade estava exercendo de forma habitual as suas atividades. ... Portanto, de acordo com que foi verificado in loco nos locais visitados, pelas informações obtidas com várias pessoas que trabalham nos locais visitados e também de informações obtidas com clientes dos referidos estabelecimentos comerciais, posso confirmar que procede a denúncia de que o segurado mesmo recebendo benefício por incapacidade, exerce de forma normal suas atividades laborativas nos locais descritos na presente (...)
Com efeito. A boa-fé é um princípio geral de Direito, segundo o qual todos devem se comportar de acordo com um padrão ético de confiança e lealdade. Gera deveres secundários de conduta, que impõe às partes comportamentos necessários. Se o agente sabe que está descumprindo obrigação jurídica (no caso, o de comunicação ao INSS do retorno normal ao trabalho), aí está configurada a má-fé. Há, portanto, consciência de que o indivíduo está descumprindo dever advindo de sua posição de beneficiário do sistema previdenciário, do qual faz parte. Ou seja, a má-fé está justamente neste descumprimento do que o indivíduo sabe ser indevido.
Consoante ensina Wladimir Novaes Martinez em sua obra Cobrança de benefícios indevidos, Ed. LTR, 2012, página 97:
A má-fé lembra a idéia de fraude, deliberada e consciente intenção de causa prejuízo a alguém. Não é correto o autor ter esse procedimento relevado porque julga, por diferentes motivos, fazer jus ao bem maior pretendido. (...) Quem age de má-fé causa dano material ao erário público. Essa ação será comissiva (a mais comum) ou omissiva.
No caso, examinando os elementos probantes do feito, tenho que não se trata de erro administrativo do INSS.
Ao contrário, o segurado, evidentemente, agiu maliciosamente no sentido de ocultar da Autarquia Previdenciária - para fins de manter o recebimento do auxílio doença - que laborava nos dois estabelecimentos comerciais. Se o apelante estava apto para o trabalho, por certo tinha conhecimento de que não fazia jus ao benefício por incapacidade.
A propósito, adoto como razões de decidir os bem lançados fundamentos da sentença proferida pelo MM juiz Federal Alexsander Fernandes Mendes no processo judicial nº 5007483-66.2014.4.04.7207, que inclusive sedimentou o convencimento do magistrado singular da presente ação, in verbis:
(...)
A parte autora, por sua vez, na esfera administrativa, em um primeiro momento, justificou a sua presença nos estabelecimentos no fato de que era amigo e cliente dos proprietários dos estabelecimentos (fls. 18-9 do procadm1 - evento 8). Em um segundo momento, ainda na esfera administrativa (fls. 43-8 do procadm1 - evento 8), e posteriormente na esfera judicial (inic1 - evento 1), argumentou que a responsabilidade pela concessão da prestação previdenciária é do INSS e que este atestou a sua incapacidade laborativa em perícia médica realizada administrativamente. Alegou ainda, pois, que recebeu os valores de boa-fé, motivo pelo qual entende não ser devida a restituição das referidas verbas, inclusive tendo em vista o seu caráter alimentar.
Ocorre, todavia, que, ainda quando concedida prestação por incapacidade a partir da verificação da inaptidão laboral por perícia médica, o retorno voluntário ao trabalho constitui causa de cessação do benefício e, nesses termos, deve ser imediatamente comunicado pelo segurado ao INSS. Tanto assim é que, no art. 60, caput, da Lei nº 8.213/91, preceitua-se que o benefício é devido 'enquanto [o segurado] permanecer incapaz', razão por que, no caso em tela, sequer é necessário cogitar-se de erro administrativo.
De outra parte, da análise dos procedimentos e conclusões exaradas no processo administrativo de suspensão não há como concluir pela boa-fé do postulante, o que poderia isentá-lo da devolução dos valores, mormente quando analisadas as conclusões exaradas no processo administrativo de suspensão, a partir da investigação levada a efeito pela Administração Previdenciária, que têm presunção de veracidade. Registre-se que o autor teve a oportunidade de desconstituí-las, mas não logrou êxito nesse intento.
Desse modo, não visualizo qualquer vício no procedimento adotado pelo INSS para cobrança dos valores recebidos indevidamente pelo autor.
Também não há que se falar em irrepetibilidade de valores de natureza alimentar, pois, no período cobrado pelo INSS, o autor estava trabalhando e, evidentemente, recebeu salário dos empregadores, o que afasta o caráter alimentar do indevido pagamento concomitante de auxílio-doença.
Por sua vez, a alegação de que, de fato, Caulino frequentava os estabelecimentos comerciais em questão, mas somente na condição de consumidor e/ou de amigo dos proprietários, não se mostra hábil para afastar o seu comportamento lesivo ao INSS, isso porque, resulta induvidoso que, concomitantemente ao período de gozo do benefício do auxílio doença, o apelante recebeu salários pelo trabalho desenvolvido.
Percebe-se, portanto, nítido enriquecimento sem causa à custa do combalido sistema previdenciário brasileiro.
Assim, tenho por comprovado que nos períodos de 19-02-2013 a 30-09-2013 (quando foi definitivamente cancelado o benefício) o apelante não preenchia os requisitos necessários à concessão e manutenção do beneficio de auxílio-doença (art. 59 da Lei n° 8.213/91) vez que não se encontrava incapaz para o desempenho de suas atividades habituais.
Conclui-se, por conseguinte, que Caulino laborou enquanto favorecido pela cobertura previdenciária.
Desse modo, impõe-se reconhecer que os pagamentos efetuados em seu favor, a título de auxílio doença (NB 31/600.704.290-5), no aludido período, o foram de maneira indevida, resultando inequívoca a má-fé, razão pela qual se justifica a imposição do dever de restituição dos valores recebidos indevidamente aos cofres da Previdência Social, como requerido pela Autarquia, após o esgotamento da via recursal administrativa.
Nessa quadra, é imperativa a manutenção da sentença monocrática,
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação.
Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE
Relatora
| Documento eletrônico assinado por Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8577122v10 e, se solicitado, do código CRC B29B5C7B. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Salise Monteiro Sanchotene |
| Data e Hora: | 27/10/2016 09:51 |
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 26/10/2016
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5001462-40.2015.4.04.7207/SC
ORIGEM: SC 50014624020154047207
RELATOR | : | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
PRESIDENTE | : | Desembargadora Federal Vânia Hack de Almeida |
PROCURADOR | : | Procuradora Regional da República Adriana Zawada Melo |
APELANTE | : | CAULINO ALVES DOS SANTOS |
ADVOGADO | : | MAICON SCHMOELLER FERNANDES |
: | LUCAS NASCIMENTO FERREIRA | |
: | VALMIR MEURER IZIDORIO | |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 26/10/2016, na seqüência 530, disponibilizada no DE de 10/10/2016, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
: | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA | |
: | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
Gilberto Flores do Nascimento
Diretor de Secretaria
| Documento eletrônico assinado por Gilberto Flores do Nascimento, Diretor de Secretaria, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8679759v1 e, se solicitado, do código CRC FF11F084. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Gilberto Flores do Nascimento |
| Data e Hora: | 27/10/2016 08:33 |
