D.E. Publicado em 26/04/2018 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0018414-48.2015.4.04.9999/RS
RELATORA | : | Juíza Federal ANA PAULA DE BORTOLI |
APELANTE | : | MARIA MARLETH DE MACEDO |
ADVOGADO | : | Renato Hirsch Goelzer |
: | Lucas de Medeiros | |
: | Alysson Martin Gomes | |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | (Os mesmos) |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. COISA JULGADA. IDENTIDADE ENTRE AÇÕES. EXTINÇÃO DO PROCESSO. LITIGÂNCIA DE MÁ FÉ. OCORRÊNCIA. CONDENAÇÃO DO ADVOGADO NOS AUTOS. AJG.
1. Há coisa julgada quando se reproduz idêntica ação anterior, com mesmas partes, causa de pedir e pedido. 2. Situação característica de litigância de má-fé, subsumida nas hipóteses dos artigos 14, 17 e 18 do CPC/1973. 3. Os danos eventualmente causados pela conduta do advogado deverão ser aferidos em ação própria para esta finalidade, sendo vedado ao magistrado, nos próprios autos do processo em que fora praticada a alegada conduta de má-fé ou temerária, condenar o patrono da parte nas penas a que se refere o art. 18, do CPC/1973. 4. O benefício da assistência judiciária gratuita depende do preenchimento dos requisitos da Lei 1.060/50, não constando a má-fé como causa para revogação. A concessão da AJG, por sua vez, não alcança a condenação por litigância de má-fé.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento às apelações e determinar a expedição de ofício à Ordem dos Advogados do Brasil, nos termos da fundamentação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 17 de abril de 2018.
ANA PAULA DE BORTOLI
Relatora
Documento eletrônico assinado por ANA PAULA DE BORTOLI, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9336010v11 e, se solicitado, do código CRC A6807BF9. | |
Informações adicionais da assinatura: | |
Signatário (a): | Ana Paula de Bortoli |
Data e Hora: | 18/04/2018 14:49 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0018414-48.2015.4.04.9999/RS
RELATORA | : | Juíza Federal ANA PAULA DE BORTOLI |
APELANTE | : | MARIA MARLETH DE MACEDO |
ADVOGADO | : | Renato Hirsch Goelzer |
: | Lucas de Medeiros | |
: | Alysson Martin Gomes | |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | (Os mesmos) |
RELATÓRIO
Cuida-se de apelações contra decisão que julgou extinto o processo, sem resolução do mérito, em razão da litispendência, em vista de a autora ter ingressado anteriormente na Justiça Federal com a mesma demanda, objetivando o restabelecimento de auxílio-doença. A demandante teve o benefício de AJG revogado, restando condenada ao pagamento das custas e honorários advocatícios, no valor de R$ 600,00 e, às penas em face da litigância de má fé, juntamente com o procurador que firmou a inicial - Lucas de Medeiros, OAB/RS 92.350 - na razão de 10% sobre o valor da causa.
A parte autora, em suas razões, sustenta, em síntese, (a) da inexistência de litigância de má-fé e (b) da impossibilidade de condenação do advogado. Pugna, ao final, pela manutenção do benefício da Justiça Gratuita.
O INSS, por sua vez, requer a fixação dos honorários advocatícios no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) e da multa, no percentual de 20% sobre o valor da causa.
Com contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
É o relatório.
VOTO
Do novo CPC (Lei 13.105/2015)
Consoante a norma inserta no art. 14 do CPC/2015, "a norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada". Portanto, apesar da nova normatização processual ter aplicação imediata aos processos em curso, os atos processuais já praticados, perfeitos e acabados não podem mais ser atingidos pela mudança ocorrida a posteriori.
Nesse sentido, serão examinados segundo as normas do CPC de 2015 tão somente os recursos e remessas em face de sentenças publicadas a contar do dia 18/03/2016.
Da litispendência
Dispõem os arts. 337, §§ 2º a 3º, e 485, V, §3º, do NCPC, respectivamente:
Art. 337. [...]
§ 2º Uma ação é idêntica à outra quando possui as mesmas partes, a mesma causa de pedir e o mesmo pedido.
§ 3º Há litispendência quando se repete ação que está em curso;
§4º Há coisa julgada quando se repete ação que já foi decidida por decisão transitada em julgado.
Art. 485. O juiz não resolverá o mérito quando:
[...]
V- reconhecer a existência de perempção, de litispendência ou de coisa julgada;
[...]
§ 3º. O juiz conhecerá de ofício da matéria constante dos incisos IV, V, VI e IX, em qualquer tempo e grau de jurisdição, enquanto não ocorrer o trânsito em julgado.
[...]
Analisando os autos (fls. 37-51), verifica-se que a parte autora ajuizou ação em 05/12/2013, sob o nº 50040912220134047121 perante o Juizado Especial Federal Cível de Capão da Canoa/RS, objetivando a concessão de benefício por incapacidade, em razão de moléstia ortopédica. O laudo técnico judicial, juntado em 10/03/2014, concluiu pela capacidade laborativa da autora.
No entanto, a presente demanda, idêntica à anterior (NB nº 6040123676), foi ajuizada perante a 1ª Vara Cível da Comarca de Tramandaí/RS, em 01/04/2014.
Escorreita, portanto, a extinção do feito sem análise do mérito pelo Juízo a quo.
Da litigância de má-fé
Observa-se que na peça inaugural dos autos ora sob exame nesta instância revisora, a parte autora sequer menciona a existência de ação anterior ajuizada perante o JEF e que ainda em trâmite, caracteriza atitude temerária. Assim, a alegação de mero engano, não merece acolhida, uma vez que a nova demanda foi ajuizada, logo após o resultado da perícia judicial.
Diante desse cenário, entendo que, na hipótese, é incontroversa a intenção da parte autora e de seu procurador - com atuação em ambas as ações - de se beneficiarem com a reprodução de ação idêntica a anterior, na qual sobreveio perícia contrária aos seus interesses e em potencial prejuízo à autarquia previdenciária.
Tais elementos demonstram a intenção dolosa da parte. Em decorrência de tal conduta, merece ser a demandante penalizada por litigância de má-fé, nos termos do Código de Processo Civil:
Art. 81. De ofício ou a requerimento, o juiz condenará o litigante de má-fé a pagar multa, que deverá ser superior a um por cento e inferior a dez por cento do valor corrigido da causa, a indenizar a parte contrária pelos prejuízos que esta sofreu e a arcar com os honorários advocatícios e com todas as despesas que efetuou.
§ 3º O valor da indenização será fixado pelo juiz ou, caso não seja possível mensurá-lo, liquidado por arbitramento ou pelo procedimento comum, nos próprios autos.
No que concerne à multa por litigância de má-fé, a regra está insculpida no § 2 do referido artigo:
§ 2º Quando o valor da causa for irrisório ou inestimável, a multa poderá ser fixada em até 10 (dez) vezes o valor do salário-mínimo.
De acordo com a jurisprudência já consolidada neste Tribunal deve ser fixada no percentual de 1% sobre o valor da causa.
Da condenação do procurador
No que pertine à condenação do procurador, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça firmou posicionamento no sentido de que somente as partes (autor, réu ou interveniente) podem praticar o ato que se repute de má-fé:
CIVIL E PROCESSO CIVIL. LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. CONDENAÇÃO SOLIDÁRIA DO ADVOGADO. IMPOSSIBILIDADE.
(...)
4. Responde por litigância de má-fé (arts. 17 e 18) quem causar dano com sua conduta processual. Contudo, nos termos do art. 16, somente as partes, assim entendidas como autor, réu ou interveniente, em sentido amplo, podem praticar o ato. Com efeito, todos que de qualquer forma participam do processo têm o dever de agir com lealdade e boa-fé (art. 14, do CPC). Em caso de má-fé, somente os litigantes estarão sujeitos à multa e indenização a que se refere o art. 18, do CPC.
5. Os danos eventualmente causados pela conduta do advogado deverão ser aferidos em ação própria para esta finalidade, sendo vedado ao magistrado, nos próprios autos do processo em que fora praticada a alegada conduta de má-fé ou temerária, condenar o patrono da parte nas penas a que se refere o art. 18, do Código de Processo Civil.
6. Recurso especial conhecido em parte e, nesta parte, provido.
(REsp 1.173.848/RS, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 20/04/2010, DJe 10/05/2010 - grifou-se)
"PROCESSUAL CIVIL. MULTA POR LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. COMPENSAÇÃO COM HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. IMPOSSIBILIDADE.
1. A pena por litigância de má-fé deve ser aplicada à parte, e não ao seu advogado, nos termos dos arts. 14 e 16 do Código de Processo Civil.
2. O advogado não pode ser penalizado nos autos em que supostamente atua como litigante de má-fé, ainda que incorra em falta profissional. Eventual conduta desleal do advogado deve ser apurada em processo autônomo, nos termos do art. 32 do Estatuto da Advocacia (Lei 8906/94).
3. Precedentes: REsp 1.194.683/MG, Rel. Min. Eliana Calmon, Segunda Turma, julgado em 17.8.2010, DJe 26.8.2010; REsp 1.173.848/RS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 20.4.2010, DJe 10.5.2010.
Recurso especial provido, para afastar a litigância de má-fé".
(REsp 1.247.820/AL, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 28/06/2011, DJe 1º/07/2011 - grifou-se)
RECURSO ESPECIAL. CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. VIOLAÇÃO DO ART. 535. (...) MULTA POR LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. CONDENAÇÃO DO ADVOGADO. IMPOSSIBILIDADE. (...)
5. A jurisprudência desta Corte firmou posicionamento no sentido de que somente as partes (autor, réu ou interveniente) podem praticar o ato que se repute de má-fé, a teor do disposto no artigo 16 do Código de Processo Civil, de modo que os danos eventualmente causados pela conduta do advogado deverão ser apurados em ação própria. (...)
(REsp 1439021/SP, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 18/08/2015, DJe 26/08/2015)
Os danos eventualmente causados pela conduta do advogado deverão ser apurados em ação própria, sendo vedado ao magistrado condenar, nos próprios autos em que supostamente praticada a conduta temerária, o advogado da parte nas penas do artigo 81 do Código de Processo Civil.
Nada obstante, determino a expedição de ofício à OAB/RS, para que tenha ciência do procedimento do advogado que ajuizou o mesmo pedido, com as mesmas partes e mesma causa de pedir em demanda previdenciária na Justiça Estadual em competência delegada, logo após o resultado do laudo pericial atestando a capacidade da parte autora no Juizado Especial Federal.
Da Assistência Judiciária Gratuita
O reconhecimento da má-fé não consta expressamente como causa para revogação da AJG. Nada obstante, o deferimento da benesse não torna a parte imune à condenação em custas e honorários. O efeito prático da AJG, em verdade, é a suspensão da exigibilidade dos créditos enquanto perdurar a condição de hipossuficiência pelo prazo de até 05 anos (art. 12 da Lei 1.060/1950).
Saliento, porém, que a concessão da AJG à demandante não alcança a condenação por litigância de má-fé, pois não se pode admitir que o benefício sirva de incentivo à propositura de lides temerárias.
Assim, condeno a parte autora ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, os quais majoro para R$ 1.000,00 (mil reais), de forma a remunerar condignamente o profissional que atua no feito.
Resta suspensa a exigibilidade das referidas verbas por litigar a autora sob o pálio da AJG.
Conclusão
Reforma-se a sentença para (a) excluir o advogado da parte autora da condenação ao pagamento de multa; (b) majorar os honorários advocatícios para R$ 1.000,00; e (c) condenar a parte autora às penas da litigância de má-fé, no percentual de 1% sobre o valor da causa.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento às apelações e determinar a expedição de ofício à Ordem dos Advogados do Brasil, nos termos da fundamentação.
ANA PAULA DE BORTOLI
Relatora
Documento eletrônico assinado por ANA PAULA DE BORTOLI, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9336009v7 e, se solicitado, do código CRC 97FC4933. | |
Informações adicionais da assinatura: | |
Signatário (a): | Ana Paula de Bortoli |
Data e Hora: | 18/04/2018 14:49 |
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 17/04/2018
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0018414-48.2015.4.04.9999/RS
ORIGEM: RS 00079733420148210073
RELATOR | : | Juíza Federal ANA PAULA DE BORTOLI |
PRESIDENTE | : | Luiz Carlos Canalli |
PROCURADOR | : | Dr. Waldir Alves |
APELANTE | : | MARIA MARLETH DE MACEDO |
ADVOGADO | : | Renato Hirsch Goelzer |
: | Lucas de Medeiros | |
: | Alysson Martin Gomes | |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | (Os mesmos) |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 17/04/2018, na seqüência 638, disponibilizada no DE de 02/04/2018, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PARCIAL PROVIMENTO ÀS APELAÇÕES E DETERMINAR A EXPEDIÇÃO DE OFÍCIO À ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL, NOS TERMOS DA FUNDAMENTAÇÃO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Juíza Federal ANA PAULA DE BORTOLI |
VOTANTE(S) | : | Juíza Federal ANA PAULA DE BORTOLI |
: | Juíza Federal GISELE LEMKE | |
: | Des. Federal LUIZ CARLOS CANALLI |
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
Documento eletrônico assinado por Lídice Peña Thomaz, Secretária de Turma, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9378586v1 e, se solicitado, do código CRC 77000110. | |
Informações adicionais da assinatura: | |
Signatário (a): | Lídice Peña Thomaz |
Data e Hora: | 17/04/2018 18:44 |