| D.E. Publicado em 24/03/2017 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0002853-47.2016.4.04.9999/RS
RELATOR | : | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
REL. ACÓRDÃO | : | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
APELANTE | : | LENI BARON |
ADVOGADO | : | Nilce Lourdes Kappes |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
EMENTA
PROCESSO CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. COISA JULGADA. DOCUMENTOS NOVOS. RELATIVIZAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE.
1. Verificada a existência de coisa julgada, o pedido de reconhecimento de tempo já apreciado em processo precedente deve ser extinto sem resolução de mérito.
2. A procedência ou improcedência da demanda, independentemente dos motivos fáticos ou jurídicos versados na decisão, importa em resolução de mérito, fazendo, assim, coisa julgada material, não se cogitando, na hipótese, de coisa julgada secundum litis e secundum eventum probationis.
3. A juntada de documentos novos não configura circunstância hábil ao ajuizamento de nova ação ordinária, cuja finalidade não se presta à análise de tal pretensão, a qual constitui matéria própria de ação rescisória.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por maioria, negar provimento ao recurso da parte autora, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 08 de março de 2017.
Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
Relatora para Acórdão
| Documento eletrônico assinado por Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA, Relatora para Acórdão, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8891221v2 e, se solicitado, do código CRC DF0B58EA. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Vânia Hack de Almeida |
| Data e Hora: | 17/03/2017 17:42 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0002853-47.2016.4.04.9999/RS
RELATOR | : | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
APELANTE | : | LENI BARON |
ADVOGADO | : | Nilce Lourdes Kappes |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
RELATÓRIO
Cuida-se de apelação interposta da sentença cujo dispositivo tem o seguinte teor:
Por tais razões, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos lançados na presente ação concessória de benefício previdenciário ajuizada por LENI BARON em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, para o fim de:
a) julgar EXTINTA a presente ação, no que se refere ao período de 01.02.1977 a 15.03.1988, sem resolução do mérito, forte no artigo 267, V, do CPC, ante o reconhecimento da coisa julgada material;
b) reconhecer pedido inicial referente ao período de 22.02.1968 a 03.06.1970 e 03/2012 a 01/2013, forte no artigo 269, II do CPC;
c) indeferir o pedido de aposentadoria, por falta dos requisitos legais para tanto.
Diante da sucumbência parcial e recíproca, condeno as partes proporcionalmente (50% para cada) ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, os quais fixo em R$ 1.000,00 (mil reais), atento às circunstâncias do artigo 20, §§ 3º e 4º, do Código de Processo Civil.
Suspendo a exigência em relação à parte autora, porque litiga sob o pálio da AJG.
Isenta a Autarquia do pagamento de custas processuais, nos termos da Lei Estadual nº 13.471/10, que deu nova redação ao artigo 11 da Lei Estadual nº 8.121/85 - Regimento de Custas.
Publique-se. Registre-se. Intimem-se.
Tempestivamente a parte autora recorre, postulando o afastamento da coisa julgada em relação ao período de 01.02.1977 a 15.03.1988, afirmando que, embora já tenha postulado o reconhecimento do exercício de atividade rural em regime de economia familiar nesse intervalo (na ação nº 2009.71.61.002358-1/RS, tramitada na Vara do Juizado Especial Federal Cível de Santa Cruz do Sul/RS), cabe nova apreciação do pedido ante o surgimento de novas provas que não foram acostadas aos autos da demanda anterior.
Sendo assim, postula pelo afastamento de preliminar de mérito e, caso esta Corte não entenda pela suficiência da documentação carreada aos autos para o pronto julgamento, o retorno dos autos ao juízo de origem para que seja proferida nova decisão.
Regularmente processados, subiram os autos a este Tribunal.
É o relatório.
VOTO
Da remessa necessária
Embora em vigor as novas regras quanto às hipóteses de conhecimento da remessa necessária, de que tratam os arts. 496, I, 496, §3.º, I e no art. 496, §4.º e seus incisos do CPC/2015, cuidando-se de sentença publicada/disponibilizada em data anterior a 18/03/2016, devem ser observados os parâmetros até então vigentes, sem que isso implique em não incidência imediata de regra processual, considerando-se que o ato foi praticado em observância aos balizadores da época.
Todavia, não conheço da remessa necessária porque não proferida sentença contra a Autarquia Previdenciária.
Da questão controversa
A questão controversa nos presentes autos cinge-se à verificação da ocorrência de coisa julgada em relação ao período de 01.02.1977 a 15.03.1988. Se superada essa questão, remanesce a controvérsia quanto à possibilidade de reconhecimento do desempenho de atividade rural em regime de economia familiar nesse intervalo, com a conseqüente concessão de Aposentadoria por Tempo de Serviço/Contribuição, a contar da data do requerimento na via administrativa.
Cumpre ainda referir que o desempenho de atividade rural no período de 22.02.1968 a 03.06.1970 bem como o intervalo de 01.03.2012 a 31.01.2013, em que a autora recolheu contribuições na qualidade de contribuinte individual foram reconhecidos pelo INNS no curso da presente ação (contestação às fls. 163 a 167) razão pela qual referido pleito foi extinto com julgamento do mérito, nos termos do art. 269, II, CPC/1973.
Da coisa julgada
O pedido de reconhecimento do labor rural no intervalo de 01.02.1977 a 15.03.1988 foi extinto pelo magistrado singular, sem resolução do mérito, com base no artigo 267, V, CPC/1973 (485, V, CPC/2015), ante o reconhecimento da coisa julgada material.
Com efeito, na ação nº 2009.71.61.002358-1/RS, a parte autora postulou o reconhecimento do labor rurícola no intervalo de 29.10.1974 a 01.06.1988 e obteve parcial provimento do pedido, sendo reconhecido o período de 29.10.1974 a 31.01.1977. O restante do interregno foi indeferido.
A tese concernente à possibilidade de renovação de pleito previdenciário, dada a fundamentalidade do bem da vida para o indivíduo e sua elevada relevância para a sociedade, não é nova, e eu já de há muito tempo a vinha defendendo. Cito como exemplo a AC nº 2003.04.01.045633-9/RS, acórdão publicado no DJU de 27/10/2004, que foi julgada por unanimidade na 6ª Turma, em antiga composição, na qual fui acompanhado pelos Desembargadores Federais Nylson Paim de Abreu e Victor dos Santos Laus no sentido de admitir a coisa julgada secundum eventum probationis:
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. COISA JULGADA. NÃO CONFIGURADA. EXTINÇÃO SEM JULGAMENTO DO MÉRITO. ART. 515, § 3º CPC. QUALIDADE DE SEGURADO. CONCESSÃO DE AUXÍLIO-DOENÇA. INCAPACIDADE LABORATIVA.
1. Não configurada a coisa julgada, quando o único motivo que ensejou a improcedência da ação anteriormente ajuizada foi a falta de provas, caso em que, segundo entendimento já firmado nesta Corte, cabível é a extinção do feito sem julgamento de mérito, pois em direito previdenciário não se admite a preclusão do direito ao benefício. 2. Cuidando-se de processo extinto sem julgamento de mérito, o juízo ad quem pode julgar a lide sem precisar determinar a remessa dos autos à origem para prolação de nova sentença, desde estejam presentes nos autos todas as provas necessárias para prestar a tutela jurisdicional, interpretando-se extensivamente a nova disposição do art. 515, § 3º do CPC. 3. Demonstrada a qualidade de segurada, como trabalhadora rural em regime de economia familiar, através de prova documental corroborada pela testemunhal. 4. Cabe a concessão do benefício de auxílio-doença desde a data do laudo judicial, pois constatada através da perícia e demais provas, que a autora possui moléstia que a incapacita parcialmente para o trabalho.
Precedentes também davam lastro tanto à orientação pela extinção sem mérito como à admissão de coisa julgada sucundum eventum probationis:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE. RURÍCOLA. AUSÊNCIA DE PROVA MATERIAL. APLICAÇÃO DA SÚMULA Nº 149 DO STJ.
1. O início de prova material exigido é aquele feito através de documentos que comprovem o exercício da atividade rural no período de carência, devendo ser, portanto, contemporâneos aos fatos, e indicar, ainda que de forma indireta, a função exercida pelo trabalhador.
2. O princípio de prova material é pré-condição para a própria admissibilidade da lide. Trata-se de documento essencial, que deve instruir a petição inicial, pena de indeferimento (art. 283 c.c 295, VI, do CPC). Conseqüentemente, sem ele, o processo deve ser extinto sem julgamento do mérito (art. 267, I, do CPC). E assim deve ser, porque o direito previdenciário não admite a preclusão do direito ao benefício, por falta de provas: sempre será possível, renovadas estas, sua concessão. Portanto, não cabe, na esfera judicial, solução diversa, certo que o Direito Processual deve ser enfocado, sempre, como meio para a realização do direito material.
(AC. proc. nº 2001.04.01.075054-3. Relator Antônio Albino Ramos de Oliveira. 5ª Turma. TRF 4ª Região. Decisão unânime. publicada no DJU em 18-09-02)
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. BÓIA-FRIA. COISA JULGADA. RELATIVIZAÇÃO.
"O direito previdenciário não admite preclusão do direito ao benefício, por falta de provas: sempre será possível, renovadas estas, sua concessão." (AC nº 2001.04.01.075054-3, rel. Des. Federal Albino Ramos de Oliveira). Com base nesse entendimento, a 5ª Turma vem entendendo que, nos casos em que o segurado não prova as alegações, deve o feito ser extinto sem julgamento de mérito. Tem-se admitido a propositura de nova demanda ainda que uma outra, anteriormente proposta, tenha sido julgada improcedente, adotando-se, desse modo, em tema de Direito Previdenciário, a coisa julgada secundum eventum probationis.
(AC. proc. nº 2001.70.01.002343-0. Relator Juiz Paulo Afonso Brum Vaz. 5ª Turma. TRF 4ª Região. Decisão unânime publicada no DJU em 21-05-03,p. 781)
Não desconheço também recente julgado do STJ (REsp nº 1.352.721-SP) que acolheu a tese de que, na ausência de prova material, em caso concreto de concessão de aposentadoria por idade a rurícola, o feito deveria ser extinto sem julgamento de mérito.
Em relação aos segurados rurícolas, mais especificamente os bóias-frias, chegou-se a admitir prova exclusivamente testemunhal para comprovação de tempo de serviço. No caso examinado pela Corte Superior, não se juntou qualquer prova material no processo (ao menos para o período de carência segundo consta do voto) tendo a prova se limitado a depoimentos testemunhais. Note-se que, na ocasião, a partir de manifestação do próprio STJ, já se havia consolidado o entendimento de que a proibição de prova exclusivamente testemunhal também deveria ser estendida aos rurícolas.
O voto vencido do Ministro Mauro Campbell Marques aponta no sentido de que foram produzidas provas, o que conduziria a um pronunciamento de mérito, mas admitiu o ajuizamento de nova demanda mediante superveniente prova de caráter inovador.
Já o Min. Og Fernandes acompanhou o Relator pela extinção sem mérito, acrescentando, porém, o fundamento de que diante de prova nova (mesmo que anterior ao ajuizamento da própria ação) seria possível ajuizamento de nova demanda caso a extinção se desse sem mérito. Quando fala em prova nova, parece incorrer em imprecisão, pois teríamos de entender que foi produzida outra prova, alguma prova material no processo anterior e o Relator, em sua conclusão, refere a "ausência de conteúdo probatório válido a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo sua extinção sem o julgamento de mérito, de forma a possibilitar que o segurado ajuíze nova ação".
Por sua vez o Min. Raul Aragão acompanhou o Relator, sob o fundamento de que seria exigível algum tipo de prova material além da prova testemunhal, por expressa disposição do § 3º do art. 55 da Lei de Benefícios, que impede o reconhecimento de tempo de serviço com apoio em prova exclusivamente testemunhal. Afastou o emprego do art. 269 do CPC, pois a extinção com apoio neste comando legal impediria o ajuizamento de nova ação.
Nesses casos, de ausência de documento essencial para o ajuizamento da demanda, a indicar a extinção do feito sem julgamento de mérito, não há inovação alguma. Todavia, o Relator, no início de seu voto, não chegou a fazer esta distinção, argumentando que a questão posta dizia respeito tanto à falta como à insuficiência de prova: "Cinge-se a questão posta na presente demanda em examinar se a insuficiência ou falta de provas ocasiona a improcedência do pedido, por se tratar de julgamento de mérito, ou a extinção do processo sem análise do mérito".
Argumenta o Relator que o Direito Previdenciário se vale da processualística civil, entretanto, dada as peculiaridades das demandas previdenciárias, haveria justificativa para a flexibilização da rígida metodologia civilista, a fim de que as normas processuais não venham a obstar a concretude do direito fundamental à prestação previdenciária a que faz jus o segurado. Deve-se priorizar o princípio da busca pela verdade real, diante do interesse social que envolveria esta espécie de demandas.
Conclui em seu item "13" que "a ausência de conteúdo probatório válido a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem o julgamento do mérito, de forma a possibilitar que o segurado ajuíze nova ação, nos termos do art. 268 do CPC, caso obtenha prova material hábil a demonstrar o exercício do labor rural pelo período de carência necessário para a concessão da aposentadoria".
Embora alegue flexibilização da legislação civilista, não vi, a rigor, naquele caso concreto, qualquer flexibilização, na medida em que se está diante de hipótese de absoluta ausência de documentos (embora apresente prova testemunhal) indispensáveis à propositura da ação, verificando-se a hipótese clássica prevista no art. 267,VI, do CPC/1973 (art. 485, VI, do CPC/2015) para qualquer ramo do direito civil.
Todavia, percebe-se da fundamentação do Recurso Especial um nítido intento de, em algumas hipóteses, em que se verifique a possibilidade de alcançar a verdade real, que este intento seja priorizado. Isso fica assente quando traz como fundamento as lições do Magistrado José Antônio Savaris:"A coisa julgada não deve significar uma técnica formidável se de ocultar a fome e a insegurança social para debaixo do tapete da forma processual, em nome da segurança jurídica(...) Não há insegurança em se discutir novamente uma questão previdenciária à luz de novas provas, como inexiste segurança na possibilidade de se rever uma sentença criminal em benefício do réu(...)seria minimamente adequada a sentença que impõe ao indivíduo a privação perpétua de cobertura previdenciária a que, na realidade, faz jus?".
Considerando ainda o argumento do item "4" do voto no sentido de deixar assente a dificuldade na obtenção de prova documental, uma vez que, normalmente, se referem a fatos ocorridos em tempo remoto, tenho, para os rurícolas, extinto o feito sem julgamento do mérito, pois, justamente para esta parcela dos segurados se verifica grande dificuldade de obtenção de prova documental, tanto é assim que por muito tempo também se flexibilizou a comprovação de tempo rural (bóias-fria), admitindo-se prova exclusivamente testemunhal.
Também não avancei na generalização, dado que o recurso especial (1) tratou de caso concreto de rurícola, (2) e de hipótese de ausência de documento indispensável à propositura da ação.
Todavia, dos fundamentos do REsp. não é possível ignorar que se desenvolveu o raciocínio de que a segurança jurídica deve ceder diante da possibilidade de se conceder o que de direito é devido ao segurado. Neste caso, não se estaria, por óbvio, a tratar de sentenças de extinção sem mérito por ausência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo.
Faço estas considerações para justificar a orientação de que não seria demais sustentar que ali também se cogitou, embora não para o caso em concreto, de coisa julgada secundum eventum probationis.
Assim, tenho entendido, porém reiteradamente vencido quanto à tese, passei a me alinhar às mais recentes decisões da 3ª Seção, a exemplo dos EI 5000037-44.2011.404.7004, julgado à unanimidade, com ressalva de entendimento do Juiz José Antonio Savaris, que entendia tratar-se de coisa julgada secundum eventum probationis.
Mais recentemente na Rescisória nº 0000529792014040000/RS, deixei consignado nas notas taquigráficas minha posição no sentido da extinção sem julgamento de mérito, porque muitas vezes pela via da rescisória se procurava, admitindo como documentos novos, a almejada verdade real.
Fato é que pelos precedentes das Cortes Superiores, embora façam referência a tese da coisa julgada secundum eventum probationis, não é seguro, ao menos por ora, alterarmos a posição da 3ª Seção a qual acabei por me alinhar, embora no item "11" da ementa do REsp 1.352.721-SP pareça haver uma tendência a que se promova esta nova leitura da regra processual em se tratando de demandas previdenciárias indistintamente.
No caso concreto, contudo, há uma particularidade, a existência de vasto rol de documentos comprobatórios da atividade rural, carreados aos presentes autos, os quais possivelmente assegurariam um pronunciamento favorável caso a segurada tivesse tido acesso aos mesmos quando da propositura da demanda anterior.
Sendo assim, embora, por ora, não me comprometa com a tese para promover incondicionalmente a alteração da orientação da 3ª Seção, porquanto prematura, apesar de com ela comungar, para manter um mínimo de estabilidade nas decisões e, excepcionalmente, dadas as particularidades do caso concreto que, em tese, admitiriam a rescisão do julgado.
Ante o exposto, afasto o reconhecimento da coisa julgada.
Da causa madura
Considerando-se a superveniência do CPC/2015, que, diga-se, veio no mesmo sentido já trilhado pelo diploma anterior, pós alteração efetuada pela Lei nº 10.352/2001, tem-se por desnecessária a remessa dos autos à instância inferior para ser apreciada a questão de fundo, haja vista que, na hipótese vertente, o feito está pronto para julgamento.
Assim dispõe o § 3º do art. 1.013 do CPC/2015:
Art.1.013. A apelação devolverá ao tribunal o conhecimento da matéria impugnada.
(...)
§3º Se o processo estiver em condições de imediato julgamento, o tribunal deve decidir desde logo o mérito quando:
I- reformar sentença fundada no art. 485;
(...)
No caso, o feito foi adequadamente instruído e está em condições de julgamento, sendo possível a esta Corte avançar e, desde logo, decidir o mérito da causa.
Vencida essa questão, passa-se à análise do mérito.
Da comprovação do tempo de atividade rural
Tratando-se de rurícola, cumpre ao julgador valorar os fatos e circunstâncias evidenciados com ênfase no artigo 5.º da Lei de introdução às normas do direito brasileiro - LIDB, e levar em conta a realidade social em que inserido o trabalhador rural, na qual predomina a informalidade na demonstração dos fatos. Vale lembrar que não se mostra razoável exigir que os documentos carreados ao processo sigam sempre a forma prescrita em lei, por isso devem ser considerados válidos quando de outra forma atingir a finalidade precípua de comprovar o exercício da atividade rural, consoante disposto no art. 244 do CPC.
O tempo de serviço rural deve ser demonstrado mediante a apresentação de início de prova material contemporânea ao período a ser comprovado, complementada por prova testemunhal idônea, não sendo esta admitida, exclusivamente, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, a teor do art. 55, § 3.º, da Lei n.º 8.213/1991, Súmula n.º 149 do STJ e REsp n.º 1.321.493/PR, Rel. Ministro Herman Benjamin, 1.ª Seção, julgado em 10-10-2012, DJe 19-12-2012 (recurso representativo da controvérsia). Cabe salientar que embora o art. 106 da Lei de Benefícios relacione os documentos aptos a essa comprovação, tal rol não é exaustivo. Outrossim, não há impedimento a que sejam considerados os documentos emitidos em período próximo ao controverso, desde que indiquem a continuidade da atividade rural.
Não se exige, por outro lado, prova documental plena da atividade rural em relação a todos os anos integrantes do período requerido, mas início de prova material (como notas fiscais, talonário de produtor, comprovantes de pagamento do ITR ou prova de titularidade de imóvel rural, certidões de casamento, de nascimento, de óbito, certificado de dispensa de serviço militar, etc.) que, juntamente com a prova oral, possibilite um juízo de valor seguro acerca dos fatos que se pretende comprovar.
Os documentos apresentados em nome de terceiros, sobretudo quando dos pais ou cônjuge, consubstanciam início de prova material do labor rural, de acordo com a Súmula n.° 73 desta Corte, haja vista que o trabalho com base em uma única unidade produtiva tem como regra a documentação emitida em nome de uma única pessoa.
Tal orientação, agora sumulada, decorre da própria interpretação possibilitada pelo art. 11 da Lei de Benefícios, que define o regime de economia familiar como aquele em que os membros da família exercem "em condições de mútua dependência e colaboração", sendo certo, repita-se, que os atos negociais da entidade respectiva, via de regra, serão formalizados não de forma individual, mas em nome do pater familiae, que é quem representa o grupo familiar perante terceiros, função esta exercida, normalmente, pelo genitor ou cônjuge masculino (AgRg no AREsp 363462, STJ, 1.ª T, Rel. Min. Sérgio Kukina, DJe de 04/02/2014; AgRg no REsp 1226929/SC, STJ, 5.ª T, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, DJe de 14/11/2012).
Assim, a qualificação de lavrador ou agricultor em atos do registro civil tem sido considerada, também, como início de prova material, se contemporânea aos fatos, podendo estender-se ao cônjuge, se caracterizado o regime de economia familiar (AgRg no AREsp 517671/PR, 2.ª T, Rel. Min. Assussete Magalhães, DJe de 21/08/2014 e AgRg no AREsp 241687/CE, STJ, 6.ª T, Rel. Min. Benedito Gonçalves, DJe de 11/03/2013).
Nos casos de trabalhadores informais, especialmente em labor rural de boia-fria, a dificuldade de obtenção de documentos permite maior abrangência na admissão do requisito legal de início de prova material, valendo como tal documentos não contemporâneos ou mesmo em nome terceiros (integrantes do grupo familiar, proprietários de terras, arrendatários).
O Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp n.º 1.321.493-PR, recebido pela Corte como recurso representativo da controvérsia, traçou as seguintes diretrizes a respeito do boia-fria:
RECURSO ESPECIAL. MATÉRIA REPETITIVA. ART. 543-C DO CPC E RESOLUÇÃO STJ 8/2008. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. SEGURADO ESPECIAL. TRABALHO RURAL. INFORMALIDADE. BOIAS-FRIAS. PROVA EXCLUSIVAMENTE TESTEMUNHAL. ART. 55, § 3º, DA LEI 8.213/1991. SÚMULA 149/STJ. IMPOSSIBILIDADE. PROVA MATERIAL QUE NÃO ABRANGE TODO O PERÍODO PRETENDIDO. IDÔNEA E ROBUSTA PROVA TESTEMUNHAL. EXTENSÃO DA EFICÁCIA PROBATÓRIA. NÃO VIOLAÇÃO DA PRECITADA SÚMULA.
1. Trata-se de Recurso Especial do INSS com o escopo de combater o abrandamento da exigência de produção de prova material, adotado pelo acórdão recorrido, para os denominados trabalhadores rurais boias-frias.
2. A solução integral da controvérsia, com fundamento suficiente, não caracteriza ofensa ao art. 535 do CPC.
3. Aplica-se a Súmula 149/STJ ("A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeitos da obtenção de benefício previdenciário") aos trabalhadores rurais denominados "boias-frias", sendo imprescindível a apresentação de início de prova material.
4. Por outro lado, considerando a inerente dificuldade probatória da condição de trabalhador campesino, o STJ sedimentou o entendimento de que a apresentação de prova material somente sobre parte do lapso temporal pretendido não implica violação da Súmula 149/STJ, cuja aplicação é mitigada se a reduzida prova material for complementada por idônea e robusta prova testemunhal.
5. No caso concreto, o Tribunal a quo, não obstante tenha pressuposto o afastamento da Súmula 149/STJ para os "boias-frias", apontou diminuta prova material e assentou a produção de robusta prova testemunhal para configurar a recorrida como segurada especial, o que está em consonância com os parâmetros aqui fixados.
6. (...) (grifo nosso)
No tocante à possibilidade do cômputo do tempo rural na qualidade de segurado especial a partir dos 12 anos de idade, a Terceira Seção desta Corte ao apreciar os Embargos Infringentes em AC n.º 2001.04.01.025230-0/RS, Rel. Juiz Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, na sessão de 12/03/2003, firmou entendimento no sentido da possibilidade do cômputo do tempo de serviço laborado em regime de economia familiar a partir dessa idade, na esteira de iterativa jurisprudência do egrégio Superior Tribunal de Justiça (AgRg no REsp 1043663/SP, 6.ª T, Rel. Min. Alderita Ramos de Oliveira, DJe de 01/07/2013 e AgRg no REsp 1192886/SP, 6.ª T, Rel. Min. Og Fernandes, DJe de 26/09/2012).
(Da dispensa) do recolhimento de contribuições
Sobre a matéria, dispõe a Lei n.º 8.213/91, ipsis literis:
Art. 55, §2.º - O tempo de serviço do segurado trabalhador rural, anterior à data de início de vigência desta Lei, será computado independentemente do recolhimento das contribuições a ele correspondentes, exceto para efeito de carência, conforme dispuser o Regulamento.
Já o art. 96, que regula os critérios dentro dos quais a contagem recíproca é admitida, consigna em seu inciso IV:
Art. 96. O tempo de contribuição ou de serviço de que trata esta Seção será contado de acordo com a legislação pertinente, observadas as normas seguintes:
(...) IV- O tempo de serviço anterior ou posterior à obrigatoriedade de filiação à Previdência Social só será contado mediante indenização da contribuição correspondente ao período respectivo, com acréscimo de juros moratórios de 0,5% ao mês, capitalizados anualmente, e multa de 10%". (redação dada pela MP nº 2.022-17, de 23/05/2000, atual MP nº 2.187-13, de 24/08/2001)
O correto alcance e aplicação dos dispositivos referidos foi objeto de julgamento nos Tribunais Superiores, onde restou consignado (1) que o tempo de serviço rural anterior à vigência da Lei n.º 8.213/91 pode ser computado para a aposentadoria por tempo de serviço/contribuição, sem recolhimento de contribuições, por expressa ressalva do § 2.º do art. 55, acima transcrito, salvo para carência (STJ, AgRg nos EDcl no REsp 1465931/RS, Rel. Min. Herman Benjamin, DJe de 09/12/2014; AR 3902/RS, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, DJe de 07/05/2013), e (2) que não cabe indenização das exações correspondentes ao interregno de trabalho rural (constante do inciso IV do art. 96, também transcrito) nos períodos nos quais o trabalhador rural estava desobrigado de contribuir ao Regime Geral de Previdência Social, justificando-se a imposição da indenização apenas em relação à contagem recíproca de tempo de serviço público (AgRg no REsp 1413730/SC, Rel. Ministro Humberto Martins, 2.ª Turma, DJe de 09/12/2013; REsp 1266143/SP, Rel. Jorge Mussi, 5.ª Turma, DJe de 09/10/2014).
No que tange ao termo inicial de eventual indenização, tratando-se o tributo para custeio do sistema de benefícios da Previdência Social como integrante da espécie contribuição social, a sua incidência deve observar o ditame do art. 195, §6.º, da Constituição Federal. Dessarte, as exações em comento, a princípio só poderiam ser exigidas após noventa dias da data da publicação da lei que as instituiu, de sorte que, tendo a normativa de regência sido publicada em 25 de julho de 1991, a data de início da cobrança das contribuições previdenciárias seria dia 22 de outubro daquele ano, à míngua da correspondente fonte de custeio de tempo de serviço rural em regime de economia familiar, posicionamento, aliás, já assentado no art. 184, inc. V, do Decreto n.º 2.172/97 e no art. 127, inc. V, do Decreto n.º 3.048/1999, o qual expressamente refere que o tempo de contribuição do segurado trabalhador rural anterior à competência de novembro de 1991 será computado. Assim, possível a extensão daquela data até 31/10/1991.
Concluindo, observamos as seguintes possibilidades: (1) o tempo de trabalho rural anterior a 31/10/1991 pode ser aproveitado para fins de aposentadoria dentro do RGPS independentemente do recolhimento de contribuições previdenciárias (exceto para os fins de carência); (2) o mesmo período pode ser aproveitado para aposentação em regime diverso do RGPS, mediante indenização (art. 96, IV, da Lei 8.213/91); (3) o aproveitamento de período posterior a 31/10/1991 sempre implica indenização.
Por fim, ressalte-se que o tempo de serviço rural sem o recolhimento das contribuições, em se tratando de regime de economia familiar, aproveita tanto ao arrimo de família como aos demais dependentes do grupo familiar que com ele laboram (STJ - REsp 506.959/RS, Rel. Min. Laurita Vaz, j. em 07/10/2003 e REsp n.º 603.202, Rel. Min. Jorge Scartezzini, decisão de 06/05/2004).
Do caso concreto
Visando à demonstração do exercício da atividade rural, a parte autora juntou aos autos os seguintes documentos:
- certidão emitida pelo INCRA informando o cadastramento de um imóvel de área de 12,3 hectares em nome do sogro da autora, relativamente ao período de 1966 a 1992 (fl. 64);
- certidões dos nascimentos dos irmãos da autora, ocorridos em 1967 e 1970, em que seu pai consta qualificado como agricultor (fls. 134 e 135);
- ficha de inscrição do pai da autora no Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Venâncio Aires/RS, datada de 1970 (fl. 41);
- declaração emitida pelo Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Venâncio Aires/RS informando que o pai da autora foi trabalhador rural em regime de economia familiar no período de 1970 a 1991 (fl. 40);
- declaração emitida pelo Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Venâncio Aires/RS informando que a autora foi trabalhadora rural em regime de economia familiar nos períodos de 1970 a 1976 e 1979 a 1989 (fls. 21 a 24);
- recibos de pagamento, pelo pai da autora, de mensalidade ao Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Venâncio Aires/RS, datados de 1970 e 1975 (fls. 42 e 43);
- ficha de inscrição do esposo da autora no Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Venâncio Aires/RS, datada de 1974 (fl. 44);
- recibos de pagamento, pelo esposo da autora, de mensalidade ao Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Venâncio Aires/RS, datados de 1974, 1975, 1976, 1977, 1978, 1979, 1980, 1981, 1982, 1983, 1984, 1985, 1986, 1987 e 1988 (fls. 49 a 60);
- folhas de cadastro de trabalhador rural produtor em nome do esposo da autora, datadas de 1975 e 1976, em que a mesma aparece como dependente (fls. 45 a 48);
- inscrição do esposo da autora como produtor rural, datada de 1977, contendo informações acerca da propriedade rural de três hectares de área, localizada na Linha Arlindo em Venâncio Aires/RS (fl. 38);
- certidão emitida pela 19ª Coordenadoria Regional da Administração Tributária da Secretaria da Fazenda do Estado do Rio Grande do Sul de que o esposo da autora encontrava-se inscrito no cadastro geral de contribuintes de tributos estaduais como produtor rural, tendo início de atividades em 1977 e baixa em 1996 (fl. 61);
- termo de partilha dos bens do sogro da autora, em que ela e seu esposo são qualificados como agricultores, datado de 1978 (fls. 25 a 36);
- declaração emitida pela Associação dos Fumicultores do Brasil (AFUBRA) informando que o esposo da autora inscreveu-se no seguro mútuo da associação em relação às safras de 1979 a 1989 (fl. 63);
- certidão de nascimento de filha da autora, ocorrido em 1982, em que seu esposo consta qualificado como agricultor (fl. 37);
- comunicado de ocorrência de perdas dirigido ao Programa de Garantia da Atividade Agropecuária (PROAGRO), em nome do esposo da autora, datado de 1982 (fl. 62);
- extrato do sistema do INSS relativo ao benefício concedido à mãe da autora em 1991, constando o ramo da atividade como rural (fl. 83);
- CTPS da autora, emitida em 21/04/1987, com anotação do primeiro vínculo urbano apenas em 16/03/1988.
Na audiência de instrução e julgamento (CD anexo à fl. 323) foram ouvidas duas testemunhas, as quais confirmaram o exercício de atividade rurícola pela autora durante todo o período pretendido. Com efeito, a senhora Alice Bick afirmou ser vizinha da autora desde que ambas eram pequenas, quando sua família veio morar na Linha Arlindo, em Venâncio Aires. Afirmou que todos os membros do grupo familiar da autora trabalhavam na roça, vivendo exclusivamente dessa atividade, plantando fumo e demais gêneros para consumo. Informou que a autora casou-se com o filho do vizinho, cuja família também era de agricultores, passando a desempenhar a agricultura no grupo familiar do esposo. A senhora Dercila Schuler informou que a autora foi agricultora até aproximadamente 1989, quando foi morar na cidade. Assegurou que até essa época a autora trabalhou na roça, primeiramente nas terras do pai e, após o casamento, com o esposo, na lavoura de fumo do sogro.
Ressalta-se que o fato de o cônjuge da autora ter-se cadastrado junto à Autarquia Previdenciária como contribuinte individual a partir de 1977 não serve para descaracterizar automaticamente sua condição de segurado especial. No caso, a certidão de fl. 61 informa que o esposo da autora, no mesmo ano de 1977, cadastrou-se perante a administração tributária estadual na qualidade de trabalhador rural.
Desse modo, a partir dos documentos acostados aos autos, os quais constituem início de prova material, corroborados pelo depoimento testemunhal, foi devidamente comprovado o trabalho agrícola desenvolvido pela parte autora, de 01.02.1977 (o período rural de 29.10.1974 a 31.01.1977 já foi reconhecido) a 15.03.1988 (data anterior ao início de suas atividades urbanas, CTPS de fl. 19), totalizando 11 anos, 1 mês e 15 dias.
Dirimida a questão acerca da comprovação do tempo de serviço controvertido, cabe a análise do direito à aposentadoria pretendida.
Em razão da promulgação da Emenda Constitucional n.º 20/98, em 16/12/1998, houve alteração das regras inicialmente consagradas pela Lei n.º 8.213/91. Assim, a Aposentadoria por Tempo de Serviço foi extinta, sendo instituídas novas regras para o alcance da agora chamada Aposentadoria por Tempo de Contribuição.
Sinale-se, entretanto, que a referida Emenda, em seu art. 3.º, ressalvou o direito adquirido dos segurados que até a data de sua publicação haviam preenchidos os requisitos legais para a concessão de benefício previdenciário, bem como introduziu a Regra de Transição (art. 9.º), a qual assegura a concessão de Aposentadoria por Tempo de Contribuição proporcional ou integral ao segurado filiado ao RGPS até a data de publicação dessa emenda.
Assim, se o segurado se filiou à Previdência Social antes da vigência da EC n.º 20/98 e conta tempo de serviço posterior àquela data, poderá trazer ao caso concreto a incidência de três hipóteses:
1) das Regras Antigas, com limitação do tempo de serviço e carência em 16/12/1998, para verificar o preenchimento das condições legais para a Aposentadoria por Tempo de Serviço, seja proporcional ou integral, cujo salário de benefício deverá ser calculado nos termos da redação original do art. 29 da Lei n. 8.213/91: exige-se o implemento da carência e do tempo de serviço mínimo de 25 anos para a segurada e 30 anos para o segurado, que corresponderá a 70% do salário de benefício, acrescido de 6% (seis por cento) para cada ano de trabalho que superar aquela soma, até o máximo de 100%, que dará ensejo à inativação integral (conforme previsto nos arts. 142, 52 e 53, I e II, todos da Lei n.º 8213/91);
2) das Regras Permanentes (EC n.º 20/98), sem qualquer restrição temporal pela legislação previdenciária, apenas com limitação na DER. A Aposentadoria por Tempo de Contribuição é devida ao segurado que, cumprindo a carência exigida, prevista no art. 142 da Lei 8213/91, completar 35 anos de contribuição, se homem, e 30 anos de contribuição, se mulher e por fim,
3) das Regras de Transição - Aposentadoria por Tempo de Contribuição proporcional ou integral, com o cômputo do tempo trabalhado até 28/11/1999, dia anterior à edição da lei do fator previdenciário (Lei n.º 9876/99), cujo salário de benefício deverá ser calculado nos termos da redação original do art. 29 da Lei n.º 8.213/91. Para a inativação proporcional é preciso o implemento da carência (art. 142 da Lei n.º 8213/91) e do tempo de contribuição mínimo de 25 anos, se mulher e 30 anos, se homem e, respectivamente, a idade mínima de 48 anos e 53 anos e, se for o caso, do pedágio de 20% para a aposentadoria integral ou 40% para a proporcional que, em 16/12/1998, faltava para atingir aquele mínimo necessário à outorga da inativação (art. 9.º, § 1.º, I, "a" e "b", da EC n.º 20/98), que corresponderá a 70% do salário de benefício, acrescido de 5% (cinco por cento) para cada ano de trabalho que superar aquela soma, até o máximo de 100%, que corresponderá à inativação integral (inciso II da norma legal antes citada). Ressalte-se, porém, que não se aplica a exigência da idade e do pedágio para a aposentadoria integral, porquanto mais gravosa ao segurado, entendimento, inclusive, do próprio INSS (Instrução Normativa INSS/DC n.º 57/2001), mantido nos regramentos subsequentes.
Importante lembrar que independentemente do tempo encontrado impõe-se a realização das simulações possíveis, uma vez que os salários de contribuição poderão variar nos períodos apurados e não necessariamente de um tempo de serviço mais reduzido advirá uma RMI menor.
Da carência
A carência exigida no caso de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição é de 180 contribuições. No entanto, para os segurados inscritos na Previdência Social Urbana até 24/07/1991, bem como para os trabalhadores e empregadores rurais cobertos pela Previdência Social Rural, a carência para as aposentadorias por idade, por tempo de serviço e especial obedecerá à tabela de acordo com o ano em que o segurado implementou as condições necessárias à obtenção do benefício (art. 142 da LB).
Da concessão do benefício
No caso, somando-se o tempo de labor rural judicialmente admitido, 11 anos, 1 mês e 15 dias, o tempo reconhecido pelo INSS no curso da presente ação, 3 anos, 2 meses e 13 dias, e o tempo de serviço já reconhecido na via administrativa, 22 anos, 6 meses e 3 dias, (documento de fl. 127), a parte autora possui, até a DER, 29/02/2012, 36 anos, 10 meses e 1 dia, fazendo jus à Aposentadoria por Tempo de Contribuição, a contar da data do requerimento administrativo, uma vez que o requisito da carência (art. 142 da LB) também foi cumprido.
Registre-se que a influência de variáveis, como valor dos salários de contribuição, período básico de cálculo a ser considerado, coeficiente de cálculo utilizado, diferença de acréscimo de coeficiente e incidência ou não de fator previdenciário, conforme seja considerado o tempo apurado até 16/12/1998, até 28/11/1999 ou até a data do requerimento, não permite identificar de plano qual a alternativa mais benéfica à parte autora. De qualquer sorte, está claro o seu direito à aposentadoria, devendo, por ocasião da implementação, ser observada a renda mais vantajosa.
Convém salientar que o próprio INSS ao processar pedidos de aposentadoria faz simulações, quando for o caso, considerando as hipóteses já referidas, concedendo o benefício mais benéfico. Se a própria Administração tem essa conduta, não tem sentido que em juízo se proceda de maneira diversa. Assim, como o que pretende o segurado é a concessão da aposentadoria, se prestando a DER apenas para definir a data a partir da qual o benefício é devido, em tais casos simplesmente deve ser reconhecido o direito ao benefício, relegando-se a definição da RMI para momento posterior.
Com o intuito de evitar possíveis discussões acerca da natureza jurídica do provimento jurisdicional deve ser esclarecido que não há falar em acórdão condicional, pois o comando é único: determinar que o INSS conceda o benefício com o cálculo que for mais vantajoso ao segurado.
Tutela Específica
Considerando os termos do art. 497 do CPC/2015, que repete dispositivo constante do art. 461 do Código de Processo Civil/1973, e o fato de que, em princípio, a presente decisão não está sujeita a recurso com efeito suspensivo (Questão de Ordem na AC nº 2002.71.00.050349-7/RS - Rel. p/ acórdão Desemb. Federal Celso Kipper, julgado em 09/08/2007 - 3.ª Seção), o presente julgado deverá ser cumprido de imediato quanto à implantação do benefício postulado, no prazo de 45 dias.
Na hipótese de a parte autora já se encontrar em gozo de benefício previdenciário, deve o INSS implantar o benefício deferido judicialmente apenas se o valor de sua renda mensal atual for superior ao daquele.
Faculta-se à parte beneficiária manifestar eventual desinteresse quanto ao cumprimento desta determinação.
Juros moratórios e correção monetária
A questão da atualização monetária das quantias a que é condenada a Fazenda Pública, dado o caráter acessório de que se reveste, não deve ser impeditiva da regular marcha do processo no caminho da conclusão da fase de conhecimento.
Firmado em sentença, em apelação ou remessa oficial o cabimento dos juros e da correção monetária por eventual condenação imposta ao ente público e seus termos iniciais, a forma como serão apurados os percentuais correspondentes, sempre que se revelar fator impeditivo ao eventual trânsito em julgado da decisão condenatória, pode ser diferida para a fase de cumprimento, observando-se a norma legal e sua interpretação então em vigor. Isso porque é na fase de cumprimento do título judicial que deverá ser apresentado, e eventualmente questionado, o real valor a ser pago a título de condenação, em total observância à legislação de regência.
O recente art. 491 do NCPC, ao prever, como regra geral, que os consectários já sejam definidos na fase de conhecimento, deve ter sua interpretação adequada às diversas situações concretas que reclamarão sua aplicação. Não por outra razão seu inciso I traz exceção à regra do caput, afastando a necessidade de predefinição quando não for possível determinar, de modo definitivo, o montante devido. A norma vem com o objetivo de favorecer a celeridade e a economia processuais, nunca para frear o processo.
E no caso, o enfrentamento da questão pertinente ao índice de correção monetária, a partir da vigência da Lei 11.960/09, nos débitos da Fazenda Pública, embora de caráter acessório, tem criado graves óbices à razoável duração do processo, especialmente se considerado que pende de julgamento no STF a definição, em regime de repercussão geral, quanto à constitucionalidade da utilização do índice da poupança na fase que antecede a expedição do precatório (RE 870.947, Tema 810).
Tratando-se de débito, cujos consectários são totalmente regulados por lei, inclusive quanto ao termo inicial de incidência, nada obsta a que sejam definidos na fase de cumprimento do julgado, em que, a propósito, poderão as partes, se assim desejarem, mais facilmente conciliar acerca do montante devido, de modo a finalizar definitivamente o processo.
Sobre esta possibilidade, já existe julgado da Terceira Seção do STJ, em que assentado que "diante a declaração de inconstitucionalidade parcial do artigo 5.º da Lei n. 11.960/09 (ADI 4357/DF), cuja modulação dos efeitos ainda não foi concluída pelo Supremo Tribunal Federal, e por transbordar o objeto do mandado de segurança a fixação de parâmetros para o pagamento do valor constante da portaria de anistia, por não se tratar de ação de cobrança, as teses referentes aos juros de mora e à correção monetária devem ser diferidas para a fase de execução. 4. Embargos de declaração rejeitados". (EDcl no MS 14.741/DF, Rel. Ministro JORGE MUSSI, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 08/10/2014, DJe 15/10/2014).
Na mesma linha vêm decidindo as duas turmas de Direito Administrativo desta Corte (2ª Seção), à unanimidade, (Ad exemplum: os processos 5005406-14.2014.404.7101 3ª Turma, julgado em 01-06-2016 e 5052050-61.2013.404.7000, 4ª Turma, julgado em 25/05/2016)
Portanto, em face da incerteza quanto ao índice de atualização monetária, e considerando que a discussão envolve apenas questão acessória no contexto da lide, à luz do que preconizam os art. 4º, 6º e 8º do novo Código de Processo Civil, mostra-se adequado e racional diferir-se para a fase de execução a decisão acerca dos critérios de correção, não prevalecendo os índices eventualmente fixados na fase de conhecimento, ocasião em que, provavelmente, a questão já terá sido dirimida pelo tribunal superior, o que conduzirá à observância, pelos julgadores, ao fim e ao cabo, da solução uniformizadora.
Os juros de mora, incidentes desde a citação, como acessórios que são, também deverão ter sua incidência garantida na fase de cumprimento de sentença, observadas as disposições legais vigentes conforme os períodos pelos quais perdurar a mora da Fazenda Pública.
Evita-se, assim, que o presente feito fique paralisado, submetido a infindáveis recursos, sobrestamentos, juízos de retratação, e até ações rescisórias, com comprometimento da efetividade da prestação jurisdicional, apenas para solução de questão acessória.
Diante disso, difere-se para a fase de execução a forma de cálculo dos juros e correção monetária, restando prejudicado, no ponto, o recurso e/ou remessa necessária.
Da Verba Honorária
Os honorários advocatícios devem ser fixados em 10% sobre o valor da condenação, excluídas as parcelas vincendas, observando-se a Súmula 76 desta Corte: "Os honorários advocatícios, nas ações previdenciárias, devem incidir somente sobre as parcelas vencidas até a data da sentença de procedência ou do acórdão que reforme a sentença de improcedência".
Das Custas Processuais
O INSS é isento do pagamento das custas no Foro Federal (art. 4.º, I, da Lei n.º 9.289/96) e na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul, devendo, contudo, pagar eventuais despesas processuais, como as relacionadas a correio, publicação de editais e condução de oficiais de justiça (artigo 11 da Lei Estadual n.º 8.121/85, com a redação da Lei Estadual nº 13.471/2010, já considerada a inconstitucionalidade formal reconhecida na ADI n.º 70038755864 julgada pelo Órgão Especial do TJ/RS), isenções estas que não se aplicam quando demandado na Justiça Estadual do Paraná (Súmula 20 do TRF4), devendo ser ressalvado, ainda, que no Estado de Santa Catarina (art. 33, p. único, da Lei Complementar estadual 156/97), a autarquia responde pela metade do valor.
Conclusão
Em relação aos pedidos de reconhecimento do período rural de 22.02.1968 a 03.06.1970 bem como do período como contribuinte individual de 01.03.2012 a 31.01.2013, reconhecidos pelo INSS no curso da presente ação, o pleito foi extinto com julgamento do mérito pelo magistrado singular, nos termos do art. 269, II, CPC/1973.
Ao recurso da parte autora deve ser dado provimento, afastando-se o reconhecimento da coisa julgada e reconhecendo-se o desempenho de atividade rural em regime de economia familiar no período de 01.02.1977 a 15.03.1988, com o que a mesma faz jus à concessão do benefício de Aposentadoria por Tempo de Contribuição, a contar da data do requerimento na via administrativa.
Em relação à forma de cálculo dos consectários legais, difere-se, de ofício, a questão para a fase de execução.
Frente ao exposto, voto por dar provimento ao recurso da parte autora, determinar a implantação do benefício e diferir, de ofício, para a fase de execução, a forma de cálculo dos consectários legais.
Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
Relator
| Documento eletrônico assinado por Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8654737v6 e, se solicitado, do código CRC BFA13B63. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | João Batista Pinto Silveira |
| Data e Hora: | 16/12/2016 11:16 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0002853-47.2016.4.04.9999/RS
RELATOR | : | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
APELANTE | : | LENI BARON |
ADVOGADO | : | Nilce Lourdes Kappes |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
VOTO COMPLEMENTAR
Tendo em conta as respeitáveis considerações contidas no Voto Divergente apresentado pela eminente desembargadora federal Vania Hack de Almeida - no sentido da existência de coisa julgada em relação ao pedido de reconhecimento do labor rural de 29/10/1974 a 01/06/1988, bem como no sentido da impossibilidade do afastamento dessa preliminar em virtude de o indeferimento anterior ter-se dado não pela ausência de prova material da atividade, mas sim devido à existência, no grupo familiar, de fonte de renda oriunda de atividade urbana -, não obstante compreenda o intuito das razões da divergência, peço vênia para manter o voto já proclamado.
Com efeito, o pleito de reconhecimento do labor rural no período supracitado já foi deduzido e indeferido em anterior ação judicial, fato que, em primeira análise, ensejaria o reconhecimento da coisa julgada. Todavia, atento ao caráter social dos direitos de que se cuida em ações de natureza previdenciária, tão bem destacado no Voto Divergente, adotei solução pro misero, delimitando o alcance da coisa julgada por seu suporte probatório, de modo a não prejudicar o segurado que, por não dispor de documentos probantes do direito alegado, deveria ter logrado, não o indeferimento de seu pedido, mas sim sua extinção sem análise do mérito.
Entendeu a eminente desembargadora federal Vania Hack de Almeida que o indeferimento anterior deu-se não em decorrência da falta de documentação comprobatória do labor rural - o que ensejaria a possibilidade de afastamento da coisa julgada, na linha do entendimento pacificado no STJ -, mas sim em virtude da constatação de que a renda do grupo familiar era complementada por labor urbano do cônjuge da autora, incompatível com a atividade rural em regime de economia familiar.
Com efeito, fora levantada pelo julgador pretérito não propriamente a questão da existência de renda incompatível no grupo familiar da autora, mas apenas o fato de o seu cônjuge ter-se inscrito como contribuinte individual a partir de 1977. De qualquer forma, com a vênia da divergência, tenho que esse não foi o motivo determinante do indeferimento, mas tão somente o marco temporal adotado para efetuar o corte entre o período reconhecido e o indeferido.
Perquirir os fundamentos que motivaram uma decisão judicial pode, não raras vezes, guardar algum grau de subjetividade. Assim é no caso presente. Permito-me transcrever o seguinte excerto do decisum (fl. 91):
Nesse contexto, considerando o conjunto probatório apresentado, analisado à luz do princípio da continuidade, há que se concluir que a autora laborou na atividade rurícola, no período de 29.10.1974 (12 anos) a 31.01.1977 (data imediatamente anterior à inscrição do marido da autora como contribuinte individual) (...)
O conjunto probatório apresentado nessa demanda fora extremamente limitado. Foram acostados apenas um documento em nome do pai da autora (datado de 1970) e quatro documentos em nome de seu esposo, sendo que, dentre esses, apenas dois eram posteriores a 1977, mas, por se tratarem de declarações particulares (declarações da AFUBRA - Associação dos Fumicultores do Brasil), foram tomados pelo juízo como prova testemunhal (fl. 90). Desse modo, é evidente que careceu a autora de início de prova material para o período posterior a 1977, tendo sido este, sob meu ponto de vista, o motivo do indeferimento.
Entendo que se a segurada dispusesse, naquela ocasião, dos documentos ora acostados - bem mais robustos no sentido de comprovar o efetivo desempenho do labor rurícola pela família - a circunstância de seu esposo ter-se inscrito junto à Previdência Social como contribuinte individual não teria sido considerada incompatível com sua alegada condição de segurado especial, até mesmo por que é sabido que muitas vezes o segurado especial, com o intuito de garantir o direito à inativação (o qual até a edição da Lei nº 8.213/91 somente era garantido aos trabalhadores rurais com 65 anos de idade e que fossem chefe ou arrimo de família), ou mesmo de assegurar assistência médica, inscrevia-se na Previdência Social como autônomo, sem, contudo, deixar de exercer, exclusivamente, a atividade rural.
Ante o exposto, renovando pedido de vênia à eminente desembargadora federal divergente voto por manter o voto anteriormente proferido, com acréscimos dos fundamentos ora expostos.
Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
Relator
| Documento eletrônico assinado por Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8864975v3 e, se solicitado, do código CRC 58BEF4BD. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | João Batista Pinto Silveira |
| Data e Hora: | 09/03/2017 12:27 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0002853-47.2016.4.04.9999/RS
RELATOR | : | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
APELANTE | : | LENI BARON |
ADVOGADO | : | Nilce Lourdes Kappes |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
VOTO DIVERGENTE
Com a vênia do eminente Relator, manifesto minha divergência.
Cuida-se de recurso de apelação interposto frente à sentença que julgou extinto parcialmente o pedido atinente ao reconhecimento do tempo de serviço rural, uma vez que parte do período cujo reconhecimento postulava já foi objetivo de análise judicial.
Nesta ação, a pretensão da apelante dirige-se ao reconhecimento do exercício de atividade rural no período de 22/02/1968 a 03/06/1970 e de 01/02/1977 a 15/03/1988, tendo em vista que o período de 04/06/1970 a 28/10/1974 já foi administrativamente reconhecido pela autarquia (fls. 109-110 e 112).
Em 06/08/2009, no entanto, a autora ajuizou ação buscando o reconhecimento do exercício de atividade rural no período de 29/10/1974 a 01/06/1988, tendo sido reconhecido somente o período de 29/10/1974 a 31/01/1977, de acordo com o conteúdo da sentença proferida nos autos do processo 20097161002358-1 (fls. 86-93).
Inicialmente, ressalto que não desconheço o entendimento jurisprudencial no sentido de que, ante o caráter social dos direitos em lide nesta espécie de ação, tem-se compreendido a delimitação da coisa julgada inclusive por seu suporte probatório, de modo a não prejudicar o direito de quem - por má orientação ou incapacidade temporária de localizar documentos e testemunhas - venha a ver reconhecido como não comprovada condição de trabalho efetivamente existente.
Consoante decidido pelo STJ, "a preservação da coisa julgada constitui garantia fundamental consagrada no art. 5º, XXXVI, da CF/88, de modo que a sua relativização, mesmo para aqueles que defendem a aplicação do referido instituto em nosso ordenamento jurídico, só pode ser permitida em hipóteses absolutamente excepcionais" (REsp. 1048586/SP, Rel. Ministra Denise Arruda, Primeira Turma, julgado em 04/06/2009, DJe 01/07/2009). Isso, definitivamente não se enquadra no presente caso.
Tratando-se de reconhecimento de tempo de serviço de trabalhador rural em período já analisado em ação anterior, havendo novos documentos preexistentes à decisão proferida com trânsito em julgado, mas não encontrados à época ou cuja existência era ignorada, em virtude do adverso contexto cultural a que submetido o hipossuficiente, admite-se a rescisão do julgado via ação rescisória, com fulcro no art. 485, VII, do CPC, na linha do entendimento pacificado no âmbito do Superior Tribunal de Justiça, adotando-se em tal hipótese específica a solução pro misero.
Todavia, no caso em julgamento, cuida-se de ação ordinária, não sendo possível a reapreciação do pedido, em face da coisa julgada.
Para a admissão da existência de coisa julgada é necessário, nos termos do § 2º do artigo 337 do CPC/2015, que entre uma e outra demanda seja caracterizada a chamada "tríplice identidade", ou seja, que haja identidade de partes, de pedido e de causa de pedir. A variação de quaisquer desses elementos identificadores afasta a ocorrência de coisa julgada.
Nesse sentido, apenas para exemplificar, o precedente a seguir transcrito:
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. CONCESSÃO DE BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. COISA JULGADA. ALEGAÇÃO DE MODIFICAÇÃO DA SITUAÇÃO SOCIOECONÔMICA. NECESSIDADE DE REALIZAÇÃO DE PERÍCIA SOCIOECONÔMICA. CERCEAMENTO DE DEFESA. ANULAÇÃO DA SENTENÇA.
1. Para a admissão da existência de coisa julgada é necessário, nos termos do § 2º do artigo 301 do CPC, que entre uma e outra demanda seja caracterizada a chamada "tríplice identidade", ou seja, que haja identidade de partes, de pedido e de causa de pedir. A variação de quaisquer desses elementos identificadores afasta a ocorrência de coisa julgada.
2. É possível o ajuizamento de nova ação pelo segurado contra o INSS (com o mesmo pedido) sempre que houver modificação da situação fática, o que não infringirá a coisa julgada, pois a causa de pedir será diferente. Precedentes da Corte. (...)
(AC nº 0019677-86.2013.404.9999, Rel. Juiz Federal Roger Raupp Rios, 6ª T., dec. un. em 26/03/2014, D.E. de 03/04/2014)
No caso concreto, as partes são as mesmas.
O pedido também é o mesmo, benefício previdenciário de aposentadoria por idade rural. O mero fato de a aposentação ser requerida em datas diferentes não tem o condão de transformar um pedido em outro, pois sempre o que terá sido requerido é o mesmo benefício. A não ser assim, se a cada dia novo requerimento fosse formulado, teríamos tantos pedidos quantos fossem os requerimentos feitos, trazendo, por via de consequência, a possibilidade de ajuizamento de igual quantidade de ações judiciais, o que seria desarrazoado.
Na verdade, a data de requerimento do benefício, no caso do benefício de aposentadoria, está mais diretamente relacionada com a causa de pedir, que é o exercício de atividade rural como segurado especial, suporte fático do pedido de aposentação. Isto porque datas diversas poderão determinar diversos períodos equivalentes ao de carência, ou parcialmente diversos, alterando total ou parcialmente o lapso temporal em que a atividade agrícola deve ser comprovada.
Assim, entendo que, naquilo em que o período a ser comprovado for diverso, a causa de pedir é diversa. Mas naquilo em que há interseção de períodos inexiste diversidade de causa de pedir, mas sim identidade. Exatamente por isto é que há coisa julgada parcial quando parte do período a ser comprovado é o mesmo.
No caso dos autos, portanto, sendo a pretensão inicial da autora o reconhecimento da atividade rural nos períodos de 22/02/1968 a 03/06/1970 e de 01/02/1977 a 15/03/1988, e já tendo sido apreciado judicialmente o período de 29/10/1974 a 01/06/1988, tenho que, para este período, o pedido deve ser julgado extinto sem resolução do mérito porque já foi objetivo de provimento jurisdicional, incidindo na espécie o art. 267, V, do CPC/1973.
Observo, por oportuno, que o fundamento adotado na decisão passada em julgado para não reconhecer o período de atividade rural exercida pela autora na qualidade de segurada especial não guarda relação com a ausência de prova material da atividade, mas, sim, com o fato de ter sido incrementada ao grupo familiar fonte de renda oriunda de atividade urbana. Eis a fundamentação adotada por aquele juízo quanto ao ponto (fl. 90):
(...)
Com efeito, conforme se depreende da prova carreada aos autos, especialmente o extrato de consulta ao Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS (evento 34), há registro de inscrição do marido da autora como contribuinte individual, desde fevereiro de 1977, circunstância que descaracteriza a condição de segurada especial da parte autora a partir daquela competência.
(...)
O fato de não ter havido interposição de recurso desta decisão por desídia do anterior patrono, ao revés do que sustentado pela requerente, não é suficiente à relativização da coisa julgada, pois esta, como acima referido, demanda excepcionalidade.
Com essas considerações, reconheço a ocorrência de coisa julgada em relação ao período já analisado na ação anterior, qual seja de 29/10/1974 a 01/06/1988.
Por fim, destaco que, no que tange ao período remanescente, entre 22/02/1968 e 03/06/1970, houve expresso reconhecimento por parte da autarquia (fl. 164), na forma do art. 269, II, do CPC/1973.
Neste contexto, entendo que ao recurso da autora deve ser negado provimento, mantendo-se a decisão proferida pelo juízo a quo.
Honorários Advocatícios
Considerando que a sentença recorrida foi publicada antes de 18/03/2016, data da entrada em vigor do NCPC, e tendo em conta as explanações tecidas quando da análise do direito intertemporal, esclareço que as novas disposições acerca da verba honorária são inaplicáveis ao caso em tela, de forma que não se determinará a graduação conforme o valor da condenação (art. 85, §3º, I ao V, do CPC/2015), tampouco se estabelecerá a majoração em razão da interposição de recurso (art. 85, §11º, do CPC/2015).
Assim, fica mantida a condenação honorária em razão da sucumbência recíproca, inclusive no que tange à possibilidade de compensação, pois, conforme já referido, as disposições do novo CPC acerca da verba honorária são inaplicáveis ao caso em tela, além do que, tal proceder, à luz do diploma processual civil de 1973, não viola dispositivos legais.
A propósito, a Súmula 306 do STJ:
Os honorários advocatícios devem ser compensados quando houver sucumbência recíproca, assegurado o direito autônomo do advogado à execução do saldo sem excluir a legitimidade da própria parte.
Ademais, consigno que a regra do art. 23 da Lei nº 8.906/94, que confere direito próprio e autônomo ao advogado de executar seus honorários, não se incompatibiliza com a do art. 21 do CPC de 1973, na medida em que, reconhecida a sucumbência recíproca, e havendo saldo em favor de uma das partes, é garantida ao advogado a possibilidade de execução autônoma da verba honorária.
Conclusão
Ante o exposto, voto por negar provimento ao recurso de apelação da autora.
Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
| Documento eletrônico assinado por Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA, , na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8759802v2 e, se solicitado, do código CRC A5EECB12. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Vânia Hack de Almeida |
| Data e Hora: | 14/12/2016 16:21 |
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 14/12/2016
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0002853-47.2016.4.04.9999/RS
ORIGEM: RS 00002071520148210077
RELATOR | : | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
PRESIDENTE | : | Desembargadora Federal Vânia Hack de Almeida |
PROCURADOR | : | Procurador Regional da República Eduardo Kurtz Lorenzoni |
APELANTE | : | LENI BARON |
ADVOGADO | : | Nilce Lourdes Kappes |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 14/12/2016, na seqüência 71, disponibilizada no DE de 29/11/2016, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
APÓS O VOTO DO RELATOR NO SENTIDO DE DAR PROVIMENTO AO RECURSO DA PARTE AUTORA, DETERMINAR A IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO E DIFERIR, DE OFÍCIO, PARA A FASE DE EXECUÇÃO, A FORMA DE CÁLCULO DOS CONSECTÁRIOS LEGAIS, DA DIVERGÊNCIA INAUGURADA PELA DESEMBARGADORA FEDERAL VÂNIA HACK DE ALMEIDA, PARA NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO DE APELAÇÃO DA AUTORA, E DO VOTO DA JUÍZA FEDERAL MARINA VASQUES DUARTE DE BARROS FALCÃO, ACOMPANHANDO A DIVERGÊNCIA, O JULGAMENTO FOI SOBRESTADO NOS TERMOS DO ART. 942 DO CPC/2015, SENDO QUE A CONTINUIDADE DO JULGAMENTO SE DARÁ NA SESSÃO DESTA 6ª TURMA DO DIA 08/03/17 COM A INCLUSÃO DO FEITO EM PAUTA DE JULGAMENTOS.
VOTANTE(S) | : | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
: | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA | |
: | Juíza Federal MARINA VASQUES DUARTE DE BARROS FALCÃO |
Gilberto Flores do Nascimento
Diretor de Secretaria
MANIFESTAÇÕES DOS MAGISTRADOS VOTANTES
Processo Pautado
Divergência em 12/12/2016 16:22:38 (Gab. Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA)
| Documento eletrônico assinado por Gilberto Flores do Nascimento, Diretor de Secretaria, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8774141v1 e, se solicitado, do código CRC 1130AF8. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Gilberto Flores do Nascimento |
| Data e Hora: | 15/12/2016 11:55 |
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 08/03/2017
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0002853-47.2016.4.04.9999/RS
ORIGEM: RS 00002071520148210077
RELATOR | : | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
PRESIDENTE | : | Desembargadora Federal Vânia Hack de Almeida |
PROCURADOR | : | Procurador Regional da República Fábio Venzon |
APELANTE | : | LENI BARON |
ADVOGADO | : | Nilce Lourdes Kappes |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 08/03/2017, na seqüência 1, disponibilizada no DE de 20/02/2017, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
PROSSEGUINDO NO JULGAMENTO, APÓS O VOTO APRESENTADO PELO DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO AFONSO BRUM VAZ, ACOMPANHANDO A DIVERGÊNCIA, E DO VOTO DO DESEMBARGADOR FEDERAL ROGER RAUPP RIOS, NO MESMO SENTIDO, E DA COMPLEMENTAÇÃO DE VOTO APRESENTADA PELO RELATOR,A TURMA, POR MAIORIA, VENCIDO O RELATOR, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO DA PARTE AUTORA. LAVRARÁ O ACÓRDÃO A DESEMBARGADORA FEDERAL VÂNIA HACK DE ALMEIDA, PRIMEIRA NA DIVERGÊNCIA. JULGAMENTO REALIZADO NA FORMA DO ART. 942 DO CPC/2015.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
: | Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ | |
: | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
Gilberto Flores do Nascimento
Diretor de Secretaria
MANIFESTAÇÕES DOS MAGISTRADOS VOTANTES
Processo Pautado
Certidão de Julgamento
Data da Sessão de Julgamento: 14/12/2016 (ST6)
Relator: Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
APÓS O VOTO DO RELATOR NO SENTIDO DE DAR PROVIMENTO AO RECURSO DA PARTE AUTORA, DETERMINAR A IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO E DIFERIR, DE OFÍCIO, PARA A FASE DE EXECUÇÃO, A FORMA DE CÁLCULO DOS CONSECTÁRIOS LEGAIS, DA DIVERGÊNCIA INAUGURADA PELA DESEMBARGADORA FEDERAL VÂNIA HACK DE ALMEIDA, PARA negar provimento ao recurso de apelação da autora, E DO VOTO DA JUÍZA FEDERAL MARINA VASQUES DUARTE DE BARROS FALCÃO, ACOMPANHANDO A DIVERGÊNCIA, O JULGAMENTO FOI SOBRESTADO NOS TERMOS DO ART. 942 DO CPC/2015, SENDO QUE A CONTINUIDADE DO JULGAMENTO SE DARÁ NA SESSÃO DESTA 6ª TURMA DO DIA 08/03/17 COM A INCLUSÃO DO FEITO EM PAUTA DE JULGAMENTOS.
Voto em 08/03/2017 08:47:46 (Gab. Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ)
Com a vênia do relator, acompanho a divergência. A improcedência não se deu por falta de inicio material de prova.
Voto em 05/03/2017 19:23:07 (Gab. Des. Federal ROGER RAUPP RIOS)
Acompanho a divergência, com a vênia do e. relator.
Voto em 08/03/2017 10:48:33 (Gab. Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA)
VOTO COMPLEMENTAR
| Documento eletrônico assinado por Gilberto Flores do Nascimento, Diretor de Secretaria, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8876850v1 e, se solicitado, do código CRC 9AEE8EC8. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Gilberto Flores do Nascimento |
| Data e Hora: | 10/03/2017 15:48 |
