APELAÇÃO CÍVEL Nº 5004658-28.2014.4.04.7215/SC
RELATOR | : | JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
APELANTE | : | ZILMA NOVAIS |
ADVOGADO | : | ROBERTO CARLOS VAILATI |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
EMENTA
PROCESSO CIVL E PREVIDENCIÁRIO. DEVOLUÇÃO DOS VALORES MÁ-FÉ DO SEGURADO. CARACTERIZAÇÃO.
1. É devida a devolução de valores recebidos em decorrência do pagamento de benefício previdenciário quando ausentes os seus pressupostos e comprovada, pela prova dos autos, a má-fé do segurado no recebimento da prestação previdenciária.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento ao recurso de apelação do autor, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 21 de setembro de 2016.
Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
Relator
| Documento eletrônico assinado por Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8511851v4 e, se solicitado, do código CRC A4E8DEC3. | |
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 5004658-28.2014.4.04.7215/SC
RELATOR | : | JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
APELANTE | : | ZILMA NOVAIS |
ADVOGADO | : | ROBERTO CARLOS VAILATI |
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RELATÓRIO
Trata-se de ação proposta por Zilma Novaes em face do INSS tendo em vista que o seu benefício atual recebe descontos provenientes da necessidade de devolução de valores pagos indevidamente em razão de benefício anteriormente cancelado em razão do reconhecimento de má-fé. Alega-se, em síntese, que não é devida a devolução em razão da boa-fé e do caráter alimentar da prestação. Destaca-se que os valores não podem ser descontados do benefício atual sem a observância do devido processo legal.
A sentença julgou improcedente o pedido formulado na inicial, resolvendo o mérito nos seguintes termos: "Ante o exposto, resolvo o mérito da lide (CPC, art. 269, inc. I) e julgo improcedentes os pedidos" (e. 27, processo originário). A tese central da sentença foi a existência de ação anterior em que apurada a existência de má-fé da segurada no recebimento do benefício objeto do desconto.
Apela a parte autora. Alega, em síntese, que não houve prova de eventual fraude pelo INSS e que a ação anterior não transitou em julgado, não podendo ser utilizada como elemento de prova.
Com contrarrazões, subiram os autos.
É o breve relatório.
VOTO
De início ressalto que a questão da prescrição se confunde com o mérito, em razão da necessidade de verificação da má-fé (art. 103-A, Lei 8213/91). Aliás, nas ações de ressarcimento promovidas pelo INSS, o elemento central tende a ser a identificação da má-fé do segurado, já que a existência do fato lesivo à autarquia previdenciária é facilmente demonstrável através do processo administrativo originário e ou do processo de revisão posterior.
Nessa esteira, reputo indispensável que seja demontrada a má-fé ou, no revés, que seja afastada boa-fé do segurado que alegadamente recebeu de forma indevida determinado benefício previdenciário. Essa é a orientação correta e atual das Turmas Previdenciárias, verbis:
BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO RECEBIDO INDEVIDAMENTE. DECLARAÇÃO FALSA PARA OBTENÇÃO DE APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. MÁ-FÉ CONFIGURADA. RESSARCIMENTO DEVIDO. 1. Apesar da manifesta natureza alimentar do benefício previdenciário, havendo má fé por parte do recebedor dos valores, devida será a restituição dos valores indevidamente sacados. 2. A afirmação da autora ao requerer a aposentadoria por idade rural de que não recebia qualquer outro benefício, quando, na verdade, vinha recebendo aposentadoria por invalidez há mais de três anos, evidencia a má-fé da beneficiária. (TRF4, AC 0006008-63.2013.404.9999, SEXTA TURMA, Relatora VÂNIA HACK DE ALMEIDA, D.E. 20/04/2016).
AGRAVO DE INSTRUMENTO. PROCESSO CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. RESSARCIMENTO DE BENEFÍCIO PAGO INDEVIDAMENTE. PARCELAS RECEBIDAS DE BOA-FÉ. IRREPETIBILIDADE. INSCRIÇÃO DO NOME DO AUTOR JUNTO AO CADIN. INCABÍVEL. 1. É indevida a repetição dos valores recebidos de boa-fé pelo segurado, em virtude do caráter alimentar das prestações previdenciárias, sendo relativizadas as normas dos artigos. 115, inciso II, da Lei nº 8.213/91, e 154, § 3º, do Decreto nº 3.048/99. Precedentes desta Corte. 2. Ausente a comprovação de comportamento doloso, fraudulento ou de má-fé por parte do recorrente, deve ser deferida a liminar para que o INSS se abstenha de inscrever o nome do autor junto ao CADIN até final julgamento da ação originária. (TRF4, AG 0001792-15.2015.404.0000, SEXTA TURMA, Relatora VÂNIA HACK DE ALMEIDA, D.E. 28/09/2015).
PREVIDENCIÁRIO. DEVOLUÇÃO DE VALORES RECEBIDOS INDEVIDAMENTE. IMPOSSIBILIDADE. BOA-FÉ. PRESCRIÇÃO. 1. A imprescritibilidade das ações de ressarcimento ao erário, prevista no art. 37, §5º, da Constituição Federal, deve ser compreendida restritivamente, uma vez que atentaria contra a segurança jurídica exegese que consagrasse a imprescritibilidade de ação de ressarcimento decorrente de qualquer ato ilícito. 2. No que tange à prescrição a jurisprudência assentou entendimento de que em dívida de direito público, o prazo prescricional é qüinqüenal. 3. O pagamento originado de decisão administrativa devidamente motivada à luz das razões de fato e de direito apresentadas quanto do requerimento, tem presunção de legitimidade. 4. Evidenciada a boa-fé, o beneficiário não pode ficar jungido à contingência de devolver valores que já foram consumidos, dada a finalidade de prover os meios de subsistência a que se destina o benefício previdenciário. (TRF4, AC 5003822-52.2014.404.7216, QUINTA TURMA, Relator ROGER RAUPP RIOS, juntado aos autos em 30/06/2016).
Pois bem. Cumpre analisar a situação dos autos. Verifica-se do processo administrativo carregado aos autos que a concessão do benefício anterior (pensão por morte) foi irregular, já que concedida sem a presença dos seus requisitos. Por tal razão, o benefício foi cancelado (vide e. 06, procadm4-5, esp. fl. 20). Em face do cancelamento, a segurada ajuizou a ação de restabelecimento n.º 50008176420104047215 e cujo pedido foi julgado improcedente. A sentença da citada ação transitou em julgado.
Aliás, colhe-se do referido processo que houve ampla dilação probatória, inclusive com o revolvimento da questão relacionada com a má-fé da segurada. Conquanto a ação de restabelecimento tenha por objeto os pressupostos para a concessão (e não a ausência de boa-fé), fato é que houve, naquela oportunidade, análise da questão.
Confira-se, a propósito, trecho contundente da sentença proferida nos autos da ação n.º 50008176420104047215:
Alega, assim , que alguns anos após a separação 'de fato' (1995) passou a conviver com o Sr. Laudino, na condição de esposa, bem como auxiliando no seu tratamento médico, tendo inclusive o acompanhado durante 50 internações hospitalares.
Revelou, por fim, que pouco antes do seu falecimento o de cujus teve um acidente onde fraturou várias costelas e a bacia, permanecendo mais de 06 (seis) meses imobilizado na cama. Após isso o falecido foi acometido por câncer de próstata, o que o obrigou a permanecer em total dependência da autora, que o alimentava e tratava na cama, cuidando do seu companheiro como se fosse uma criança.
Pois bem. Os fatos acima narrados, aliado à considerável diferença de idade entre a autora e o Sr. Laudino (quase 40 anos) nos remetem à conclusão de que esta e o de cujus possuíam uma relação que mais se aproximava de um vínculo empregatício (doente x enfermeira) do que de uma convivência marital.
Com efeito, a autora alega que desde 1995 se encontrava 'separada de fato' do seu 1º esposo (Sr. Otávio), mas o conteúdo da ação de separação judicial litigiosa juntada aos autos revela que a 'separação judicial de corpos' só ocorreu a partir de 27-11-1998, ou seja: 03 (três) anos após o alegado início da convivência com o de cujus.
Além disso, foi juntado aos autos excerto de termo circunstanciado, com data de comunicação de 16-11-1998, onde a postulante revela que o seu ex-marido vinha lhe caluniando e agredindo, inclusive na frente dos filhos, o que reforça a idéia de que até essa época a postulante ainda convivia em relação conturbada com o seu ex-marido, o que inviabilizaria, assim, a existência de convivência marital simultânea com o de cujus.
Assim, os fatos articulados na exordial não se sustentam frente às provas juntadas aos autos, notadamente em relação à convivência marital da autora com o extinto desde o ano de 1995, porquanto na melhor das hipóteses eventual convivência marital só poderia ocorrer a partir da separação formal de corpos, ocorrida em 27-11-1998.
Contudo, tenho que não houve convivência marital entre a autora e o de cujus até a data do seu óbito (25-04-2000), na medida em que a própria requerente demonstrou imprecisão e incerteza quando indagada sobre a data do óbito e idade do falecido.
Além disso, a própria demandante deixou transparecer que a sua relação para com o de cujus não possuía caráter marital, pois referiu, em transcrição livre, que '(...) a gente sentia amor por eles que são pessoas de idade. Se hoje em dia aparecer uma pessoa de idade para mim cuidar eu pego, cuido também... a gente faz o bem, né?'.
Tal declaração, apesar de possuir elevado teor altruísta, não evidencia uma relação de companheirismo, na medida em que falta o caráter more uxório, que é a manifestação da convivência dos companheiros na aparência de marido e esposa.
O conteúdo testemunhal também não se revelou favorável à pretensão da postulante, uma vez que tanto a testemunha Maria da Conceição quanto Ari Teixeira não se revelaram suficientemente seguros no tocante à relação de companheirismo havida entre ambos, tendo inclusive a testemunha Ari Teixeira inicialmente se referido ao de cujus como 'amigo' da autora.
Ademais, a outra testemunha, Sra. Maria da Conceição, havia se mudado da localidade por ocasião do período da suposta convivência marital do casal.
Por fim, nenhuma das testemunhas foi suficientemente enfática no tocante à quantidade de filhos do 1º casamento que residiam com a autora quando esta passou a supostamente conviver maritalmente com o extinto, o que deixa dúvidas em relação à confiabilidade dos seus depoimentos.
De outra parte, os informantes do INSS foram uníssonos ao declarar que a requerente não convivia maritalmente com o falecido, mas que apenas cuidava deste (lavava roupa, fazia comida e cuidava do falecido).
Além disso, chama a atenção o fato de os informantes possuírem uma precisão muito maior no relato dos fatos relacionados à vida da autora e do de cujus do que as próprias testemunhas arroladas pela demandante, haja vista que estas souberam precisar com exatidão a quantidade de filhos que a requerente possuía do seu 1º casamento, o nome e 'apelido' do seu 1º esposo, a idade do de cujus, entre outros.
De outra parte, o conteúdo documental não se revelou favorável à pretensão da postulante, uma vez que as fichas de internação hospitalar e os termos de responsabilidade não se constituem em um indicativo de convivência more uxória, mas tão-somente demonstram que a requerente cuidava do falecido.
Assim, o INSS logrou êxito em demonstrar judicialmente a consistência da decisão emitida na esfera administrativa, porquanto restou suficientemente demonstrado nos autos que inexistia convivência marital entre a autora e o falecido segurado Laudino.
Por derradeiro, impõe afastar as preliminares de decadência e de ofensa aos princípios do contraditório e da ampla defesa.
Digo isso porque apesar de o INSS possuir 10 (dez) anos para anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis aos seus beneficiários, inexiste decadência para os casos de comprovada má-fé, conforme a seguir demonstrado:
Art. 103-A. O direito da Previdência Social de anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os seus beneficiários decai em dez anos, contados da data em que foram praticados, salvo comprovada má-fé. (Incluído pela Lei nº 10.839, de 2004) (o grifo é nosso)
Assim, diante dos fundamentos acima expendidos entendo que houve má-fé na concessão do benefício de pensão por morte à requerente, uma vez que as circunstâncias fáticas ventiladas nestes autos não nos levam à ilação de que a autora e o Sr. Laudino possuíam convivência marital anteriormente ao decesso deste último.
Está comprovada, portanto, a má-fé da segurada na percepção indevida do benefício.
Poder-se-ia controverter acerca da violação ao devido processo legal, já que o fato foi apurado na esfera administrativa, como dá conta o processo administrativo carregado a estes autos. Entretanto, o que se verifica é que a questão foi judicializada pela autora e, naquele momento, teve a oportunidade de demonstrar o desacerto do INSS em cancelar o benefícío. Ao fim e ao cabo, porém, o pedido foi improcedente. Tenho, portanto, que não houve violação ao devido processo legal.
Uma vez reconhecida a má-fé e a observância do devido processo legal, reputo viável o desconto no benefício atual, praticado pela autarquia previdenciária. Não há aí ilegalidade. Pelo contrário. A Lei 8.213/91 expressamente autoriza a medida (art. 115, II. Lei 8.213/91).
Diante do exposto, voto por negar provimento ao recurso de apelação do autor.
Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
Relator
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 21/09/2016
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5004658-28.2014.4.04.7215/SC
ORIGEM: SC 50046582820144047215
RELATOR | : | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
PRESIDENTE | : | Desembargadora Federal Vânia Hack de Almeida |
PROCURADOR | : | Procurador Regional da República Alexandre Amaral Gavronski |
APELANTE | : | ZILMA NOVAIS |
ADVOGADO | : | ROBERTO CARLOS VAILATI |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 21/09/2016, na seqüência 748, disponibilizada no DE de 02/09/2016, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO DE APELAÇÃO DO AUTOR.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
: | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA | |
: | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
Gilberto Flores do Nascimento
Diretor de Secretaria
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