AÇÃO RESCISÓRIA (SEÇÃO) Nº 5047677-30.2016.4.04.0000/TRF
RELATOR | : | JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
AUTOR | : | CLAUDETE PUERARI TREVISAN |
ADVOGADO | : | JOÃO LUIZ SPANCERSKI |
RÉU | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
MPF | : | MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL |
EMENTA
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO RESCISÓRIA. ERRO DE FATO E MANIFESTA VIOLAÇÃO À NORMA JURÍDICA. CONCESSÃO DE APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. REQUISITOS. CARÊNCIA.
1. A ação rescisória configura ação autônoma que visa desconstituir decisão com trânsito em julgado, tendo hipóteses de cabimento numerus clausus (art. 966 do NCPC). 2. A má apreciação da prova ou a eventual injustiça do julgamento não constitui erro de fato. 3. Admite-se a alegação de manifesta violação à norma jurídica com base em amplo espectro normativo e tanto no caso de error in judicando quanto no de error in procedendo, mas não como mero sucedâneo recursal. 4. Caso em que o direito à aposentadoria por idade rural foi negado após minucioso exame do conjunto probatório. 5. Violação de norma jurídica não caracterizada. 6. Ação rescisória julgada improcedente.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 3ª Seção do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, julgar improcedente a ação rescisória, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 23 de maio de 2018.
Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
Relator
| Documento eletrônico assinado por Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9374019v3 e, se solicitado, do código CRC 8E8568BA. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | João Batista Pinto Silveira |
| Data e Hora: | 29/05/2018 15:51 |
AÇÃO RESCISÓRIA (SEÇÃO) Nº 5047677-30.2016.4.04.0000/TRF
RELATOR | : | JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
AUTOR | : | CLAUDETE PUERARI TREVISAN |
ADVOGADO | : | JOÃO LUIZ SPANCERSKI |
RÉU | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
MPF | : | MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL |
RELATÓRIO
Trata-se de ação rescisória proposta por Claudete Puerari Trevisan, com fulcro no art. 966, V, do NCPC, visando desconstituir acórdão da Quinta Turma desta Corte no qual se julgou indevido o benefício de aposentadoria rural por idade, ao entendimento de que não houve comprovação do exercício de atividade agrícola no período da carência.
A autora alega que, ao contrário do que concluíram os julgadores, ela apresentou prova suficiente de que laborou como arrendatária na propriedade de seu genitor entre os anos de 1976 e 2013, período que equivale à carência. Sendo assim, o acórdão incorreu em manifesta violação dos arts. 5º, XXXV, LIV e LV, da CRFB, bem como do art. 11, VII, da Lei nº 8213-91. Afirma que todas as testemunhas ouvidas afirmaram que ela sempre exerceu atividade rural. Assevera que a circunstância de um dos cônjuges desempenhar atividade urbana não constitui óbice, por si só, o reconhecimento da qualidade de segurado especial do outro.
Em contestação, o INSS alega que os argumentos expendidos na inicial são próprios de um novo recurso contra a sentença de improcedência. Sustenta que o acórdão rescindendo, devidamente fundamentado, levou em consideração todo o conjunto probatório para concluir que não foi demonstrado o exercício de atividade rural no período da carência. Aduz que a ação rescisória não é remédio processual para corrigir eventual injustiça das decisões, nem substitutivo processual.
A autora apresentou réplica.
O Ministério Público Federal manifestou-se pelo regular prosseguimento do feito.
É o relatório.
VOTO
Do direito de propor a ação rescisória
A sentença rescindenda transitou em julgado em 13-05-16 (evento 108 - CERTTRAN8), e a presente demanda foi ajuizada em 28-10-16. Portanto, nos termos do art. 975, caput, do NCPC, o autor exercer o direito de pleitear a rescisão do julgado dentro do prazo decadencial de dois anos.
Juízo Rescindendo
A ação rescisória é uma ação autônoma que visa desconstituir decisão transitada em julgado. As hipóteses que ensejam a rescisão da sentença estão arroladas no art. 966 do NCPC, não admitindo ampliação por interpretação analógica ou extensiva. Como relatado, o autor baseia a pretensão rescisória nas alegações de manifesta violação à norma jurídica e erro de fato.
Manifesta violação à norma jurídica
Para configurar a hipótese de rescisão prevista no inciso V do art. art. 966 do NCPC, exige a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça que a violação à disposição de lei seja direta e inequívoca, conforme se depreende dos seguintes julgados:
PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO RESCISÓRIA. ERRO DE FATO. QUESTÃO NÃO APRECIADA PELO ACÓRDÃO RESCINDENDO. VIOLAÇÃO DE LITERAL DISPOSITIVO DE LEI. OFENSA REFLEXA. IMPOSSIBILIDADE.
(...)
5. A pretensão rescisória, fundada no art. 485, inciso V, CPC, conforme o entendimento doutrinário e jurisprudencial, tem aplicabilidade quando o aresto ofusca direta e explicitamente a norma jurídica legal, não se admitindo a mera ofensa reflexa ou indireta. Nesse sentido: AR 1.192/PR, Rel. Min. HUMBERTO MARTINS, Primeira Seção, DJe 17/11/08.
Ação rescisória improcedente.
(AR 4.264/CE, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 27/04/2016, DJe 02/05/2016)
PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO RESCISÓRIA. CONCURSO DE REMOÇÃO PARA ATIVIDADE NOTARIAL E DE REGISTRO. INSCRIÇÕES DISTINTAS PREVISTAS NO EDITAL. SEGURANÇA CONCEDIDA PARA ANULAR LISTA CLASSIFICATÓRIA UNIFICADA. VIOLAÇÃO A LITERAL DISPOSITIVO DE LEI. INEXISTÊNCIA.
(...)
8. De acordo com a jurisprudência do STJ, a rescisão de julgado com base no art. 485, V, do CPC somente é cabível quando houver flagrante violação de norma legal, e não mero descontentamento com a interpretação que lhe foi dada.
9. A argumentação do autor evidencia mero inconformismo e intuito de rediscutir a controvérsia, à margem das hipóteses de cabimento da Ação rescisória, que não pode ser utilizada como sucedâneo recursal.
10. Considerando as circunstâncias e a complexidade da causa e o baixo valor atribuído à ação (R$ 5.000,00), os honorários advocatícios são fixados em R$ 5.000,00 (cinco mil reais), à luz do art. 20, § 4º, do CPC, em favor do patrono do réu.
11. O depósito realizado deve ser revertido em favor do réu (art. 494 do CPC).
12. Ação rescisória julgada improcedente.
(AR 3.920/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 25/02/2016, DJe 25/05/2016)
O autor alega que foram violados os arts. 11, VII, da Lei nº 8213-91, bem como os arts. 5º, XXXVI, e 201, I, da CRFB, pois comprovou o exercício de atividade rural no período da carência, a despeito de seu cônjuge ter-se dedicado a atividade urbana.
O acórdão rescindendo teve a seguinte fundamentação:
(...)
O tempo de serviço rural deve ser demonstrado mediante a apresentação de início de prova material contemporânea ao período a ser comprovado, complementada por prova testemunhal idônea, não sendo esta admitida, exclusivamente, a teor do art. 55, § 3º, da Lei nº 8.213/1991, Súmula nº 149 do STJ e REsp nº 1.321.493/PR, Rel. Ministro Herman Benjamin, 1ª Seção, julgado em 10/10/2012, DJe 19/12/2012 (recurso representativo da controvérsia). Cabe salientar que embora o art. 106 da Lei de Benefícios relacione os documentos aptos a essa comprovação, tal rol não é exaustivo.
Não se exige, por outro lado, prova documental plena da atividade rural em relação a todos os anos integrantes do período correspondente à carência, mas início de prova material (como notas fiscais, talonário de produtor, comprovantes de pagamento do ITR ou prova de titularidade de imóvel rural, certidões de casamento, de nascimento, de óbito, certificado de dispensa de serviço militar, etc.) que, juntamente com a prova oral, possibilite um juízo de valor seguro acerca dos fatos que se pretende comprovar.
Os documentos apresentados em nome de terceiros, sobretudo quando dos pais ou cônjuge, consubstanciam início de prova material do labor rural. Com efeito, como o §1º do art. 11 da Lei de Benefícios define como sendo regime de economia familiar aquele em que os membros da família exercem 'em condições de mútua dependência e colaboração'. Via de regra, os atos negociais da entidade respectiva serão formalizados não individualmente, mas em nome do pater familiae, que é quem representa o grupo familiar perante terceiros, função esta, exercida, normalmente, no caso dos trabalhadores rurais, pelo genitor ou cônjuge masculino. Nesse sentido, a propósito, preceitua a Súmula nº 73 do Tribunal Regional Federal da 4ª Região: 'Admitem-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental'.
Importante, ainda, ressaltar que o fato de o cônjuge exercer atividade outra que não a rural também não serve para descaracterizar automaticamente a condição de segurado especial de quem postula o benefício, pois, de acordo com o que dispõe o inciso VII do art. 11 da Lei nº 8.213/1991, é segurado especial o produtor, o parceiro, o meeiro e o arrendatário rurais, o pescador artesanal e o assemelhado, que exerçam suas atividades, individualmente ou em regime de economia familiar, ainda que com o auxílio eventual de terceiros, bem como seus respectivos cônjuges ou companheiros e filhos maiores de 14 anos ou a eles equiparados, desde que trabalhem, comprovadamente, com o grupo familiar respectivo. Ou seja, somente será descaracterizado o regime de economia familiar acaso reste comprovado que a remuneração proveniente do labor urbano do cônjuge importe em montante tal que dispense a renda do labor rural para a subsistência do grupo familiar.
Cumpre salientar que, muitas vezes, a Autarquia Previdenciária alega que os depoimentos e informações tomados na via administrativa apontam para a ausência de atividade agrícola no período de carência. Quanto a isso, deve ser dito que as conclusões a que chegou o INSS no âmbito administrativo devem ser corroboradas pelo conjunto probatório produzido nos autos judiciais. Existindo conflito entre as provas colhidas na via administrativa e em juízo, deve-se ficar com estas últimas, pois produzidas com todas as cautelas legais, garantindo-se o contraditório. Não se trata aqui de imputar inverídicas as informações tomadas pela Seguradora, mas de prestigiar a imparcialidade que caracteriza a prova produzida no curso do processo jurisdicional. Dispondo de elementos que possam obstaculizar a pretensão da parte autora, cabe ao INSS judicializar a prova administrativa, a fim de que seja examinada no conjunto do acervo probatório constante dos autos.
No presente caso, observo que a parte autora preencheu o requisito etário, 55 (cinquenta e cinco) anos, em 25/02/2013, porquanto nascida em 25/02/1958 (evento 1, OUT3). O requerimento administrativo foi efetuado em 08/03/2013 (evento 1, OUT4). Dessa forma, a parte autora deve comprovar o exercício de atividade rural no período de 180 meses imediatamente anteriores ao implemento do requisito etário o que coincide com o requerimento administrativo, na hipótese.
Para fazer prova do exercício de atividade rural, a parte autora instruiu sua peça inicial com os seguintes documentos:
- carteira do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Mariluz em nome do cônjuge da autora, com admissão em 27/09/1976 (evento 1, OUT5);
- certidão de casamento da autora, contraído em 29/06/1976, em que consta a profissão do seu cônjuge como lavrador (evento 1, OUT5);
- certidão de óbito do filho da autora, ocorrido em 05/11/1976, em que consta a profissão do seu cônjuge como lavrador (evento 1, OUT5);
- certidão de nascimento dos filhos da autora, ocorridos em 09/01/1978, 07/05/1982, 08/10/1984, em que consta a profissão do seu cônjuge como lavrador/agricultor (evento 1, OUT5);
- matrícula de imóvel rural em nome do irmão da autora, datado de 09/07/1990 (evento 1, OUT5);
- carteira do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Mariluz em nome da autora, com admissão em 02/03/2006 (evento 1, OUT5);
- recibo de mensalidades do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Mariluz em nome da autora, referente aos anos de 2006, 2007, 2008, 2009, 2010, 2011, 2012, 2013 (evento 1, OUT5);
- certificado de cadastro de imóvel rural em nome do irmão da autora, referente aos 2003/2004/2005 (evento 36, OUT2);
- notas fiscais de compra/venda de produtos rurais em nome do irmão, referente aos anos de 1999, 2000, 2001, 2002, 2003, 2004, 2005, 2006, 2007, 2008, 2009, 2011, 2012, 2013, 2014 (evento 36, OUT2);
Por ocasião da audiência de instrução, em 21/08/2014 (evento 34, OUT1), foram inquiridas as testemunhas José de Oliveira, Martinho Marques Carreira Gregório e João Leme Barbosa de Queiroz, as quais confirmaram o exercício de atividades rurais pela demandante.
A testemunha José de Oliveira relata esclarece que conheceu a autora quando esta ainda era criança, pois foi vizinho da propriedade dos pais da mesma. Narra que a requerente ajudava os pais na agricultura desde muito nova, já que ao voltar da escola ia trabalhar na lavoura. Informa que a propriedade dos pais da demandante era de porte médio e que a principal cultura era o plantio de café. Menciona que a autora, após seu casamento, passou a residir na cidade onde seu marido, inicialmente, trabalhou numa serraria e após como caminhoneiro. Relata que a requerente, mesmo morando na cidade, sempre ia ajudar a mãe e o irmão nas lides do sítio, porém essa atividade não era contínua, mas sim nos períodos de maior demanda, ou seja, plantio e colheita. Afirma que a demandante ajudava a mãe e o irmão no cultivo de lavoura branca, sendo que nada recebia em troca, pois era da família. Por fim diz ainda que a família da autora, por certo tempo, manteve criação de bicho-da-seda e também cultivo de uva.
A testemunha Martinho Marques Carreira Gregório, por sua vez, esclarece que conhece a autora desde criança, pois eram vizinhos de propriedade, no bairro Catarinense. Narra que a propriedade dos pais da demandante possuía de quatro a cinco alqueires, onde plantavam feijão, arroz, milho e café. Explica que a requerente, após seu casamento, permaneceu por algum tempo, trabalhando na mesma região, mais tarde mudou-se para a cidade, uma vez que seu cônjuge passou a trabalhar como caminhoneiro. Afirma que mesmo morando na cidade, a autora retornava ao sítio para ajudar a mãe e o irmão, mas não sabe informar se a mesma recebia pelo trabalho. Menciona que em torno do ano de 2003 a família da requerente trabalhou na criação de bicho-da-seda. Por fim, diz que desconhece a frequência com que a demandante se deslocava ao sítio para auxiliar a mãe e o irmão.
Por fim, a testemunha João Leme Barbosa de Queiroz confirma as demais inquirições, afirmando que conhece a autora há cinquenta anos, época em que a demandante morava e trabalhava na propriedade de seus pais. Narra que a requerente trabalhou com os pais até seu casamento e que após permaneceu na mesma região trabalhando com o marido. Explica que a autora, quando seus filhos atingiram idade escolar, passou a morar na cidade, onde o marido iniciou atividade como caminhoneiro. Informa que a demandante, nesta época, sempre retornava às terras da família para auxiliar o irmão e a mãe nas tarefas agrícolas, uma vez que seu pai já era falecido. Menciona que o irmão plantava milho, feijão e arroz e nessas culturas recebia ajuda da autora. Afirma desconhecer se a requerente recebia alguma remuneração pelo trabalho prestado Por fim diz achar que a principal fonte de renda da família da demandante era o salário do marido.
No presente caso, entre os documentos juntados aos autos, encontramos a certidão de casamento da autora (evento 1, OUT5), certidões de nascimento dos filhos (Evento 1, OUT5), certidão de óbito do filho (evento 1, OUT5) e carteira do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Mariluz em nome do seu cônjuge (evento 1, OUT5), onde o marido apresenta qualificações de lavrador e agricultor, sendo que este passou a exercer atividade urbana, a partir de 1994. Ora, tais documentos não são extensíveis à autora, para fins de comprovação do labor rural, tendo em vista que o mesmo se afastou das atividades rurícolas.
Sinale-se, ainda, que, nesta hipótese, não pode a esposa utilizar-se de documentos em nome do cônjuge, especialmente quando extemporâneos ao período de carência, nos termos do que já restou decidido pelo Colendo Superior Tribunal de Justiça, em sede de recurso repetitivo. Veja-se:
RECURSO ESPECIAL. MATÉRIA REPETITIVA. ART. 543-C DO CPC E RESOLUÇÃO STJ 8/2008. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. TRABALHO RURAL. ARTS. 11, VI, E 143 DA LEI 8.213/1991. SEGURADO ESPECIAL. CONFIGURAÇÃO JURÍDICA. TRABALHO URBANO DE INTEGRANTE DO GRUPO FAMILIAR. REPERCUSSÃO. NECESSIDADE DE PROVA MATERIAL EM NOME DO MESMO MEMBRO. EXTENSIBILIDADE PREJUDICADA.
1. Trata-se de Recurso Especial do INSS com o escopo de desfazer a caracterização da qualidade de segurada especial da recorrida, em razão do trabalho urbano de seu cônjuge, e, com isso, indeferir a aposentadoria prevista no art. 143 da Lei 8.213/1991.
2. A solução integral da controvérsia, com fundamento suficiente, não evidencia ofensa ao art. 535 do CPC.
3. O trabalho urbano de um dos membros do grupo familiar não descaracteriza, por si só, os demais integrantes como segurados especiais, devendo ser averiguada a dispensabilidade do trabalho rural para a subsistência do grupo familiar, incumbência esta das instâncias ordinárias (Súmula 7/STJ).
4. Em exceção à regra geral fixada no item anterior, a extensão de prova material em nome de um integrante do núcleo familiar a outro não é possível quando aquele passa a exercer trabalho incompatível com o labor rurícola, como o de natureza urbana.
5. No caso concreto, o Tribunal de origem considerou algumas provas em nome do marido da recorrida, que passou a exercer atividade urbana, mas estabeleceu que fora juntada prova material em nome desta em período imediatamente anterior ao implemento do requisito etário e em lapso suficiente ao cumprimento da carência, o que está em conformidade com os parâmetros estabelecidos na presente decisão.
6. Recurso Especial do INSS não provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução 8/2008 do STJ.
(REsp 1304479/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 10/10/2012, DJe 19/12/2012) (grifei)
A extensão da prova material em nome de um dos cônjuges para o outro, quando aquele a que o documento se refere passa a exercer atividade urbana, não é possível. Exige-se, nesses casos, que a parte apresente prova material em nome próprio.
Além do que, os únicos documentos em nome próprio apresentados são a carteira e os recibos de mensalidade do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Mariluz, porém estes não se prestam como início de prova material, pois constituem-se em manifestações unilaterais sem compromisso judicial ou sujeição ao princípio do contraditório
Além do mais, ainda que exista algum vínculo da autora com o meio rural, o fato de seu esposo ser aposentado por tempo de contribuição, e ter exercido a função de motorista durante grande parte de sua vida, resta evidente que a agricultura não é a principal fonte de renda da família, acrescente-se que:
- a própria autora, na entrevista rural (Evento 1, OUT5, Página 32), afirmou que não possui nenhuma fonte de renda e que somente o marido trabalha. Além do que, as notas fiscais do produtor rural (evento 36, OUT2) estão em nome de seu irmão, o comprova novamente alegação da requerente, na mesma entrevista, de que nada recebe do auferido na comercialização dos produtos, que a renda é dividida entre a mãe e o irmão.
- as testemunhas forma uníssonas em afirmar que a autora nada recebia ou desconhecem a existência de remuneração pelo trabalho efetuado nas terras da família.
Some-se a isto, os depoimentos não permitem afirmar com convicção a continuidade do trabalho prestado pela autora, visto que as testemunhas apresentaram informações contraditórias e vagas, ou mesmo, asseveraram ser este descontínuo, ocorrendo apenas nos períodos de maior demanda. Dessa forma, resta a convicção que o pretenso trabalho rural da demandante não se configura. O que inviabiliza a caracterização da autora como segurado especial.
Assim, não restando comprovado o exercício de atividades rurícolas pela parte autora no período de carência, deve ser mantida a sentença para julgar improcedente o pedido de concessão do benefício de aposentadoria por idade.
(...)
Como se pode ver, o acórdão não rejeita a possibilidade de se reconhecer a condição de segurado especial do agricultor individual, quando o cônjuge exerce atividade urbana. Ao contrário, admite-a expressamente, nos termos do art. 11, VII, da Lei nº 8213-91, desde que a remuneração proveniente do labor urbano do cônjuge não importe em montante tal, que torne dispensável a renda do labor rural para a subsistência do grupo familiar.
É o conjunto de circunstâncias do caso, sejam elas (a) a falta de documentos em nome próprio, visto que até as notas de produtor apresentadas estão em nome do irmão, (b) testemunhos contraditórios e vagos, referindo trabalho rural descontínuo e não remunerado, (c) vínculos urbanos do cônjuge seguidos de concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, que leva à conclusão desfavorável à concessão do benefício. Acolher a pretensão da autora importaria, neste caso, reduzir a ação rescisória a mero sucedâneo recursal. Nesse contexto, ainda que ela não tenha alcançado seu intento na ação ordinária, entendo que não há manifesta violação aos artigos invocados na inicial.
Erro de fato
Para justificar a desconstituição do julgado, o erro de fato deve decorrer não da má apreciação da prova, mas da desatenção do julgador, consistindo em admitir um fato inexistente ou considerar inexistente um fato efetivamente ocorrido (art. 966, §1º, do NCPC). Nas duas hipóteses, também é necessário que não tenha havido controvérsia, nem pronunciamento judicial sobre tal, é dizer, o acórdão chegou à conclusão diversa em face daquele vício, pois o julgador não teria julgado como o fez, caso tivesse atentado para a prova. A respeito desse tema, escreveu Barbosa Moreira:
(...) Quatro pressupostos hão de concorrer para que tal erro dê causa à rescindibilidade:
a) que a sentença nele seja fundada, isto é, que sem ele a conclusão do juiz houvesse de ser diferente;
b) que o erro seja apurável mediante o simples exame dos documentos e mais peças dos autos, não se admitindo de modo algum, na rescisória, a produção de quaisquer outras provas tendentes a demonstrar que não existia o fato admitido pelo juiz, ou que ocorrera o fato por ele considerado inexistente;
c) que 'não tenha havido controvérsia' sobre o fato (§2º);
d) que sobre ele tampouco tenha havido 'pronunciamento judicial'. (Comentários ao Código de Processo Civil. Rio de Janeiro: Forense, 1993, Vol. V)
Assim, o conceito de erro de fato deve ser entendido como um erro de apreciação da prova colacionada aos autos. Contudo, não há como se admitir a rescisória pela valoração ou interpretação do acervo probatório, pois o erro de fato não comunga com o erro de valoração ou de interpretação sobre a subsistência ou relevância de um fato, mas, a rigor perfectibiliza-se na falta percepção dos sentidos, de modo que o julgador supõe a existência de um fato inexistente ou a inexistência de um fato realmente existente.
Com efeito, o erro de fato supõe fato provocado e ignorado. Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery afirmam que:
Para que o erro legitime a propositura da ação rescisória, é preciso que tenha influído decisivamente no julgamento rescindendo. Em outras palavras: é preciso que a sentença seja efeito do erro de fato; que haja entre aquela e este um nexo de causalidade (Sidney Sanches. RT 501/25). Devem estar presentes os seguintes requisitos para que possa rescindir sentença por erro de fato: a) a sentença deve estar baseada em erro de fato; b) sobre ele não pode ter havido controvérsia entre as partes;c) sobre ele não pode ter havido pronunciamento judicial; d) que seja aferível pelo exame das provas já constantes dos autos da ação matriz, sendo inadmissível a produção, na rescisória, de novas provas para demonstrá-lo. (in CPC comentado, 11ª edição - 2010. pag.817)
A certa altura da inicial, a autora alega que o acórdão teria incorrido em erro de fato, ao não atentar ao acervo probatório constantes dos autos.
Basta retomar os fundamentos da sentença para se constatar que não é essa a hipótese do caso em apreço: no feito originário, o juízo de improcedência seguiu-se a minucioso exame do conjunto probatório. Torna-se claro, assim, que o autor está a valer-se do pedido de desconstituição do julgado para buscar a reforma da decisão que lhe foi desfavorável. A eventual injustiça do julgamento não dá, contudo, ensejo à ação rescisória. Nesse sentido, colaciono precedente desta Corte:
AÇÃO RESCISÓRIA. VIOLAÇÃO A DISPOSITIVO DE LEI. REVISÃO DO JULGADO. O art. 485 do CPC elenca casos em que possível a rescisão do julgado, não sendo viável interposição da ação objetivando tão-somente revisar o julgado, na medida em que esta não se presta a analisar a justiça ou injustiça do posicionamento adotado, devolvendo a matéria como se recurso ordinário fosse.
(AR 2000.04.01.0145004-6/RS, TRF da 4ª Região, Terceira Seção, Relator Des. Federal Luiz Carlos de Castro Lugon, DJU 09/06/04, p. 266)
Em face dessas considerações, entendo não estarem demonstradas as hipóteses de desconstituição do julgado.
Dos ônus da sucumbência
Condeno a autora a arcar com os honorários de advogado, que fixo em R$ 937,00, dado o exíguo valor atribuído à causa (art. 85, § 8º, do NCPC), suspendendo a exigibilidade do crédito ante a concessão do benefício da justiça gratuita.
Ante o exposto, voto por julgar improcedente a ação rescisória.
Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
Relator
| Documento eletrônico assinado por Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9374018v3 e, se solicitado, do código CRC 90F56AAB. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | João Batista Pinto Silveira |
| Data e Hora: | 29/05/2018 15:51 |
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 23/05/2018
AÇÃO RESCISÓRIA (SEÇÃO) Nº 5047677-30.2016.4.04.0000/TRF
ORIGEM: TRF 50271982620154049999
RELATOR | : | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
PRESIDENTE | : | Desª. Federal Maria de Fátima Freitas Labarrère |
PROCURADOR | : | Dr. MARCELO VEIGA BECKHAUSEN |
AUTOR | : | CLAUDETE PUERARI TREVISAN |
ADVOGADO | : | JOÃO LUIZ SPANCERSKI |
RÉU | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
MPF | : | MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 23/05/2018, na seqüência 314, disponibilizada no DE de 04/05/2018, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 3ª Seção, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A SEÇÃO, POR UNANIMIDADE, DECIDIU JULGAR IMPROCEDENTE A AÇÃO RESCISÓRIA.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
: | Des. Federal CELSO KIPPER | |
: | Des. Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA | |
: | Des. Federal MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA | |
: | Des. Federal JORGE ANTONIO MAURIQUE | |
: | Juiz Federal OSNI CARDOSO FILHO | |
: | Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ | |
: | Des. Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO |
Paulo André Sayão Lobato Ely
Diretor de Secretaria
| Documento eletrônico assinado por Paulo André Sayão Lobato Ely, Diretor de Secretaria, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9412047v1 e, se solicitado, do código CRC AD7719C. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Paulo André Sayão Lobato Ely |
| Data e Hora: | 23/05/2018 20:46 |
