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PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. PROVA TESTEMUNHAL IDÔNEA. DESCONTIN...

Data da publicação: 14/08/2020, 09:56:02

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. PROVA TESTEMUNHAL IDÔNEA. DESCONTINUIDADE DO LABOR RURAL. POSSIBILIDADE.DOCUMENTOS DE TERCEIROS. TEMPO DE SERVIÇO RURAL ANTERIOR AO DOCUMENTO MAIS ANTIGO APRESENTADO.REQUISITOS PREENCHIDOS. CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. TUTELA ESPECÍFICA. 1. O tempo de serviço rural para fins previdenciários pode ser demonstrado mediante início de prova material suficiente, desde que complementado por prova testemunhal idônea. 2. Admite-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental. (Súmula n.º 73 deste Regional.) 3. A descontinuidade do labor rurícola permite afastamentos do campo sem que haja a desqualificação como segurado especial, desde que o conjunto probatório demonstre haver um retorno efetivo às lides campesinas, por tempo não inferior a 1/3 da carência necessária (parâmetro que não deve ser compreendido de forma absoluta). 4. Comprovado nos autos o requisito etário e o exercício de atividade rural, no período de carência é de ser concedida a Aposentadoria por Idade Rural à parte autora, a contar do requerimento administrativo, a teor do disposto no art. 49, II, da Lei 8.213/91. 5. Determina-se o cumprimento imediato do acórdão naquilo que se refere à obrigação de implementar o benefício, por se tratar de decisão de eficácia mandamental que deverá ser efetivada mediante as atividades de cumprimento da sentença stricto sensu previstas no art. 497 do CPC/15, sem a necessidade de um processo executivo autônomo (sine intervallo). (TRF4, AC 5025241-48.2019.4.04.9999, SEXTA TURMA, Relator JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, juntado aos autos em 06/08/2020)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Rua Otávio Francisco Caruso da Rocha, 300, Gabinete do Des. Federal João Batista Pinto Silveira - Bairro: Praia de Belas - CEP: 90010-395 - Fone: (51)3213-3191 - www.trf4.jus.br - Email: gbatista@trf4.jus.br

Apelação Cível Nº 5025241-48.2019.4.04.9999/RS

RELATOR: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

APELADO: JOSE ANTONIO DA SILVA SOUZA

RELATÓRIO

Cuida-se de apelação interposta da sentença (proferida sob a égide do CPC/2015) que julgou procedente o pedido de concessão de Aposentadoria por Idade Rural, assim deixando consignado:

ANTE O EXPOSTO, JULGO PROCEDENTE o pedido contido na AÇÃO DE CONCESSÃO DE APOSENTADORIA POR IDADE (RURAL) proposta por JOSÉ ANTONIO DA SILVA SOUZA contra o INSS - INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL para condenar o réu a conceder em favor da autora o benefício da aposentadoria por idade rural, correspondente ao valor de um salário-mínimo mensal, fixando a data inicial do benefício em (12/09/2017 fls.15) (DEB), e CONDENAR o INSS ao pagamento das parcelas vencidas.

Sobre as parcelas vencidas incidirá correção monetária pelos índices da TR até o dia 25/03/2015, aplicando-se a partir de então o IPCA-E. Os juros de mora, no percentual de 0,5% ao mês, incidem a contar da citação.

Sucumbente o réu, condeno-o ao pagamento de honorários ao procurador do autor, fixados em 10% sobre o valor das parcelas vencidas, nos termos do art. 85, § 2º, do Novo Código de Processo Civil. Isento do recolhimento de custas, observado o teor do art. 5º, I, da Lei 14.634/14.

Sentença não sujeita ao reexame necessário, por força do artigo 496,§3, inciso I, do Novo Código de Processo Civil.

Caso haja apelação, considerando as novas disposições do atual Código de Processo Civil (art. 1.010), que determina a remessa do recurso independentemente do juízo de admissibilidade no primeiro grau, deverá o cartório intimar a parte recorrida para oferecer contrarrazões e dar vista ao Ministério Público para parecer e, na sequência, remeter os autos para a instância superior.

Nada sendo postulado após o trânsito em julgado, arquive-se com baixa.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se. (Grifei.)

Recorreu o INSS sustentando que o autor não apresentou início de prova material suficiente, apto a comprovar a atividade rural em regime de economia familiar, no período equivalente à carência. Alegou que as notas fiscais de produtor emitidas em nome do pai e do irmão do autor, não merecem ser considerados para fins probatórios. Referiu que a propriedade rural do genitor do requerente esta classificada no cadastro de imóvel rural como "latifúndio exploração", e o pai do autor como "empregador rural". Aduziu, ainda, que a prova exclusivamente testemunhal não basta para a comprovação da atividade rurícola. Aduziu que as notas fiscais emitidas em nome de terceiros, estranhos ao grupo familiar do autor, não merecem ser considerados para fins probatórios, por não haver relação de dependência. Subsidiariamente, requereu a aplicação integral dos critérios de atualização do art. 1.º-F, da Lei 9.494/97, na redação do art. 5º da Lei nº 11.960/09, e o prequestionamento da matéria para fins de acesso às instâncias superiores.

Oportunizadas as contrarrazões, subiram os autos a este Tribunal.

É o relatório.

VOTO

Juízo de Admissibilidade

A apelação preenche os requisitos legais de admissibilidade.

Da aposentadoria por idade rural

Tratando-se de rurícola, deve o julgador valorar os fatos e as circunstâncias evidenciados, com ênfase no artigo 5.º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro - LINDB, e levar em conta a realidade social em que inserido o trabalhador rural, na qual predomina a informalidade na demonstração dos acontecimentos. Vale lembrar que não se mostra razoável exigir que os documentos carreados ao processo sigam sempre a forma prescrita em lei, por isso devem ser considerados válidos, quando de outra forma atingirem a finalidade precípua de comprovar o exercício da atividade rural, consoante disposto no art. 277 do CPC/2015.

Os requisitos para a aposentadoria por idade dos trabalhadores rurais filiados à Previdência à época da edição da Lei nº 8.213/91 são os seguintes: (a) idade mínima de 60 anos para o homem e 55 anos para a mulher (art. 48, § 1.º); e (b) exercício de atividade rural, ainda que descontínua, por tempo igual ao número de meses correspondentes à carência exigida nas aposentadorias em geral, independente do recolhimento de contribuições.

Quanto ao ano a ser utilizado para verificação do tempo de atividade rural necessário à obtenção do benefício, nos termos da tabela prevista no artigo 142 da Lei n.º 8.213/91, como regra deverá ser aquele em que o segurado completa a idade mínima, desde que até então já disponha de tempo rural suficiente para o deferimento do benefício, sendo irrelevante, neste caso, que o requerimento tenha sido efetuado em anos posteriores, ou que na data do requerimento o segurado não esteja mais trabalhando, em homenagem ao princípio do direito adquirido (Constituição Federal, art. 5º, XXXVI, e Lei de Benefícios, art. 102, §1º).

Pode acontecer, todavia, que o segurado complete a idade mínima, mas não tenha o tempo de atividade rural exigido pela lei, observada a tabela do artigo 142 da Lei n.º 8.213/91. Neste caso, a verificação do tempo de atividade rural necessário ao deferimento do benefício não poderá mais ser feita com base no ano em que implementada a idade mínima, devendo ser verificado o implemento do requisito "tempo equivalente à carência" progressivamente, nos anos subseqüentes ao implemento do requisito etário, de acordo com a tabela do mencionado artigo 142 da Lei de Benefícios.

Não é possível dispensar a necessidade de implementação simultânea dos requisitos da idade e tempo de serviço durante o interregno correspondente à carência, uma vez que esse benefício não tem caráter atuarial, sendo vedado criar regime híbrido que comporte a ausência de contribuições e a dispensa do preenchimento concomitante das exigências legais.

Em qualquer caso, desde que implementados os requisitos, o benefício de aposentadoria por idade rural será devido a partir da data do requerimento administrativo ou, inexistente este, e desde que caracterizado o interesse processual para a propositura da ação judicial, da data do respectivo ajuizamento (STF, RE 631.240, com repercussão geral, Plenário, Rel. Ministro Luís Roberto Barroso, julgado em 03/09/2014).

Quanto aos segurados especiais que implementarem os requisitos para concessão do benefício após 31 de dezembro de 2010, não deve ser aplicado o limite temporal a que se refere o art. 143, com as alterações promovidas pela Lei 11.718/2008, destinadas, exclusivamente, aos trabalhadores rurais não enquadrados ou equiparados a segurados especiais. A estes últimos, aplica-se o disposto no art. 39, I, sem limite de data.

Da demonstração da atividade rural

Como regra geral, a comprovação do tempo de atividade rural para fins previdenciários exige, pelo menos, início de prova material (documental), complementado por prova testemunhal idônea (STJ - REsp 1.348.633/SP, Primeira Seção, Rel.Ministro Arnaldo Esteves Lima, julgado em 28/08/2013).

A relação de documentos referida no art. 106 da Lei n.º 8.213/1991 é apenas exemplificativa, sendo admitidos, como início de prova material, quaisquer documentos que indiquem, direta ou indiretamente, o exercício da atividade rural, inclusive em nome de outros membros do grupo familiar (STJ, AgRg no AREsp 31.676/CE, Quinta Turma, Rel.Ministro Gilson Dipp, julgado em 28/08/2012).

O Superior Tribunal de Justiça, em regime de recurso especial repetitivo, assentou definitivamente que a prova exclusivamente testemunhal é insuficiente para comprovação da atividade laborativa do trabalhador rural, inclusive o informal (STJ, REsp 1.321.493/PR, Primeira Seção, Rel. Ministro Herman Benjamin, julgado em 10/10/2012).

Para a análise do início de prova material, associo-me aos seguintes entendimentos:

Súmula n.º 73 deste Regional: Admite-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental.

Súmula n.º 149 do STJ: A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de beneficio previdenciário.

Súmula n.º 577 do STJ: É possível reconhecer o tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentado, desde que amparado em convincente prova testemunhal colhida sob o contraditório.

Também devem ser observados os precedentes vinculantes do STJ, nos temos das seguintes teses firmadas:

Tema 532: O trabalho urbano de um dos membros do grupo familiar não descaracteriza, por si só, os demais integrantes como segurados especiais, devendo ser averiguada a dispensabilidade do trabalho rural para a subsistência do grupo familiar, incumbência esta das instâncias ordinárias (Súmula 7/STJ).

Tema 533: A extensão de prova material em nome de um integrante do núcleo familiar a outro não é possível quando aquele passa a exercer trabalho incompatível com o labor rurícola, como o de natureza urbana.

Tema 642: O segurado especial tem que estar laborando no campo, quando completar a idade mínima para se aposentar por idade rural, momento em que poderá requerer seu benefício. Ressalvada a hipótese do direito adquirido, em que o segurado especial, embora não tenha requerido sua aposentadoria por idade rural, preenchera de forma concomitante, no passado, ambos os requisitos carência e idade.

Tema 629: Ausência de prova material em ação de aposentadoria por idade de trabalhador rural e a possibilidade de reproposição de ação.

Tema 638 - Mostra-se possível o reconhecimento de tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo, desde que amparado por convincente prova testemunhal.

Ressalte-se que não há necessidade de que a prova material abarque todo o período de trabalho rural, uma vez que se deve presumir a continuidade do labor rural. Em decisão proferida no Recurso Especial 1.348.633/SP (Tema 638), o STJ firmou entendimento de que as provas testemunhais, tanto do período anterior ao mais antigo documento quanto do posterior ao mais recente, são válidas para complementar o início de prova material do tempo de serviço rural.

É de se ressaltar que o exercício de pequenos períodos de labor urbano, não retira do interessado a condição de trabalhador rural, pois o exercício da atividade rural pode ser descontínuo (STJ, EDcl no AgRg no AREsp 297.322/PB, Segunda Turma, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, julgado em 13/08/2013).

Com relação à idade mínima para exercício de atividade rural, o Superior Tribunal de Justiça consolidou o entendimento no sentido da possibilidade do cômputo de tempo de atividade rural a partir dos doze anos, em regime de economia familiar, visto que a lei ao vedar o trabalho infantil do menor de 14, visou estabelecer a proibição em benefício do menor e não em seu prejuízo (STJ, REsp 573.556/RS, Quinta Turma, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, julgado em 16/02/2006; STJ, AR 3629/RS, Terceira Seção, Rel.Ministra Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 23/06/2008).

Em se tratando de aposentadoria por idade rural do segurado especial, tanto os períodos anteriores ao advento da Lei n.º 8.213/91 como os posteriores podem ser considerados independentemente do recolhimento de contribuições.

Do caso concreto

Da idade e da carência

Observa-se que a parte autora preencheu o requisito etário (60 anos) em 11-08-2015 e requereu o benefício na via administrativa em 12-09-2017. Assim, deve comprovar o efetivo exercício da atividade rural, ainda que de forma descontínua, nos 180 meses anteriores ao implemento do requisito etário ou anteriores ao requerimento administrativo, o que lhe for mais favorável.

Da comprovação do trabalho rural

Para comprovar o exercício da atividade rural foram acostados aos autos os seguintes documentos (ev.3-anexospet4):

- Certidão de nascimento do autor, ocorrido em 11-08-1955, onde o genitor foi qualificado como agricultor;

- Certidão de nascimento do irmão do autor, Sr. Jorge da Silva Souza, lavrada no ano de 1952, sem registro da profissão dos pais;

- Certificado de Cadastro no INCRA, referente à área rural com 33,3 hectares de extensão, em nome do pai do autor, qualificado como empregador rural, classificada como latifúndio exploração, do ano de 1976;

- Notas de produtor e notas fiscais de comercialização de produtos agrícolas em nome do genitor, dos anos de 1994, 1998, 1999 e 2012;

- notas fiscais de produtor expedidas em nome próprio em conjunto cdom seu irmão, Sr. Jorge da Silva Souza, dos anos de 2008, e 2010 a 2012;

- Extrato do CNIS em nome do autor, sem registros de vínculos rurais ou urbanos;

- Nota fiscal de energia elétrica, em nome do requerente, faturada em agosto/2012, indicando seu endereço na Estrada Vila Solidão, n. 5152, município de Mostardas-RS.

Os documentos acostados aos autos são válidos para comprovar que o autor e sua família trabalhavam no meio rural.

A prova testemunhal foi uníssona e convincente ao afirmar o labor rural do requerente, por longa data, em regime de economia familiar.

Nesse sentido bem assentou o juízo a quo ao prolatar a sentença, na parte que a seguir reproduzo (ev.3-sent15)::

As testemunhas afirmam, em síntese, o exercício das atividades rurais pelo autor durante o período de carência na condição de trabalhadora rural em regime de economia familiar, ou seja, confirmando que a requerente sempre trabalhou na atividade da agricultura, no período exigido em lei.

Francisco de Souza Pereira, “Confirmou que o autor trabalhava nas terras dos pais desde tenra idade, em regime de economia familiar, juntamente com os irmãos e seus pais. Que o trabalho era braçal, com bois. Que tinham criação de bois, ovelhas, porcos. Que cultivavam cebola, aipim e etc.. Que sempre viveu na mesma localidade. Que não tinham máquinas agrícolas, nem empregados. Que a propriedade tinha 72ha, e com o falecimento do pai, a área foi dividida com seus irmãos. Que a única fonte de renda é a agricultura. Que até antes de adoecer o autor continuava trabalhando na agricultura”.

Natalio Machado de Souza, “Confirmou que o autor é agricultor desde os 10 anos de idade em regime de economia familiar. Que plantam, cebola, feijão e plantas do seco. Que chegou a ver o autor pegando no pesado na roça. Que o trabalho era braçal, com o uso de bois e enxada. Que Não tinham empregados. Que até os dias atuais o autor continua sendo agricultor, e que atualmente está com câncer, andando de cadeira de rodas. Que o que cultivavam usavam para o consumo e o que sobrava vendiam para a subsistência”.

Ressalte-se que, para caracterizar o início de prova material, não é necessário que os documentos apresentados comprovem ano a ano o exercício da atividade rural, seja porque se deve presumir a continuidade nos períodos imediatamente próximos, sobretudo no período anterior à comprovação, considerando-se que a realidade em nosso país é a migração do meio rural ao urbano, e não o inverso, sendo inerente à informalidade do trabalho campesino a escassez documental.

Quanto ao fato da prova ser extemporânea, em decisão proferida no Recurso Especial 1.348.633/SP, o qual seguiu o rito dos recursos repetitivos, firmou-se entendimento de que as provas testemunhais, tanto do período anterior ao mais antigo documento quanto do posterior ao mais recente, são válidas para complementar o início de prova material do tempo de serviço rural.

Conforme consolidada jurisprudência (Súmula n.º 73 deste Regional), os documentos em nome do genitor servem de início de prova material da atividade rural em relação aos demais membros do grupo familiar. Os documentos em nome de terceiros, inclusive em nome do irmão, também consubstanciam início de prova material do trabalho rural desenvolvido em regime de economia familiar, eis que as testemunhas foram unânimes ao afirmar que o autor exercia atividades rurícolas na propriedade de seu genitor, juntamente com seu irmão, servindo as notas fiscais em nome destes como início de prova material do labor rurícola daquele durante o período correspondente à carência. Nesse sentido já decidiu esta Corte: AC nº 2001.04.01.018458-6, de minha relatoria DJU 06-07-2005; AC nº 2001.04.01.078207-6, Rel. Des. Federal Victor Luiz dos Santos Laus, DJU 22-09-2004 e EIAC Nº 1999.04.01.085467-4/RS, Relator Des. Federal Celso Kipper, DJU 09-11-2005.

Do extrato do CNIS juntado aos autos, observa-se que a parte autora não possui registro de vínculos empregatícios, fortalecendo-se a indicação de que, de fato, sobreviveu unicamente das lides rurais no período de carência.

Não restou comprovada a alegação de que o pai da autora tenha sido empregador rural. Embora tenha constado em alguns certificados de cadastro do INCRA para fins de pagamento de ITR a denominação de "empregador rural", observa-se nos mesmos documentos que a propriedade tinha área inferior a dois módulos fiscais, sem registro de assalariados. No mesmo sentido, a prova testemunhal demonstra que o labor rural no período em que o autor residiu com seu pai e irmão foi realizado de forma manual, com auxílio de tração animal.

Assim sendo, considerando-se as notas fiscais de produtor emitidas em nome do genitor, do autor e em nome do irmão, a certidão de nascimento do requerente na qual consta a profissão do genitor como agricultor), em conjunto com a prova testemunhal, restou efetivamente comprovado o labor rural do autor, nos seguintes intervalos: de 11-08-1967 (12 anos de idade) a 24-02-1999 (data da última nota fiscal em nome do genitor), e de 16-03-2008 (data da primeira nota fiscal de produtor em nome próprio) até 11-08-2015 (data da última nota fiscal em nome do requerente.

Havendo prova de desempenho de atividade rural em período imediatamente anterior ao requerimento administrativo, que se mostre significativo, ou seja, de no mínimo 1/3 do total da carência necessária (prazo previsto no parágrafo único do artigo 24 da Lei 8.213/91), suficiente para permitir a conclusão de que o segurado, efetivamente, passou a sobreviver de forma estável dos frutos de seu trabalho junto à terra, deve ser admitido o direito ao benefício com o cômputo de períodos anteriores descontínuos, mesmo que tenha havido a perda da condição de segurado, para fins de implemento de tempo equivalente à carência exigido pela legislação de regência.

Obviamente que o parâmetro a ser adotado analogicamente (1/3 do total da carência necessária) não deve ser compreendido de forma absoluta, pois trata-se de apenas um referencial para balizar a atividade do julgador, no sentido de verificar se o trabalhador efetivamente retornou à condição de rurícola.

No caso, admitida a descontinuidade, e tendo o autor comprovado o efetivo desempenho do labor rural nos últimos 04 anos e 05 meses anteriores ao implemento do requisito etário, não é possível que se adote entendimento restritivo quanto ao conceito de descontinuidade, o que acabaria por deixar ao desamparo segurados que desempenharam longos períodos de atividade rural, mas por terem intercalado períodos significativos de atividade urbana ou mesmo de inatividade, restam excluídos da proteção previdenciária.

No caso, é possível a formação de uma convicção plena, após a análise do conjunto probatório, no sentido de que, efetivamente, houve o exercício da atividade laborativa rurícola em regime de economia familiar no período correspondente à carência.

Com efeito, preenchido o requisito da idade exigida (60 anos, em 11-08- 2015) e comprovado o exercício da atividade rural no período correspondente à carência (180 meses), considerada a data do implemento do requisito etário, deve ser dado parcial provimento ao recurso do INSS, reconhecendo a condição de segurado especial do autor nos períodos descontínuos de 11-08-1967 a 24-02-1999 e de 16-03-2008 até 11-08-2015. Mantém-se a condenação do INSS a conceder o benefício de Aposentadoria Rural por Idade à parte autora, a partir do requerimento administrativo, em 12-09-2017 (art. 49, II, da Lei 8.213/91).

Da tutela específica

Considerando os termos do art. 497 do CPC/2015, que repete dispositivo constante do art. 461 do Código de Processo Civil/1973, e o fato de que, em princípio, a presente decisão não está sujeita a recurso com efeito suspensivo (Questão de Ordem na AC 2002.71.00.050349-7/RS - Rel. p/ acórdão Desembargador Federal Celso Kipper, julgado em 09.08.2007 - 3.ª Seção), o presente julgado deverá ser cumprido de imediato quanto à implantação do benefício concedido em favor da parte autora, no prazo de 45 dias.

Na hipótese de a parte autora já se encontrar em gozo de benefício previdenciário, deve o INSS implantar o benefício deferido judicialmente apenas se o valor da renda mensal atual desse benefício for superior ao daquele.

Faculta-se à parte beneficiária manifestar eventual desinteresse quanto ao cumprimento desta determinação.

Dos Consectários

Correção monetária

A correção monetária das parcelas vencidas dos benefícios previdenciários será calculada conforme a variação dos seguintes índices:

- IGP-DI de 05/96 a 03/2006 (art. 10 da Lei 9.711/98, combinado com o art. 20, §§5.º e 6.º, da Lei 8.880/94);

- INPC a partir de 04/2006 (art. 41-A da lei 8.213/91, na redação da Lei 11.430/06, precedida da MP 316, de 11.08.2006, e art. 31 da Lei 10.741/03, que determina a aplicação do índice de reajustamento dos benefícios do RGPS às parcelas pagas em atraso).

A utilização da TR como índice de correção monetária dos débitos judiciais da Fazenda Pública, que fora prevista na Lei 11.960/2009, que introduziu o art. 1º-F na Lei 9.494/97, foi afastada pelo STF no julgamento do tema 810, através do RE 870947, com repercussão geral, o que restou confirmado, no julgamento de embargos de declaração por aquela Corte, sem qualquer modulação de efeitos. O precedente do STF é aplicável desde logo, uma vez que, nos termos da decisão do Relator, a pendência do julgamento dos embargos de declaração é que motivava a suspensão nacional dos processos.

No julgamento do tema 905, através do REsp 1.495146, e interpretando o julgamento do STF, o STJ definiu quais os índices que se aplicariam em substituição à TR, concluindo que aos benefícios assistenciais deveria ser utilizado IPCA-E, conforme decidiu a Suprema Corte, no recurso representativo da controvérsia e que, aos previdenciários, voltaria a ser aplicável o INPC, uma vez que a inconstitucionalidade reconhecida restabeleceu a validade e os efeitos da legislação anterior, que determinava a adoção deste último índice, nos termos acima indicados.

Ainda que o STJ não tenha levantado a suspensão dos efeitos da tese que firmou no julgamento do Tema 905, nada obsta à utilização dos respectivos argumentos, por esta Turma, como razões de decidir, uma vez que bem explicitam os critérios atualizatórios, a partir da natureza dos benefícios – assistencial ou previdenciária.

A conjugação dos precedentes dos tribunais superiores resulta, assim, na aplicação do INPC aos benefícios previdenciários, a partir de abril 2006, reservando-se a aplicação do IPCA-E aos benefícios de natureza assistencial.

Importante ter presente, para a adequada compreensão do eventual impacto sobre os créditos dos segurados, que os índices em referência - INPC e IPCA-E tiveram variação muito próxima no período de julho de 2009 (data em que começou a vigorar a TR) e até setembro de 2019, quando julgados os embargos de declaração no RE 870947 pelo STF (IPCA-E: 76,77%; INPC 75,11), de forma que a adoção de um ou outro índice nas decisões judiciais já proferidas não produzirá diferenças significativas sobre o valor da condenação.

Juros de mora

Os juros de mora devem incidir a partir da citação.

Até 29.06.2009, já tendo havido citação, deve-se adotar a taxa de 1% ao mês a título de juros de mora, conforme o art. 3.º do Decreto-Lei 2.322/87, aplicável analogicamente aos benefícios pagos com atraso, tendo em vista o seu caráter eminentemente alimentar, consoante firme entendimento consagrado na jurisprudência do STJ e na Súmula 75 desta Corte.

A partir de então, deve haver incidência dos juros, uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo percentual aplicado à caderneta de poupança, nos termos estabelecidos no art. 1º-F, da Lei 9.494/97, na redação da Lei 11.960/2009, considerado, no ponto, constitucional pelo STF no RE 870947, decisão com repercussão geral.

Os juros de mora devem ser calculados sem capitalização, tendo em vista que o dispositivo legal em referência determina que os índices devem ser aplicados "uma única vez" e porque a capitalização, no direito brasileiro, pressupõe expressa autorização legal (STJ, AgRgno AgRg no Ag 1211604/SP).

Das Custas Processuais

O INSS é isento do pagamento das custas no Foro Federal (art. 4.º, I, da Lei 9.289/96). Tratando-se de feitos afetos à competência delegada, tramitados na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul, a autarquia também é isenta do pagamento dessas custas (taxa única), de acordo com o disposto no art. 5.º, I, da Lei Estadual n.º 14.634/14, que institui a Taxa Única de Serviços Judiciais desse Estado, ressalvando-se que tal isenção não a exime da obrigação de reembolsar eventuais despesas judiciais feitas pela parte vencedora (parágrafo único, do art. 5.º). Salienta-se, ainda, que nessa taxa única não estão incluídas as despesas processuais mencionadas no parágrafo único do art. 2.º da referida lei, tais como remuneração de peritos e assistentes técnicos, despesas de condução de oficiais de justiça, entre outras.

Da Verba Honorária

A sentença condenou o INSS ao pagamento de honorários advocatícios, fixados em 10% sobre o valor da condenação, excluídas as parcelas vincendas, observando-se a Súmula 76 desta Corte: "Os honorários advocatícios, nas ações previdenciárias, devem incidir somente sobre as parcelas vencidas até a data da sentença de procedência ou do acórdão que reforme a sentença de improcedência".

Parcialmente procedente a apelação, é incabível a majoração da verba honorária prevista no parágrafo 11 do art. 85 do CPC/2015, uma vez que não se trata de hipótese de não conhecimento ou desprovimento de recurso interposto pela parte condenada ao pagamento de honorários pelo juízo de origem, conforme critérios estabelecidos pela Segunda Seção do STJ no julgamento do AgInt nos EREsp 1.539.725 – DF (DJe: 19.10.2017).

Prequestionamento

A fim de possibilitar o acesso às instâncias superiores, consideram-se prequestionadas as matérias constitucionais e legais suscitadas nos recursos oferecidos pela(s) parte(s), nos termos dos fundamentos do voto, deixando de aplicar dispositivos constitucionais ou legais não expressamente mencionados e/ou havidos como aptos a fundamentar pronunciamento judicial em sentido diverso do que está declarado.

Ante o exposto, voto por dar parcial provimento ao apelo do INSS e determinar a implantação do benefício.



Documento eletrônico assinado por JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001846755v22 e do código CRC 6ae2cd89.Informações adicionais da assinatura:
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Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

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Apelação Cível Nº 5025241-48.2019.4.04.9999/RS

RELATOR: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

APELADO: JOSE ANTONIO DA SILVA SOUZA

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. processual civil. APOSENTADORIA POR IDADE rural. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. PROVA TESTEMUNHAL idônea. DESCONTINUIDADE DO LABOR RURAL. POSSIBILIDADE.Documentos de terceiros. tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentado.REQUISITOS PREENCHIDOS. CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. TUTELA ESPECÍFICA.

1. O tempo de serviço rural para fins previdenciários pode ser demonstrado mediante início de prova material suficiente, desde que complementado por prova testemunhal idônea. 2. Admite-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental. (Súmula n.º 73 deste Regional.) 3. A descontinuidade do labor rurícola permite afastamentos do campo sem que haja a desqualificação como segurado especial, desde que o conjunto probatório demonstre haver um retorno efetivo às lides campesinas, por tempo não inferior a 1/3 da carência necessária (parâmetro que não deve ser compreendido de forma absoluta). 4. Comprovado nos autos o requisito etário e o exercício de atividade rural, no período de carência é de ser concedida a Aposentadoria por Idade Rural à parte autora, a contar do requerimento administrativo, a teor do disposto no art. 49, II, da Lei 8.213/91. 5. Determina-se o cumprimento imediato do acórdão naquilo que se refere à obrigação de implementar o benefício, por se tratar de decisão de eficácia mandamental que deverá ser efetivada mediante as atividades de cumprimento da sentença stricto sensu previstas no art. 497 do CPC/15, sem a necessidade de um processo executivo autônomo (sine intervallo).

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento ao apelo do INSS e determinar a implantação do benefício, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 05 de agosto de 2020.



Documento eletrônico assinado por JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001846756v7 e do código CRC c09e8dd3.Informações adicionais da assinatura:
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Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 27/07/2020 A 05/08/2020

Apelação Cível Nº 5025241-48.2019.4.04.9999/RS

RELATOR: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA

PRESIDENTE: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA

PROCURADOR(A): RODOLFO MARTINS KRIEGER

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

APELADO: JOSE ANTONIO DA SILVA SOUZA

ADVOGADO: TEODORO MATOS TOMAZ (OAB RS045475)

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 27/07/2020, às 00:00, a 05/08/2020, às 14:00, na sequência 1, disponibilizada no DE de 16/07/2020.

Certifico que a 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 6ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PARCIAL PROVIMENTO AO APELO DO INSS E DETERMINAR A IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA

Votante: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA

Votante: Juíza Federal TAIS SCHILLING FERRAZ

Votante: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER

LIDICE PEÑA THOMAZ

Secretária



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