| D.E. Publicado em 12/12/2016 |
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0013461-12.2013.4.04.9999/RS
RELATOR | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | CARMEN TERESA KUNZ |
ADVOGADO | : | Eugenio Schoffen |
REMETENTE | : | JUIZO DE DIREITO DA 1A VARA DA COMARCA DE CERRO LARGO/RS |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. REQUISITOS LEGAIS. TEMPO DE SERVIÇO RURAL EM REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. PERÍODO A PARTIR DE 11/1991. NECESSIDADE DE INDENIZAÇÃO. CARÊNCIA. NÃO PREENCHIMENTO.
1. É possível o aproveitamento do tempo de serviço rural até 31/10/1991 independentemente do recolhimento das contribuições previdenciárias, exceto para efeito de carência.
2. A partir de novembro de 1991, pretendendo o segurado especial computar tempo rural para obtenção de aposentadoria por tempo de contribuição, deverá comprovar o recolhimento das contribuições facultativas (Súmula 272 do STJ).
3. Considera-se provada a atividade rural do segurado especial havendo início de prova material complementado por idônea prova testemunhal.
4. Reconhecido o exercício da atividade rural pela parte autora em período posterior a 31/10/1991, a averbação do tempo correspondente, para fins de aposentadoria por tempo de contribuição, depende do pagamento da indenização referente às contribuições previdenciárias devidas no interregno.
5. Não preenchido o requisito da carência, a parte não tem direito à aposentadoria por tempo de serviço/contribuição.
6. Reconhecida a sucumbência recíproca, vedada a compensação de verba honorária.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação e parcial provimento à remessa oficial, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 29 de novembro de 2016.
Des. Federal ROGER RAUPP RIOS
Relator
| Documento eletrônico assinado por Des. Federal ROGER RAUPP RIOS, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8612141v2 e, se solicitado, do código CRC 6E900772. | |
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APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0013461-12.2013.4.04.9999/RS
RELATOR | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
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APELADO | : | CARMEN TERESA KUNZ |
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REMETENTE | : | JUIZO DE DIREITO DA 1A VARA DA COMARCA DE CERRO LARGO/RS |
RELATÓRIO
Trata-se de apelação e de remessa oficial de sentença em que foi julgado procedente o pedido, para conceder à parte autora aposentadoria por tempo de contribuição, a partir da data do requerimento administrativo, mediante o reconhecimento de exercício de atividade rural em regime de economia familiar, em dispositivo transcrito a seguir:
"Face ao exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido formulado na presente ação previdenciária movida por CARMEN TEREZA KUNZ em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, para o fim de: 1) reconhecer e determinar a averbação do tempo de labor rural como segurado especial, de 1º/11/1991 a 30/11/2001; 2) declarar a requerente aposentada por tempo de contribuição integral a contar da data do pedido administrativo; 3) condenar o requerido ao pagamento ao demandante do valor mensal referente a tal benefício, retroativo até a data do pedido administrativo, além de gratificação natalina. Tais valores deverão ser corrigidos monetariamente pelo IGP-DI desde o vencimento de cada parcela e com juros de 1% ao mês desde a citação. Quanto às parcelas posteriores a 01-07-2009, data em que passou a viger a Lei n.º 11.960, de 29-06-2009, publicada em 30-06-2009, que alterou o art. 1.º-F da Lei n.º 9.494/97, para fins de atualização monetária e juros haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, dos índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança. Ademais, condeno o réu ao pagamento dos honorários advocatícios do procurador da parte contrária, os quais fixo, em atenção às balizadoras do § 3º do art. 20 do Código de Processo Civil, considerando a natureza da causa, em 10% sobre o valor total da condenação, abrangidas as parcelas vencidas até a presente data, sem incidir sobre as vincendas (Súmula nº 111 do Superior Tribunal de Justiça). Custas pelo INSS. Decorrido o prazo, em não havendo a interposição de recurso voluntário, subam os autos em reexame obrigatório ao TRF4ª Região. Publicada em audiência. Registre-se."
Nas suas razões recursais, o INSS sustenta a necessidade de indenização das contribuições referentes ao período de 01/11/1991 a 30/11/2001 para que possa ser computado para fins de concessão de benefício junto ao RGPS. Outrossim, assevera não ter sido preenchida a carência de 180 contribuições mensais exigida para a concessão do benefício, uma vez que o tempo rural anterior à vigência da Lei 8.213/91 não pode ser computado para tal efeito. Postula a isenção do pagamento das custas processuais.
Apresentadas as contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
É o relatório.
VOTO
Do novo CPC (Lei 13.105/2015)
Consoante a norma inserta no art. 14 do atual CPC, Lei 13.105, de 16/03/2015, "a norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada". Portanto, apesar da nova normatização processual ter aplicação imediata aos processos em curso, os atos processuais já praticados, perfeitos e acabados não podem mais ser atingidos pela mudança ocorrida a posteriori.
Nesse sentido, serão examinados segundo as normas do CPC de 2015 tão somente os recursos e remessas em face de sentenças/acórdãos publicado(a)s a contar do dia 18/03/2016.
Da ordem cronológica dos processos
Dispõe o art. 12 do atual CPC (Lei nº 13.105/2015, com redação da Lei nº 13.256/2016) que "os juízes e os tribunais atenderão, preferencialmente, à ordem cronológica de conclusão para proferir sentença ou acórdão", estando, contudo, excluídos da regra do caput, entre outros, "as preferências legais e as metas estabelecidas pelo Conselho Nacional de Justiça" (§2º, inciso VII), bem como "a causa que exija urgência no julgamento, assim reconhecida por decisão fundamentada" (§2º, inciso IX).
Dessa forma, deverão ter preferência de julgamento em relação àqueles processos que estão conclusos há mais tempo, aqueles feitos em que esteja litigando pessoa com mais de sessenta anos (idoso, Lei n. 10.741/2013), pessoas portadoras de doenças indicadas no art. 6º, inciso XIV, da Lei n. 7.713/88, as demandas de interesse de criança ou adolescente (Lei n. 8.069/90) ou os processos inseridos como prioritários nas metas impostas pelo CNJ.
Observado que o caso presente se enquadra em uma das hipóteses referidas (a saber: metas do CNJ), justifica-se seja proferido julgamento fora da ordem cronológica de conclusão.
Da controvérsia
A parte autora ajuizou a presente demanda objetivando a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição desde a DER (01/12/2011) mediante o reconhecimento do exercício de atividade rural em regime de economia familiar nos períodos de 02/10/1969 a 30/04/1978 e de 04/02/1979 a 30/11/2001.
Com a juntada do processo administrativo, ficou demonstrado que a autarquia já havia reconhecido administrativamente o desempenho de atividade rural pela autora nos intervalos de 02/10/1969 a 30/04/1978 e de 04/02/1979 a 31/10/1991 (fl. 173).
Assim, na decisão da fl. 208, o pedido foi parcialmente extinto, sem resolução de mérito, por falta de interesse de agir, prosseguindo com relação ao período de 01/11/1991 a 30/11/2001.
A sentença, por sua vez, reconheceu o período de 01/11/1991 a 30/11/2001 como tempo rural e determinou sua averbação, concedendo à parte autora o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição integral a partir da DER. A análise do caso concreto por ocasião da prolação da sentença restou exarada nos seguintes termos:
"No mérito, cuida-se de ação previdenciária, em que objetiva a requerente a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, em razão de exercício de atividade rural. Para o reconhecimento da condição de segurado especial, é necessário o implemento dos requisitos estabelecidos na Lei nº 8.213/91. A comprovação da atividade rural em regime de economia familiar, em que o trabalho dos membros da família é indispensável à própria subsistência, exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem utilização de empregados, nos moldes do art. 11, VII, §1º, da Lei 8.213/91, restou demonstrada. A Lei nº 8.213/91, em seu art. 55, § 3º, exige início de prova material da atividade rurícola, o que também é objeto do verbete 149, do STJ, não bastando a prova oral para a comprovação do exercício de tal atividade. Por início de prova material devem-se entender aqueles documentos ordinariamente produzidos pela parte, em suas relações sociais. Tratando-se de atividade rural, por óbvio que se torna inexigível documentação farta, escrita ou firmada por entidades de direito público. Isso porque, tais trabalhadores, na maioria das vezes, possuem pouca instrução ou poucos recursos financeiros. A corroborar tal entendimento, cito a seguinte ementa: "(...)" Na hipótese dos autos, tem-se início da prova material através dos documentos fornecidos pela parte autora, quais sejam: certidão de casamento, em que consta a profissão do marido da autora como agricultor (fl. 46); certidão de casamento de fl. 57, que consta o pai da autora como agricultor; certidão do INCRA de fl. 59; certidão de fl. 60; escritura de fl. 61; certidão de fl. 62; documentos de fls. 65/71; contrato de arredamento de fls. 72/74; certidões de nascimento de fls. 75/76; e notas de produtor rural de fls. 87/155. Tais provas servem como princípio de prova material de que exerceu atividade rurícola em regime de economia familiar, devendo ser consignado que o fato de estarem alguns documentos em nome de seus familiares, notadamente seu marido, não impede que sejam considerados em seu proveito. Nesse sentido, o TRF 4ª Região tem-se manifestado: "(...)" Contrariamente ao sustentado pela autarquia, a prova produzida denota que o autor laborava na terra, sem o auxílio de funcionários, em regime de economia familiar para subsistência. A prova testemunhal, por sua vez, corroborou o início de prova material, sendo categórica no sentido de que o requerente desempenhou atividade agrícola em regime de economia familiar. Outrossim, não é da natureza de tal atividade a sua escrituração, sendo as relações daí advindas, em grande parte dos casos, mantida por manifestação verbal. Nesse sentido, a jurisprudência já decidiu: "(...)" Assim, entendo que a requerente comprovou, à saciedade, as atividades desenvolvidas na lavoura, juntamente com sua família. Saliento que, conforme decisão de fl. 208, o período de 02/10/1969 a 30/10/1978, e 04/02/1979 a 30/10/1991 já foi reconhecido administrativamente, já tendo sido extinto o feito quanto a tal lapso temporal. Assim, faz jus à aposentadoria."
Neste feito, o exame recursal abrange a apelação cível e a remessa oficial, expressamente interpostas diante da sentença recorrida.
Nessas circunstâncias, havendo recurso de apelação por parte do INSS, onde suscitados os tópicos indicados no relatório, tenho que quanto aos demais fundamentos de mérito a sentença deve ser confirmada por suas próprias razões, uma vez que lançada conforme a legislação aplicável. Tanto que a autarquia previdenciária deles teve expressa ciência e resolveu não se insurgir.
Assim, a controvérsia restringe-se à necessidade de indenização para averbação do período rural posterior à vigência da Lei 8.213/91 e ao preenchimento do requisito da carência.
Do tempo de serviço rural
O aproveitamento do tempo de atividade rural exercido até 31 de outubro de 1991 - independentemente do recolhimento das respectivas contribuições previdenciárias e exceto para efeito de carência - está expressamente autorizado e previsto pelo art. 55, § 2º, da Lei n.º 8.213/91, e pelo art. 127, inc. V, do Decreto n.º 3.048/99. Quando exercido em regime de economia familiar, aproveita tanto ao arrimo de família quanto aos demais membros do grupo familiar que com ele laboram, porquanto a todos estes integrantes foi estendida a condição de segurado, nos termos do art. 11, inc. VII, da lei previdenciária (STJ, REsp 506.959/RS, 5ª Turma, Rel. Min. Laurita Vaz, DJU de 10/11/2003).
Pode o exercício do labor rural ser comprovado mediante a produção de início de prova material, complementada por prova testemunhal idônea - quando necessária ao preenchimento de eventuais lacunas - não sendo esta admitida exclusivamente, a teor do disposto no art. 55, § 3º, da Lei n.º 8.213/91, e na Súmula n.º 149 do STJ ("A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de benefício previdenciário).
Cabe salientar que, embora o art. 106 da Lei de Benefícios relacione os documentos aptos a essa comprovação, tal rol não é exaustivo; ademais, não se exige prova documental plena da atividade rural em relação a todos os anos integrantes do período correspondente à carência, mas um documento que, juntamente com a prova oral, criando um liame com a circunstância fática que se quer demonstrar, possibilite um juízo de valor seguro.
Também não é necessário que o início de prova material seja contemporâneo à época dos fatos que se pretende comprovar, conforme se vê do § 3º, do art. 55 da Lei 8.213. Tal exigência implicaria introdução indevida em limites não estabelecidos pelo legislador, e que devem ser de pronto afastados.
Ademais, já restou firmado pelo Colendo STJ, na Súmula 577 (DJe 27/06/2016) que "É possível reconhecer o tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentado, desde que amparado em convincente prova testemunhal colhida sob o contraditório.".
Observa-se que as certidões da vida civil são hábeis a constituir início probatório da atividade rural da parte autora, nos termos na jurisprudência pacífica do Superior Tribunal de Justiça (REsp n.º 980.065/SP, Quinta Turma, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, j. em 20-11-2007, DJU, Seção 1, de 17-12-2007, p. 340, e REsp n.º 637.437/PB, Relatora Ministra Laurita Vaz, Quinta Turma, j. em 17-08-2004, DJU, Seção 1, de 13-09-2004, p. 287, REsp n.º 1.321.493-PR, Primeira Seção, Relator Ministro Herman Benjamim, DJe em 19-12-2012, submetido à sistemática dos recursos repetitivos.).
De outro lado, nada impede que sejam considerados os documentos emitidos em período próximo ao controverso, desde que levem a supor a continuidade da atividade rural.
No regime de economia familiar (§1º do art. 11 da Lei de Benefícios) em que os membros da família trabalham "em condições de mútua dependência e colaboração", os atos negociais da entidade respectiva, via de regra, serão formalizados não de forma individual, mas em nome daquele considerado como representante do grupo familiar perante terceiros. Assim, os documentos apresentados em nome de algum dos integrantes da mesma família consubstanciam início de prova material do labor rural, conforme preceitua a Súmula 73 deste Tribunal: "Admitem-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental".
A existência de assalariados nos comprovantes de pagamento de ITR não tem o condão, por si só, de descaracterizar a atividade agrícola em regime individual ou mesmo de economia familiar, pois o mero fato dessa anotação constar nos referidos documentos não significa, inequivocamente, regime permanente de contratação, devendo cada caso ser analisado individualmente de modo a que se possa extrair do conjunto probatório dos autos, a natureza do auxílio de terceiros (se eventual ou não), enquadrando-se assim na previsão do art. 11, VII da Lei 8.213/91, que define o segurado especial. Mesmo o fato de constar a qualificação empregador II b nos respectivos recibos de ITR não implica a condição de empregador rural . Ocorre que a simples qualificação no documento não desconfigura a condição do trabalho agrícola em regime de economia familiar, como se pode ver da redação do artigo 1º, II, "b", do Decreto-Lei 1166, de 15.04.71.
Importante ainda ressaltar que o fato de o cônjuge exercer atividade outra que não a rural também não é "per se stante" para descaracterizar automaticamente a condição de segurado especial de quem postula o benefício, pois, de acordo com o que dispõe o inciso VII do art. 11 da Lei nº 8.213/91, é segurado especial o produtor, o parceiro, o meeiro e o arrendatário rurais, o pescador artesanal e o assemelhado, que exerçam suas atividades, individualmente ou em regime de economia familiar, ainda que com o auxílio eventual de terceiros, bem como seus respectivos cônjuges ou companheiros e filhos maiores de 14 anos ou a eles equiparados, desde que trabalhem, comprovadamente, com o grupo familiar respectivo; ou seja, ainda que considerado como trabalhador rural individual, sua situação encontra guarida no permissivo legal referido, sendo certo também que irrelevante a remuneração percebida pelo cônjuge, que não se comunica ou interfere com os ganhos oriundos da atividade agrícola.
No tocante ao trabalho do segurado especial em regime de economia familiar a partir dos 12 anos de idade, a Terceira Seção desta Corte ao apreciar os Embargos Infringentes em AC n.º 2001.04.01.025230-0/RS, Rel. Juiz Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, na sessão de 12-03-2003, firmou entendimento no sentido da possibilidade de seu cômputo, na esteira de iterativa jurisprudência do egrégio Superior Tribunal de Justiça, tendo a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, ao julgar o AI n.º 529.694/RS, da relatoria do Ministro Gilmar Mendes, com decisão publicada no DJU de 11-03-2005, reconhecido o tempo de serviço agrícola ao menor de quatorze anos, não merecendo a questão maiores digressões.
Como destacado no tópico anterior, não há controvérsia acerca do desempenho da atividade rural em regime de economia familiar pela autora no período de 01/11/1991 a 30/11/2001; os documentos juntados constituem início de prova material e a prova testemunhal é precisa quanto ao exercício do labor rurícola no período postulado.
A discussão reside na necessidade do pagamento de indenização das contribuições devidas no período para que o tempo correspondente seja averbado e computado para fins de concessão de aposentadoria por tempo de contribuição.
Com efeito, a partir da competência novembro de 1991, em observância ao princípio constitucional da anterioridade previsto no art. 195, §6º, da Constituição Federal (90 dias para a instituição de contribuições para a seguridade social), pretendendo o segurado especial computar tempo de serviço rural para obtenção de aposentadoria por tempo de contribuição, deverá comprovar o recolhimento de contribuições facultativas, conforme dispõe o art. 39, II, da Lei nº 8.213/91. Significa dizer que a contribuição obrigatória sobre percentual retirado da receita bruta da comercialização da produção rural, prevista no art. 25 da Lei nº 8.212/91, não garante ao segurado especial a aposentadoria por tempo de serviço, pois tal benefício, conforme se depreende do exame dos arts. 11, inciso VII, e 39, I e II, da Lei nº 8.213/91, tem sua concessão condicionada ao recolhimento facultativo de contribuições.
Tal entendimento restou assim sumulado pelo Superior Tribunal de Justiça, em 11/09/2002:
Súmula 272 - "O trabalhador rural, na condição de segurado especial, sujeito à contribuição obrigatória sobre a produção rural comercializada, somente faz jus à aposentadoria por tempo de serviço, se recolher contribuições facultativas."
Nesse passo, a averbação e aproveitamento do intervalo de 01/11/1991 a 30/11/2001, em que a autora desempenhou atividade rural em regime de economia familiar, para fins de aposentadoria por tempo de contribuição depende do pagamento da indenização referente às contribuições previdenciárias correspondentes.
Conclusão: Fica mantida a sentença quanto ao reconhecimento do exercício da atividade rural pela autora no intervalo de 01/11/1991 a 30/11/2001, ressalvado que a sua averbação e aproveitamento para fins de aposentadoria depende do pagamento da indenização referente às contribuições previdenciárias correspondentes.
Da aposentadoria por tempo de serviço/contribuição
A aposentadoria por tempo de serviço, extinta pela Emenda Constitucional nº 20, de 15.12.1998 e transformada em aposentadoria por tempo de contribuição, foi garantida (art. 3º) aos segurados da previdência social que, até a data da publicação da Emenda, em 16.12.98, tivessem cumprido os requisitos para sua obtenção, com base nos critérios da legislação então vigente (arts. 29, caput, e 52 a 56 da Lei nº 8.213/91, na sua redação original), quais sejam: a) 25 anos de tempo de serviço, se mulher, ou 30 anos, se homem e b) carência (conforme a tabela do art. 142 da Lei nº 8.213/91, inscritos até 24-7-1991, ou conforme o art. 25, II, da Lei, para os inscritos posteriormente). O valor da aposentadoria corresponde a 70% do salário-de-benefício, acrescido de 6% por ano para cada ano completo de atividade até o máximo de 100% (aposentadoria integral), o que se dá aos 30 anos de tempo de serviço para as mulheres, e 35 para os homens.
Oportuno enfatizar que o direito adquirido a tal modalidade de benefício exige a satisfação de todos os requisitos até a data da EC nº 20/98, já que, a partir de então, passa a viger a aposentadoria por tempo de contribuição, consoante previsão do art. 201, §7º, da Constituição Federal, para a qual exigem-se 35 anos de contribuição, se homem, ou 30, se mulher, e carência de 180 contribuições mensais.
Em caráter excepcional, para os segurados filiados até a data da publicação da Emenda, foi estabelecida regra de transição no art. 9º, §1º, possibilitando aposentadoria proporcional quando, o segurado I) contando com 53 anos de idade, se homem, e 48 anos, se mulher e, atendido o requisito da carência, II) atingir tempo de contribuição igual, no mínimo, à soma de: a) 30 anos, se homem, e 25, se mulher; e b) um período adicional de contribuição (pedágio) equivalente a 40% do tempo que, na data da publicação da Emenda, faltaria para atingir o mínimo de tempo para a aposentadoria proporcional. O valor da aposentadoria proporcional será equivalente a 70% do salário-de-benefício, acrescido de 5% por ano de contribuição que supere a soma a que se referem os itens a e b supra, até o limite de 100%).
De qualquer modo, o disposto no art. 56 do Decreto n.º 3.048/99 (§3º e 4º) expressamente ressalvou, independentemente da data do requerimento do benefício, o direito à aposentadoria pelas condições legalmente previstas à época do cumprimento de todos os requisitos, assegurando sua concessão pela forma mais benéfica, desde a entrada do requerimento.
Forma de cálculo da renda mensal inicial (RMI)
A renda mensal inicial do benefício será calculada de acordo com as regras da legislação infraconstitucional vigente na data em que o segurado completar todos os requisitos do benefício.
Assim, o segurado que completar os requisitos necessários à aposentadoria antes de 29/11/1999 (início da vigência da Lei n.º 9.876/99), terá direito a uma RMI calculada com base na média dos 36 últimos salários-de-contribuição apurados em período não superior a 48 meses (redação original do art. 29 da Lei n.º 8.213/91), não se cogitando da aplicação do fator previdenciário, conforme expressamente garantido pelo art. 6º da respectiva lei.
Completando o segurado os requisitos da aposentadoria já na vigência da Lei nº 9.876/99 (em vigor desde 29.11.1999), o período básico do cálculo (PBC) estender-se-á por todo o período contributivo, extraindo-se a média aritmética dos 80% maiores salários-de-contribuição, a qual será multiplicada pelo "fator previdenciário" (Lei n.º 8.213/91, art. 29, I, e §7º).
Do direito à aposentadoria no caso concreto
Mesmo excluído o tempo de serviço rural correspondente ao período de 01/11/1991 a 30/11/2001 (cujo aproveitamento depende do pagamento da indenização), verifica-se que a parte autora já contava, na DER (01/12/2011), com 31 anos, 10 meses e 25 anos de tempo de contribuição (fl. 176), preenchendo o requisito temporal exigido pela lei para a concessão do benefício postulado.
Entretanto, a carência de 180 meses, necessária à obtenção do benefício de aposentadoria no ano de 2011 (art. 142 da Lei nº 8.213/91) não restou cumprida.
Verifica-se do documento da fl. 176 que, na DER, a parte autora possuía 127 contribuições mensais para fins de carência, uma vez que os períodos de labor rural em regime de economia familiar reconhecidos na via administrativa (de 02/10/1969 a 30/04/1978 e de 04/02/1979 a 31/10/1991) não podem ser computados para tal efeito, a teor do art. 55, § 2º da Lei 8.213/91. Inclusive esse foi o motivo do indeferimento do benefício na esfera administrativa (fl. 32).
Não cumprindo com todos os requisitos legais, a parte autora não tem direito à concessão do benefício. A averbação do período de 01/11/1991 a 30/11/2001 depende da indenização pertinente, devendo a autarquia apresentar o cálculo correspondente.
Dos ônus sucumbenciais
Reconheço a sucumbência recíproca, razão pela qual condeno cada uma das partes no pagamento de metade das custas processuais e no pagamento dos honorários advocatícios da parte adversa; arbitrados em R$ 880,00 (oitocentos e oitenta reais), considerando que a fixação em 10% sobre o valor dado à causa resultaria em montante irrisório. Fica, no entanto, vedada a compensação da verba honorária.
Deverá, ainda, ser observada a isenção prevista pela Lei Estadual 13.471/2010 com relação ao INSS; bem como a suspensão da exigibilidade das verbas de sucumbência com relação à parte autora, por ser beneficiária da gratuidade de justiça (art. 12 da Lei 1060/50).
Conclusão
O apelo da autarquia foi provido e a remessa oficial, parcialmente provida para o fim de: a) reconhecer a necessidade de indenização das contribuições previdenciárias devidas no período de 01/11/1991 a 30/11/2001 para fins de averbação junto ao RGPS; b) afastar a condenação à concessão de aposentadoria por tempo de contribuição por não ter sido preenchido o requisito da carência; e c) isentar o INSS do pagamento das custas processuais, nos termos da Lei Estadual nº 13.471/2010.
Foi reconhecida a sucumbência recíproca, vedada a compensação de verba honorária.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar provimento à apelação e parcial provimento à remessa oficial.
É o voto.
Des. Federal ROGER RAUPP RIOS
Relator
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 29/11/2016
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0013461-12.2013.4.04.9999/RS
ORIGEM: RS 4311200003590
RELATOR | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
PRESIDENTE | : | Paulo Afonso Brum Vaz |
PROCURADOR | : | Dr. Jorge Luiz Gasparini da Silva |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | CARMEN TERESA KUNZ |
ADVOGADO | : | Eugenio Schoffen |
REMETENTE | : | JUIZO DE DIREITO DA 1A VARA DA COMARCA DE CERRO LARGO/RS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 29/11/2016, na seqüência 940, disponibilizada no DE de 16/11/2016, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 5ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO E PARCIAL PROVIMENTO À REMESSA OFICIAL.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
: | Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ | |
: | Des. Federal ROGERIO FAVRETO |
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
| Documento eletrônico assinado por Lídice Peña Thomaz, Secretária de Turma, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8740058v1 e, se solicitado, do código CRC A3700D4F. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Lídice Peña Thomaz |
| Data e Hora: | 30/11/2016 16:53 |
