| D.E. Publicado em 02/10/2017 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0004846-62.2015.4.04.9999/SC
RELATOR | : | Des. Federal CELSO KIPPER |
APELANTE | : | INEZ BARBIERI THOMAZZONI |
ADVOGADO | : | Eliane Paula Braatz |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. AUXÍLIO-DOENÇA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. QUALIDADE DE SEGURADO ESPECIAL. EXTENSÃO DA PROPRIEDADE. CONTRATAÇÃO DE EMPREGADOS PERMANENTES. NÃO COMPROVAÇÃO. AUXÍLIO DE VIZINHOS. POSSIBILIDADE. INCAPACIDADE LABORAL. TERMO INICIAL. PRINCÍPIO DA FUNGIBILIDADE.
1. É devido o reconhecimento do tempo de serviço rural, em regime de economia familiar, quando comprovado mediante início de prova material corroborado por testemunhas.
2. A extensão da propriedade não constitui óbice, por si só, ao reconhecimento da condição de segurado especial, devendo ser analisada juntamente com o restante do conjunto probatório que, na hipótese, confirmou o exercício da atividade rural somente pelo grupo familiar.
3. O auxílio eventual de terceiros no exercício da atividade rural sob o regime de "troca de dia" ou "empréstimo de máquinas" não descaracteriza o regime de economia familiar.
4. Tratando-se de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez, o Julgador firma sua convicção, via de regra, por meio da prova pericial.
5. Tendo o conjunto probatório apontado a existência da incapacidade laboral desde a época do requerimento administrativo, o benefício é devido desde então e, após a juntada do laudo pericial judicial que atestou a sua total e permanente incapacidade, convertido em aposentadoria por invalidez.
6. Este Regional tem o entendimento consolidado de que os benefícios previdenciários de auxílio-doença, aposentadoria por invalidez e assistencial à pessoa com deficiência são fungíveis, cabendo ao magistrado (e mesmo ao INSS, em sede administrativa) conceder à parte ou a conversão, o benefício apropriado à sua condição fática, sem que disso resulte julgamento extra petita.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Turma Regional suplementar de Santa Catarina do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação da parte autora determinar o cumprimento imediato do acórdão no tocante à implantação do benefício da parte autora, e diferir, de ofício, para a fase de execução, a forma de cálculo dos juros e da correção monetária, adotando-se inicialmente o índice da Lei 11.960/2009, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 14 de setembro de 2017.
Des. Federal CELSO KIPPER
Relator
| Documento eletrônico assinado por Des. Federal CELSO KIPPER, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9101794v6 e, se solicitado, do código CRC 4FB5900B. | |
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| Signatário (a): | Celso Kipper |
| Data e Hora: | 21/09/2017 14:35 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0004846-62.2015.4.04.9999/SC
RELATOR | : | Des. Federal CELSO KIPPER |
APELANTE | : | INEZ BARBIERI THOMAZZONI |
ADVOGADO | : | Eliane Paula Braatz |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
RELATÓRIO
Cuida-se de apelação contra sentença, publicada em 10-10-2014, na qual o magistrado a quo julgou improcedente o pedido de concessão do benefício de auxílio-doença, condenando a parte autora ao pagamento de custas processuais e de honorários advocatícios, os quais restaram suspensos em razão do benefício da assistência judiciária gratuita.
Em suas razões, a parte autora sustenta que a perícia realizada no INSS a considerou incapaz (DER 21-06-2012), todavia, o indeferimento do benefício ocorreu em razão da alegada falta de condição de segurada. Argumenta que a ação foi proposta com o objetivo de comprovar, por meio de notas de produtor e a prova testemunhal, a condição de segura especial da autora. Relata que o médico perito judicial considerou a parte autora capaz, todavia, tal conclusão vai de encontro as provas juntadas e a conclusão do perito no âmbito administrativo que a declarou inapta ao traballho. Assim, requer a concessão do benefício de auxílio-doença ou, ao menos, o reconhecimento de tal direito no período entre a DER (21-06-2012) e a perícia judicial que a considerou capaz (17-06-2013).
Sem contrarrazões, vieram os autos a esta Corte para julgamento.
Neste Tribunal, o Relator, diante da controvérsia existente entre o laudo do perito do INSS e o expert nomeado pelo juízo acerca da capacidade, ou não, da autora, converteu o julgamento em diligência, a fim de se verificar, com a nomeação de novo perito, a situação de saúde da autora, respondendo a todos os quesitos já apresentados pelas partes, bem como estabelecer se, desde a DER (26-05-2012) até os dias atuais, houve períodos de incapacidade laboral.
Cumprida a diligência, laudo juntado às fls. 173/176, cujo conteúdo as partes foram intimadas (fls. 177, 179 e 182-v).
É o relatório.
VOTO
Qualidade de segurado e carência mínima
A controvérsia cinge-se à verificação da qualidade de segurado especial da autora e, caso preenchido tal requisito, à análise da existência de incapacidade que enseje a concessão de auxílio-doença desde a data do requerimento administrativo.
O exercício de atividade rural deve ser comprovado mediante a produção de prova material suficiente, ainda que inicial, complementada por prova testemunhal idônea, não sendo esta admitida exclusivamente, a teor do art. 55, § 3º, da Lei n. 8.213/91 e da Súmula 149 do Eg. STJ. Embora o art. 106 da Lei de Benefícios relacione os documentos aptos a essa comprovação, tal rol não é exaustivo, sendo certa a possibilidade de alternância das provas ali referidas. Não se exige prova plena da atividade rural de toda a vida do autor, mas um início de documentação que, juntamente com a prova oral, possibilite um juízo de valor seguro de que o labor campesino fora exercido contemporaneamente ao período equivalente à carência.
Para comprovação da qualidade de segurado especial, a autora trouxe aos autos os seguintes documentos:
a) notas de produtor rural, datada de 2011, em nome do marido da autora (fl. 23);
b) notas de produtor rural, datadas de 2012, em nome da autora e esposo (fls. 23/24);
c) recibo de declaração de imposto sobre propriedade territorial rural, constando área de 67,8 hectares, em nome do marido da autora, datado de 2011 (fl. 17).
No dia 12-11-2013, em audiência, foram colhidos os depoimentos da autora e de duas testemunhas; em continuidade ao ato, no dia 10-12-2013, foi colhido o depoimento da terceira testemunha (CDs juntados às fls. 113 e 126), cujos áudios passo a transcrever:
Testemunha João Pasquali:
Relatou que é vizinho da autora durante toda a vida, a autora mora na zona rural, acredita que a terra da autora, juntamente com o marido, compõe o montante de 20 alqueires, nessa propriedade mora autora, esposo e os filhos, que fica numa área próxima a casa da sogra, nessa área eles cultivam tudo na agricultura, milho, soja, feijão, arroz e vaca de leite, comercializam alguma coisa para sobrevivência, não sabe se possuem outra fonte de renda, o marido da autora também vive exclusivamente da agricultura. O senhor Claudir Tomazzoni trabalharam em parceira juntos com a autora e marido, ajudando, emprestando as máquinas, não contavam com ajuda de terceiros como empregados, a ajuda era no plantio, com o empréstimo de máquinas por um tempo; a autora permanece trabalhando até hoje, menos do que antes, mas todo o dia vai na propriedade, todo o dia ela está presente no serviço, os filhos não vão mais.
Testemunha Jucelino Bonatto:
Descreveu que é vizinho da autora e que a propriedade mede umas duas colônias, plantam na roça, hoje um pouco menos, em razão dos problemas de saúde, plantavam soja, milho, a autora e o marido, hoje os filhos trabalham fora, como vizinho auxiliam um pouco, o marido da autora vive só da roça, antigamente, há muitos anos, quando era solteiro, o marido foi motorista, depois que casou com a autora, sempre na roça, o sustento é retirado da produção, a autora ajudava, sempre trabalhou junto, atualmente está com problema de saúde e não consegue trabalhar e a cada vez vai se agravando mais. Senhor Claudir é o irmão do marido da autora, não trabalha na terra, mas já ajudou emprestando máquina, ajudando a plantar, não sabe se arrendaram, somente ajudavam. Senhor Claudir trabalhava na agricultura, hoje trabalha na cidade.
Testemunha Fernanda Favaro:
Relatou que é médica psiquiátrica da autora que a atende há uns três anos; descreveu que a autora há procurou há uns três anos com um quadro de depressão e com traços psicóticos, ouvindo vozes, vendo vultos e delírios, acreditando que os vizinhos estavam a envenenando, diz que a tratou para a depressão, mas a psicose permanece, já utilizou medicamento, mas não está apresentando melhora dos delírios, o quadro psicótico permanece, pensa que a sogra a quer envenenar, já efetuou troca de remédio, mas não vem apresentando melhora, o diagnóstico é transtorno delirante persistente, mesmo com alteração e aumento da dose do remédio não vê melhora por parte da autora, não tem muita resposta ao tratamento; o grau da patologia é moderada, as atividades da autora eram na agricultura; a autora está comprometida, mas não é incapaz de gerir seu dinheiro, por exemplo, dos delírios ela nunca melhorou; nas sessões de terapia verifica o grau agudo das alucinações da autora; não acredita que a autora no grau da doença possa trabalhar; a autora passa com medo o tempo todo; os delírios vem se agravando; no último ano o quadro da autora se agravou; ela tem uma certa cognição; não se opõe ao medicamento; as alucinações causam um quadro disfuncional na autora.
Os documentos juntados aos autos, bem como o depoimento das testemunham comprovam que a autora desempenhou, ao longo de sua vida, a atividade rural. Ao que tudo indica, na data da DER (26-05-2012), embora com alguma dificuldade por conta de seu estado clínico, ainda realizava as lides campesinas.
A condição de segurado especial, para aquele que desenvolve atividade rural, individualmente ou em regime de economia familiar, deve ser verificado a partir da análise de vários elementos probatórios.
No caso, as notas de produtor (fls. 22/25), a declaração da utilização total da terra para o cultivo (fl. 20), corroborado pela prova oral que foi uníssona no sentido de que a autora, juntamente com o marido, desempenhava a atividade rural de forma plena, ao menos, até meados de 2012, período contemporâneo a DER. Demais, em consulta ao sistema Cnis, cujo extrato determino a juntada, vê-se que o marido da autora possui registro de atividade rural de segurado especial desde 1992, o que fortalece a condição de segura especial da autora, realizando atividade rural na companhia do marido.
Ressalto que eventual ajuda de terceiros, como parentes e vizinhos, na troca de trabalho ou no empréstimo de máquinas, por si só, não tem o condão de desconstituir a qualidade de segurada da autora. Resta afastada, assim, a alegação do INSS de que a autora perdera a qualidade de segurada a partir de 2011, por ter declarado, na entrevista rural, que arrendou a terra para seu cunhado (Sr. Claudir). Fl. 66.
O depoimento das testemunhas foi claro no sentido de que o cunhado (Sr. Claudir), na realidade, ajudava o casal no plantio, com o empréstimo de máquina e troca de serviço em período de colheitas.
Nessa linha, colaciono julgado desta Corte:
PREVIDENCIÁRIO. CARACTERIZAÇÃO DE SEGURADO ESPECIAL. CONTRATAÇÃO DE EMPREGADOS PERMANENTES. NÃO COMPROVAÇÃO. AUXÍLIO DE VIZINHOS. POSSIBILIDADE. 1. A comprovação do exercício de atividade rural pode ser efetuada mediante início de prova material, complementada por prova testemunhal idônea. 2. O auxílio eventual de terceiros no exercício da atividade rural sob o regime de "troca de dia" não descaracteriza o regime de economia familiar em face da previsão insculpida no §7º do art. 11 da Lei 8.213/91. (TRF4, AC 5042697-16.2016.404.9999, SEXTA TURMA, Relatora VÂNIA HACK DE ALMEIDA, juntado aos autos em 15/12/2016).
Vê-se, ainda, que na cópia do processo administrativo de reconhecimento de atividade rural, há anotação de que outro fator a descaracterizar a qualidade de segurada da autora seria a dimensão da terra, superior a 4 módulos fiscais (fl. 26).
No entanto, esta Corte tem o entendimento de que a extensão da terra, considerada isoladamente, não pode ser um elemento a desconfigurar a condição de segurado especial.
Nesse passo, colaciono precedentes deste Tribunal:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. REQUISITOS PREENCHIDOS. EXTENSÃO DA PROPRIEDADE. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA. FASE DE CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. DIFERIMENTO. 1. O tempo de serviço rural, cuja existência é demonstrada por testemunhas que complementam início de prova material, deve ser reconhecido ao segurado em regime de economia familiar ou individual. 2. Uma vez completada a idade mínima (55 anos para a mulher e 60 anos para o homem) e comprovado o exercício da atividade agrícola no período correspondente à carência (art. 142 da Lei nº 8.213/1991), é devido o benefício de aposentadoria por idade rural. 3. A extensão da propriedade não constitui óbice, por si só, ao reconhecimento da condição de segurado especial, devendo ser analisada com o restante do conjunto probatório. 4. Deliberação sobre índices de correção monetária e taxas de juros diferida para a fase de cumprimento de sentença, a iniciar-se com a observância dos critérios da Lei 11.960/2009, de modo a racionalizar o andamento do processo, permitindo-se a expedição de precatório pelo valor incontroverso, enquanto pendente, no Supremo Tribunal Federal, decisão sobre o tema com caráter geral e vinculante. Precedentes do STJ e do TRF da 4ª Região. (TRF4, APELREEX 0019576-78.2015.404.9999, SEXTA TURMA, Relatora SALISE MONTEIRO SANCHOTENE, D.E. 11/07/2017).
O conjunto probatório, portanto, demonstra o exercício da atividade rural pela parte autora, em regime de economia familiar, no período equivalente ao da carência exigida à concessão do benefício postulado.
Incapacidade laboral
Resta, pois, averiguar a existência de incapacidade laboral que justifique a concessão do benefício postulado.
Tratando-se de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez, o Julgador firma sua convicção, via de regra, por meio da prova pericial.
No caso concreto, foi realizada perícia médica judicial, por especialista em 19-06-2013. Respondendo aos quesitos formulados, assim se manifestou o perito: "A pericianda apresenta como diagnóstico Transtorno de estresse pós-traumático, referente ao código F43.1 do Código Internacional de Doenças (COD - 10)". A conclusão da perícia judicial foi no sentido de que "A pericianda apresenta condições psiquiátricas de exercer atividades laborais remuneradas".
Observa-se, no entanto, que a conclusão do médico perito do INSS, no dia 21-06-2012 - fl. 67, foi no sentido de que havia incapacidade laborativa da parte autora, tendo em conta Transtorno afetivo bipolar, episódio atual maníaco com sintomas psicóticos (F312). O indeferimento do pedido de auxílio-doença deu-se em razão da alegada perda da qualidade de segurada, argumento esse já afastado.
Diante da inconsistência no diagnóstico da autora, este Tribunal, converteu o julgamento em diligência para que outro perito efetuasse o diagnóstico - fls. 155/156.
Às fls. 173/174, juntou-se, em 18-07-2016, nova perícia, em que consta breve relatório sobre os problemas psiquiátricos enfrentados pela autora desde 2010. Constou ser a parte autora portadora de doença esquizofrênica, razão pela qual está incapacitada para atividade laboral de forma absoluta e permanente. Ao final, constou que o quadro da autora é incurável e definitivo.
Essas conclusões do perito judicial são corroboradas pelos registros médicos juntados da Prefeitura Municipal de Passos Maia, em que constam atendimentos com queixas da parte autora de ordem psíquica desde 2004 - fl. 48 e 50, tais como, pânico, depressão e ansiedade, bem assim o uso de medicação especial -fl. 49.
Soma-se a tal laudo, a conclusão da perícia do INSS, em que a parte autora foi considerada inapta ao trabalho, tendo em conta a mesma patologia psíquica - fl. 67. Na mesma linha, o depoimento, acima transcrito, da médica psiquiátrica do Centro de Saúde Municipal que vem tratando a autora (Dra. Fernanda Favaro).
Considerando todo o exposto, é devido o benefício de auxílio-doença desde a data da DER (24-05-2012) até a data da juntada aos autos da última perícia judicial (18-07-2016), e, a partir de então, dado o princípio da fungibilidade, converto em aposentadoria por invalidez, uma vez que esta perícia atestou a incapacidade total, definitiva e absoluta da parte autora, devendo o INSS pagar a esta as respectivas parcelas vencidas.
Registro que, em relação à aplicação do princípio da fungibilidade, em matéria previdenciária, devem ser mitigadas algumas formalidades processuais, haja vista o caráter de direito social da previdência e assistência sociais (Constituição Federal, art. 6º), intimamente vinculado à concretização da cidadania e ao respeito à dignidade da pessoa humana, fundamentos do Estado Democrático de Direito (CF, art. 1º, inc. II e III), bem como à construção de uma sociedade livre, justa e solidária, à erradicação da pobreza e da marginalização e à redução das desigualdades sociais, objetivos fundamentais daquele Estado (CF, art. 3º, inc. I e III), tudo a demandar uma proteção social eficaz aos segurados e seus dependentes, e demais beneficiários, inclusive quando litigam em juízo.
A Autarquia Previdenciária, enquanto Estado sob a forma descentralizada, possui o dever constitucional de tornar efetivas as prestações previdenciárias e assistenciais a todos os legítimos beneficiários, que se traduz, tanto na esfera administrativa quanto judicial, na obrigação de conceder o benefício previdenciário ou assistencial a que tem direito a parte autora.
Ressalte-se que à Autarquia Previdenciária continua competindo, mesmo em juízo, a efetividade dos direitos previdenciários e assistenciais. A condição de parte não lhe retira o dever de prestação positiva consistente na concessão do benefício a que tem direito o segurado, dependente ou beneficiário.
Dentro desse contexto - que se pode resumir pela relevância social que envolve a matéria -, e considerando, ainda, o caráter instrumental do processo, com vistas à realização do direito material, deve-se compreender o pedido, em ação previdenciária, como o de obtenção do benefício previdenciário ou assistencial a que tem direito a parte autora, independentemente de indicação da espécie de benefício ou de especificação equivocada deste.
À mesma conclusão chega-se a partir de uma interpretação extensiva do art. 105 da Lei de Benefícios - o que, aliás, deve ser feito, tendo em vista, mais uma vez, a relevância da questão social e a íntima ligação entre a previdência e assistência sociais e a dignidade da pessoa humana -, no sentido de que não apenas a apresentação de documentação incompleta não constitui motivo para recusa do requerimento de benefício, como também a formulação de pedido administrativo de qualquer espécie de prestação previdenciária não exime o INSS de examinar a possibilidade de concessão de benefício previdenciário diverso, ou mesmo de benefício assistencial, sempre que mais vantajoso para o beneficiário, ainda que, para tanto, tenha que orientar, sugerir ou solicitar os documentos necessários. Ora, se é assim no âmbito administrativo, não pode ser diferente na esfera judicial, eis que presentes os mesmos elementos asseguradores de uma atividade estatal direcionada à concretização de direitos sociais.
Considerando, pois, que o pedido, nas causas previdenciárias, é o de obtenção do benefício a que tem direito o autor da ação, inexiste, em caso de concessão de benefício diverso do mencionado na inicial, afronta ao princípio da congruência entre pedido e sentença, insculpido nos arts. 128 e 460 do Código de Processo Civil. Nem poderia ser diferente, haja vista que o fator subjacente à eventual violação daquele princípio - o elemento surpresa, que redundaria em situação de injustificada desigualdade entre as partes - não se encontra presente, pois se a autarquia previdenciária possui, a priori (isto é, inclusive antes da demanda judicial), o dever de concessão da prestação previdenciária ou assistencial a que tem direito o segurado, dependente ou beneficiário, não se pode considerar surpreendida por deferimento de benefício diferente do pleiteado.
Nessa linha, colaciono julgado desta Corte:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. FUNGIBILIDADE. Este Regional, em suas duas Turmas especializadas em Direito Previdenciário, tem o entendimento consolidado de que os benefícios previdenciários de auxílio-doença, aposentadoria por invalidez e assistencial à pessoa com deficiência são fungíveis, cabendo ao magistrado (e mesmo ao INSS, em sede administrativa) conceder à parte ou a conversão, o benefício apropriado à sua condição fática, sem que disso resulte julgamento extra petita. (TRF4, AC 5009859-20.2016.404.9999, SEXTA TURMA, Relator MARCELO DE NARDI, juntado aos autos em 06/04/2017).
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-ACIDENTE. FUNGIBILIDADE DAS AÇÕES PREVIDENCIÁRIAS. SEGURADO ESPECIAL. RECOLHIMENTO DE CONTRIBUIÇÕES. DESNECESSIDADE REDUÇÃO DA APTIDÃO LABORAL. GRAU MÍNIMO. RESP 1109591 REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. TUTELA ESPECÍFICA. JUROS MORATÓRIOS E CORREÇÃO MONETÁRIA. DIFERIDOS. 1. Os benefícios previdenciários de auxílio-doença, aposentadoria por invalidez e auxílio-acidente possuem a questão relativa à capacidade laboral - seja sua redução seja sua supressão - como elemento comum entre seus requisitos, o que permite a incidência do princípio da fungibilidade entre eles. 2-7(...). Precedentes do STJ e do TRF da 4ª Região. (TRF4, AC 0012105-74.2016.404.9999, SEXTA TURMA, Relatora VÂNIA HACK DE ALMEIDA, D.E. 05/04/2017).
Sendo assim, este Regional tem o entendimento consolidado de que os benefícios previdenciários de auxílio-doença, aposentadoria por invalidez e assistencial à pessoa com deficiência são fungíveis, cabendo ao magistrado (e mesmo ao INSS, em sede administrativa) conceder à parte ou a conversão, o benefício apropriado à sua condição fática, sem que disso resulte julgamento extra petita.
Correção monetária e juros
A questão da atualização monetária das quantias a que é condenada a Fazenda Pública, dado o caráter acessório de que se reveste, não deve ser impeditiva da regular marcha do processo no caminho da conclusão da fase de conhecimento.
Firmado em sentença, em apelação ou remessa oficial o cabimento dos juros e da correção monetária por eventual condenação imposta ao ente público e seus termos iniciais, a forma como serão apurados os percentuais correspondentes, sempre que se revelar fator impeditivo ao eventual trânsito em julgado da decisão condenatória, pode ser diferida para a fase de cumprimento, observando-se a norma legal e sua interpretação então em vigor. Isso porque é na fase de cumprimento do título judicial que deverá ser apresentado, e eventualmente questionado, o real valor a ser pago a título de condenação, em total observância à legislação de regência.
O recente art. 491 do NCPC, ao prever, como regra geral, que os consectários já sejam definidos na fase de conhecimento, deve ter sua interpretação adequada às diversas situações concretas que reclamarão sua aplicação. Não por outra razão seu inciso I traz exceção à regra do caput, afastando a necessidade de predefinição quando não for possível determinar, de modo definitivo, o montante devido. A norma vem com o objetivo de favorecer a celeridade e a economia processuais, nunca para frear o processo.
E no caso, o enfrentamento da questão pertinente ao índice de correção monetária, a partir da vigência da Lei 11.960/09, nos débitos da Fazenda Pública, embora de caráter acessório, tem criado graves óbices à razoável duração do processo, especialmente se considerado que pende de julgamento no STF a definição, em regime de repercussão geral, quanto à constitucionalidade da utilização do índice da poupança na fase que antecede a expedição do precatório (RE 870.947, Tema 810).
Tratando-se de débito, cujos consectários são totalmente definidos por lei, inclusive quanto ao termo inicial de incidência, nada obsta a que seja diferida a solução definitiva para a fase de cumprimento do julgado, em que, a propósito, poderão as partes, se assim desejarem, mais facilmente conciliar acerca do montante devido, de modo a finalizar definitivamente o processo.
Sobre esta possibilidade, já existe julgado da Terceira Seção do STJ, em que assentado que "diante a declaração de inconstitucionalidade parcial do artigo 5º da Lei n. 11.960/09 (ADI 4357/DF), cuja modulação dos efeitos ainda não foi concluída pelo Supremo Tribunal Federal, e por transbordar o objeto do mandado de segurança a fixação de parâmetros para o pagamento do valor constante da portaria de anistia, por não se tratar de ação de cobrança, as teses referentes aos juros de mora e à correção monetária devem ser diferidas para a fase de execução. 4. Embargos de declaração rejeitados". (EDcl no MS 14.741/DF, Rel. Ministro JORGE MUSSI, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 08/10/2014, DJe 15/10/2014).
Na mesma linha vêm decidindo as duas turmas de Direito Administrativo desta Corte (2ª Seção), à unanimidade (ad exemplum: os processos 5005406-14.2014.404.7101, 3ª Turma, julgado em 01-06-2016 e 5052050-61.2013.404.7000, 4ª Turma, julgado em 25-05-2016)
Portanto, em face da incerteza quanto ao índice de atualização monetária, e considerando que a discussão envolve apenas questão acessória no contexto da lide, à luz do que preconizam os art. 4º, 6º e 8º do novo Código de Processo Civil, mostra-se adequado e racional diferir-se para a fase de execução a solução em definitivo acerca dos critérios de correção, ocasião em que, provavelmente, a questão já terá sido dirimida pelo tribunal superior, o que conduzirá à observância, pelos julgadores, ao fim e ao cabo, da solução uniformizadora.
A fim de evitar novos recursos, inclusive na fase de cumprimento de sentença, e anteriormente à solução definitiva pelo STF sobre o tema, a alternativa é que o cumprimento do julgado se inicie, adotando-se os índices da Lei 11.960/2009, inclusive para fins de expedição de precatório ou RPV pelo valor incontroverso, diferindo-se para momento posterior ao julgamento pelo STF a decisão do juízo sobre a existência de diferenças remanescentes, a serem requisitadas, acaso outro índice venha a ter sua aplicação legitimada.
Os juros de mora, incidentes desde a citação ou da posterior reafirmação da DER, se for o caso, como acessórios que são, também deverão ter sua incidência garantida na fase de cumprimento de sentença, observadas as disposições legais vigentes conforme os períodos pelos quais perdurar a mora da Fazenda Pública.
Evita-se, assim, que o presente feito fique paralisado, submetido a infindáveis recursos, sobrestamentos, juízos de retratação, e até ações rescisórias, com comprometimento da efetividade da prestação jurisdicional, apenas para solução de questão acessória.
Diante disso, difere-se para a fase de cumprimento de sentença a forma de cálculo dos consectários legais, adotando-se inicialmente o índice da Lei 11.960/2009.
Honorários advocatícios
Considerando que a sentença foi proferida antes de 18-03-2016, data definida pelo Plenário do STJ para início da vigência do NCPC (EnunciadoAdministrativo nº 1-STJ), bem como o Enunciado Administrativo n. 7 - STJ (Somente nos recursos interpostos contra decisão publicada a partir de 18 demarço de 2016, será possível o arbitramento de honorários sucumbenciais recursais, na forma do art. 85, § 11, do novo CPC), aplica-se ao caso a sistemática de honorários advocatícios da norma anteriormente vigente.
Desse modo, os honorários advocatícios devem ser fixados em 10% sobre o valor das parcelas vencidas até a data do presente julgamento, a teor das Súmulas 111 do STJ e 76 desta Corte.
Honorários periciais
Sucumbente, deve o INSS suportar o pagamento do valor fixado a título de honorários periciais.
Custas
O INSS é isento do pagamento das custas judiciais na Justiça Federal, nos termos do art. 4º, I, da Lei nº 9.289/96.
A isenção, entretanto, não se aplica quando o INSS é demandado na Justiça Estadual de Santa Catarina, sendo as custas judiciais devidas pela metade, a teor do que preceitua o art. 33, parágrafo único, da Lei Complementar Estadual nº 156/97.
Tutela específica
Na vigência do Código de Processo Civil de 1973, a Terceira Seção desta Corte, buscando dar efetividade ao disposto no art. 461, que dispunha acerca da tutela específica, firmou o entendimento de que o acórdão que concedesse benefício previdenciário e sujeito apenas a recurso especial e/ou extraordinário, em princípio, sem efeito suspensivo, ensejava o cumprimento imediato da determinação de implantar o benefício, independentemente do trânsito em julgado ou de requerimento específico da parte, em virtude da eficácia mandamental dos provimentos fundados no referido artigo (TRF4, 3ª Seção, Questão de Ordem na AC n. 2002.71.00.050349-7/RS, de minha Relatoria, julgado em 09-08-2007).
Nesses termos, entendeu o Órgão Julgador que a parte correspondente à obrigação de fazer ensejava o cumprimento desde logo, enquanto a obrigação de pagar ficaria postergada para a fase executória.
O art. 497 do novo CPC, buscando dar efetividade ao processo, dispôs de forma similar à prevista no Código de 1973, razão pela qual o entendimento firmado pela Terceira Seção deste Tribunal, no julgamento da Questão de Ordem acima referida, mantém-se íntegro e atual.
Portanto, com fulcro no art. 497 do CPC, determino o cumprimento imediato do acórdão no tocante à implantação do benefício de aposentadoria por invalidez da parte autora (CPF 018.546.249-97), a ser efetivada em 45 dias.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar provimento à apelação da parte autora determinar o cumprimento imediato do acórdão no tocante à implantação do benefício da parte autora, e diferir, de ofício, para a fase de execução, a forma de cálculo dos juros e da correção monetária, adotando-se inicialmente o índice da Lei 11.960/2009.
Des. Federal CELSO KIPPER
Relator
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 14/09/2017
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0004846-62.2015.4.04.9999/SC
ORIGEM: SC 05000643420128240051
RELATOR | : | Des. Federal CELSO KIPPER |
PRESIDENTE | : | Paulo Afonso Brum Vaz |
PROCURADOR | : | Fábio Nesi Venzon |
APELANTE | : | INEZ BARBIERI THOMAZZONI |
ADVOGADO | : | Eliane Paula Braatz |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 14/09/2017, na seqüência 491, disponibilizada no DE de 28/08/2017, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) Turma Regional suplementar de Santa Catarina, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA DETERMINAR O CUMPRIMENTO IMEDIATO DO ACÓRDÃO NO TOCANTE À IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO DA PARTE AUTORA, E DIFERIR, DE OFÍCIO, PARA A FASE DE EXECUÇÃO, A FORMA DE CÁLCULO DOS JUROS E DA CORREÇÃO MONETÁRIA, ADOTANDO-SE INICIALMENTE O ÍNDICE DA LEI 11.960/2009.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal CELSO KIPPER |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal CELSO KIPPER |
: | Des. Federal JORGE ANTONIO MAURIQUE | |
: | Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ |
Ana Carolina Gamba Bernardes
Secretária
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