APELAÇÃO CÍVEL Nº 5003760-60.2014.4.04.7006/PR
RELATOR | : | LUIZ CARLOS CANALLI |
APELANTE | : | SAMANTA CARLA RIBEIRO |
ADVOGADO | : | EDILBERTO SPRICIGO |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
MPF | : | MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL |
EMENTA
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. PESSOA INCAPACITADA DE PROVER A PRÓPRIA MANUTENÇÃO OU TÊ-LA PROVIDA DE OUTRA FORMA. COMPROVAÇÃO. CONCESSÃO. INÍCIO DA INCAPACIDADE.
1. O direito ao benefício assistencial pressupõe o preenchimento dos seguintes requisitos: condição de deficiente ou idoso (65 anos ou mais); e situação de risco social (estado de miserabilidade, hipossuficiência econômica ou situação de desamparo) da parte autora e de sua família.
2. O Supremo Tribunal Federal já decidiu que o critério definido pelo art. 20, § 3º, da Lei 8.742/1993 é apenas um indicativo objetivo, o qual não exclui a possibilidade de verificação da hipossuficiência econômica dos postulantes do benefício assistencial de prestação continuada.
3. Comprovada a condição de pessoa deficiente ou idosa e a situação de risco social da parte autora e de sua família, é devido o benefício assistencial.
4. In casu, a patologia que acomete a autora surgiu com o nascimento. Todavia, a incapacidade somente se estabeleceu com o agravamento da doença.
5. Sistemática da atualização do passivo observará a decisão do STF consubstanciada no seu Tema 810.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório, dos votos e das notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 20 de fevereiro de 2018.
Desembargador Federal LUIZ CARLOS CANALLI
Relator
| Documento eletrônico assinado por Desembargador Federal LUIZ CARLOS CANALLI, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9260265v5 e, se solicitado, do código CRC 31D8BCA3. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Luiz Carlos Canalli |
| Data e Hora: | 22/02/2018 09:54 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5003760-60.2014.4.04.7006/PR
RELATOR | : | LUIZ CARLOS CANALLI |
APELANTE | : | SAMANTA CARLA RIBEIRO |
ADVOGADO | : | EDILBERTO SPRICIGO |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
MPF | : | MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL |
RELATÓRIO
Trata-se de ação de concessão de benefício previdenciário ajuizada por SAMANTA CARLA RIBEIRO em face do INSS com o fito de obter a concessão do benefício previsto na Lei nº 8.742/93 desde o requerimento administrativo, formulado em 21/11/2002.
A parte autora alegou fazer jus ao benefício por ser portadora de transtornos mentais e comportamentais, além de distúrbios visuais e problemas pulmonares, deficiências que a impossibilita para a vida independente e para o trabalho, tendo em vista, ainda, a impossibilidade de manter-se com recursos próprios ou de sua família.
Foi deferida a gratuidade da Justiça.
Em contestação, o INSS sustentou prejudiciais de decadência e prescrição e, no mérito, aduziu que a demandante não preenche os requisitos previstos na Lei para a concessão do benefício assistencial.
Sentenciando, o MM. Juiz, em 26/6/2015 (evento 46), julgou improcedente o pedido inicial.
Irresignada, a parte autora interpôs apelação, requerendo, preliminarmente, que fosse analisado seu agravo de instrumento, convertido em agravo retido, para que fosse realizada perícia judicial com médico especialista em psiquiatria e oftalmologia.
Oportunizadas as contrarrazões. Vieram os autos a esta Corte.
O Ministério Público Federal opinou pelo desprovimento da apelação.
Nesta Corte, a apelação foi provida com o fito de anular a sentença para realização de estudo social e de nova perícia.
Efetivadas as referidas diligências, sobreveio nova sentença, em 16/1/2017 (evento 141), em que o Juízo entendeu que a condição de pessoa com deficiência somente deve ser reconhecida com o agravamento do quadro psiquiátrico, em 02/09/2014, quando houve quadro de surto psicótico. Na ocasião da prolação do decisum, assim dispôs:
3. Dispositivo
Diante do exposto, julgo procedente em parte o pedido inicial, resolvendo o mérito da demanda, na forma do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, para o fim de condenar o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS a:
a) Conceder benefício assistencial à parte autora, no valor de um salário mínimo mensal, nos termos do artigo 20 da Lei 8.742/1993, com efeitos financeiros desde 02/09/2014.
b) Pagar a importância resultante da somatória das prestações vencidas entre 02/09/2014 e a data da implantação do benefício, devidamente atualizada até o efetivo pagamento. Durante o período previsto no parágrafo 1º do artigo 100 da Constituição, não incidem juros de mora sobre os precatórios que nele sejam pagos (súmula vinculante n. 17). A correção monetária incidirá a partir de cada vencimento e será calculada pelos índices oficiais e aceitos na jurisprudência, a saber, IPC-r de 07/1994 a 06/1995, INPC de 07/1995 a 04/1996, IGP-DI de 05/1996 a 03/2006, INPC de 04/2006 a 29/06/2009, e TR a partir de 30/06/2009. Os juros de mora, devidos desde a citação, incidirão à taxa de 1% (um por cento) ao mês, de forma simples, até junho de 2009 e, a partir de julho de 2009, seguirá o índice oficial de juros aplicados à caderneta de poupança, nos seguintes termos: a) 0,5% (meio por cento) ao mês, de forma simples, de julho de 2009 a abril de 2012 e, b) a partir de maio de 2012, conforme variação descrita no inciso II do artigo 12 da Lei 8.177/1991. Ficará a cargo do Juízo da execução a observância do que vier a ser decidido pelo STF no RE 870.947 (repercussão geral reconhecida). As prestações vencidas até o ajuizamento da presente demanda ficam limitadas ao teto de 60 (sessenta) salários mínimos, devendo integrar esse patamar o valor correspondente a 12 (doze) prestações vincendas, por se tratar de demanda de trato sucessivo, nos termos do artigo 3º, caput, da Lei 10.259/2001, combinado com os §§ 1º e 2º do artigo 292 do Código de Processo Civil.
c) Restituir os honorários periciais à Seção Judiciária do Paraná, cujo valor deverá ser incluído na requisição de pagamento, na forma do artigo 12, § 1º, da Lei 10.259/2001.
Os valores a que se referem os itens "b" e "c" deverão ser requisitados ao Tribunal Regional Federal, na forma do artigo 100, §§ 3º e 4º, da Constituição Federal de 1988, e artigo 17, caput e §§ 3º e 4º, da Lei 10.259/2001.
Sem custas (art. 4º, I e II, da Lei n. 9.289/96).
Reconheço a sucumbência recíproca à razão de 50% para cada uma das partes. Assim, condeno as partes ao pagamento de honorários advocatícios ao patrono da parte adversária, que arbitro em 10% (dez) por cento sobre o valor atualizado da condenação (CPC, art. 85, § 3º, I). A verba devida pela autora fica submetida à condição suspensiva prevista no artigo 98, § 3º, do Código de Processo Civil. A verba devida pelo INSS deverá ser incluída na requisição de pagamento a ser expedida em favor da autora, sendo vedada a compensação com o valor pela parte devido (CPC, art. 85, § 14).
Sentença não sujeita ao reexame necessário, uma vez que o proveito econômico auferido pela autora (um salário mínimo mensal desde 02/09/2014, acrescidos de correção monetária e juros de mora), evidentemente não ultrapassa o limite previsto no artigo 496, § 3º, inciso I, do Código de Processo Civil.
Intime-se o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS para que dê cabal cumprimento à decisão concessiva de tutela de urgência antecipada, no prazo de 30 dias, comprovando nos autos a implantação do benefício, sob pena de multa diária de R$ 50,00 (cinquenta reais), nos termos do artigo 297 combinado com os artigos 536, §1º e 537, todos do Código de Processo Civil.
Sentença publicada e registrada eletronicamente. Intimem-se.
Ciência ao Ministério Público Federal.
Havendo interposição de recurso de apelação, intime-se o apelado para contrarrazões, no prazo de 15 dias. Se houver apelação adesiva do apelado, intime-se o apelante para contrarrazões, no prazo de 15 dias. Após tais formalidades, independente de juízo de admissibilidade (CPC, art. 1.010), promova-se a remessa eletrônica ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região, que fará a análise acerca da atribuição, ou não, de efeito suspensivo (arts. 995 e 1.012, do mesmo codex).
A parte autora apela, porquanto entende que a data de início do benefício deve ser a do requerimento administrativo, em 21/11/2002. Aduz que, conforme a pericia judicial, possui retardo mental desde o nascimento, com comprometimento intelectual desde então. Defende que desde o requerimento administrativo passa por necessidades em decorrência da incapacidade e do estado de necessidade.
Oportunizadas as contrarrazões. Vieram os autos a esta Corte.
O Ministério Público Federal opinou pela suspensão do processo, com base no art. 76, caput, do CPC, para que seja providenciada a interdição da requerente na Justiça Estadual e a subsequente regularização da representação processual, com outorga de procuração pelo curador(a) da apelante,
É o relatório.
VOTO
Do benefício assistencial
A Constituição Federal prevê, em seu art. 203, caput e inc. V, "a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei."
Tal garantia foi regulamentada pelo art. 20 da Lei nº 8.742/93 (Lei Orgânica da Assistência Social - LOAS), alterada pela Lei nº 9.720/98. Posteriormente, a redação do mencionado art. 20 foi novamente alterada pelas Leis nº 12.435/11 e 12.470/11, passando a apresentar a seguinte redação:
Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)
§ 1º Para os efeitos do disposto no caput, a família é composta pelo requerente, o cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)
§ 2º Para efeito de concessão deste benefício, considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas. (Redação dada pela Lei nº 12.470, de 2011)
§ 3º Considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa com deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)
§ 4º O benefício de que trata este artigo não pode ser acumulado pelo beneficiário com qualquer outro no âmbito da seguridade social ou de outro regime, salvo os da assistência médica e da pensão especial de natureza indenizatória. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)
§ 5º A condição de acolhimento em instituições de longa permanência não prejudica o direito do idoso ou da pessoa com deficiência ao benefício de prestação continuada. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)
§ 6º A concessão do benefício ficará sujeita à avaliação da deficiência e do grau de impedimento de que trata o § 2º, composta por avaliação médica e avaliação social realizadas por médicos peritos e por assistentes sociais do Instituto Nacional de Seguro Social - INSS. (Redação dada pela Lei nº 12.470, de 2011)
§ 7º Na hipótese de não existirem serviços no município de residência do beneficiário, fica assegurado, na forma prevista em regulamento, o seu encaminhamento ao município mais próximo que contar com tal estrutura. (Incluído pela Lei nº 9.720, de 30.11.1998)
§ 8º A renda familiar mensal a que se refere o § 3º deverá ser declarada pelo requerente ou seu representante legal, sujeitando-se aos demais procedimentos previstos no regulamento para o deferimento do pedido. (Incluído pela Lei nº 9.720, de 30.11.1998)
§ 9º Os rendimentos decorrentes de estágio supervisionado e de aprendizagem não serão computados para os fins de cálculo da renda familiar per capita a que se refere o § 3º deste artigo. (Redação dada pela Lei nº 13.146, de 2015)
§ 10. Considera-se impedimento de longo prazo, para os fins do § 2º deste artigo, aquele que produza efeitos pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos. (Incluído pela Lei nº 12.470, de 2011)
§ 11. Para concessão do benefício de que trata o caput deste artigo, poderão ser utilizados outros elementos probatórios da condição de miserabilidade do grupo familiar e da situação de vulnerabilidade, conforme regulamento. (Incluído pela Lei nº 13.146, de 2015)
Consoante se depreende, o direito ao benefício assistencial pressupõe o preenchimento de dois requisitos, quais sejam: (1) condição de deficiente ou idoso (65 anos ou mais); e (2) situação de risco social (estado de miserabilidade, hipossuficiência econômica ou situação de desamparo) da parte autora e de sua família.
Por um lado, o conceito de deficiência está intimamente ligado ao impedimento efetivo para o exercício de atividade que proveja a própria subsistência.
Por outro, no que tange ao requisito socioeconômico, o Supremo Tribunal Federal já decidiu que o critério definido pelo art. 20, § 3º, da Lei 8.742/1993 é apenas um indicativo objetivo, o qual não exclui a possibilidade de verificação da hipossuficiência econômica dos postulantes do benefício assistencial de prestação continuada. Destaca-se, inclusive, que no julgamento do RE 567985/MT, cuja repercussão geral foi reconhecida, o STF declarou a inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 20, § 3º, da Lei nº 8.742/1993, relativizando o critério objetivo definido naquele dispositivo. Destarte, a renda per capita inferior a ¼ de salário mínimo implica presunção de miserabilidade a ensejar o deferimento do benefício, mas não impede o julgador, mediante as demais provas dos autos, de concluir pela caracterização da condição de miserabilidade da parte e de sua família. Com efeito, a insuficiência financeira das famílias deve ser aferida individualmente, conforme as peculiaridades de cada caso.
Nesse sentido, precedentes desta Corte:
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. REQUISITOS. 1. O direito ao benefício assistencial pressupõe o preenchimento dos seguintes requisitos: condição de deficiente (incapacidade para o trabalho e para a vida independente, consoante a redação original do art. 20, da LOAS, ou impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir a participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas, consoante a redação atual do referido dispositivo) ou idoso (assim considerado aquele com 65 anos ou mais, a partir de 1º de janeiro de 2004, data da entrada em vigor da Lei nº 10.741/2003 - Estatuto do Idoso) e situação de risco social (ausência de meios para a parte autora, dignamente, prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família). 2. Reconhecida a inconstitucionalidade do critério econômico objetivo em regime de repercussão geral, bem como a possibilidade de admissão de outros meios de prova para verificação da hipossuficiência familiar, cabe ao julgador, na análise do caso concreto, aferir o estado de miserabilidade da parte autora e de sua família. 3. Deve ser excluído do cômputo da renda familiar o benefício previdenciário de renda mínima (valor de um salário mínimo) percebido por idoso e o benefício assistencial recebido por outro membro da família de qualquer idade. Aplicação analógica do art. 34, parágrafo único, da Lei 10.741/2003 (Estatuto do Idoso). (TRF4, APELAÇÃO CÍVEL Nº 5049702-55.2017.404.9999, Turma Regional suplementar de Santa Catarina, Des. Federal JORGE ANTONIO MAURIQUE, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 23/10/2017)
BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. RESTABELECIMENTO DE BENEFÍCIO. PESSOA IDOSA. CONDIÇÃO SOCIOECONÔMICA. MISERABILIDADE. PREENCHIMENTO DE REQUISITOS. BENEFÍCIO DE RENDA MÍNIMA. IDOSO. EXCLUSÃO. CONSECTÁRIOS LEGAIS. DIFERIMENTO. IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO. 1. O direito ao benefício assistencial, previsto no art. 203, V, da Constituição Federal, e nos arts. 20 e 21 da Lei 8.742/93 (LOAS) pressupõe o preenchimento de dois requisitos: a) condição de pessoa com deficiência ou idosa e b) situação de risco social, ou seja, de miserabilidade ou de desamparo. 2. Reconhecida a inconstitucionalidade do critério econômico objetivo em regime de repercussão geral, bem como a possibilidade de admissão de outros meios de prova para verificação da hipossuficiência familiar, cabe ao julgador, na análise do caso concreto, aferir o estado de miserabilidade da parte autora e de sua família. 3. [...] (TRF4, AC 0002657-43.2017.404.9999, QUINTA TURMA, Relator ROGER RAUPP RIOS, D.E. 22/06/2017) (destaquei)
Precedentes jurisprudenciais resultaram por conformar o cálculo da renda familiar per capita, da qual deve ser excluído o valor auferido por idoso com 65 anos ou mais a título de benefício assistencial ou benefício previdenciário de renda mínima. In verbis:
AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. JULGAMENTO NO STF. SOBRESTAMENTO DO FEITO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. RENDA MENSAL PER CAPITA FAMILIAR. EXCLUSÃO DE BENEFÍCIO DE VALOR MÍNIMO PERCEBIDO POR MAIOR DE 65 ANOS. ART. 34, PARÁGRAFO ÚNICO, LEI Nº 10.741/2003. APLICAÇÃO ANALÓGICA. LEI Nº 11.960/2009. INCIDÊNCIA IMEDIATA. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
1. Esta Corte não está adstrita ao julgamento do Excelso Pretório, por força do art. 543-B da lei processual civil, não possuindo os julgados daquela Corte efeito vinculante para com os desta.
2. A finalidade da Lei nº 10.741/2003 (Estatuto do Idoso), ao excluir da renda do núcleo familiar o valor do benefício assistencial percebido pelo idoso, foi protegê-lo, destinando essa verba exclusivamente à sua subsistência.
3. Nessa linha de raciocínio, também o benefício previdenciário no valor de um salário mínimo recebido por maior de 65 anos deve ser afastado para fins de apuração da renda mensal per capita objetivando a concessão de benefício de prestação continuada.
4. O entendimento de que somente o benefício assistencial não é considerado no cômputo da renda mensal per capita desprestigia o segurado que contribuiu para a Previdência Social e, por isso, faz jus a uma aposentadoria de valor mínimo, na medida em que este tem de compartilhar esse valor com seu grupo familiar.
5. Em respeito aos princípios da igualdade e da razoabilidade, deve ser excluído do cálculo da renda familiar per capita qualquer benefício de valor mínimo recebido por maior de 65 anos, independentemente se assistencial ou previdenciário, aplicando-se, analogicamente, o disposto no parágrafo único do art. 34 do Estatuto do Idoso.
6. A Lei nº 11.960/2009, segundo compreensão da Corte Especial deste Sodalício na linha do que vem entendendo a Suprema Corte, tem incidência imediata.
7. Agravo regimental parcialmente provido.
(STJ, AgRg no REsp nº 1.178.377/SP, 6ª Turma, Relatora Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, DJe de 19-03-2012)
Também deverá ser desconsiderado o benefício previdenciário de valor superior ao mínimo, até o limite de um salário mínimo, bem como o valor auferido a título de benefício previdenciário por incapacidade ou assistencial em razão de deficiência, independentemente de idade.
Nesse sentido:
PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS INFRINGENTES. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. ARTS. 203, V, DA CRFB/88 E 20 DA LEI N.º 8.742/93. MISERABILIDADE. COMPROVAÇÃO.
1. A constitucionalidade do § 3.º do art. 20 da Lei n.º 8.742/93 (STF, ADIN 1.232, Plenário, Rel. p/acórdão Min. Nelson Jobim, DJU 01-6-2001 e RCL 2303-AgR, Plenário, Rel. Min. Ellen Gracie, DJU 01-4-2005) não desautoriza o entendimento de que a comprovação do requisito da renda mínima familiar per capita não superior a ¼ (um quarto) do salário mínimo, necessária à concessão do benefício assistencial, não exclui outros fatores que tenham o condão de aferir a condição de miserabilidade da parte autora e de sua família.
2. Para fins de aferir a renda familiar nos casos de pretensão à concessão de benefício assistencial, os valores de benefícios decorrentes de incapacidade (auxílio-doença e aposentadoria por invalidez) devem ser considerados distintamente se comparados aos valores referentes aos outros benefícios previdenciários, porquanto aqueles, via de regra, devem fazer frente às necessidades geradas pela incapacidade que ensejou a concessão do benefício, não se podendo dar-lhes a dimensão, à vista do princípio da razoabilidade, de também atender a todas as demais exigências do grupo familiar.
3. Caso em que o único rendimento do grupo familiar (autora, mãe e pai), resume-se ao benefício de aposentadoria por invalidez percebido pelo genitor, de valor mínimo (R$ 300,00), que, se excluído, configura a situação de renda inexistente, expondo a situação de risco social, necessária à concessão do benefício.
(TRF4, EIAC nº 2004.04.01.017568-9/PR, 3ª Seção, Relator Juiz Federal JOÃO BATISTA LAZZARI, unânime, D.E. de 20-07-2009)
Ressalta-se que tal pessoa, em decorrência da exclusão de sua renda, também não será considerada na composição familiar, para efeito do cálculo da renda per capita.
Do caso concreto
A perícia médica (evento 82) atestou que a parte autora é portadora de retardo mental moderado, com comprometimento significativo do comportamento, requerendo vigilância ou tratamento, CID10 F71.1. Ao passo que a perícia sócio-econômica (evento 121) atestou a hipossuficência econômica da família da autora. Destarte, estão presentes ambos os requisitos exigidos pelo art. 20 da LOAS, tendo sido deferido o benefício assistencial pelo Juízo a quo, desde a data 2/9/2014.
O ponto controvertido destes autos centra-se justamente no marco inicial da incapacidade e o consequente direito ao benefício.
Entende a autora que a incapacidade se deu com o nascimento, sendo o benefício devido desde o requerimento administrativo, em 2002. Por outro lado, quando do pedido administrativo, o pleito foi indeferido pela autarquia tendo em vista o parecer contrário da perícia médica administrativa (evento 1 - INFBEN7).
Por fim, a perícia médica judicial solve essa questão. O laudo realizado por psiquiatra em 5/4/2016 (evento 82), entendeu que, embora a patologia que acomete a autora tenha surgido desde o nascimento, a incapacidade somente se estabeleceu com o agravamento da doença e o internamento em decorrência de alteração comportamental, em 2/9/2014. Destacou o médico:
"Entretanto, independente do diagnóstico que venha a delinear na evolução do quadro (seja esquizofrenia, seja alteração comportamental derivada de retardo mental), fato é que avaliada apresenta comprometimento importante na capacidade individual para os atos da vida civil e auto-sustento. Sendo que tal incapacidade não tem prazo de recuperação em período menor de 02 anos. Além de, para efetivo desenvolvimento da independência pessoal efetiva, necessitaria de um foco terapêutico adequado e individualizado que provavelmente não teria acesso via SUS - piorando o prognóstico para vida independente. Assim sendo, parecer pericial de que autora encontra-se psiquiatricamente incapaz de gerar o auto-sustento de forma regular, continuada e efetiva. Não tendo plenas condições para os atos da vida civil (sem condição de voto, contrato, casamento, transações financeiras, empréstimos). Incapacidade que fica claramente evidenciada desde internamento pela alteração comportamental, em 02.09.14, sem previsão de recuperação.
Data de Início da Doença: 27.07.1994
Data de Início da Incapacidade: 02.09.14"
Destarte, correto o Togado singular ao determinar como início do benefício a data em que o especialista aponta como início da incapacidade.
Sistemática de atualização do passivo
Juros de mora e correção monetária
A controvérsia relativa à sistemática de atualização do passivo do benefício restou superada a partir do julgamento do RE nº 870.947/SE, pelo excelso STF, submetido ao rito da repercussão geral e de cuja ata de julgamento, publicada no DJe de 25-9-2017, emerge a síntese da tese acolhida pelo plenário para o Tema nº 810 daquela Corte.
E nesse particular aspecto, vale anotar ser uníssono o entendimento das turmas do STF no sentido de que possam - devam - as demais instâncias aplicar a tese já firmada, não obstante a ausência de trânsito em julgado da decisão paradigmática. Nesse sentido: RE 1006958 AgR-ED-ED, Relator o Ministro Dias Toffoli, Segunda Turma, DJe 18-09-2017 e ARE nº 909.527/RS-AgR, Primeira Turma, Relator o Ministro Luiz Fux, DJe de 30-5-16. Essa, ademais, a letra do artigo 1.030, inciso I, e do artigo 1.035, § 11, ambos do CPC.
Em face disso, assim como do intrínseco efeito expansivo de decisões dessa natureza, deve a sua eficácia incidir ao caso ora sob exame.
Nessa linha, a atualização do débito previdenciário, até o dia 29-6-2009, deverá observar os parâmetros constantes no Manual para Orientação e Procedimento para os Cálculos da Justiça Federal. E, após essa data, ou seja, a contar de 30-6-2009, coincidente com o início da vigência do artigo 5º da Lei nº 11.960/2009, pelo qual conferida nova redação ao artigo 1º-F da Lei nº 9.494/97, deverá ser utilizada a metodologia ali prevista para os juros de mora; e, a título de correção monetária, será aplicado o IPCA-E.
Convém registrar que a Corte Suprema abordou e solveu a questão da atualização monetária em perfeita sintonia com o que já havia sintetizado em seu Tema nº 96, o qual tratava da atualização da conta objeto de precatórios e requisições de pequeno valor, estabelecendo jurídica isonomia entre essas situações.
Logo, no caso concreto, observar-se-á a sistemática do aludido manual, até 29-6-2009. Após, os juros de mora incidirão conforme estabelece o artigo 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação que lhe foi dada pelo artigo 5º da Lei nº 11.960/2009; e a correção monetária, mediante aplicação do IPCA-E.
Conclusão
Mantida a sentença que deferiu o benefício assistencial de prestação continuada desde a data de início da incapacidade.
Sistemática da atualização do passivo observará a decisão do STF consubstanciada no seu Tema 810.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação, nos termos da fundamentação.
Desembargador Federal LUIZ CARLOS CANALLI
Relator
| Documento eletrônico assinado por Desembargador Federal LUIZ CARLOS CANALLI, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9260264v4 e, se solicitado, do código CRC 3983E927. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Luiz Carlos Canalli |
| Data e Hora: | 22/02/2018 09:54 |
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 20/02/2018
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5003760-60.2014.4.04.7006/PR
ORIGEM: PR 50037606020144047006
RELATOR | : | Des. Federal LUIZ CARLOS CANALLI |
PRESIDENTE | : | Luiz Carlos Canalli |
PROCURADOR | : | Dr. Jorge Luiz Gasparini da Silva |
APELANTE | : | SAMANTA CARLA RIBEIRO |
ADVOGADO | : | EDILBERTO SPRICIGO |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
MPF | : | MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 20/02/2018, na seqüência 233, disponibilizada no DE de 09/01/2018, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO, NOS TERMOS DA FUNDAMENTAÇÃO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal LUIZ CARLOS CANALLI |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal LUIZ CARLOS CANALLI |
: | Juiz Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO | |
: | Juíza Federal GISELE LEMKE |
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
| Documento eletrônico assinado por Lídice Peña Thomaz, Secretária de Turma, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9321394v1 e, se solicitado, do código CRC 3199814C. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Lídice Peña Thomaz |
| Data e Hora: | 21/02/2018 16:36 |
