Rua Otávio Francisco Caruso da Rocha, 300, Gabinete do Des. Federal João Batista Pinto Silveira - Bairro: Praia de Belas - CEP: 90010-395 - Fone: (51)3213-3191 - www.trf4.jus.br - Email: gbatista@trf4.jus.br
Apelação Cível Nº 5006651-53.2016.4.04.7113/RS
RELATOR: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
APELANTE: VALTELEI ALONCO DOS REIS (AUTOR)
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: OS MESMOS
RELATÓRIO
Cuida-se de apelações interpostas de sentença publicada na vigência do CPC/2015, cujo dispositivo foi assim proferido:
Ante o exposto, ponho fim à fase cognitiva do procedimento comum, com resolução do mérito (art. 487, inciso I, do CPC), julgando parcialmente procedentes os pedidos veiculados para o fim de:
a) reconhecer a especialidade dos períodos de 12/01/1987 a 06/02/1987, 01/07/1991 a 10/02/1992, 04/03/1992 a 04/03/1993, 20/07/1993 a 14/01/1994, 11/05/1995 a 12/11/1996, 05/05/1997 a 02/06/1998, 06/01/2009 a 02/04/2012 e de 02/04/2012 a 01/07/2014;
b) indeferir os pedidos de reconhecimento da atividade rural e da especialidade dos demais intervalos postulados, bem como os pedidos de conversão de tempo comum em especial, de concessão de aposentadoria especial, de concessão da aposentadoria por tempo de contribuição e de indenização por danos morais.
Presente sucumbência recíproca, condeno cada parte ao pagamento de honorários advocatícios ao patrono da parte adversa, na proporção de 80% a ser pago pelo autor e 20% devido pelo réu, fixados em 10% do valor da causa atualizado, nos termos do art. 85, §4º, III, do CPC. Suspendo a exigibilidade da verba em relação ao autor, dado o deferimento da gratuidade judiciária.
Não há custas a serem ressarcidas, considerando a gratuidade de justiça deferida à parte autora e a isenção legal da parte ré.
Tendo em vista que o valor do proveito econômico não atinge 1.000 (mil) salários mínimos, não há remessa necessária (art. 496, inciso I, do CPC), seguindo-se entendimento do Egrégio TRF da 4ª Região de que "em sentenças proferidas na vigência do Código de Processo Civil de 2015, as condenações ao pagamento de benefício previdenciário - seja benefício de valor mínimo, seja benefício de valor máximo - por prazo inferior a dez anos não admitem a remessa necessária" (TRF4 5002250-49.2017.404.9999, Sexta Turma, Relatora Salise Monteiro Sanchotene, juntado aos autos em 31/03/2017).
Apela o demandante, alegando que há cerceamento de defesa. Requer a anulação da sentença para produção de prova testemunhal e pericial. No mérito, reitera o pedido de tempo rural e especial, bem como requer a concessão da Aposentadoria Especial a contar da DER ou DER reafirmada. Subsidiariamente, requer a concessão da Aposentadoria por Tempo de Contribuição a contar da DER ou DER reafirmada. Requer a reforma dos honorários advocatícios.
O INSS recorre, postulando a reforma da sentença. Alega ser caso de reexame necessário. No que pertine ao tempo de serviço especial, alega que não há documentos que comprovem o exercício de atividades sujeitas a condições prejudiciais à saúde ou integridade física da parte autora, inclusive pelo uso de EPI. Não são aceitas provas por similaridade.
Regularmente processados, subiram os autos a este Tribunal.
O autor peticiona, acostando documentos e pedindo preferência no julgamento por ser portador de deficiência.
É o relatório.
VOTO
Da preliminar de nulidade da sentença por cerceamento de defesa
Impende iniciar o julgamento pela análise da alegação de cerceamento de defesa, em virtude do indeferimento da produção da prova pericial e testemunhal requeridas.
Em que pese seja recorrente na doutrina e na jurisprudência a afirmação de que o juiz é o destinatário da prova, essa assertiva deve ser tratada de forma contextualizada, mormente diante das inovações introduzidas pelo CPC/2015. Que o juiz é destinatário da prova não se pode negar. Todavia, não é o único, pois ela tem por destinatários todos os sujeitos do processo. O espírito insculpido no novo regramento exige a construção de um processo mais participativo, mais cooperativo. E não há como pretender esta cooperação sem ter como norte o intuito de garantir que todos os envolvidos tenham a convicção de que a prova produzida foi a mais adequada possível, de modo a permitir uma cognição atrelada à verdade real dos fatos.
Ademais, não se pode olvidar que, salvo em excepcionalíssimos casos, a jurisdição não se exaure na primeira instância, cumprindo aos Tribunais de segundo grau conhecerem das questões de fato que envolvem a lide, sendo ínsita uma reanálise da prova produzida nesse âmbito colegiado. Esse fato, por si só, já induz à conclusão de que, embora o juiz singular seja o responsável direto pela mais completa instrução do feito, a prova é para o processo, destinada a todos os julgadores que definirão o resultado da lide.
Impõe-se considerar que o princípio do livre convencimento motivado ou da persuasão racional, de acordo com o qual o julgador tem liberdade para apreciar e valorar a prova, com a condição de que exponha na decisão as razões de seu convencimento, não pode ser traduzido como uma autorização para que o magistrado descuide do fato de que não é o único destinatário da prova, e que o processo pode não se encerrar com sua decisão. Esse entendimento revela-se em harmonia com a circunstância de o CPC/2015 não ter reproduzido a expressão livre convencimento. Com efeito, enquanto o CPC/1973 consignava, no art. 131, que incumbia ao juiz apreciar livremente a prova, o novo Código limita-se a atribuir ao juiz o dever de apreciar a prova (art. 371). A retirada do termo livremente traz implícita a noção de que a valoração da prova não se pode dar de forma discricionária. Ao proferir a decisão, o juiz deve proceder a uma valoração discursiva da prova, justificando seu convencimento acerca da veracidade das alegações e, mais do que isso, indicando os motivos pelos quais acolhe ou rejeita cada elemento do conjunto probatório, inclusive a produção das provas tidas por imprescindíveis pelos demais interessados no processo.
Com essas considerações em mente, passo a analisar o pedido de produção de provas.
Analisando os documentos carreados aos autos, não há dúvidas de que a decisão de indeferimento da realização de perícia técnica acabou por configurar cerceamento do direito de defesa da parte autora, que se viu impedida de produzir a prova do direito alegado.
Havendo divergência na documentação apresentada pela própria empresa, está configurada a necessidade de perícia judicial para dirimir as dúvidas levantadas, no caso da empresa Sultec.
No que tange a empresa Legour, o autor alega que, diferentemente do que consta no formulário da empresa, a entrada em câmaras frias fazia parte do seu trabalho habitual e diário, na função de serviços gerais. Não há outro modo de demonstrar o seu direito, no caso, que não a realização de prova testemunhal, como requerido. Desse modo, quanto a este lapso, deve ser realizada prova testemunhal e na sequencia, prova pericial, como requerido.
Quanto à empresa Japa, refere a injustificável variação dos níveis de ruído presentes no formulário. Refere também necessária a prova testemunhal para verificar as reais atividades exercidas no período em que laborou no almoxarifado, pois estava sujeito a outros agentes. Portanto, deve ser acolhido o pleito para realização de prova testemunhal e pericial.
Com efeito, a responsabilidade pela confecção e guarda da documentação tradicionalmente adotada para a comprovação do exercício de atividade especial pelos segurados da Previdência Social é do empregador, de modo que, na ausência desses formulários, ou no caso do descompasso entre as informações ali constantes e a realidade laboral efetivamente vivenciada, o trabalhador não possui outros meios para provar seu direito, além da perícia judicial. Não se deve perder de vista que, embora os empregadores não sejam parte integrante da relação jurídica previdenciária, mantida entre o segurado e o INSS, o reconhecimento da existência de insalubridade na atividade prestada implica ônus para as empresas, que são obrigadas a recolher o adicional sobre as contribuições previdenciárias para custeio da aposentadoria especial, motivo pelo qual os laudos por elas produzidos não podem ser tomados como prova plena da inexistência de agentes nocivos, quando há nos autos elementos probatórios a indicar que a realidade laboral pode ter sido diversa da atestada. Ademais, também não se deve desconsiderar o dever de fiscalização da própria autarquia previdenciária.
Desse modo, o indeferimento da realização da prova pericial somente deve ser adotado nos casos em que a documentação carreada aos autos está regularmente constituída e é coerente com a generalidade dos casos similares, sob pena de se tolher o direito do trabalhador de produzir a prova da insalubridade que alegou sofrer, o que não pode jamais ser admitido, sobretudo levando-se em conta a natureza de direito fundamental que reveste o direito previdenciário.
Impõe-se, assim, que seja dado provimento ao apelo da parte autora para anular a sentença e determinar o retorno do feito ao Juízo de origem, para que se proceda à reabertura da instrução processual, com a realização de prova testemunhal acerca das efetivas atividades exercidas nas empresas LEGOUR INDÚSTRIA E COMÉRCIO DE ALIMENTOS LTDA., JAPA COMPONENTES LTDA ME. e pericial nas empresas SULTEC METALÚRGICA LTDA., LEGOUR INDÚSTRIA E COMÉRCIO DE ALIMENTOS LTDA., JAPA COMPONENTES LTDA ME, com vistas à aferição se as atividades desempenhadas nos períodos de 03-05-97 a 18-11-03, 01-04-05 a 17-07-08 e 02-04-12 a 23-07-15 eram especiais em razão de insalubridade, periculosidade ou penosidade.
A perícia deverá ser realizada preferencialmente no próprio local onde exercido o trabalho pela parte autora. Em caso de empresa inativa, a perícia deverá ser realizada em estabelecimento similar.
Saliento ainda que, diante da extinção da possibilidade de enquadramento por categoria profissional, deverá o perito fazer a análise da questão no caso concreto, ou seja, observando as particularidades do trabalho efetivamente desempenhado pela parte autora para verificar se, nesse desempenho, havia algum elemento caracterizador da atividade especial, indicando fundamentadamente os motivos de seu reconhecimento ou não. Sendo verificada a presença de agentes nocivos, deverá o profissional ainda enfrentar a questão relativa aos Equipamentos de Proteção Individual: se houve fornecimento e se, no caso concreto, foram eficazes na atenuação ou neutralização da nocividade dos agentes verificados.
Cumprida a diligência, deverá ser proferido novo julgamento em substituição à sentença anulada.
Ante o exposto, voto por dar provimento ao apelo da parte autora para anular a sentença e determinar a reabertura da instrução, prejudicado o exame do mérito recursal.
Documento eletrônico assinado por JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001126840v8 e do código CRC b53126b4.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
Data e Hora: 4/7/2019, às 14:49:2
Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 02:33:18.
Rua Otávio Francisco Caruso da Rocha, 300, Gabinete do Des. Federal João Batista Pinto Silveira - Bairro: Praia de Belas - CEP: 90010-395 - Fone: (51)3213-3191 - www.trf4.jus.br - Email: gbatista@trf4.jus.br
Apelação Cível Nº 5006651-53.2016.4.04.7113/RS
RELATOR: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELANTE: VALTELEI ALONCO DOS REIS (AUTOR)
APELADO: OS MESMOS
EMENTA
PROCESSUAL CIVIL e PREVIDENCIÁRIO. TEMPO de serviço especial. indeferimento de prova testemunhal e pericial. CERCEAMENTO DE DEFESA. anulação da sentença. REABERTUra DA INSTRUÇÃO.
Ocorre cerceamento de defesa quando indeferida prova necessária ao deslinde do feito, devendo ser anulada a sentença e reaberta a instrução a fim de que seja realizada prova testemunhal e pericial, para comprovar, respectivamente, as atividades efetivamente exercidas e a exposição ou não da parte autora a agentes nocivos no período laboral.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar provimento ao apelo da parte autora para anular a sentença e determinar a reabertura da instrução, prejudicado o exame do mérito recursal, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 03 de julho de 2019.
Documento eletrônico assinado por JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001126841v3 e do código CRC 59207088.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
Data e Hora: 4/7/2019, às 14:49:2
Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 02:33:18.
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Ordinária DE 03/07/2019
Apelação Cível Nº 5006651-53.2016.4.04.7113/RS
RELATOR: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
PRESIDENTE: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELANTE: VALTELEI ALONCO DOS REIS (AUTOR)
ADVOGADO: HENRIQUE OLTRAMARI (OAB RS060442)
APELADO: OS MESMOS
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Ordinária do dia 03/07/2019, na sequência 163, disponibilizada no DE de 17/06/2019.
Certifico que a 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 6ª TURMA, DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PROVIMENTO AO APELO DA PARTE AUTORA PARA ANULAR A SENTENÇA E DETERMINAR A REABERTURA DA INSTRUÇÃO, PREJUDICADO O EXAME DO MÉRITO RECURSAL.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
Votante: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
Votante: Juíza Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
Votante: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER
Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 02:33:18.